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domingo, 21 de abril de 2024

De que são feitas as pastas, capas e mochilas?

     De que são feitas as capas, pastas e mochilas que usamos nas escolas, desde o primeiro ano? Se as capas, pastas e mochilas tivessem memória e falassem, elas diriam que são feitas de muitas coisas! 

    De certeza que se lembrariam do primeiro dia em que foram usadas por nós, diriam que guardavam os nossos medo: o choro de muitos, pelo medo do desconhecido, o medo das mudanças que íamos enfrentar, o medo do ou da professora, o medo dos coleguinhas ou de mesmo sem sabermos, não termos amiguinhos, porque éramos envergonhados, ou porque tínhamos alguma coisa diferente, por isso iam pôr-nos de lado.  

    Lembrariam  das nossas lágrimas, ou do que o nosso corpo libertava mais, com o medo, não queríamos crescer, gostávamos tanto da infância, e sabíamos que ia ser diferente.  

    Lembrariam da quantidade de livros, cadernos, lápis, canetas, marcadores, tesouras, réguas, colas, e outro material que íamos utilizar. Ansiosos por estrear e utilizar aquilo tudo. 

    Recordariam as primeiras letras que aprendemos, as imagens, os exercícios, os gritos e ralhetes dos professores, quando errávamos, ou quando algum menino se comportava mal, o medo de fazer mal, misturado com a curiosidade e a ansiedade de saber fazer. 

    Falariam nos trabalhos de casa, que não era a nossa tarefa preferida, e da nossa tristeza por muitas vezes, esses trabalhos serem a nossa prisão, que nos impedia de brincar. 

    Saberiam certamente, do nosso entusiamo quando começamos a juntar as letrinhas e a ler as primeiras palavras, a ver livros de histórias fantásticas, a folhear livros, mesmo sem saber ler, nem escrever, e inventar as nossas próprias histórias. 

    Deveriam rir à gargalhada! E daquelas crianças mais sensíveis, que choravam porque faziam mal, ou porque ficavam de castigo no intervalo, as que eram mais lentas e a professora ou professor pressionava para se despacharem, mas o medo de errar era demasiado. 

    Além de levar livros, folhas, cadernos, lápis e outros materiais, as pastas, capas e mochilas que começavam a ficar cheias, também levavam lanchinhos que comíamos a meio da manhã, num saquinho de pano, ou de tarde. Um consolo para o stresse que sentíamos muitas vezes, e medo. 

    Se elas se lembrassem e falassem, também poderiam incluir dentro delas, a nossa vontade de sair dali para fora, da alegria que era às sextas feiras, e aos fins de semana em que não tínhamos trabalhos de casa, e podíamos brincar.

    Mas não esqueceriam por vezes, o nosso medo, quando os pais vigiavam os cadernos, e livros para ver se não tínhamos trabalho de casa ou se não havia recados dos professores. 

    De certeza que não se esqueciam dos trabalhos fracos, ou mal feitos, cheios de erros, notas baixas, que nos faziam chorar, ter medo, e perder a vontade (já pouca para muitos). 

    Às vezes, as pastas, capas  e mochilas, estavam cheias de testes negativos que escondíamos, por vergonha e medo dos ralhetes. Mas essas mesmas pastas conteriam também as lembranças de brincadeiras com meninas mais próximas. 

    No recreio, os jogos coletivos, os diálogos com os professores, as queixinhas psicossomáticas, as atividades livres, os desenhos que mal ou bem, fazíamos.  Os comentários humilhantes de alguns professores, a sua falta de incentivo, a desvalorização dos pequenos passos  e conquistas, a ansiedade e o medo de falhar nos testes, que acabavam mesmo por fazer falhar.

    Lembrariam os testes negativos, que nos faziam corar de vergonha, chorar, ter reações nervosas, escondíamos ou omitíamos, tristes, mas os nossos pais encontravam e ficavam zangados, ralhavam. 

    Perdíamos a vontade de estudar, mas éramos obrigados a fazê-lo, sob pressão, contrariados, queríamos era brincar. Essas pastas, capas e mochilas, lembrariam com certeza dos amiguinhos que muitos chamavam de namoradinhos, namoradinhas, os melhores amigos, as tardes nas casas uns dos outros para brincar, a alegria que esses momentos nos traziam. 

    Arquivariam com certeza, as primeiras paixões, os amores não correspondidos, e os correspondidos, os namoricos às escondidas, de curta duração, e o «fim do mundo» que enfrentávamos quando terminavam, mas não dizíamos nada aos nossos pais. 

     As pastas lembrariam as regras demasiado duras, nas aulas, mas hoje, algumas fariam falta, porque havia respeito, mesmo à base do medo. E em casa, ainda mais. 

    Lembrariam as festinhas de fim de ano letivo ou épocas festivas na escola, a nossa vergonha ou vaidade, o nosso orgulho, o nosso nervoso disfarçado, as nossas  amizades, desilusões. 

    As fofoquices, os grupinhos que rapidamente se desfaziam, e construíam com novos elementos, o «veneno» e os ciúmes de muitas meninas, a inveja, as fantasias com os ídolos. 

    As trocas de papéis e bilhetinhos nas aulas, os jogos mais lúdicos, a vergonha nas aulas de Educação Física, a vergonha quando tínhamos de responder em voz alta, ou responder, e quando respondíamos errado, os risinhos dos sabichões, da turma toda. 

