Número total de visualizações de páginas

quinta-feira, 24 de março de 2016

palavras bonitas vs. palavras feias

NARRADORA - Era uma vez um grupo de meninos escuteiros, que decidiram fazer uma caminhada pelo monte, com os seus monitores adultos. Cantarolaram o caminho todo, riram muito, e conversaram alegremente, beberam água fresca, e colheram algumas folhas de diferentes árvores que encontraram pelo caminho. Num certo momento da caminhada, um menino sente uma enorme vontade de fazer xixi, e desvia-se um pouco do grupo, indo para um descampado, sem dono, um terreno abandonado. O grupo ia tão distraído com a conversa que não reparou que o menino se tinha desviado, e continuam a andar em direcção ao monte. Param, e fazem a chamada…e…falta um menino. Gera-se o pânico total.
MONITORA – Pedro…?!
MONITOR – Deve estar a brincar connosco às escondidas…!
MONITORA – Vai levar uma tareia…
MONITOR – Só pode! Onde estás, Pedro…?
MONITORA – Pedro…deixa-te de brincadeiras…aparece!
MONITOR (grita) – Peeeeeedddrrrooooooooo….
TODOS (gritam) – Peeeeeedddrrrooooooooo…!
MONITORA (nervosa, grita) – Pedro, não estamos a brincar...aparece!
MONITOR (nervoso) – Isto não é sítio para brincar ao esconde…
MONITORA (nervosa, grita) – Aparece! Estás de castigo!
HELENA (grita, preocupada) – Ai…aqui há maus…!
GABRIELA (assustada) – Será que ele foi raptado?
FILIPA (preocupada) – Ou…engolido por um monstro?
DIANA (assustada) – Ou caiu num poço?
FRANCISCO – Não…tenho a certeza que não aconteceu nada disso!
MONITORA (preocupada) – Calma, meninas…ele vai aparecer…deve estar a pregar-nos alguma partida…calma…!
SARA – Mas com estas coisas não se brincam.
MONITORA – Pois não, mas há meninos muito malandros.
SOFIA – Ele merece uma boa sapatada.
MONITORA – Com certeza…vai ficar de castigo.
MONITOR – Alguém viu o Pedro afastar-se?
TODOS – Não!
MONITOR – Somos todos responsáveis!
MONITORA – Calma…ele vai aparecer…Ai…! Que raio de rapaz. Apetece-me desfazê-lo, mas agora o que eu quero é que ele apareça.
MONITOR (nervoso) – Estamos tramados.
MONITORA (nervosa) – Ele vai aparecer.
MONITOR (nervoso) – Temos que aturar cada uma…
NARRADORA - Desatam todos aos gritos pelo nome do amigo. A monitora grita:
MONITORA - Não se afastem.
MONITOR - Vamos dividir-nos…eu vou com alguns por aqui, tu vais por ali com os outros. Encontramo-nos todos ali naquele campo em baixo.
TODOS - Entendido!
NARRADORA - Os monitores procuram com os meninos…uns correm para um lado, outros correm para o outro. De repente, o menino está a passear-se pelo campo abandonado, e a chorar, muito triste. A monitora encontra-o, e grita-lhe, embora aliviada:
MONITORA - Meu estardalho! Quem é que te mandou separar do resto do grupo?
HELENA (grita, preocupada) – Pensávamos que aqui havia monstros e que te tinham levado! Ou que apareceram maus.
GABRIELA (assustada) – Sim, ou que tinhas sido raptado.
FILIPA (preocupada) – Ou…engolido por um monstro!
DIANA (assustada) – Ou que tinhas caído a um poço?
TODAS – Que susto!
(O menino triste e envergonhado explica)
PEDRO - Desculpem…deu-me vontade de fazer xixi, e desviei-me, mas pensei que tinham visto, e que iam esperar.
SARA - Pois, estávamos distraídos.
MONITORA - Que grande susto que nos pregaste…! Já viste o que era de nós se te acontecesse alguma coisa? Tinhas que ter avisado.
(O menino mostra que entende)
PEDRO - Eu sei, desculpem!
MONITORA - Estás de castigo…desobedeceste e puseste a tua vida em perigo, e a nossa também…porque somos responsáveis por vocês, quando os vossos pais não estão.
