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segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021

O trombone mágico

       


Era uma vez uma pequena aldeia, onde viviam muitas famílias enormes de animais. Havia paz enquanto não foi para lá um rapaz que tocava trombone, foi à procura de inspiração. Ainda ninguém o tinha visto, mas sentiam um violento tremor de terra, nas casas, e em toda a floresta, associado a um barulho estrondoso, que ecoava por todo o lado, parecia atravessar todos os seres vivos. 

        Até as flores se encolhiam, os animais recolhiam às suas tocas com o medo. Andavam todos muito intrigados e assustados, não falavam noutra coisa quando se encontravam, e ninguém sabia explicar. Os mochos e as corujas apercebiam-se de algo estranho, sentiam-se agitadas, mas não viam nada. Passados alguns dias, viram um vulto, a passear-se lentamente, de um lado para o outro, com alguma coisa ao lado. 

- Cuidado... temos aqui um intruso. - alerta um urso 

- Vamos lá falar com ele, mas devagar... e vamos todos juntos para o caso de ele ser perigoso. - sugere um lobo 

- Boa. - apoiam todos 

        Sorrateiramente, aproximaram-se e como quem não quer a coisa, o mais corajoso, passeou-se devagar a assoviar e a olhar para todo o lado. Tinham combinado esconderem-se, e estarem juntos, caso fosse preciso. Tudo estava silencioso, os animais à escuta muito atentos. 

- Boa noite! - diz um urso

- Boa noite, óh, um urso...(disfarça o medo) que surpresa agradável... não me vais comer, pois não? 

- Não, não... está descansado, acabei de jantar, e comi muito bem. - diz o urso a sorrir 

- Áh!

- Vives aqui? - pergunta o urso 

- Não... quer dizer, agora sim. Espero que não me corram daqui, porque já fui corrido do lugar onde vivia. - responde o rapaz 

- E porque vieste para aqui? - pergunta o urso 

- Porque aqui posso fazer barulho! - responde o rapaz 

- E que barulho fazias? - pergunta o urso 

- Toco trombone, estudo música, tinha de tocar fora das aulas para ensaiar. Eu sei que faz muito barulho. 

- Áh...um trombone...é isso que tens aí ao teu lado? 

- Sim. 

- Mas aqui já tocaste alguma vez? 

- Já. 

            Os animais saem todos do esconderijo. 

- Então o tremor de terra que ouvimos és tu a tocar isso?! - pergunta um lobo com os dentes de fora, a rosnar 

- Óh, vocês já ouviram? - pergunta o rapaz assustado 

- Claro, era impossível não ouvir. Tudo treme, as flores encolhem-se, vai tudo para casa. 

- Andávamos todos muito preocupados.   

- Mas como te atreves...? - resmunga uma girafa 

- Não podes tocar isso de noite! - alerta um sapo 

- Nem imaginas o barulho e os estragos que essa coisa faz. 

- A sério? - pergunta o rapaz 

- Ora toca só uma vez para tu veres...até lá em baixo sentimos! - sugere uma toupeira

            O jovem toca, e tudo abana. 

- Estás a ver? 

- Óh... desculpem. E de dia, posso tocar? 

- Não! - gritam todos 

- Isso abana de dia e de noite! - responde uma lebre 

- Temos todos, filhos pequenos, precisam de sossego e nós também. - alerta uma cabrinha do monte 

- Eles ficam muito nervosos. 

- Vais ter de escolher outro sítio. 

- Óh, não! Por favor, deixem-me ficar. - implora o rapaz 

            Olham-se todos, juntam-se, conversam entre eles, quase não se percebe nada, e o urso comunica: 

- O que nos dás em troca, se te deixarmos ficar? 

- Tudo o que vocês quiserem. 

            Reúnem-se outra vez, juntam-se, conversam entre eles, quase sem se perceber, e o urso comunica: 

- Porque é que escolheste este lugar? 

- Porque achei que era um ligar bonito, inspirador, e livre para poder tocar. 

- Vamos construir-te uma casa para não fazeres as nossas casas tremerem. Até lá, não faças barulho por favor. 

- Óh, muito obrigada. Querem a minha ajuda? 

- Está bem. 

            O jovem tem uma longa conversa com os animais, sobre o trombone, como se toca, e outros instrumentos. fala sobre ele próprio, a família, a cidade, a escola. Os animais estão deliciados a ouvi-los. 

            Como prometido, no dia seguinte todos os animais e o rapaz constroem uma casa para o jovem tocar, à prova de som, onde ele podia tocar à vontade sem fazer tremer toda a floresta. Não podia estar mais feliz, e tocou para experimentar, que alívio, os animais não sentiram o chão nem as casas a tremer, sorriram, e aplaudiram.

- Muito obrigada, amigos! Obrigada. Está uma casa maravilhosa. Nem tenho palavras para agradecer. 

            Quando ia para tocar, todos tapam os ouvidos e quando se preparavam para fugir, do trombone não sai o som, mas sim, milhares de bolas de sabão e flores, todas lindas, uma de cada cor e espécie. O rapaz não tinha revelado, mas também era mágico, por isso, para agradecer, ofereceu várias flores a cada animal pela casa. 

            Os animais pequeninos ficaram loucos de alegria a correr atrás das milhares de bolas de sabão que voavam do trombone, as fêmeas adoraram as flores, que receberam às dezenas, e para os machos não havia nada...? Sim, do trombone saíram os petiscos preferidos deles, que o jovem ficou a conhecer quando conversou com eles. Comeram com satisfação. 

            Depois desse dia, o jovem tocava na sua casa, construída pelos animais, sem os incomodar, convivia com eles, convidava-os para concertos, na floresta, só para eles, dançavam, cantavam e alguns até quiseram aprender a tocar diferentes instrumentos. 

            Como era mágico, sempre que os animais precisavam de alguma coisa, o jovem dava. Uns tempos depois, o rapaz levou lá a sua família e apresentou todos os animais que os receberam de forma muito simpática.  

            Todos o adoravam! 