    As pastas, capas a mochilas, não esqueceriam o que aconteceu de melhor e de pior em cada ano de estudo que as usamos. Agora, que somos adultos, quando olhamos para as pastas, capas e mochilas, ainda cheias de material, pó, humidade, de estarem guardadas, é como víssemos escritas todas essas memórias, boas e más, além do material. 

    Não podemos guardar tudo, então, rasgamos papel que já não precisamos, e temos de deitar algumas capas fora porque se estragaram com o tempo, mas as lembranças, parece que as vemos lá escritas, as boas e as más, todas as que as preencheram. 

    Eram pastas, capas e mochilas, que contavam muitas histórias, eram feitas de muitas lembranças, umas que nos fazem rir, outras, nem tanto, e outras quase nos fazem chorar. 

     Só não chorámos porque já passou, fez parte do passado, e agora que somos adultos, percebemos que fomos aprendendo a não lhes dar tanto valor, aprendemos com algumas menos boas, a tornarmo-nos mais fortes, com outras a não suportar determinadas disciplinas, e a adorar outras. 

      Eram pastas, capas e mochilas cheias de sonhos para o futuro, dúvidas, fantasias, medos, incertezas, ansiedades, inseguranças, raivas, desilusões, frustrações, insónias. 

      A ideia ilusória da perfeição e de que tínhamos de ser os melhores, as competições com os outros, o terror antes dos testes e exames, a pressão que impúnhamos a nós mesmos, até prejudicarmos a saúde física  e mental. 

      O sentido de responsabilidade, os trabalhos de grupo, os colegas, os bons professores, outros, queremos esquecer, mas marcaram-nos pela «negativa». A rejeição, a baixa auto-estima pelos amores não correspondidos, e pelas notas baixas, ou auto-estima elevada para os que tinham notas excelentes e amores correspondidos. 

      O medo do fracasso, o medo de desiludir, o ser posto de lado porque se era diferente e não se seguia a maioria. As pastas, capas e mochilas, teriam muito para contar, mas tudo fica na nossa memória, ativada por elas, e fazem-nos viajar, recuar no tempo, e reviver o que parecia esquecido.

      Elas são feitas de pedaços daquilo que já fomos, e não somos mais. Outras, contêm sombras do que fomos e continuamos a ser, outras, restos daquilo que gostaríamos de ter sido. 

        Elas são feitas de uma criança, uma adolescente e uma adulta, com todas as transformações que sofremos em cada etapa, de que elas fizeram parte, connosco. 

                                                        FIM 

                                                  Lara Rocha

                                                  21/Abril/2024  

      E as vossas pastas, capas e mochilas? De que eram feitas? Eram parecidas com estas? Se quiserem podem deixar nos comentários. 

            

A obsessão do rapaz pianista

 Era uma vez um rapaz que estudava e tocava piano, e outros instrumentos. Era todo virado para a música, adorava o que aprendia de novo, e ensaiava horas, dias, até sair perfeito. 

Os pais sentiam um orgulho enorme, não lhe diziam diretamente, mas o próprio sentia que tinha de ser perfeito, o melhor, para que continuassem a gostar dele. 

O rapaz achava que se falhasse, os pais e todos os que o ouviam, deixariam de gostar dele, e sentiria uma enorme vergonha. 

Muitas vezes, os familiares e amigos convidavam-no para sair, distrair-se, brincar, fazer outras coisas. Umas vezes aceitava, mas os comportamentos dele, era de mexer os dedos como se estivesse a tocar piano, abanar a cabeça, e as mãos, imaginar que estava a tocar violino, enquanto conversava. 

Outras vezes, não aceitava porque tinha de ensaiar, tinha falhado uma nota, e gritava nervoso, frustrado, tinha crises de choro e ansiedade. Tremia como uma vara verde. 

Quando os pais lhe perguntavam o que tinha acontecido, gritava que tinha errado uma nota musical. 

Os pais diziam que aquele comportamento era um exagero, toda a gente falha, até os grandes músicos falharam, os artistas erram muitas vezes, mesmo assim, as palavras dos pais, acalmavam-no por pouco tempo. 

Mandavam-no parar, e fazer coisas diferentes, mas estava sempre ansioso por voltar a casa para estudar, tocar os instrumentos. 

De noite, acordava muitas vezes aos gritos, a transpirar, com o coração a bater muito rápido, falta de ar, ou a chorar. 

Os pais iam ver, e ele dizia que tinha tido um pesadelo, que tinha errado aquela nota, ou que estava num espetáculo e tinha-se esquecido da pauta toda, bloqueava. 

Os pais começaram a ficar preocupados com aquela obsessão do filho, porque só estava voltado para a música, demasiado centrado nos instrumentos musicais, no estudo da música, e andava com muitos comportamentos ansiosos, pesadelos constantes. 

Numa das grandes crises de ansiedade, em que os pais tiveram de o levar ao hospital, porque estava fora de si, só gritava, chorava, dava murros no piano, pontapés na cama, ficaram seriamente preocupados. 

Depois de o examinar, o médico disse que o rapaz estava a sofrer de grandes níveis de stresse, andava muito nervoso, muito ansioso pela obsessão com a música, e não descansava. 

Um médico perguntou-lhe: 

- Oh rapaz, porque é que não fazes as coisas que todos os rapazes da tua idade fazem? 

