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quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

A MENINA DE ÁGUA


                       desenhada por Lara Rocha 


     Era uma vez uma menina muito especial, que vivia com a sua família numa toca num tronco de árvore, com musgo, folhas, cascas de árvores, bolotas, e pedacinhos de algodão. Dormiam numas verdadeiras camas macias e quentes, feitas com pétalas de flores e edredões cheios de dentes de leão. A casinha tinha tudo!
     A menina andava entre as pessoas, mas nem toda a gente via, porque ela era feita gotas de água, em forma de cristais que brilhavam quando o sol lhe dava, e apareciam arco-íris.
Ao longo do dia, e à noite um conjunto de nuvens descia para o jardim da casa da menina, pousavam entre as duas árvores e formavam um baloiço grande, leve, para onde todos adoravam ir.
A menina sentava-se e dava lanço, outras vezes instalava-se confortavelmente nas nuvens e deixava que o vento tratasse do assunto. Quando ia para o baloiço, conseguia ver muito longe, estava atenta a tudo o que via, via pessoas e natureza.
Era nesses passeios de baloiço que alguns a conseguiam ver, ficam encantados com aqueles pequeninos arco-íris e brilho de cristais que dançavam de um lado para o outro, só as crianças mais pequenas algumas pessoas mais atentas, viam essa beleza.
As crianças mostravam aos pais e a toda a família, mas estes não a viam, achavam que era imaginação dos pequenos. Ela sorria, e acenava a quem a via, e retribuíam. Um dia uma senhora solitária estava à janela e viu a menina a brilhar. Primeiro assustou-se, pensou que estava a ver coisas, olhou, e voltou a olhar, e viu a menina.
- Áh! O que é isto? Que coisa tão bonita. Parece que de repente anda aqui uma estrela! Áh! Ou será que é mesmo uma estrela que caiu? Não…não caiu, ela continua ali…! Será que sou eu que estou a ver coisa? Óh, valham-me todos…será que estou a perder o meu juízo? Será que mais alguém vê? Vou perguntar. Ou, se calhar é melhor não! Não…é melhor não, as minhas amigas e família podem pensar que estou a ficar tolinha! Mas o que será aquilo? Será que é dos meus olhos? Ou será mesmo real? Em criança é que eu costumava ver estas coisas, de fadas, e estrelas, eu não…a minha imaginação, a inocência da criança. Mas acho que as crianças de agora são muito diferentes, talvez elas não vejam! Óh! É lindo. Parecem cristais encadeados em forma de gente, como acontece às vezes nas formas das nuvens, com arco-íris.
     A menina pede às nuvens para a deixarem ir à janela da senhora.
- Olha, agora estão cristais aqui na minha janela?
     Abre a janela, e a menina brilhante com os raios de sol a bater-lhe, sorri à senhora:
- Olá! Sim, estás a ver-me!
- Áh! Como é que sabes?
- Eu vi o teu brilho nos olhos. Deixa-me adivinhar…tu achas que eu não existo, não é? Achas que é tudo da tua imaginação, ou que estás a ver coisas!
- Como é que sabes?
- Eu percebi! Sim, existo. Nem todos me conseguem ver, mas existo!
- Porque é que nem todos te conseguem ver?
- A isso não sei responder, sei que acontece!
- Mas tu és uma estrela lá do imenso Universo?
- Não!
- És um astro? Um meteorito? Um cometa?
- Também não!
- Mas então…
- Sou como tu me vês! Feita de gotas de água, brilho e crio arco-íris quando o sol me bate.
- Sim, é mesmo assim que te vejo! Que linda que és! Entra, vamos conversar um pouco…podes fazer-me companhia?
- Claro!
    A menina entra, a senhora oferece-lhe um chá. As duas conversam, riem e chegam à conclusão que afinal já se conhecem desde há muitos anos, desde que a senhora era bebé.