                                                                   FIM 

                                                                Lara Rocha 

                                                            22/Fevereiro/2021            

domingo, 21 de fevereiro de 2021

monólogo reflexão sobre a sexualidade


 Reflexão sobre sexualidade


O ser humano é um corpo, tem um corpo, mas é muito mais do que isso, é um todo, construído desde a conceção, influenciado pela genética, ambiente, relação de vinculação, estímulos internos e externos.

Possui um espírito, uma mente, uma alma, uma personalidade e uma sexualidade, seja ela qual for. É uma energia que faz parte de nós, desenvolve-se e adapta-se, manifesta-se com recurso ao corpo.

O corpo mantém-nos em contacto com o outro, aproxima e afasta, embora todos tenhamos o desejo e a necessidade de ternura, de amor nas suas diferentes formas. Homem e mulher, são diferentes nos carateres que definem o seu género biologicamente determinado no que se refere a anatomia, fisiologia e emocionalidade.

Apesar das diferenças, os dois géneros complementam-se, e partilham em comum o aspeto social, a necessidade de partilhar experiências, afetos, sentimentos, ternuras, carinhos, gestos de amor e contacto íntimo com alguém.

A sexualidade humana, abarca várias dimensões: biológica, psicológica, social e moral. A dimensão biológica (as diferenças físicas; mecanismos de reprodução, as alterações físicas que o corpo vai conhecendo).

A dimensão psicológica composta por emoções e sentimentos que vão mudando ao longo do desenvolvimento, logo, opiniões relativas à própria imagem (maior ou menor apreciação e valorização do corpo).

A dimensão social, que se reflete nos contactos sociais, nas relações bem e, ou mal sucedidas, os comportamentos esperados pela sociedade e atribuídos por esta a cada género.

Não menos importante é a vertente espiritual que de certa forma, molda a forma como cada um de nós vai assumir os seus compromissos, e as consequências que advirão das suas escolhas feitas livremente, o valor que dará a rituais religiosos, de união, ou a interpretação que fazem do divórcio, do casamento, das uniões, das relações com os outros, com responsabilidade por si e pelos outros.

Somos seres em constante construção, pois confrontamo-nos a todo o momento com um conjunto de escolhas livres para fazermos, decisões para tomarmos e assumirmos a responsabilidade por todas as consequências, às quais respondemos mais ou menos fácil, a par da nossa personalidade e em conjunto com os valores éticos, morais, sociais e culturais que cada família transmite aos seus elementos.

Homens e mulheres têm direito e liberdade de escolha quanto à sua orientação sexual, independentemente do sentido da reprodução, esta deve ser vivida de forma respeitosa, segura, baseada em valores como o dar e receber amor, tendo em conta a dignidade da pessoa.

Este respeito e dignidade, inclui o saber estar na relação com o outro, conhecer-se bem e conhecer o outro através do diálogo assertivo, sincero, aberto, sobre o que cada um gosta, e o que não gosta, encontrando juntos alternativas para que seja do agrado do casal e proporcione, tanto satisfação, realização, como felicidade.

Apesar de sermos livres nas escolhas, é esperado e desejável que não nos esqueçamos de respeitar as escolhas do outro, mesmo que vão contra as nossas, ou que nos desiludam, provoquem dor.

Só assim estaremos a respeitar quer a nossa, quer a dignidade do outro, um fator crucial para a harmonia e felicidade do casal, no sentido de construir um «nós», composto por dois «eus» diferentes, que partilham os mesmos sentimentos, e procuram complementar-se.

Para haver sexualidade tem de haver mútua vontade, mútuo desejo, mútua satisfação. Disponibilidade, por parte dos dois, imaginação, fantasia, cumplicidade, amizade, companheirismo, respeito.

Para haver sexualidade, é essencial a valorização e apreciação do corpo que se tem, sentir prazer na exploração sensorial e emocional, com todos os órgãos dos sentidos disponíveis.

A sexualidade é uma descoberta constante, um conhecimento contínuo (do próprio e do outro), uma (re) descoberta e um (re) apaixonar, brincar, aprender e apoiar. A sexualidade é rir, proteger, chorar, discutir, fazer as pazes, pedir desculpa, dialogar, compreender, e se necessário, deixar estar sossegado/a um pouco.

A sexualidade é também estar em silêncio, no mesmo espaço, lado a lado, a fazer coisas diferentes, e ou estar, simplesmente a contemplar-se, a deixar que os olhos se toquem e conversem entre si, com sorrisos sem sentido, que só os olhos sabem.

A sexualidade está nos momentos em que os corpos relaxam, simplesmente envolvidos nos abraços um do outro, debaixo da manta, no sofá, ou de mãos dadas, ver o outro feliz, com pequenos mimos, abraçar, tocar, beijar, fazer arrepiar, acariciar, segredar, e tudo o que for da vontade conjunta.

Não é sexualidade, as situações em que uma relação é forçada, não é consentida, nem desejada, quando decorre em contexto de violência no qual não existe respeito, nem dignidade.

Não é sexualidade quando a pessoa usa o corpo do outro para satisfação machista, egocêntrica, muito menos quando se expõem momentos íntimos, humilham ou envergonham.

O amor e a sexualidade não são a mesma coisa que posse, nem ciúmes cegos, quando provocam dor, e quando não existe liberdade para cada um ser como é, o que é, consigo, e com os outros.

Lara Rocha

20/Fevereiro/2021

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021

A borboleta tímida

      


             Era uma vez uma borboleta enorme, espetacularmente linda, nas suas cores, e elegância dos seus voos. 

            Mas ela era muito envergonhada, estava na adolescência, e achava que era feia, desajeitada, não merecia ser vista. 

           Tudo isto era falso, mas foi por causa de um bando de abelhas, em especial uma que tinha a mania que mandava, também na adolescência, muito maldosas com todos, menos com quem as seguia. 

           Com a mania que eram as melhores, achavam-se as rainhas do mundo animal, eram demasiado vaidosas, arrogantes e invejosas. 

        Na prática, estes comportamentos eram só para disfarçar a sua auto-estima baixa. Pensavam que precisavam de se armar em poderosas, de ser más, para repararem nelas.                