- Não sei, nem me interessa saber o que os outros rapazes da minha idade fazem. Só quero a minha música, os meus instrumentos, as minhas pautas, não dar erros, acertar todas as notas musicais, tocar tudo e mais alguma coisa, sem nunca falhar. 

A mãe, grita, nervosa e cansada daquela obsessão: 

- Ou fazes o que o Dr. te disser, ou sais da música! Essa tua ideia fixa está a destruir a tua saúde, e a nossa também. É isso que tu queres? Dar cabo de ti e de nós? Um rapaz da tua idade, não tem essas ideias fixas. (faz-se silêncio) Desculpe, Dr. 

- Não se preocupe. A tua mãe tem razão! 

- Eu tenho de ser o melhor! - diz o rapaz 

- Quem é que te disse? - pergunta a mãe irritada 

- Eu! 

- Para quê? - pergunta o médico 

- Para os meus pais e amigos, familiares e professores, a escola toda, sentirem orgulho em mim. 

- O quê? - perguntam os pais 

- Vamos ter orgulho nessa tua ideia fixa…? - pergunta o pai 

- Alguma vez te dissemos que tinhas que ser o melhor, se não, não sentíamos orgulho em ti? - pergunta a mãe 

- Alguma vez exigimos que nunca errasses, que fizesses sempre tudo bem, que fosses o melhor, o perfeito…? Isso não existe! - pergunta o pai 

- Achas que queremos um filho famoso? Queremos é que sejas feliz, que tenhas sucesso, claro, mas não que chegues a este ponto. - acrescenta a mãe 

- É claro que nós sentimos orgulho em ti! - diz o pai 

- E vamos sentir orgulho em ti, mesmo a falhar, mesmo a dar erros, mas não é preciso estares sempre a ensaiar, quase a enlouquecer, só porque falhaste, ou te esqueceste de alguma coisa. 

- Não percebemos nada de música, só gostamos de ouvir, por isso para nós é igual, falhares, esqueceres-te, errares...O orgulho é igual - diz a mãe 

- Ainda tens tantos anos pela frente, rapaz! Eu e todos os meus colegas erramos centenas, milhares de vezes, gostamos do fazíamos, mas havia outras coisas tão ou mais importantes do que o estudo! Havia o convívio, as festas, as brincadeiras, as namoradas, os passeios, as tunas, não era só estudar, e queríamos que os nossos pais sentissem orgulho em nós. Sabíamos que sim! E eles nunca exigiram que fossemos os melhores, nem os perfeitos. Reprovamos muitas vezes, a muitas cadeiras, mas nunca nos recriminaram por isso, sabiam muito bem como era a vida de estudantes! Fazíamos de novo, mais tarde. E os teus pais também sabem! É claro que eles sentem muito orgulho em ti, com erros, com reprovações, que servem para aprenderes, com as tuas brincadeiras com os outros, sentem orgulho em ver-te com namoradas, feliz, a sair, a descansar. A vida não é só estudo, e perfeição. Nem obsessões em ser os melhores, ainda tens muito tempo para aprender, melhorar, evoluir, mas primeiro, sê criança, sê jovem, diverte-te, não estejas sempre em casa, sempre a estudar, sempre a tocar instrumentos. Também erras porque estás sempre a fazer o mesmo, sempre a tocar, sempre a insistir, ficas com raiva quando erras, claro, a tua cabeça não aguenta! Nem a tua, nem a de ninguém. Os teus pais eram iguais a mim, com certeza! E olha como eles agora são bons profissionais! - diz o médico

Os pais sorriem. 

- É verdade! - dizem os dois 

- E continuamos a errar, a falhar, a não saber tudo, mas vamos aprendendo, melhorando. - diz o pai 

- Claro. - confirma a mãe 

- E a nossa vida de estudantes, não era ficar fechados no quarto a estudar o dia todo. É claro que sim, também íamos a festas, convivíamos, saímos, brincávamos, fazíamos parte das tunas, reprovamos em muitos testes e exames, porque a vida de estudante não era só estudar. Como hás-de aguentar? Claro que não. - reforça o pai 

- E mesmo assim, vamos sentir muito orgulho em ti, também já fomos da tua idade, estudantes como tu. 

- Isso mesmo! Vou medicar-te, e vais prometer-me que vais mudar a tua vida, que vais ser um rapaz como os da tua idade, estudar e fazer outras coisas, sem estar o dia todo a estudar. Prometes que vais reprovar algumas vezes também, e que isso não significa que és mau, só significa que és jovem, que estás a aprender, e tens possibilidade de fazer bem, a seguir a um ensaio? Prometes que vais errar e falhar, como todos os da tua idade? Prometes que vais ter as tuas saídas e namoradas? Isso traz-te novas ideias, e saúde, nova inspiração. Para que queres ser o melhor, o perfeito? Ninguém é o melhor, ninguém é perfeito, fazemos bem umas coisas, outras nem tanto, mas somos todos assim! Para quê perseguir uma ideia que não existe? Uma realidade que não passa de ficção?  Isso não existe, só te destrói e até te afasta das pessoas, o que é muito mau! - pergunta o médico 

- Prometo! - diz o menino 

- É que se não prometeres, vens para aqui, e olha que aqui não é bom! - diz o médico 

- Está bem. 

O médico medica-o, agradecem, marcam encontro para passados uns tempos, e o menino quando regressa a casa, fica deitado, em silêncio, a pensar no que o médico tinha dito. 