- Acho que já percebi porque é que nem todos te veem! – Diz a senhora pensativa
- Porquê?
- Porque andam muito distraídos, ou porque a alma deles está velha! Não admira, andam sempre a correr, quase nem falam uns com os outros, é só aquelas porcarias daquelas maquinetas, as crianças de agora nem brincam!
- És capaz de ter razão! Também já percebi isso. Andam sempre a correr, muito irritados, com caras compridas, sempre com os telefones nas orelhas, e aquelas coisas com rodas a fazer barulho, e a deitar fumo.
- Os carros…! Sim, é verdade.
- Mas onde é que eles vão com tanta pressa? – pergunta a menina
- Dizem que vão para o emprego, o que lhes dá dinheiro, é certo, mas também é o que dá cabo deles. Sim, estão sempre irritados com tudo, só gritam, não veem nada do que se passa à volta deles, só quando lhes toca!
- Pois é! Então também andam muito distraídos! – Diz a menina
- Andam!
- Isso é triste. Perdem tanta coisa boa e bonita à volta deles!
- Tens toda a razão! A ti incluída! Não te veem…e és tão bonita! Também és tu que apareces nos campos, por cima da relva, não és? – pergunta a senhora
- Sim, sou eu! Adoro andar pelos campos de manhã, principalmente quando o sol amanhece.
- És o orvalho?! Aquele brilho fantástico das gotinhas de orvalho no frio do Inverno! A geada…
- Sim. É tão bonito de ver! Também és tu, que pousas nas pétalas das flores?
- Sou! Vou muitas vezes cumprimentar e abraçar as minhas amigas flores, por isso que ficam lá os meus passos, tenho de subir pelas suas folhas, e depois gosto de lhes deixar lá uns beijinhos e mimos.
- É um regalo para os meus olhos! E és tu que andas por cima dos poços, às vezes congelados?
- Sim, eu e a minha família, fazemos muitas festas nessa altura, para celebrar aniversários e o Inverno, conviver… então escolhemos sítios onde possamos dançar, claro, que tenha água. Gostamos tanto de estar juntos que até congelamos poços! As nossas festas duram a noite toda, e somos uma família gigante, entre tios, tias, primos, primas, avós, bisavós...
- Então também são vocês que enchem os vidros de gotas, quando nós dizemos que estão embaciados?
- Isso mesmo! Nós andamos por todo o lado.
- As crianças também te devem ver!
- Sim, mas elas não sabem quem sou. Talvez me vejam assim, mas não sabem o que faço, e os adultos acham que sou um ser imaginário dos pequenos!
- Pois, é verdade! Para eles és como as fadas e outras personagens encantadas, mas és muito mais bonita do que elas! As fadas vi-as em criança, mas depois cresci nunca mais as vi, estou agora a ver-te! Estou tão feliz de te ver! Como não tenho o que fazer para já, e adoro ver a natureza, consigo ver-te…
- Claro! Não estás distraída. Ainda bem!
    As duas sorriem. Chegam os filhos e os netos da senhora, e não veem a menina, chegam agarrados aos telemóveis e jogos eletrónicos, cumprimentam a Avó. Ela resmunga-lhes:
- Lá estão vocês com essa porcaria. Não veem nada à vossa volta, com tanta coisa bonita, só veem isso que não tem interesse nenhum. Não está aqui mais ninguém?
     A menina ri, eles respondem:
- Estás tu, Avó!
- Que distraídos…arrumem lá essas coisas, e vão mas é para o campo ver as maravilhas da Natureza!
- Já vimos! – Respondem todos
- Veem agora lá alguma coisa…? Só tendes vento nessas cabeças, não sai nada daí.
    Os netos continuam alheados a tudo. Os filhos, pais dos netos também entram, cumprimentam a senhora, falam a correr, e saem.
- Lá vão eles com o fogo todo no rabo. Que tristeza de mundo. Não têm tempo para nada! Não sei onde vão parar, não veem nada…
    A menina ri-se.