        Eram mais venenosas do que os seus ferrões, sempre em punho, prontas a atacar quem achavam ser inferiores a elas. Achavam que era assim que conquistavam amizades, mas estavam muito enganadas. 

        A borboleta tímida, era das suas presas preferidas para envenenar. Quando viam que alguém se aproximava da borboleta, iam ter com elas e enchiam-lhes os ouvidos de coisas más, o que fazia com que se afastassem. 

        A borboleta ficava cada vez mais solitária e triste. Escondia-se, chorava, via-se ao espelho e não gostava.  

        Um dia, uma das abelhas que pertencia ao grupo das venenosas, recebeu um aviso de uma abelha rainha, sua madrinha, que não gostava nada desses comportamentos dela. 

        Ouviu um grande ralhete, incluindo a ideia que a borboleta que elas perseguiam não era nada do que aquela venenosa dizia. 

        A abelha rainha explicou porque é que a que se dizia chefe tinha esses comportamentos. Era muito feio, fazia a borboleta sofrer muito, e essa abelha que ela seguia não era de confiança! 

        Aconselhou-a a afastar-se dessa criatura que se achava rainha, porque ela era perigosa, falsa, invejosa, maldosa. 

         Estes não eram os bons valores que os seus pais e os avós, lhe tinham ensinado. Se eles descobrissem iriam com certeza ficar muito tristes, porque pensavam que a filha tinha boas amigas. 

        Conheciam-nas e até tinham boa impressão delas, mas na verdade, não suspeitavam como era realmente a que comandava. A própria abelha madrinha estava desiludida com a afilhada. 

- Desculpe, madrinha! Não sabia que ela era assim. 

- O que ela faz é muito grave! Sabias sim, achavas bonito e que era daquela maneira que iam conseguir conquistar amigas? A dar cabo de uma inocente? A acreditar nas palavras falsas e invejosas de uma, que nem sequer conhece realmente a borboleta? Inventa falsidades contra outros, para ter amigos...quem é que vai gostar ou querer amizade com um pequeno diabo? Só quem for igual a ela, ou não tiver nada na cabeça. Eu pensei que tinhas alguma coisa nessa cabeça, mas afinal também te deixaste levar. Que coisa mais feia...inveja! 

- Mas é que eu...também gosto de ter amigas! 

- Ora essa...isso não é justificação. Ela também gosta, e eu também, mas não temos de ser amigas de todos da nossa espécie. Era só o que faltava, mas pelo menos devemos ter respeito e ser educados com todos, a não ser que nos ofendam, e mesmo nessas situações, é melhor nem responder à letra, porque o que querem é mesmo isso. 

- Mas se eu não ando com elas, fico sem ninguém. 

- Que disparate! Ficas sem ninguém se continuares com essa criatura. Tu por acaso alguma vez falaste com a borboleta? 

- Não! Porque ela diz que ela... 

    A madrinha interrompe: 

- Ela diz...ela diz...e o que ela diz é sagrado, não? Ela também a conhece, por acaso? 

- Acho que...

- Claro que não conhece! Tem inveja dela, por ser tão bonita! Quem lhe dera ser como ela. Como a borboleta não fala com ela, nem a segue, ela inventa uma maneira de ser da borboleta que não existe, porque não a conhece. É tudo baseado na inveja. Achas que esse tipo de amigas serve? Para mim nunca serviu, e para ti também não, aliás, não te ensinamos a ser assim. Não faltam abelhas boas, que talvez não se tenham aproximado de ti porque andas com aquela maldosa, por isso, antes que eu vá contar aos teus pais e avós que andas com más companhias afasta-te dessa miserável. Vai ter com a borboleta, conversa com ela. Ela é muito tímida, passeia com ela, diz-lhe que a queres conhecer, e ser amiga dela. Fala-lhe de ti e pergunta-lhe coisas sobre ela. Mostra-lhe coisas boas e bonitas, brinca com ela, mostra-lhe como ela é bonita. Preocupo-me contigo, é por isso que te estou a dizer isto, antes que seja muito pior, entendido? 

- Entendido! Mas, óh madrinha, o que é que eu digo à rainha abelha? 

- Ora...não tens que lhe dar satisfações, não somos obrigados a andar com quem não gostamos, nem temos de ter amigas só da mesma espécie. Se ela meter veneno, não acredites no que ela diz até porque quando conheceres realmente a borboleta, vais ver que ela não tem razão. Deixa-a falar. 

- Está bem! 

- Olha que eu estou a ver! 

- Madrinha, acompanhe-me por favor, e vá-me dando ideias para conversar com ela. 

- Está bem, eu estou próxima, mas sê tu mesma, como és, connosco por exemplo, na família, 

- Está bem, entendi. 

        As duas vão ter com a borboleta que estava muito chorosa, sentada na beirada da sua janela, encolhida. A abelha aproxima-se a medo. 

- Olá como estás? Precisas de alguma coisa? 

- Quem és tu? - pergunta a borboleta? 

- Não tenhas medo de mim. Sou uma abelha, mas... pareces-me muito triste! Queres...conversar comigo? 

- Senta-te!     


A abelha senta-se à beira da borboleta, olha para ela.

- Adoro as cores das tuas asas! Como és bonita!

- Achas? Obrigada... eu acho que não... quer dizer...dizem que não!

- Ui, quem é que diz que não?

- Umas que andam para aí.

- Óh, não lhes ligues.

        A borboleta conta-lhe tudo, falha-lhe da sua tristeza e solidão, de se achar feia, das coisas más que ouve

sobre ela, A abelha ouve-a sem interromper, e até deixa escapar umas lágrimas.

- Mas isso é muito mau! Eu sei quem faz isso para te magoar.

- Sabes?

- Sei. É a abelha que se dizia chefe, com quem eu andava. Eu, e muitas outras. Eu não sabia que ela era assim tão má!

Juntei-me a ela porque também tinha medo de ficar sozinha, medo que ela dissesse coisas más sobre mim.

Mas a minha madrinha avisou-me, sobre como ele é realmente! Aconselhou-me a afastar-me dela.

A minha madrinha disse-me que ela faz isso porque tem inveja de ti, por não ser bonita como tu. e porque

quer ter toda a gente do lado dela, para se achar importante, e poderosa!