Vai para o piano, começa a tocar, a fraquejar, até que adormece em cima das teclas. O pai pega nele ao colo, deita-o, cobre-o, e ele continua a dormir, com a persiana mais baixada.

O menino começou a tomar a medicação, e decidiu seguir as indicações do médico. Descansou uns dias, com passeios pela natureza, a apreciar coisas que nunca tinha visto, por estar só centrado na música. Começou a dar caminhadas com os pais, feliz, e quando voltava, ensaiava mais leve. 

Passou a sair com amigos, a ir a festas, muito mais calmo, ensaiava na mesma, mas intercalava com outras atividades, ria e brincava com os amigos. 

Como um rapaz da idade dele, teve amizades coloridas e namoricos, quando errava, voltava a ensaiar, mais calmo, ria de si próprio, e como estava mais inspirado, até criou novas letras de músicas, que compôs com a ajuda dos professores. 

Era um rapaz muito diferente do que estava obessecado em ser o melhor, em fazer tudo perfeito, porque ficou a saber que os pais sentiam muito orgulho nele, mesmo com o que ele achava imperfeito ou errado. 

Deixou de ter pesadelos, e tanta ansiedade, deixou de ser obessecado pela perfeição, sempre com o apoio dos pais, dos amigos, dos professores, e do médico que o acompanhava constantemente, também muito feliz pela mudança. 

O rapaz partilhava com o médico as coisas novas que fazia, e o médico elogiava-o, incentivava-o a continuar, mas com regra, sem pressão, e na brincadeira. 


                                                FIM 

                                           Lara Rocha 

                                          (20/Abril/2024) 


Qual é, (ou quais são as vossas) obsessões? 

Como é que elas vos fizeram ou ainda fazem sentir? 

Como lidam com elas? 

Se quiserem, podem deixar nos comentários. 

                                        


quinta-feira, 18 de abril de 2024

A surpresa dos pacotes dourados

 A surpresa dos pacotes dourados 


Foto de Lara Rocha 

    Era uma vez um cesto com uns pacotinhos dourados muito atraentes, brilhantes, que apareceram num descampado, onde pastavam animais. 

    Uma alma solitária passeava durante a noite, sobre um céu de lua cheia, e estrelas cintilantes. Essa pessoa já conhecia a zona de trás para a frente, e da frente para trás, todos os esconderijos, todas as árvores, todos os animais.  

    Mas viu uma coisa nova, nesse passeio noturno, que o deixou muito surpreso. Os animais estavam calmos, por isso não seria ameaçador, ficou muito intrigado com uma cesta que continha pacotinhos de luz dourada. 

    Olhou, voltou a olhar, olhou outra vez, rodeou a cesta, ansioso por lhe tocar, até que um esquilo grita de uma árvore: 

- Não mexas aí. 

    O rapaz estremeceu, olhou para o esquilo: 

- É teu? 

- Não! 

- Então porque não posso mexer? Quero ver o que é, se é perigoso para nós. 

- Não, não é perigoso para nós. 

- Como é que sabes? 

- Porque tem uma luz dourada. 

- E o que é que isso garante que é seguro? 

- É. 

- Quem pôs isto aqui? 

- Não sei. 

- Apareceu aqui do nada...? 

- Sim. Bem, quer dizer...do nada não deve ter sido, mas também não sei quem foi, nem para quê! 

- É tão bonito...até apetece tocar. 

- Mas é melhor não tocarmos.

- Porquê? 

- Porque não é nosso. 

- Pois, aí tens razão! 

    Aparece o dono da cesta: 

- Mexeste aí? 

- Não! Estava só a olhar. Porquê?

- Porque vou ser eu que vou distribuir estes pacotinhos pelas portas. 

- Áh! Que lindos, e o que têm? 

- Têm coisas especiais. 

- São de comer? 

- Alguns. 

- E outros? 

- Outras coisas. 

- De onde vieste? 

- Das estrelas! 

- Das estrelas? (ri) Só se for nos teus sonhos. 

- É verdade. Vim das estrelas, são desejos que me pediram. 

- Desejos? (ri à gargalhada) Coitadinhos, santa inocência…!

- O quê? Nunca tiveste desejos? 

- Sim, mas nunca se realizaram, nem foram distribuir pacotinhos dourados pela porta, com os desejos realizados. 

- Porque não eram possíveis de realizar, ou não pediste com o coração. 

- E quem pediu esses? 

- Muita gente. 

- Esses são realizados? 

- São! Com licença, vou ao meu trabalho. 

    Pega na cesta, e começa a distribuir os pacotinhos dourados pelas casas, e põe-nos na beirada da janela. Uns pacotinhos tinham rebuçados com sabor a fruta, outros tinham um pozinho e quando abrissem sairia um animalzinho. 

    Outro pacote tinha sorrisos, que se espalhariam por todo o lado. Outro muito grande, tinha abraços para todos, cada um ia recebê-los quando alguém abrisse o pacotinho. 

    Noutro pacotinho estava um irmãozinho para uma criança que pediu esse desejo, noutro tinha um passarinho, noutros, um lindo boneco que dava luz, para umas crianças que tinham medo do escuro. 

    Noutro muito grande, havia comida, que chegaria para cada um, e outro seria levado para países onde há fome. Outro pacote muito grande, tinha pontinhos de luz, que eram todos os pedidos de cura, para quem sofria, por parte de adultos e crianças, que pediram esse desejo, seriam espalhados por todos os hospitais e casas que precisavam. 