- Nem te viram.
- Não faz mal! Olha, vou ter de te deixar, daqui a pouco são horas de lanchar com a minha família.
- Óh, já?
- Sim, mas volto noutro dia. Agora que me vês, estarei aqui mais vezes, prometo!
- Combinado. Muito obrigada!
- Obrigada eu! Foi um gosto este bocadinho…
- Volta sempre que quiseres.
- Voltarei. Até já!
- Até já.
    A menina deixa uma gotinha no pires da chávena de chá e outra na janela. A senhora sorri encantada. A menina voltou no baloiço de nuvens para a sua casa, e contou o que aconteceu. Os pais e os irmãos ficaram encantados, e quiseram conhecer a senhora. No dia seguinte, foram todos juntos, e encheram a janela da senhora de gotas. Quando a senhora acordou, olhou para a janela, e disse:
- Olá, bom dia! Chegaste cedo, hoje!
- Bom dia! Trouxe os meus pais, os meus irmãos, irmãs e avós que te queriam conhecer!
- Áh! Olá a todos… bem-vindos. Tomem o pequeno-almoço comigo!
    Todos entram em forma de gotinhas, como a menina, e tomam o chá, enquanto conversam com a senhora, muito animados. Depois desse dia, foram visitar mais vezes a senhora, e ela ficava sempre tão feliz, de cada vez que via aquela família de gotas, através das diferentes formas que apareciam.
    Umas vezes em forma de orvalho, outras vezes em forma de chuva, outras em forma de geada, ou poços congelados, e pousavam muitas vezes na janela da senhora, onde deixavam sempre um beijinho em forma de gotinha. 
E muitas outras vezes, entravam na casa da senhora para lhe fazer companhia, conversar, rir, e beber chá.  
     Nem toda a gente via a menina, e a sua família. Andavam todos com muita pressa, muito distraídos, e não reparavam nas coisas que havia à sua volta, tão bonitas, tão especiais como o orvalho em cima da relva, as gotinhas nas flores e nas folhas, as gotinhas nos vidros, os poços congelados e o brilho do sol nas gotas que faz aparecer pequenino arco-íris.
E vocês, conseguem ver esta menina, com a família dela? Ela também anda entre nós. Procurem-na! E digam aos vossos pais para fazerem o mesmo. Vale a pena parar uns minutos para ver a menina de água, e a sua família. Os vossos pais conseguem vê-la? Onde?
Onde podem encontra-la mais?
Podem fazer um desenho da menina gotinha.


FIM
Lálá
24/Janeiro/2018
  história para todas as idades; natureza; orvalho; geada; chuva; gotinhas; cristais; sol; menina; beleza,



terça-feira, 23 de janeiro de 2018

o menino e o papagaio especiais






            Era uma vez um menino que vivia numa aldeia, e passava parte das suas tardes a lançar um papagaio, de plástico, colorido, preso por um fio à sua mão, a correr livre e solto, feliz, com um grande sorriso a levar com o vento na cara que brincava com os seus cabelos encaracolados. Era um menino sorridente, e o papagaio não se cansava de voar ao sabor das suas corridas pelos campos. 
           Os dois conversavam muito, o papagaio contava ao menino coisas que via de cima, e o menino ouvia-o encantado, conseguia imaginar o que o papagaio descrevia. 
Um dia, o menino contou ao seu papagaio o seu desejo de levar uma luz que curasse doentes, aos lugares onde houvesse, e milhares de luzes para que houvesse paz no mundo. O papagaio riu, mas ficou pensativo. 
          Ambos sabiam que ia ser difícil isso acontecer, mas acreditavam que talvez um dia fosse possível acontecer, também não sabiam onde iam arranjar essas luzes tão poderosas, se os médicos não conseguiam curar todas as doenças! 