Algumas das minhas amigas, tal como eu, tinham medo dela, seguiam-na para ele não dizer coisas más.

Mas não temos que seguir alguém, só por medo de ficarmos sozinhas! Se não for aquela...há certamente

muita mais gente que gosta de nós. Vamos passear?

- Vamos.

- Posso dar-te um abraço?

- Claro que sim.

        As duas dão um abraço, e vão passear. Conversam durante longas horas, apreciam a paisagem, dão umas

boas gargalhadas, brincam, a borboleta ensina a abelha a dançar, e aplaude. A madrinha está orgulhosa, mas a

abelha rainha invejosa não acha piada nenhuma.

        Ao ver aquilo, vai envenenar as outras contra a abelha que se tornou amiga da borboleta, e tentam várias vezes

envenenar as outras contra as duas, mas a abelha não lhe dá ouvidos e ainda lhe grita:

- Falsa! Um dia vais estar sozinha, quando as outras perceberem quem és realmente! Não é com esse veneno todo

que vais ter amigos, a não ser que sejam como tu! Também podes ser amiga de quem quiseres!

Até da borboleta que não é nada do que tu disseste.

- Odeio-te! - grita a abelha rainha

- Não faz mal. Há quem me ame, e chegam, não preciso de mais. - responde a abelha

- Borboleta estúpida, feia! - diz a abelha rainha furiosa.

- Não sabes nada, sua ignorante! Vai, vai lá para a tua comandita de veneno, e sê muito feliz.

Duvido que sejas, com essa maldade toda, mas tu é que sabes! - responde a abelha

        Esta abelha aprendeu bem a lição, e tornou-se amiga da borboleta. A amizade entre as dois cresceu, a

abelha ensinou a borboleta a gostar dela própria, a achar-se bonita como era realmente, e a mostrar como era especial.

Aos poucos, outras abelhas do grupo, começaram a sentir curiosidade em conhecer a borboleta, porque a viam tão feliz

e tão animada com a sua amiga abelha, e perceberam que realmente, a que se dizia amiga delas, era um grande veneno,

maldosa, arrogante e convencida.

        Todas se afastaram dela, e ela acabou por aprender a mudar o seu mau feitio, só assim conseguiu conquistar alguns amigos.

A própria abelha rainha percebeu que afinal estava errada sobre a borboleta, pediu desculpa, mas não se aproximava muito.

Mas não precisava de fazer isso, pois não? Não! Também há pessoas assim, por isso é importante gostarmos

de nós, como somos, aceitar o que somos, e quem somos! E antes de nos deixarmos levar «abelhas venenosas»,

devemos procurar conhecer as pessoas, por nós, tirar as nossas próprias conclusões, e perceber se gostamos da pessoa ou não.

        Claro que não gostamos de todos, nem todos têm de gostar de nós, mas não devemos influenciar os outros,

nem dizer que não gostamos de alguém só porque outro disse mal, coisas que nem sabemos se são verdadeiras ou falsas.

Antes de sermos todos «abelhas venenosas», podemos e devemos ser abelhas e borboletas.

Cada um é diferente, até nos gostos.


                                                                               FIM

                                                                            Lara Rocha

                                                                        10/Fevereiro/2021


 

O coro dos quatro mochinhos

           

        Era uma vez quatro mochos pequeninos, simpáticos que adoravam brincar com palavras e construíam autênticas histórias, ao responder uns aos outros, quando alguém os ouvia. 
        Muitas pessoas não percebiam o que diziam, mas conseguiam imaginar diálogos entre eles. Gostavam muito de ser vistos e ouvidos, por isso saiam dos seus ninhos e pousavam num tronco à vista de quem passava. 
        Umas pessoas não lhes ligavam nenhuma, mesmo assim, eles divertiam-se, desafiavam-se, e convidavam quem quisesse a fazer o mesmo.                Quando alguém reparava neles, eles começavam a fazer uns barulhos com os bicos como se estivessem a mandar beijinhos para agradecer.
         As pessoas riam, depois ajeitavam as penas, pareciam gente a pentear os cabelos, sorriam, punham-se em posição, umas vezes alinhados, outras vezes, um em cada tronco e começavam a dizer palavras. 
        Desafiavam as pessoas a dizer as palavras que mais gostavam, ou as que saíssem na hora. Todos os dias, muitos respondiam aos desafios dos mochinhos, divertidos, que tanto cantavam em coro, como cada um dizia uma palavra, os outros completavam e todos aplaudiam. 
         Para as pessoas que os mochinhos viam estar tristes, primeiro dançavam, piavam, faziam piruetas e gracinhas, olhavam docemente, pousavam nas mãos, nos braços ou nas pernas, como que a pedir mimo, e a dizer que estavam lá para ela. 
         Normalmente ninguém resistia a tal doçura, e acabavam por abrir grandes sorrisos, acariciar os mochinhos, e dialogar com eles. 
         Para os mochinhos era um prémio que os deixava realmente felizes! Gostavam tanto de brincar e de companhia que até os gatos, os cães vadios ou com donos ladravam, miavam, quando os ouviam, só não respondiam. 
         Quer dizer, os mochinhos não percebiam, mesmo assim criavam histórias inspiradas naquilo que imaginavam ou achavam que os animais queriam dizer. Divertiam-se à grande!             Um dia, um  músico foi para esse parque tocar. Os mochinhos não gostaram nada, porque acharam que ele tocava melhor do que eles, e cantar, nem se fala. 
         Os quatro mochinhos ficaram muito tristes, o músico reparou neles, e achou que...alguma coisa lhe dizia que estavam tristes. 
         Assobiou-lhes, mas eles não responderam. Chegou um Sr. com  alguma idade que já ia a essa árvore muitas vezes conversar com os mochinhos. 
         O músico ficou muito surpreso, por ver que o Sr. falava com eles: 
- Então, moços...hoje não cantam para o Avô? Não me desafiam? Huuummm...estão amuados...! Ou tristes. Será que estão doentes? 
         O músico pensou que o Sr. estava a imaginar coisas, talvez se sentisse sozinho.                      Mesmo assim, meteu conversa com ele: 
- O Sr. desculpe...mas...está a falar comigo? 
          Ele sabia que não falava consigo, mas perguntou para não parecer ofensivo. 