     Outro pacotinho tinha livros, a pedido de uma criança que adorava ler, mas a família não tinha dinheiro para comprar muitos livros, o que o deixava muito triste. 

     Mas o maior pacote dourado de todos, continha o pedido de Paz para o Mundo, era tão grande, que o dono da cesta teve de saltar em cima dele, para o abrir, fez um grande estrondo. 

    A alma solitária que tinha falado com o dono da cesta, estremeceu, e gritou: 

- Mentiroso! A dizer que os pacotinhos não eram perigosos, e tinham desejos. Tinham era bombas. 

    E vai a correr ver se o encontra. Quando o vê, murmura: 

- Afinal…

    Aproxima-se dele: 

- Então disseste que esses pacotinhos dourados não eram perigosos, e ouvi um estouro...têm bombas? 

    O dono da cesta ri: 

- Para de dizer disparates e olha à tua volta, olha para o que está a acontecer diante dos teus olhos, e ali, aquelas partículas douradas a circular. 

    Abriu, e todo o pó espalhou-se no ar, onde era possível ver as partículas luminosas a seguir o seu caminho por toda a atmosfera, e dirigir-se para esses países. 

- É pó tóxico? 

- Não, claro que não. É um pó muito especial, vais já ver qual é. 

    Todos se assustaram com o estrondo, abriram as janelas e as portas, viram os pacotinhos, viram o dono da cesta, e as partículas douradas pelo céu, quase se confundiam com as estrelas. 

- Este é o vosso maior desejo, comum a todos, e lá vai ele… olhem que bonito! E estão aí os de cada um. - diz o dono da cesta. 

    Todos aplaudem, felizes, maravilhados com aqueles pontos de luz dourada, para a paz no mundo, e para a cura de quem estava em sofrimento, por doenças e outras razões. 

    Cada um abre o seu pacotinho e agradece ao dono da cesta, todos ficam com uma lagriminha de felicidade ao ver que o desejo de paz e de cura para quem sofre, ia a caminho, e seria realizado. Esperavam e acreditavam eles. 

- Desculpa. Tinhas razão! É mesmo especial. 

- Nunca pediste esse desejo? 

- Não, mas daqui para a frente vou pedir. 

- Boa! Vais vê-lo assim! 

- Gratidão! - gritam todos, e aplaudem. Abraçam-se, sorriem, ficam a apreciar as viagens das partículas douradas pelo céu. 


                                            FIM 

                                       Lara Rocha 

                                     18/Abril/2024 

    Vamos pedir também esse desejo? 

Todos e cada um de nós, vamos pedir um pacotinho dourado de Paz para o Mundo, o fim do Sofrimento, e da fome, o fim da Guerra, a cura para quem está doente e a sofrer? 

    Vamos acreditar que veremos esse pozinho dourado a cobrir os céus, juntamente com as estrelas, e que esses nossos desejos vão realizar-se? 

    Que desejos pediriam? 

Incluíam esses desejos de paz, e cura? 

Como imaginam essa cestinha? 

E os pacotinhos dourados? Acreditam ou acreditariam, acreditarão que esses desejos podem ser realizados? 

Porque não experimentamos, pedir com o máximo de pessoas com quem nos damos bem, e nós próprios, todas as próximas noites, pedir um pacotinho de paz e cura para o Mundo? 

Podem deixar nos comentários, se quiserem :) 

                                    