         Fizeram o seu dia-a-dia normal, as suas corridas e brincadeiras, conversas, e não pensaram mais no assunto. À noite, o menino não conseguia dormir, estava inquieto, dava voltas e mais voltas na cama, mexia e remexia, cobria-se, destapava-se, mas o sono não vinha. Ficou a pensar no seu desejo, e como poderia realizá-lo. Decidiu que iria pedir ajuda ao feiticeiro da aldeia. Sossegou, adormeceu e sonhou com o seu desejo. De manhã, foi a casa do feiticeiro, explicou-lhe o seu desejo, e o feiticeiro riu com vontade: 
- Meu filho, isso é o desejo do mundo inteiro, de todas as pessoas do bem que não praticam a guerra. Eu sou feiticeiro, mas não vou poder realizar esse teu desejo! Desculpa. 
- Porque não? 
- Porque não há nenhuma magia que eu possa fazer para que as pessoas maldosas deixem de pensar em guerra. 
- O amor não pode fazer isso? 
- Pode, mas não há amor assim...por aí, à venda. Tem de vir do coração de cada um de nós, juntamente com a felicidade, a bondade, a vontade de ser bom, e a humildade. O amor é mágico, mas os feiticeiros não podem fabricá-lo! Tem de partir de cada um, já tem de estar em cada um. 
- E os sorrisos? Os abraços? 
- Tudo isso é bom, é do bem, só existe nos corações, eu também não posso fabricar. 
- Porque não? 
- Porque isso também não há assim à venda, há dentro de algumas pessoas, as pessoas que fazem bem, no coração delas, eu não posso andar por aí a roubar bocadinhos de amor, de abraços, e sorrisos, ou outras coisas bonitas. 
- Mas não podes criar uma luz que transmita paz, e que se solte nos sítios que mais precisam? 
- Hummm...não sei. Acho que não! Mas, agora vai brincar, se eu conseguir digo qualquer coisa. 
- Está bem, obrigada. 
            O menino saiu, e o feiticeiro riu às gargalhadas. 
- Santa Inocência! Coitadinho... 
            E continuou a rir, mas de repente parou, pensativo: 
- Espera ai...ele é inocente, mas...uma luz que acalme... talvez consiga criar! Pelo menos para ele não ficar tão triste, e até pode ser que funcione! Uma luz que acalme...que transmita paz....
            Revirou vários livros, procurou, pediu inspiração, e conseguiu criar umas luzinhas muito leves, de cores muito suaves, que acreditava acalmarem. Chamou o menino e comunicou-lhe a invenção. O menino ficou todo iluminado com um sorriso de orelha a orelha. 
- Mas como vais lançar estas luzinhas? - Pergunta o feiticeiro 
- Presas no papagaio. 
- Áh! Está bem! Boa sorte...e vamos acreditar que vão funcionar. Pede ao vento que tas leve para os países em guerra. 
- Está bem! Muito obrigada. 
          O feiticeiro guarda as luzinhas todas num saco. 
- São lindas...! - Diz o menino quase hipnotizado
- Sim, são. - Diz o feiticeiro 
         O menino agradece mais uma vez, e vai logo ter com o seu amigo papagaio. Prendeu as luzinhas no papagaio, e explicou para pedir ao vento que as leve para longe, mas pelo caminho podia largar as luzinhas em muitos sítios onde havia pessoas doentes. O papagaio estava preparado, orgulhoso e feliz por levar umas luzinhas tão poderosas, que acreditava cumprirem o seu desejo. 
- Vai amigo! Boa sorte, estou aqui... vai-me dizendo para onde devo levar-te. 
- Combinado! 
          O menino corre de um lado para o outro, como sempre livre, leve, solto, feliz, e o papagaio voa ao sabor dos seus movimentos, dando indicações ao menino para onde virar. Em todos os sítios onde chegou e sabia que havia pessoas doentes, largou centenas de luzinhas, que seguiram o seu caminho, e foram ter com quem mais precisavam. As pessoas melhoraram e ficaram curadas. 