- Olá rapaz! Estou a falar com os meus netos, estes mochinhos. São uma simpatia! Adoram ser o centro das atenções. É maravilhoso ouvi-los, porque inventam histórias, e brincam com as nossas palavras. Convidam-nos a dizer palavras, as que mais gostamos, ou as que nos vierem à mente na hora. Depois, cantam-nas, e respondem uns aos outros. Quer ouvir...? Diga uma palavra! Mochinhos...preparados, filhos? 
    
         Os mochinhos ficam radiantes, com um grande sorriso, mandam os beijinhos, ajeitam as penas, põem-se em posição. 

- Já pode! Diga lá as palavras. 
    
         O músico está com dificuldade em acreditar, mas experimenta, começa a dizer palavras, o Sr. diz outras, os mochinhos completam com as deles, desafiam-se, e respondem aos humanos que dão umas sonoras gargalhadas. 

- Parece que estão mesmo a falar como nós. - diz o músico 

- Com certeza! Venho cá todos os dias conversar com eles, são uma companhia maravilhosa. - diz o Sr.

- Será que podemos experimentar, fazer uma canção, comigo a tocar? - sugere o músico 
   
        Os mochinhos saltitam de alegria e entusiasmo. O Sr. mais velho acrescenta: 

- Eles estão de acordo! Também posso participar? 

- Óh, por favor...claro que sim! Com todo o gosto. - diz o músico 

- Preparados? 

- Sim. 
         Os mochinhos abanam a cabeça a dizer que sim. Chovem palavras de cada um, os mochinhos rapidamente criam histórias com as palavras, inspirados pelos acordes da música. 
         O rapaz grava todas, á medida que começam a conversar, a responder uns aos outros, mais músicas e canções maravilhosas surgem para o músico.   
         Isto chama a atenção, e rapidamente, têm diante deles uma enorme plateia completamente rendida aos acordes dos instrumentos musicais do jovem, e aos diálogos entre humanos e mochinhos. 
         Riem e aplaudem, e todos querem participar. O músico sai de lá feliz, e cheio de novas músicas. 
         No dia seguinte, como gostaram tanto da experiência, muitas educadoras levaram as suas crianças ao parque para construírem histórias coletivas, a partir das palavras que diziam cantadas pelos mochinhos. 
         É bom observar e conversar com a natureza, tão bonita e inspiradora. 
       Imaginem que são os mochinhos; que palavras bonitas gostavam de ouvir? Que palavras bonitas diziam? Construam histórias com os vossos crescidos, e podem colocar aqui, ou enviar-me para o e-mail! 

                                                                            FIM 
                                                                        Lara Rocha 
                                                                    10/Fevereiro/2021           

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2021

As luas foram à praia

        






fotos de Lara Rocha 


            Era uma vez lá no espaço, as luas e as estrelas, o sol e os planetas. Conversavam alegremente, e um dos seus passatempos preferidos era apreciar imagens do planeta terra, em especial as praias e o mar. Um dia pediram à feiticeira Lua Nova que as transformasse em alguma coisa, para poderem visitar as praias do planeta terra sem serem vistas. 

        A feiticeira transformou-as em meninas transparentes e brilhantes, se as vissem pareceriam bolas de sabão, leves com brilhantes a flutuar. E como eram meninas, humanas, sentiram uma deliciosa aragem que transportava um cheirinho a maresia. 

- Hummm...que cheirinho bom! - suspiram todas 

- E esta aragem?! - suspira a quarto minguante 

- Até dá vontade de comer! - diz a quarto crescente, mastigando o ar 

Todas riem, 

- É por isso que tu és quarto crescente, mas só cresces para o lado e para a frente! - diz a lua cheia a brincar 

- Tu cresces muito mais, é por isso que és Lua Cheia. - responde a quarto crescente 

- Claro! Tens toda a razão, mas eu não como ar. - concorda a Lua Cheia 

Todas riem, a Lua Cheia senta-se no chão, 

- Meninas...apreciem este som! - alerta a quarto minguante 

- Ááááhhh... - suspiram todas 

- É o cantar do mar! - repara a luz quarto crescente 

- É! - dizem todas 

- Que lindo! Que bom que é ouvir este som. Sentem-se e sintam esta maciez de chão onde estamos pousadas. - diz a Lua Cheia

         Sentam-se na areia, mexem-lhe com as mãos, deitam-se, e olham para o céu.

- Áh! Que pontinhos são aqueles?

- São as estrelas!

- Ui, tão pequeninas?

- Claro. Estamos muito, muito, muito longe!

- Não te lembras do que lemos há pouco tempo? Daqui da terra, as estrelas vêem-se assim, minúsculas!

- Áh! Pois é.

- Que lindas!

- Será que elas nos estão a ver?

- Talvez.

            Continuam deitadas a brincar com a areia: pegam nela, pousam-na, cheiram-na, esfregam-na pelo

corpo todo, correm, rebolam.

- É muito diferente da nossa! - repara a Lua Cheia

- Pois é!

- Vamos levar um bocadinho para a sentirmos lá em cima.

- Boa!

- E aquela água toda?

- É o mar!

- Será que podemos ir lá experimentar?

- Sim.

            Levantam-se e a Lua Cheia ilumina o mar. As ondas maiores estão longe da costa, e há muitas possecas.

Tudo está calmo. Elas molham os pés.

- Uaaaauuuu...

- Que espetáculo de água.

- Áh!

- Olhem aquelas ervas que vimos nos livros.

- Não são ervas, são as algas! Chamam-se algas.

- Isso.

- As lapas coladas às rochas...

- Os peixinhos a rabiar...

                Todas riem, molham-se, deitam-se na areia molhada, e lavam-se na água. Pegam na areia seca,

e na areia molhada para verem a diferença, Esfregam uma e outra, voltam a tomar banho. Caminham pela praia,

e começam a ver coisas estranhas na areia. Toneladas de lixo de toda a espécie: cordas, garrafas de vidro, de plástico,

copos de plástico, paus, pedras, papéis, pneus, fraldas, sacos de plástico, palhinhas, restos de comida.