quinta-feira, 4 de abril de 2024

A boneca que mudava de cor de olhos

           Era uma vez uma boneca diferente das outras, que foi oferecida por uma tia a uma sobrinha. A boneca que parecia com expressão séria, sorriu, no dia em que foi comprada. 
    A tia pensou que estava a imaginar, e sorriu com ela, porque fez-lhe lembrar a sua infância. A boneca tinha olhos que pareciam de vidro, da cor dos girassóis, com rajadas amarelas, muito bonita, cabelos de cristal, pareciam prata, uma boquinha perfeita, uma roupa lindíssima. 
    Na noite em que a tia a comprou, reparou que os cabelos da boneca, brilhavam no escuro, com estrelas pequeninas, planetas, sóis, pintinhas, luas. 
    Depois do susto, e de achar que estava a imaginar coisas, sorriu, e dormiu. De manhã, viu que os olhos da boneca estavam mais escuros, pareciam dois bolinhos de chocolate, estava a sorrir, e os cabelos dourados, como o sol. 
- Que estranho! Acho que se está a passar alguma coisa estranha comigo. Parece que preciso de ir ao médico. - suspira a tia 
    A tia foi dar as suas voltas, e quando regressou, a boneca já estava olhos que pareciam de vidro, com a mesma cor dos girassóis, e os cabelos castanhos claros, com pétalas de girassóis. 
- O que é isto? A boneca está enfeitiçada, ou sou eu que estou a perder o juízo? Ainda bem que amanhã já vou oferecê-la, e pergunto à minha sobrinha se vê o mesmo que eu. 
    A boneca sorri, à noite, a tia repara que a boneca tinha os olhos quase pretos, e salpicados de branco, que cintilavam em várias cores, pareciam estrelas a brilhar. Os seus cabelos estavam igualmente pretos. 
    A tia ficou assustada. Apagou a luz, com medo, e viu outra vez os cabelos a brilhar como o espaço. Acendeu a luz, e a boneca estava igual. Voltou a apagar a luz, viu as estrelas dos olhos a cintilar, e os cabelos a brilhar. 
    Ela senta-se na cama assustada. Pergunta à boneca: 
- Óh boneca...tu falas? 
- Sou uma boneca! - responde esta 
    A tia grita, treme, acende a luz. 
- Cruzes...! Quem é que falou? 
    Procurou debaixo da cama, nos armários, a boneca desata às gargalhadas. 
- Não sei porque estás a fazer isso...? Fui eu que falei, claro, quem mais poderia ser? - pergunta a boneca a rir 
- Ou sou eu que estou a ficar com algum problema? 
- Não. Fui mesmo eu. Ainda não reparaste nas minhas mudanças, nos olhos e nos cabelos? 
- Já. Até pensei que estava a imaginar, a voltar a ser criança. 
   A boneca ri: 
- Já foste criança, mas de certeza que não tiveste uma boneca como eu. 
- Não. Ainda bem, porque se não, sentia medo de ti. 
- Não sei porquê? Eu não faço mal! Sou assim tão feia? 
- Não. Não...! Mas ontem estavas de uma maneira, hoje estás doutra...
- Ora, e tu também não ficas assim? Uns dias estás mais animada, outros mais amuada? 
- Sim, e é por isso que tu mudas de formas e cores? 
- Sim, quem me fabricou, acho que tinha esse objetivo, tornar-me mais parecida com as pessoas. 
- Ainda por cima, falas...! 
- Então...? Tu não falavas com as tuas bonecas, e elas não te respondiam, na tua imaginação? 
- Sim, claro, mas pensei que essa fase já tinha passado. 
- Não sei porque é que põem prazos limites a nós, bonecas, para estar convosco. 
- Porque crescemos. 
- Crescem em tamanho, e deixam de gostar de nós, abandonam-nos como se fossemos prejudicar alguma coisa na vossa vida. Que tristeza! 
- Pois, também não sei porque não nos deixam brincar a partir de uma certa idade. Mas vocês, bonecas, ficam tristes? 
- Claro! Fazemos-vos companhia, passamos bons momentos convosco, e depois abandonam-nos. 
- Também, sinceramente...custa um bocadinho! Mas são regras. 
- Não concordo com o haver essas regras. Podem brincar connosco sem limites de idade, nem que seja às escondidas. Nós vemos o vosso brilho no olhar, e os sorrisos de ternura, quando veem bonecas, e bonecos. 
- É, isso é verdade. Ainda hoje gosto muito de bonecos. 
- Não parece! 
- Eu sei. Desculpa. Vou oferecer-te à minha sobrinha amanhã. 
- Mal cheguei e já me vais abandonar. 
- O que posso fazer? Ela é que está de aniversário. 
- Vai buscar outra à loja, e ficas comigo! 
- Hummm... 
- Não sei, tu não foste barata. 
- Gostas da tua sobrinha, não gostas? 
- Gosto, claro que sim. 
- E gostaste de mim? 
- Gostei. 
- Então porque não compras uma igual e ficas comigo? Eu faço-te companhia. 
- Mas como é que mudas de cor de olhos e cabelo, se és uma boneca? 
- Não sei. Quem me construiu disse que eu era o reflexo das emoções de quem ficava comigo, do dia e da noite. Não me perguntes o que é isso porque não sei, só ouvi isso. 
- Áhhhh....que giro! Acho que me convenceste. Tu queres ficar comigo? 
- Sim. 
- Está bem, então, amanhã passo na loja e compro outra igual a ti. 
- Boa! Obrigada. 
    A tia pega na boneca, e deita-a à beira dela, sorri encantada, por vê-la brilhar no escuro, faz-lhe uma festinha e cobre-a. 
- Boa noite, boneca noite.
- É esse o meu nome? 
- Não, estou só a chamar-te assim, porque estás como a noite. 
- Áh. Está bem. Obrigada, igualmente. 
    No dia seguinte, a boneca estava com um sorriso aberto, olhos que pareciam de vidro e reflexos de girassol, cabelos dourados. A tia põe-na sentada na cadeira, e os olhos da boneca ficam amarelos, como o sol, os cabelos com rajadas loiras e cor-de-laranja, amarelas, castanhas. 
- Bom dia, linda boneca. Dormiste bem? 
- Bom dia. Sim, dormi muito bem, e tu? 
- Também. 
- Que bonita que estás agora. 
- Obrigada. 
- Vou buscar uma igual a ti, e oferecer à minha sobrinha, conversamos mais tarde, está bem?
- Está bem. Parabéns à tua sobrinha. 
- Obrigada.
    A tia vai à loja e compra uma boneca igual. Oferece-a e a sobrinha adora a boneca. Abraça-a, beija-a, dá-lhe a mão, faz-lhe festas. Ao longo do dia, a boneca vai mudando de cor e a  sobrinha repara, comenta com a tia. 
    A tia faz de conta que não sabe de nada, e fica surpresa. A boneca da sobrinha muda de cor de olhos e cabelos, conforme as emoções, quase como a da tia. 
- Que linda! - dizem as duas 
    A sobrinha estava sempre a mostrar à tia as diferenças da boneca. A tia ri-se, e no fim da festa, regressa a casa. Lá está a boneca dela, sentada na cadeira à sua espera. 
    A tia e a boneca têm uma longa conversa, sobre a festa e a boneca oferecida à sobrinha, as mudanças e as reações dela. As duas riem muito, e vão descansar. 
    A boneca tinha razão. A tia podia continuar a brincar e a apreciar bonecas, independentemente da idade, nem precisava de contar aos outros, e já foi criança, mesmo assim, essa criança ainda existe. 
    É bom brincar, em qualquer idade. 