PEDRO - Eu sei, tens razão. Desculpa.
MONITORA (vê que ele está a chorar) - Ficaste assustado? Nós ficamos muito mais!
PEDRO - Não. Eu sabia que vocês voltariam por aqui, e ficaria aqui até que voltassem!
MONITORA (elogia) - Muito bem, pelo menos isso…sim…iríamos voltar por aqui. Mas estiveste a chorar, não foi?
PEDRO - Sim, mas não foi por isso.
MONITORA - Então? Estás a fazer chantagem a ver se te livras do castigo não é?
PEDRO – Não. Eu sei que vou ser castigado, e não me importo. Eu mereço. Olhem para este terreno.
(Todos olham em volta)
LÚCIA - O que é que tem de especial?
PEDRO - Está abandonado.
RAQUEL – E depois…?
FILIPA – Tu não estás abandonado, é o que interessa.
PEDRO (triste) – Mas eu fico triste quando vejo isto abandonado.
MONITORA – São sentimentos bonitos.
PEDRO – Não podemos dar vida a isto?
MONITORA – Humm…parece-me bem. É uma boa acção. Pode ser o teu castigo…é isso mesmo! Vens para aqui limpar o terreno todo, e plantar aqui flores, alimentos, ou o que quiseres.
PEDRO – Está bem! Mas têm que me dar dinheiro para comprar as sementes.
MONITORA (sorri) – Não te preocupes com isso.
NARRADORA – Aparece o monitor com os meninos, e ralha com Pedro, humilha-o, diz-lhe coisas muito más, e feias. A monitora Paula tenta acalmá-lo, mas ele não se cala. Todos os amigos de Pedro encolhem-se e ficam assustados com o monitor. O monitor quase bate no Pedro, mas a monitora Paula grita:
MONITORA (grita, nervosa) – Agora cala-te! (O monitor obedece) E nem te atrevas a levantar outra vez a mão, se não, tu é que vais ser castigado e com muito justa causa…tens testemunhas e tudo!
MONITOR – Ok…
MONITORA (grita-lhe) – Ele já se explicou…a culpa não foi dele…todos estávamos distraídos, e ele não ia sair daqui enquanto não voltássemos…já se explicou, e pediu desculpa. Já lhe disse qual vai ser o castigo.
MONITOR – Espero que seja bem pesado.
MONITORA – Vamos voltar para o acampamento.
MONITOR (grita) – Pedro…
MONITORA (grita) – Ele vai aqui comigo.
MONITOR (grita) – Se mais alguém se afastar, fica sem orelhas…
MONITORA (grita) – Vamos. Está tudo bem!
NARRADORA – Tudo segue em silêncio, até ao acampamento. A monitora vai de mão dada com Pedro, que vai a chorar. Ao chegar ao acampamento, os meninos vão para as actividades, mas Pedro não quer participar, e vai para a sua tenda, chorar, depois de ter ouvido o monitor a ralhar com ele, e depois de o ter humilhado e envergonhado. A monitora tenta chama-lo, mas ele não quer, ela fica preocupada.
MONITORA – Pedro, querido…deixa-me entrar…quero saber como estás.
PEDRO (a chorar) – Vai-te embora…! Eu quero ir embora…liga aos meus pais. Eu não quero ficar aqui nem mais um minuto.
MONITORA – Óh, lindo…abre a tenda…eu quero falar contigo.
PEDRO (a chorar) – Mas eu não quero falar contigo…só quero ir embora.
MONITORA – Por favor…deixa-me falar contigo…eu sou tua amiga.
PEDRO (a chorar) – Não és nada…vai-te embora…és amiga daquele…vai para a beira dele.
(A monitora entra na tenda de Pedro)
PEDRO (a chorar encolhido) – Vai-te embora.
MONITORA – Então, querido…?
PEDRO (a chorar) – Para que é que me estás a chamar querido…? Tu não gostas de mim. Só chamamos queridos a quem gostamos mesmo.
MONITORA – Mas é claro que gosto de ti…! É por isso que te chamo querido…
PEDRO (a chorar) – Não gostas.
NARRADORA – A monitora agarra em Pedro, puxa-o, senta-o à beira dela, abraça-o, ele chora.
MONITORA – Óh lindo…então…? O que é que se passa?
PEDRO (a chorar) – Eu nunca mais quero vir para este acampamento…nunca mais quero olhar para aquele…