- Mas o que é isto? - perguntam todas

- É lixo.

- O passeio estava a ser tão bom, estávamos a ver tanta coisa bonita, e agora... isto?

- Não posso acreditar!

- Pois é, minhas queridas, o vosso lugar de sonho, é maravilho mas também tem estas coisas más! Os humanos no seu pior! - diz a Feiticeira

- E agora?

- Mas é muito injusto!

- Que ingratos!

- Não se faz!

- Podemos fazer alguma coisa?

- Talvez...limpar....

- Boa ideia.

- Mas o que fazemos com esta nojice toda?

            A Lua Nova atira sacos do lixo, pás, engaços, luvas grossas, tenazes para pegarem no lixo, e explica o que tem de fazer.,

As pobres Luas passam o resto da noite a apanhar lixo, a conversar umas com as outras. Depois de tanto trabalho , a compensação...

Veem o sol nascer. Que coisa mais linda, mágica e especial.

Nunca tinham presenciado, nem sequer imaginado, como era bonito o nascer do dia, visto da terra.

Já tinham lido sobre isso, mas uma coisa era ler, e ver em livros, outra era presenciar, sentir tudo o que aquelas cores transmitiam.

- Parabéns, querido sol, e obrigada por este presente.

- Como és lindo, aqui em baixo e aí em cima.

- Como é que estes seres que vivem aqui em baixo são capazes de desperdiçar tanta coisa tão bonita, e enchem de lixo?

- Já que o fazem, deviam apanhá-lo.

- Também acho.

- Deviam engoli-lo. - resmunga a Lua Cheia

- Lua Nova, podemos dar só mais uma voltinha pela praia, para ver como é de dia? - pede a Lua quarto minguante

- Sim, podem! Aproveitem, e quando quiserem voltar é só chamar. - sugere a Lua Nova

- Obrigada! - respondem todas

            As luas passeiam pela praia, veem tudo ao pormenor encantadas, sentem outra vez a areia, deitando-se,

esfregando-a nas mãos e no corpo, rebolam, amassam-na, deixam-na escorregar pelos dedos.

- Que linda! Cheia de brilhantes. - repara a lua quarto minguante

- Pois é! - concordam todas

- Mas é macia de noite e de dia! - comenta a lua quarto crescente

- Claro! - dizem todas

- Como é bom senti-la. - diz a Lua Cheia

- Olhem as cores do mar! - repara a lua quarto minguante

- Áhhh...que delícia. Uau! - exclamam todas

- Como é grande e tem tanta cor diferente. - diz a Lua quarto crescente

- Cada qual a mais bonita. - comenta a Lua quarto minguante

            Voltam a molhar-se no mar, veem as lapas, pequenos e grandes caranguejos, e uma surpresa muito especial, que não estavam à espera.

A Lua Nova escolheu búzios de vários tamanhos, conchas grandes e pequenas, algumas pedrinhas de cores diferentes.

Duas garrafas de vidro para cada uma. A Lua Nova chama a atenção:

- Meninas, estão aí duas garrafas de vidro para cada uma. Uma para meterem areia, seca e molhada, os búzios, as conchas e as pedrinhas, a outra para meterem a água do mar.

- Ááááhhh...Que lindas! Obrigada! - dizem todas com um grande sorriso

            As luas recolhem tudo.

- Querem voltar, ou ficar? - pergunta a Lua Nova

- Vamos voltar. - respondem todas

           A Lua Nova transporta as fases, e estão felizes, com os olhos cheios de coisas bonitas, boas.

A única coisa que não gostaram, foi do lixo, mas não era da responsabilidade delas.

Mesmo assim tinham dado um passeio inesquecível. Depois do passeio, dormem uma bela soneca.


                                                                    Fim

                                                                Lara Rocha

                                                                4/Fevereiro/2021

A lenda dos patos

         


Foto de Lara Rocha


Era uma vez um lago cheio de patos e cisnes lindos, grandes, vistosos, num parque de uma grande cidade, onde antes, há muitos séculos atrás existiu um castelo, e uma lenda. Dizia-se que os patos desse lago, certamente não eram estes que lá estavam agora, foram alimentados por uma princesa, e dos seus bicos choveram centenas ou milhares de flores, de todas as espécies e cores. 

         Essas flores transformaram totalmente o Rei que vivia nesse castelo, a dada altura ficou completamente sozinho, porque todos os empregados, e família não suportavam mais o seu mau humor. Era um homem ainda novo, mas muito carrancudo, resmungão, nervoso, infeliz, muito arrogante, vaidoso, e não tinha conseguido conquistar nenhuma princesa. 

         Odiava tudo e todos, até a natureza, nem os patos escapavam, até que a princesa os fez deitar flores pelos bicos, enquanto conversava com ele. Ela percebeu que havia outro homem diferente por baixo daquele que se mostrava. 

         Dizem que o Rei pensou que estava a ver coisas, pela sua solidão, mas quando viu a princesa e esta falou com ele, percebeu que era real. Ficou tão maravilhado com aqueles flores todas que começou a mostrar o seu melhor. 

         Passearam por todo o castelo, e o Rei estava a ver tudo como se fosse a primeira vez, totalmente rendido a tanta beleza. Embora o Rei dissesse que não conhecia aqueles espaços, a princesa disse-lhe que eles sempre estiveram lá, mas ele não os via porque só estava centrado nele próprio, no mau, no feio, irritante, na dor, na desilusão. 

         Enquanto passeavam e conversavam, riam muito, e o Rei  mostrou sorrisos abertos, já não parecia o mesmo, deu gargalhadas sonoras, os seus olhos ganharam um novo brilho, como nunca antes se tinha visto. A princesa ria com vontade, principalmente de ver que tinha razão ao achar que havia outro homem. 