           Depois, pediu ao vento para levar as luzes para mais longe, onde havia guerra. As luzes voltaram para os campos do menino, umas semanas depois, todas furadas e fundidas, umas largas centenas. O menino nem queria acreditar! Os dois choraram destroçados, perceberam logo que a maldade tinha ganho nesses países, e que até desfizeram as luzes. Começaram a pensar em como estariam as pessoas...se as luzes estavam naquele estado...como não estariam as pessoas, e as crianças, as casas...tudo! 
- O feiticeiro tinha razão! O amor não se vende por aí, tem de vir do coração de cada um de nós, juntamente com a felicidade, a bondade, a vontade de ser bom, e a humildade. O amor é mágico, mas os feiticeiros não podem fabricá-lo! Tem de partir de cada um, já tem de estar em cada um. - Diz o menino ainda a chorar
 - Óh! E nós temos isso tudo, porque nos devolveram as luzes naquele estado? - Lamenta o papagaio 
- Porque não tinham o mesmo que tu, filho! - Diz o feiticeiro que apareceu de repente, sem se saber de onde. 
- Ai que susto...estava tão mergulhado na minha tristeza que não te vi chegar. Já viste o que aconteceu? As luzes que mandei para os países em guerra, voltaram todas furadas! - E desata outra vez a chorar. 
- Claro! Entendo a tua tristeza! Eu disse-te que não podia fabricar paz, tentei fazer umas luzes que despertassem a paz, mas a maldade é tanta que eles nem as viram, não perceberam para que eram! 
- As outras foram entregues, e resultaram! - Diz o menino a chorar 
- Pois! As que curaram. Porque essas pessoas precisam de amor, de abraços, de todos os ingredientes vindos de corações bons, puros, como o teu! O teu desejo era sincero e funcionou.- Diz o feiticeiro 
- Mas o meu desejo para a paz nos países em guerra também era sincero! - Garante o menino 
- Não tenho dúvidas disso. Mas o deles não era! Foi por isso que elas voltaram. - Diz o feiticeiro 
- Óh, estou tão triste! - Diz o menino
- Eu também. Tinha tanta esperança que iam funcionar! - Acrescenta o papagaio
- Parte dela funcionou! Deves sentir orgulho e ficar feliz por isso.- Diz o feiticeiro
- E a outra? - Pergunta o menino 
- Com a outra não podes fazer mais nada, filho! Não vais ser tu a mudar os corações de pedra, que só tem maldade! 
- Porque é que eles são assim? Já pensaram na quantidade de pessoas que...bem, nem quero imaginar como estarão as pessoas, as casas e tudo...se as luzes ficaram assim! 
- Pois! É melhor nem imaginar! Mas continua a pedir nas tuas orações, que haja paz. Pode ser que um dia chegue lá a tua luz, e a de muita gente, a luz da bondade, a luz do amor, do bem. Não podemos fazer mais nada, infelizmente. Apenas podemos espalhar essa luz tão bonita, pelos que estão mais perto de nós, e pelos que querem recebê-la! - Explica o feiticeiro
- Entendi. - Diz o menino
            E naquela tarde, o menino continua triste, arruma as luzes numa gruta, e por cima de cada uma delas deixa cair uma lágrima, tal como o papagaio que o ajuda a arrumar. À noite, chorou outra vez e pediu paz. Ele não conseguiu levar paz e luz aos países que estão em guerra, como queria, mas conseguiu distribuir a sua luz, pelas pessoas que mais precisavam à sua volta, a quem ele ajudava, sorria, abraçava, visitava, com quem brincava, e falava, a quem dava carinho, e a quem dizia palavras simpáticas.
           Ele era um menino bom! Depois da tristeza, voltou a ser o menino feliz que era, que corria livre pelos campos, e adorava que o vento brincasse com os seus cabelos, a fazer voar o seu amigo papagaio. 