                             FIM 
                         Lara Rocha 
                        4/Abril/2024 

Se vocês tivessem uma boneca assim, como é que ela seria?  Quais seriam as cores e as respetivas emoções que veriam nos olhos, e nos cabelos da boneca? O que mudava na boneca? 

Toca a imaginar :) 

Podem deixar nos comentários, todas as respostas são subjetivas e válidas. 
  

terça-feira, 2 de abril de 2024

O tornado arco-íris

    Era uma vez um tufão pequenino, com as cores do arco-íris. Ele queria ser visto, e tinha de cumprir as ordens da Natureza, quando ela mandava aparecer, mas sentia-se envergonhado e nervoso porque ainda era pequenino. 

  Por ser pequeno, ainda não conhecia na sua força destruidora, mas sabia que isso aconteceria mais cedo ou mais tarde. Já tinha ouvido falar, e sentia medo. 

    Não queria magoar as pessoas da Terra, nem destruir as suas coisas que lhes fazem tanta falta. A Mãe Natureza mandou-o aparecer na cidade, e mesmo sem querer, lá foi ele. 

  Surgiu por trás de um monte na cidade, como um pequenino arco-íris, com as lindas cores, ondulando, e dançando ao sabor do vento, que era muito mais forte. 

    O pequenino tornado estava tímido e com medo, por isso o arco-íris não aumentou. O vento mais forte do que ele ri à gargalhada e comenta: 

- Pareces uma chama insignificante! A abanar com o meu sopro! 

   Um trovão estrondoso rasga as nuvens, o vento forte treme e fica gelado. 

- Mas o que é isto? O vento que também já foi deste tamanho, armado em forte, só porque agora é maior, a gozar com o mais fraco?! Achas bem? Tu também tens medo de mim, e tiveste medo, das primeiras vezes que apareceste na cidade...parece que já te esqueceste, e eu não te humilho, pois não? 

    O vento maior não sabe onde se meter com a vergonha, e tenta fugir. 

- Nem te atrevas a fugir, que eu vou atrás de ti. Responde! Assume que sentias medo, e sentem medo de mim, em vez de fugir. - grita o trovão

- Sim, é verdade...senti medo, e sinto. Desculpe... - responde o vento 

- Não é a mim que tens de pedir desculpa, é ao pequeno tornado. Não vês que ele é pequeno? Tu nunca foste deste tamanho? E deste tamanho não sentias medo...? (ri) Óh, que valentão que eras, claro! 

- Desculpa, pequeno tornado! 

- Como és bonito, pequeno tornado. Não fiques envergonhado! Em breve, vais ser tão forte como ele! Tens umas cores maravilhosas, para encantar as pessoas da cidade. Ele é invisível, só o sentem. - diz o trovão 

- Obrigado! Mas eles não me veem. 

- Eles agora veem mais computadores e telemóveis à frente, mas ainda há quem repare em ti, principalmente os mais pequenitos, e adultos. 

- Ele disse que eu parecia uma chama insignificante, a abanar com o sopro dele... 

- Eu ouvi. Uma chama a ondular com o vento também se vê, e é bonito. Não lhe ligues! És pequenino e envergonhado, não tem problema nenhum. Um dia destes vais ser grande e extrovertido, todos vão reparar na tua beleza. 

- Ai, que vergonha. 

- Vergonha nada! Isso é só no início, mas habituas-te. Tenho a certeza! 

(O pequenito tornado sorri)

- Ai de ti que voltes a desvalorizar o pequeno! Já sabes como é que eu sou! - avisa o trovão 

- Sim, senhor. Sei muito bem. 

- Já sabes muito bem como sou, quando vejo injustiças como esta, e mais comportamentos, por isso...! 

- Sim, Sr. Trovão. 

- Olha que eu estou atento. Faz a tua tarefa, sem comentários infelizes. 

- Combinado! 

    O trovão recolhe, e fica de orelha levantada. O furacão sopra mais forte e o pequeno tornado volta a abanar como se fosse uma chama. Algumas pessoas na cidade reparam nele, e fotografam-no.

- Ai, que vergonha, tanta gente a olhar por mim, e a fotografar-me! Será que estou apresentável, e bem arranjado? 

- Queres ser visto, e tens vergonha? - comenta o furacão a rir à gargalhada. 

    O trovão dispara outra vez, as pessoas na cidade gritam, umas fogem assustadas, outras tentam proteger-se, porque cai um chuveiro fenomenal, com saraiva à mistura.

- Outra vez? - pergunta o trovão furioso - Estás muito bonito, pequeno! Olha como tiveste pessoas a olhar para ti? Até te fotografaram...e ficaram a ver se crescias. Ainda não cresceste, mas cumpriste o teu papel: encantar as pessoas da cidade! Parabéns! Não sintas vergonha por ainda seres pequeno! Tens tanta beleza como um arco-íris grande. Não tenhas pressa de crescer. És na mesma apreciado, ou ainda mais, por seres como és! As pessoas gostam de ver arco-íris, estão mais habituadas aos grandes, mas é bom verem pequeninos, enche-os de ternura, que eles bem precisam. Até te fotografaram, eu percebi que ficaram encantados. Ainda estão a olhar para ti, vejo daqui o brilho nos seus olhos e sorrisos, com ternura. Estão deliciados, como se estivessem a ver uma criança, que és! Linda! 