        Os dois paravam para apreciar cada pormenor, e partilharam histórias que tinham vivido com aquelas coisas. ela estava a adorar vê-lo rir com a alma e expressar-se com todo o corpo. Os dois brincam no jardim, ela cozinha para os dois, e ele põe-se de joelhos para lhe agradecer: 

- Obrigado, princesa! Obrigado por esta manhã, por estares aqui comigo, por me ouvires, obrigado por me mostrares tanta coisa bonita, por este almoço que está uma delícia. 

         A princesa comunica essa mudança a todos os que tinham fugido do castelo, e no mesmo dia regressam. O Rei, envergonhado, pede desculpa a todos e a um de cada vez. Distribui beijos e abraços carinhosos por todos e todas, eles aceitam e retribuem. 

         Todos vivem felizes com o novo Rei que depois de um longo namoro, casam e são eternos namorados. Há pessoas e amores que nos mudam para sempre! Umas fazem-nos mostrar os reis e as rainhas antes das flores dos patos, outras fazem-nos as princesas, reis, rainhas e príncipes, depois de as conhecermos. 

         Nós próprios somos castelos encantados, e às vezes assombrados, com recantos que só os vemos quando alguém nos leva a eles, cheios de mistérios floridos que já existem, só esperam poder sair! Às vezes só o amor consegue isso. 

         Se ficarmos só em nós, não saímos dos pântanos, mas se sairmos de nós mesmos, podemos ver flores e todo um mundo paralelo que a tristeza, a desilusão, e outros não nos deixam ver! Como aconteceu na Lenda dos patos que deitavam flores pelos bicos. 


                                                                           FIM 

                                                                    Lara Rocha 

                                                                4/Fevereiro/2021 

                                                                   

        

            

De dia e de noite

  


    À noite somos sementinhas de flores, fechadas apara o mundo que ficou fora da porta. 
    Deitamo-nos numa nuvem fofa, macia e quente. Recebemos miminhos de pétalas de flores, beijinhos de penas, e abraços de borboletas. 

    Descansamos, no silêncio, e no escuro, sonhamos...medo? Nada de medo! 

  Estamos no nosso quarto. O escuro é mentiroso, sim, gosta de nos contar histórias para nos assustar, mas sabes uma coisa, amiguinho? 

     Vou-te contar um segredo: o medo só faz isso porque quer brincar connosco, nós gostamos de companhia e ele também. A essas horas não é tempo de brincar, mas o medo não tem relógio, nem sabe ver as horas. 

     Primeiro, quando conheci o medo, não gostei nada. Gritei, chorei, chamei pela mamã, e pelo papá, os dois vieram ver o que tinha acontecido. Eu disse-lhes que estava muito escuro, havia barulhos e pequeninos monstros, mas de luz acesa não os via. Só apareciam no escuro. 

    Os papás disseram que era eu a imaginar, porque estava com medo do escuro, mas podia estar descansado e deram a ideia de conversar com o medo. Explicar-lhe que percebia que ele queria brincar, mas na minha cidade, no quarto onde estava, a essas horas não se podia brincar. 

      Eram horas de descansar, para no dia seguinte estar bem disposto e feliz, com os meu amiguinhos. Foi isso que fiz. Quando voltei a encontrá-lo no escuro, dei-lhe o recado, e ele pediu-me desculpa!        Contou-me que se sentia muito sozinho, não tinha amigos, ninguém gostava dele porque não o viam, e porque ele assustava. 

     Coitadinho! Sabem que até fiquei com pena dele? É. É que nós temos amiguinhos, mas ele não. Então, eu e ele fizemos um acordo! Seriamos amigos, ele aceitou, e foi tão querido! Contou-me que tudo o que eu tinha medo no escuro, era ele a tentar conquistar-me. 

     Explicou-me que tudo o que eu via e ouvia, existia no meu quarto. Ele pegava nos seus objetos e brinquedos preferidos, brincava com eles, conversava, explorava-os, rodava-os, transformava-os noutras coisas, e ria com isso! 

     Só fazia isso para eu ver, mas garantiu-me que aquele espaço, o meu quarto, era seguro, sentia-se bem e gostava muito dos meus brinquedos. 

     Até fez um teatro de sombras, com a minha luzinha de presenças e usou os brinquedos que mais gostava. Convida os crescidos da tua casa, a fazerem um teatro de sombras, para verem como é giro. 

    Uau! Foi tão engraçado. Ele tinha toda a razão...aquilo era o que a  nossa imaginação fazia, era...o medo que estava brincar com nossos brinquedos! No escuro ou com pouca luz tudo parece enorme, assustador, diferente. Mas não é perigoso. 

  Isso foi outra coisa que me contou: trabalha com a nossa imaginação, e também, às vezes ele é uma espécie de anjo da guarda. Já viste que giro? Nós temos o nosso Anjo da Guarda, que nos guarda de noite e de dia, e ainda temos outro suplente. O medo! 

     Só que...este Anjo da Guarda, anda de dia! E faz companhia tanto aos pequenos como aos adultos. Não me digas que achavas que os crescidos como os pais, os tios, os Avós, os manos mais velhos, não tinham medos? 

    Claro que têm! Eles dizem que não, tentam convencer-nos que, só as crianças é que têm medo, riem-se dos nossos medos mas eles também os têm! Ainda bem, eles é que não sabem, mas quando têm medo, é este amigo que está ao lado deles, que os acompanha, para não se meterem em coisas perigosas. 

    Por isso, o medo pode parecer assustador mas também é amigo! Depois de sabermos que ele existe, podemos muito bem ser amigos deles, e ele gosta. Já sabes! Se encontrares o medo no teu quarto, não precisas de gritar, nem fugir a correr, é só o medo que quer mais um amigo. 

    Brinca com ele, lembra-te que estão os dois num lugar seguro, e que tudo o que ouves ou vês no escuro, são só as brincadeiras do medo e a convidar-te para te fazer companhia e não se sentir sozinho. Não te esqueças que não te quer fazer mal. 

     Se ele não fizer o teatro de sombras, podes pedir-lhe, ou se não te apetecer brincar com ele, algum dia, não faz mal, diz ao medo que brincarão noutro dia, e deseja-lhe uma boa noite! Ele não vai ficar triste, porque de dia também tem muito trabalho com os crescidos. 