           Nós também não podemos acabar com a guerra nos países lá muito longe, mas podemos levar as nossas luzinhas mágicas, às pessoas mais próximas de nós, do bem, com corações bons, ao fazermos pequeninas coisas por elas, como o menino! 
           Experimentem, e podem experimentar rezar também pela paz! A paz só podemos fazer por nós, connosco e com os outros à nossa volta, ela já existe em alguns corações. Vocês conhecem corações bons? 

Fim 
Lálá 
22/Janeiro/2018
 

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

A formiguinha feliz na aldeia dos tristes

desenhado e pintado por Lara Rocha 

Era uma vez uma formiguinha que teve de ir viver para outra aldeia, por causa do seu trabalho. Arranjou rapidamente uma casinha onde ficar, indicada pela sra. Fina, uma abelha rainha dona de muitas casas que alugava e vendia. Não era má, mas não sorria, talvez por ser rainha e por ter de ser séria. A formiguinha instalou-se e acomodou as suas coisas. Petiscou, e foi para a janela ver a paisagem. Estava uma lua cheia lindíssima, mas não se via ninguém. De repente passou um coelho a correr, e parecia assustado.
- Boa noite! - Diz a formiguinha sorridente
O coelho correu ainda mais.
- Áh! Mas porque é que ele está a correr tanto? Nem me respondeu.
Passou uma raposa a caminhar devagar e a farejar.
- Boa noite! - Diz a formiguinha
A raposa olha para ela, e responde sem sorrir:
- Não te conheço, mas...boa noite!
- Sou uma formiga, a nova residente desta casinha. Vim de outra aldeia para aqui, por causa do meu trabalho. Vives aqui?
- Áh! Muito gosto. Sim, vivo aqui. Estou à procura de comida, hoje não fiz as refeições todas.
- Porquê?
- Porque dormi muito.
- Porquê?
- Passei a noite acordada, e dormi de manhã.
- Porquê?
- Porque não tinha sono!
- Porque é que não tinhas sono?
- Não sei!
- Queres comer alguma coisa?
- Tens alguma coisa para me dar?
- Entra e vê, pode ser que tenha.
A raposa fica à porta.
- Entra! - Diz a formiga
- Com licença...
- Já te dei! Porque estás a fazer tantas cerimónias? - Diz a formiga
- Eu? Cerimónias...? O que é isso?
- Parece que estás com vergonha de entrar.
- Áh! Não é bem vergonha...é que...não estou habituado a entrar na casa dos outros.
- Porque não?
- Aqui ninguém faz isso.
- Senta-te! Vê se alguma destas comidas te agrada.
A raposa escolhe alguns pedaços de carne, e bebe um chá com a formiga.
- Então, e de onde vens, formiga? Hummm...esta carne é deliciosa!
- Venho da aldeia do sorriso. Já ouviste falar?
- Sim! Nunca lá fui, mas conheço animais de lá, quando nos encontramos de vez em quando.
- Se se encontram de vez em quando como é que não entras nas casas dos outros?
- Aqui nesta nossa aldeia não.
- Mas qual é o problema?
- Não sei. São regras.
- Na minha aldeia, somos como família, vamos a casa uns dos outros, oferecemos coisas uns aos outros, convivemos e partilhamos o que temos.
- Aqui não fazemos nada disso. A rainha não quer ser incomodada, por isso acha que quem está à sua volta também não pode andar por ai.
- Mas que rainha tão egoísta, e má! Ela não pode fazer isso... quem é ela?- Diz a formiga zangada
- É a que te abriu a porta desta casa.
- É mesmo carrancuda! - Resmunga a formiga
- Carrancuda? O que é isso?
- Que tem um focinho muito comprido, que não sorri.
- O que é sorrir?
A formiga sorri.
- É o que estou a fazer agora, para ti...a sorrir.
- Vejo qualquer coisa de diferente em ti.