MONITORA – Com o David…? Eu sei que estás magoado com ele, e tens toda a razão…mas sabes, ele ficou muito assustado…e muito preocupado, por não saber de ti. Claro que ele disse-te coisas muito más, e muito feias, mas não lhe ligues. Ele falou de cabeça quente, estava nervoso e assustado, e quando isso acontece, dizemos coisas que não queríamos. Mas nada do que ele disse é verdade.
PEDRO – Não quero saber…ele disse…eu quero ir embora. Não quero mais vê-lo, nem ficar aqui.
MONITORA – Aqui toda a gente gosta de ti. Não queres estar com o Paulo… estás comigo, e com os meninos.
PEDRO (a chorar) – Eu não quero! Estava a gostar muito, mas o Paulo fez-me não gostar mais.
MONITORA – Perdoa-o, querido, para te sentires um bocadinho mais feliz.
PEDRO (a chorar) – Nunca…! Nunca o vou perdoar. Eu não presto…quero ir para um sítio, onde dizem que gostam de mim, e pelo menos nunca me disseram aquelas coisas que o Paulo disse.
MONITORA – Tenho a certeza que ele está arrependido e que te vai pedir desculpa.
PEDRO (a chorar) – Eu não quero saber, que ele esteja arrependido, ou que me venha pedir desculpa…não vai adiantar nada! Nunca o vou perdoar.
MONITORA – Quando não estiveres tão triste, vais conseguir perdoá-lo…és um bom menino! Tens toda a razão…ele foi muito mau…mas não te quis magoar…!
PEDRO (a chorar) – Isso não serve de desculpa.
MONITORA – Pois não…não és obrigado a perdoá-lo, mas também não precisas de ir embora! Se vais embora…quem é que vai tratar daquele terreno?
PEDRO (a chorar) – Ele que trate…ou os outros.
MONITORA – Vá lá…não vás embora…por causa do Paulo. Ele não merece isso…nem os outros meninos. Nem tu. Não gostas de mim?
PEDRO (chateado) – Mais ou menos.
MONITORA (sorri) – Eu entendo…foi porque te ralhei…mas só ralhei porque fiquei muito preocupada, e assustada…! E é porque gosto muito de ti, se não, não ficaria tão preocupada.
NARRADORA – A monitora tem uma longa conversa com ele, e tenta acalmá-lo, e animá-lo. Ela dá-lhe carinho, fá-lo rir, elogia-o, valoriza-o, e ele acaba por ficar. Nessa noite não volta a juntar-se ao grupo, fica na sua tenda, e quase não dorme, pois ficou mesmo muito triste e magoado. Ao amanhecer, Pedro levanta-se, veste-se, toma o pequeno-almoço, pega em utensílios de campo, nas sementes variadas, e leva tudo na sua mochilinha, incluindo água e alimento, uma muda de roupa e chinelos. Ele informa as funcionárias que vai sair para cumprir o seu castigo. O monitor está arrependido do que disse ao menino, e pretende falar com ele. Lá vai o menino triste, para o terreno abandonado. Está um amanhecer fresco, e o menino começa a alisar a terra, a arrancar ervas secas, humedece o terreno, com as suas lágrimas, misturadas com água do poço que abriu, cava buraquinhos, coloca as sementes espalhadas…tudo como aprendeu. Depois de tudo plantado, bebe água, e caminha à volta do terreno, e volta para o acampamento. No acampamento, o monitor tenta falar com o menino, mas este vira-lhe as costas, e não fala com ele, foge dele, mas brinca com os outros meninos. Uns dias mais tarde, voltam a passear pelo terreno, e…Uaaaauuu…estão a aparecer as primeiras folhinhas de florinhas. Que lindo…Pedro fica orgulhoso, assim como a monitora. Os dois regam o terreno, e mais uns dias depois, as flores estão fora da terra. Cada qual a mais bonita, os legumes também já começam a mostrar-se, e o campo abandonado, ganha agora uma nova vida. Que lindo que está! Todos os meninos fazem uma grande festa nesse terreno onde há erva, piqueniques, danças, jogos, sem nunca pisar as plantações. Todos os meninos batem palmas.