    Agora que já sabes quem é o medo, o que é que ele faz. e porque faz isso connosco: boa noite, descansa, dorme bem em cima da nuvem fofa e macia, para que tu, e todos nós, que somos sementes fechadas à noite, sejamos lindas flores abertas, grandes, coloridas. Amanhã é outro dia! 

                                                            FIM 

                                                        Lara Rocha 

                                                    4/Fevereiro/2021 

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2021

O maestro maluco

 


      Era uma vez um rapaz jovem, que fazia magia e era maestro de um grande coro. 

    Foi despedido porque brincava mais do que tocava, e apesar de ser divertido, o público não gostava, pensavam que ele era maluco. 

     Vivia com os seus pais, mas ficou tão triste que foi à procura de um refúgio para recuperar, e onde pudesse divertir-se. 

      Pôs pés ao caminho, e encontrou um pequeno descampado, feito de palha. Espreitou, não viu ninguém, aquele espacinho era perfeito, não tinha nada. 

     Confiou que lá poderia estar à vontade e inventar as suas músicas, tocar, brincar. Era isso que o fazia sentir-se feliz! Instalou-se confortavelmente, e começou a dedilhar numa viola, tentando construir uma canção. 

     Passou um rebanho de cabras, ovelhas, bodes e o cão, cada um com as suas vozes, pareciam estar a conversar ou a discutir uns com os outros. O rapaz espreitou, e fez uma magia, que trocou as vozes de todos, sem lhes tocar. 

     O cão começou a bramir, as ovelhas, as cabras e os bodes a ladrar. Estavam tão envolvidos nas conversas e discussões que nem repararam nas vozes diferentes, e o rapaz às gargalhadas, até que se fez silêncio, o pastor chegou, e todos voltam às suas vozes normais. 

     Passado um bocado, uma lebre atravessa o espaço a grande velocidade, mas para quando ouve a música, um bando de falcões sobrevoa numa grande algazarra, juntam-se uma manada de bois e vacas a mugir e a deslocar-se devagar, e um gato a miar. Serviu de inspiração para o mágico, que trocou as vozes dos animais. 

     Pôs os bois e as vacas a piar, os falcões a mugir, e a lebre a miar enquanto conversavam uns com os outros, e o mágico às gargalhadas. 

     Aproxima-se um bando de cavalos, a cavalgar e a relinchar, pararam junto dos outros e perguntaram o que estava a acontecer. Explicaram nas suas vozes que ouviam música, não viam ninguém, e que parecia estar a acontecer alguma coisa estranha. 

     O mágico volta a brincar com as vozes dos animais, pondo os cavalos a miar, a lebre a ladrar, os bois a piar, os falcões a mugir, o gato a relinchar. Ele dá umas sonoras gargalhadas. Todos os animais fazem silêncio, não voltam a ouvir música nesse dia. 

      No dia seguinte, o rapaz mágico volta ao refúgio, o rebanho de cabras, ovelhas e bodes passa outra vez, com o cão, juntam-se os falcões, o gato, a lebre, os cavalos, as vacas e os bois. 

      O mágico não resistiu e mostrou-se, apresentou-se, disse que fazia magia, e perguntou se queriam experimentar. Ficaram muito surpresos, e aceitaram. 

     Deu várias voltas aos dedos, a olhar para os diferentes animais, e trocou as vozes todas. 

- Agora sigam os meus movimentos, e falem. 

     Os animais fazem o que ele diz, mas tudo trocado. As ovelhas, cabras, e bodes mugem, os bois miam, as vacas piam, os cavalos bramem, os falcões ladram, o cão e o gato relincham. 

     O mágico ri às gargalhadas, e grava para os animais ouvirem. Fazem silêncio, e quando ouvem, assustam-se, mas no fim dão umas sonoras gargalhadas. 

- Querem fazer outra? 

- Sim! 

     Volta a trocar as vozes aos animais: as vacas e os bois relincham, os falcões bramem, os cavalos piam, o cão mia, o gato ladra, as ovelhas, as cabras e os bodes mugem. 

     Dão umas valentes gargalhadas, e ainda mais quando o jovem os convida a fazerem um coro, com as vozes trocadas. Todos alinham divertidíssimos. A estes juntam-se uma vara de porcos, e um bando de galinhas, e galos. 

     Mas que surpresa agradável, quiseram experimentar, e então, as vacas e os bois cacarejaram, o gato bramiu, os cavalos mugiram, as vacas e os bois miaram, o cão piou, as galinhas e os galos ladraram, os falcões grunhiram, e os porcos relincham. 

     Todos quiseram experimentar as vozes uns dos outros, e muitas gargalhadas. Gostaram tanto que passaram a encontrar-se todos os dias naquele espaço, os que passassem por lá, e juntavam-se para o coro. 

      Os agricultores não gostaram muito da brincadeira no início, mas o mágico também os convidou a participar. Eles aceitaram, participaram e ainda riam às gargalhadas ao ouvir os animais com vozes que não lhes pertenciam. 

      No fim, aplaudiam, formaram quase uma grande e verdadeira família, com amizade, acharam tão divertido que pensaram ser uma boa ideia para dar a conhecer a aldeia, ganhar algum dinheiro com espetáculos. 

      Foi mesmo o que fizeram, e graças a essas brincadeiras do rapaz com os animais, o público divertia-se, e no fim de cada espetáculo deixavam o dinheiro que queriam. 

     Foi a salvação do mágico, dos agricultores, tornando a aldeia muito conhecida, ia gente de aldeias vizinhas e todas as noites os espetáculos eram diferentes, ensaiavam ao longo do dia. 

     Já conheciam os gestos do mágico e sabiam quando era para trocar, cantar, dançar, mudar de vozes. Todos aplaudiam, e eram grandes fãs, tiravam muitas fotos. 

     Fecharam-se muitas portas para este mágico, mas também se abriu uma gigante com a qual ele nunca tinha sequer sonhado ou imaginado vagamente. Voltou a ser feliz, e a fazer muita gente feliz, para ele era o mais importante, e assim pôde ajudar os seus pais. 

                                                            

                                           FIM 

                                        Lara Rocha 

                                    3/Fevereiro/2021