- Sim, é normal, estou a sorrir, fico diferente.
- Não sei o que é isso.
- Como não sabes o que é sorrir? Olha para ali, para aquele espelho.
A raposa não sabe sorrir, não consegue.
- Óh, isso deve ser só a tua espécie que faz.
- Claro que não é só a minha espécie, qualquer espécie faz isso!
- A nossa não faz.
- Claro que faz!
- Já nos viste a fazer isso?
- Sorrir...chama-se...sorrir! A ti ainda não vi, à tua família também não, ao coelho que passou aqui também não, passou a correr, nem boa noite me disse. Aquela vossa rainha também não a vi sorrir.
- Pois não. Ela não faz isso que tu fizeste.
- Porque não?
- Não sei. Nunca vi ninguém aqui na aldeia fazer isso! - Diz a raposa pensativa
- Não pode ser!
- Queres ver...? Anda comigo, vamos passear por aí, e vais ver como ninguém faz isso!
A formiga fica muito intrigada e pensativa. As duas saem, e passeiam pela pequena aldeia. Em todas as casas por onde passam, não se vê ninguém a sorrir.
- Mas será possível que ainda não tenha visto um sorriso, além do meu?
- O que é isso que acabaste de dizer?
- Sorriso! Foi o que fiz há bocado...dei um sorriso, sorri.
- Eu não sei fazer isso.
- Parece que aqui realmente ninguém sabe!
A formiga tem uma ideia. Vai de porta em porta a sorrir, e tenta perguntar aos vizinhos se são felizes, e porque não sorriem. Todos os vizinhos lhe fecham a porta no focinho, sem responderem, nem sorrirem.
- Áh! Não posso acreditar. Mas que antipáticos, grossos... isto não se faz! Óh, não...(triste) onde é que eu vim parar...? Acho que vou mudar de aldeia.
- Porquê?
- Porque não gosto de ver tanto animal sem sorriso! Não gosto de antipáticos.
- Mas... (a raposa deixa escapar umas lagriminhas)
- O que foi? - Pergunta a formiga
- Vais-te embora...?
- Vou!
- Óhhh...agora que eu tinha alguém com quem falar e passear, já vais embora?! Aqui somos mesmo assim, tristonhos, mal falamos uns com os outros, só nos conhecemos de vista, bom dia, boa tarde, boa noite, às vezes nem isso! Aqui choram muitas vezes.
- Não admira que chorem! Não sorriem! Não gosto de estar aqui, não falam comigo, fecharam-me a porta no focinho, e não sorriem.
- E eu vou ficar sozinha?
- Já deves estar habituada não?
- Estou com a minha família, mas somos todos assim.
- Sem sorrisos!
- Sim.
- Que tristeza. Eu sou sorridente, adoro sorrir, adoro ver sorrisos, adoro que sorriam e riam para mim, adoro que falem comigo...aqui ninguém faz isso. Não gosto disto!
- Mas...por favor, não vás!
- Vou!
- Não!
- Vou!
- Não!
- Porque não? Se eu estou num sítio onde não sou feliz, vou procurar outro, onde encontre sorrisos, onde me sorriam, onde falem comigo!
- Por favor...não vás...sem antes me ensinares a sorrir!
- O quê? Acho que não posso fazer isso. O sorriso não se aprende, é natural, vem dos nossos olhos, do nosso coração, da nossa cabeça.
- Vá lá! Tenta! Eu quero saber como tu fazes.
- Se queres sorrir...se calhar...tens de vir comigo para outro sítio, onde vejas sorrisos.
- Óh...mas...vou ter de deixar a minha família?
- Não precisas, podes ir e voltar.
- E achas que posso aprender a sorrir?
- Sim. Queres ver? Anda!
- Mas por favor, fica mais um dia.
- Vou pensar.