MONITORA (sorridente) – Vês, Pedrinho…eis as flores…filhas das tuas lágrimas! (p.c) Vês, como foste preciso…?
MONITOR – Desculpa, Pedro, o que te disse…o outro dia…foi de cabeça quente.
PEDRO – Nunca te vou perdoar. Se não fosse pelas flores, e pelo cumprimento do meu castigo, eu tinha ido embora.
MONITOR – Eu…disse as coisas sem pensar…
PEDRO – Pois, mas os meus ouvidos, ouvem, o meu coração também ouve e sente, e a minha cabeça…ouve, pensa e sente. E não esquecem.
MONITOR – Eu sei que exagerei, mas foi na hora…o que me saiu.
PEDRO – Que pena…eu até gostava de ti.
MONITOR – Eu gosto muito de ti…
PEDRO – Não preciso que gostes de mim. Não deve haver quem goste de ti.
MONITORA – Vá…Paulo…não alimentes mais a mágoa…
MONITOR – Eu entendo que estejas magoado…talvez um dia me entendas.
PEDRO – Nunca serei igual a ti…nunca fui…nunca serei…não tenho pais como tu, felizmente…não tens bondade no coração, nem delicadeza…mas eu tenho! É pena que não tenhas.
MONITOR – Já pareces um adulto a falar…
PEDRO – Não é preciso ser adulto…basta ter ouvido o que eu ouvi da tua boca, e a monitora que gosta de mim, que tem bondade no coração.
MONITOR – Foste tu que lhe falaste de mim…?
MONITORA – Sim. E qual é o problema? Para curar a ferida que lhe fizeste, quando abriste essa boca. Só assim ele continuou aqui. Eu teria ido mesmo embora, depois do que ouvi. Bem…ele não te perdoa, mas as férias continuam…vamos continuar a divertir-nos.
NARRADORA – Pois é…há palavras que nos saem pela boca, sem que a nossa cabeça pense, e sem que o coração queira libertar essas palavras. Há coisas que dizemos e não queríamos, mas quando o coração está magoado, não consegue escondê-las. Ficamos muito tristes com muitas palavras que ouvimos dos outros, e ficamos magoados com essas pessoas…pelo menos enquanto não conseguimos esquecer. Devemos sempre pedir desculpa, se fomos nós que dissemos palavras que não queríamos, a alguém que era muito querido e especial para nós…e devíamos perdoar as palavras que outros nos dizem, e que nos magoam, mas nem sempre é fácil. O melhor nessas alturas é arrefecer, e quando os dois estiverem calmos, falar um com o outro…dizer o que realmente sentiram e sentem, e dizer que se sentem magoados porque…podemos perder amizades muito boas por causa de palavras que nos saem sem pedir autorização, quando o coração está magoado. Ou então, falar uns tempos depois. E devemos sempre que possível, sempre que for verdadeiro, dizer coisas agradáveis ou bonitas sobre as pessoas à nossa volta. Todos gostamos de ouvir palavras bonitas, e que nos dêem valor, que reparem nas nossas qualidades, e no que fazemos bem…não há que ter vergonha de o fazer. Faz-nos bem, e fazemos bem aos outros…e melhor…poderemos receber de volta, alguma palavra agradável.

Actividade:
Vocês dizem coisas agradáveis e bonitas uns aos outros?
Que coisas bonitas e ou agradáveis dizem? (elogiam a roupa, o sorriso, os olhos, as letras…?)
Como se sentem ao fazer isso?
Como acham que os outros que ouvem se sentem?
Como é que eles ficam?
E vocês ouvem palavras bonitas ou agradáveis sobre vocês? Quais?
Como se sentem ao ouvir essas coisas bonitas e agradáveis?
Experimentem dizer coisas bonitas e agradáveis uns aos outros.

FIM
Lálá 
(24/Maio/2013)




Sem comentários:

Enviar um comentário

Muito obrigada pela visita, e leitura! Voltem sempre, e votem na (s) vossa (s) história (s) preferida (s). Boas leituras