As duas saem e vão para a aldeia da formiga. Pelo caminho cruzam-se com muitas formigas que param para a cumprimentar, com sorrisos abertos, e trocas de abraços. Ela apresenta a sua amiga raposa, que também recebe sorrisos, olás e abraços. A raposa fica tão feliz que naturalmente, e sem pensar, abre um grande sorriso.
- Áh! Boa! Já consegues sorrir, estás a ver?
- A sério? Estou a fazer o que tu fizeste?
- Estás! Todas com quem me cruzei sorriram, fizeram o que eu fiz, e são minhas amigas, simpáticas!
- Sinto-me tão diferente! São mesmo diferentes das da minha aldeia.
- Pois, sentes-te feliz, estás a sorrir, sorridente...que linda que estás! Adoro ver-te sorrir.
- E tu também estás feliz, formiga?
- Claro que sim, agora sim, depois de ver tantos sorrisos! Vou levá-los na minha memória para me animar naquele sítio onde vou ficar, só até encontrar um sítio melhor.
A raposa dá saltinhos de alegria, com grandes sorrisos e abraça e lambe a formiga, que primeiro se assusta e depois ri, e retribui. As duas conversam alegremente pelo caminho, de regresso a casa, riem e sorriem. Quando chegam à aldeia, a rainha trombuda vem logo resmungar:
- Que pouca vergonha é esta? A esta hora, e com esse comportamento tão estranho? O que andaram a fazer?
- Aprendi a sorrir, rainha! Estou tão feliz! - Diz a raposa
- O que é isso? - Resmunga a rainha
- É...muito bom. Tem de aprender também! De certeza que vai ficar muito mais bonita. - Diz a raposa
- O que estás a dizer? Que eu sou feia?
- Não! Disse que já é bonita, mas se aprender a sorrir, vai ficar ainda mais. Quer ver...?
A raposa dá um abraço à rainha, e lambe-a. A rainha encolhe-se, e ri por uns instantes.
- Mas o que estás a fazer...? Larga-me...
- Gosto muito de si, rainha linda...! - Diz a raposa 
A formiga ri-se, e as duas conseguem derreter o gelo do coração da rainha que se ri, e sorri.
- Há quanto tempo não ouvia isso...! (sorri) Mas estás a falar a sério?
- Sim, estou muito a sério.
A rainha ri:
- E um abraço destes... Ai, sinto-me diferente!
- Pois sente! Está feliz e está a sorrir!
A rainha abana as asas, sorridente, e fica toda luminosa. As duas (formiga e raposa) aplaudem a sorrir:
- Que linda! Uau!
- Vamos ensinar aos outros...? - Sugere a rainha
- Claro que sim! - Dizem as duas
As três engancham os braços, e vão a cantarolar, sorridentes, bater de porta em porta. Quando abrem, ficam completamente surpresos, e as três dizem:
- Sorriam!
- Nova regra para todos... sorrir! Assim, como nós as três! - Diz a rainha
- Aprendam! - Diz a raposa
As três distribuem abraços, sorrisos e beijos por todos, que sem darem por isso, sorriem, até parece que dão luz. O carinho das três, com o sorriso, derretem o gelo e a tristeza que todos os habitantes transmitiam, mas como foi ordem da rainha que depois disso não parou mais de sorrir a toda a gente, de falar com toda a gente e ser simpática com todos, todos se tornaram sorridentes, simpáticos, aprenderam a conviver uns com os outros, a rir, a ir a casa uns dos outros, a partilhar e a brincar, a dar e receber carinho! A formiga estava orgulhosa, e porque agora tinha ensinado um povo tão carrancudo e antipático, a sorrir, e a abraçar, continuou feliz naquela aldeia. A aldeia nunca mais foi a mesma. A formiguinha era quase outra rainha, querida por todos, e a aldeia ganhou vida, alegria, sorrisos, amizades.Sorrir é mesmo bom, deixa-nos mais bonitos, mais felizes, fazemos mais amigos.

                                                                                 FIM
                                                                                 Lálá