- Obrigado! - diz o tornado a sorrir 

   A Mãe Natureza está orgulhosa, e manda o pequeno tornado para casa, onde os seus pais também sentem orgulho por ele ter chamado a atenção. 

- Muito bem, filho! Continua...para a próxima já estarás maior, mas para já, valeu a pena! O trovão tem toda a razão...lembra-te das palavras dele. 

    Passados uns dias, o pequeno tornado, com as cores do arco-íris, ganhar força, cresce, e a Mãe Natureza manda-o para a cidade. Mesmo ainda com alguma vergonha e timidez, mas maior, ele lembrou-se do trovão, das palavras, e aparece por trás do monte, até meio círculo. 

  Os habitantes ficam encantados, fotografam, sorriem, soltam exclamações de surpresa, e o tornado recolhe, todos ficam na expectativa para ver se vai desaparecer. 

- Anda cá, vamos brincar com eles...! - diz o furacão

   O tornado arco-íris volta a parecer uma chama ondulante com o vento, mas desta vez, com a ajuda do furacão, faz redemoinho, e começa a subir na vertical, com círculos grandes, em movimento.

 Os habitantes nunca tinham visto tal coisa, ficam assustados porque o vento era fortíssimo, mo céu estava muito escuro, as nuvens muito pesadas. 

   Todos repararam, fotografaram, sorriram ao ver aqueles círculos, embora pensassem que se estava a formar um tornado, ficaram a olhar, pareciam hipnotizados. 

- Que bonito! 

- Uau! 

- Nunca tinha visto nada disto! 

- Parece um tornado, mas tem as cores do arco-íris! 

- É mágico!

- Ááááhhhh...mesmo bonito! 

   Todos aplaudem, e os que param para ver: 

- Gratidão, Natureza, por este presente! 

  Pouco depois, o tornado arco-íris desaparece. Quando regressa a casa, todos dizem: 

- Estamos orgulhosos de ti. 

- Obrigada! Obrigado! 

   Partilha a sua experiência com todos, sorriem, continua a crescer, orgulhoso e vaidoso. A Natureza manda-o aparecer, quando ele já está com o triplo do tamanho, e todos repararam na sua beleza, o arco-íris, como o conhecemos agora. 

                              Fim 

                           Lara Rocha 

                            2/Abril/2024 


quinta-feira, 21 de março de 2024

Jardim confuso

     Era uma vez um jardim muito confuso, onde se encontravam coisas confusas, que nunca se poderia imaginar. Havia tulipas e girassóis que dormiam de dia, e ficavam acordados de noite, conversavam a noite toda, dançavam, cantavam, passeavam pelos campos, e voltavam pouco antes do nascer do sol aos seus lugares. 

    Encontravam-se pinguins que vinham da Antártida, com pedaços de gelo metidos numa mochila até esse jardim, e construíam os seus iglôs à sombra, por trás da grande cascata. O gelo não derretia, e ultimamente, viam-se cada vez mais pinguins a fazer maratonas para ir buscar gelo, e instalar-se no jardim. 

    Havia tartarugas que andavam tão rápido, e faziam corridas pela cidade, com direito a prémio para a que chegasse mais rápido a um determinado ponto da cidade. Outras tartarugas subiam às árvores com tanta facilidade como os macacos e esquilos, Kualas e pássaros. 

    Ouviam-se sapos a grasnar como os patos, e a fazer buracos na terra, como as toupeiras, toupeiras que coaxavam, rãs que cantavam ópera, lagartixas acrobatas, gatos rappers a dar espetáculos para todos. 

    Viam-se gaivotas penduradas em ramos de árvores, com as cabeças para baixo, à procura de peixe, e a dormir, morcegos que gritavam, e batiam com as asas como se estivessem a aplaudir, dormiam pendurados em cogumelos nas raízes das árvores. 

    As joaninhas a andar nas costas de caracóis, deitavam-se, de óculos de sol, e apanhavam sol, enquanto os caracóis andavam na sua lentidão. Quando recolhiam, as joaninhas iam para flores. 

    Flores que guinchavam, outras estavam sempre a rir, outras sempre a choramingar sem motivo, outras a dançar, outras bordavam lindos paninhos, outras teciam com a ajuda de aranhas, cortinas e vestidos, capas para as galinhas, cobertores para cães. 

    Depois, tudo era transformado no que fosse preciso. Ouviam-se lobos que faziam o som dos golfinhos, e golfinhos que uivavam muitas vezes por dia. 

    Nas tocas, havia coelhos que faziam construções, outros distribuíam refeições, serviam almoços, jantares, pequenos almoços e lanches, para quem mais precisava. 

    Cães que eram sapateiros e outros costureiros, muito vaidosos, mas ficava tudo perfeito, e muito bonito. Cadelas cabeleireiras e cisnes barbeiros. 

    Galinhas que vendiam num supermercado, onde havia tudo o que era preciso, galos padeiros, veados e porcos artistas a fazer bolos, a cozinhar, patos que eram médicos. 

Não faltava nada neste jardim, nem a confusão! 

                                          Fim 

                                    Lara Rocha 

                                    21/Março/2023 

Que outras coisas confusas poderiam encontrar, vocês leitores, neste jardim? 

Podem deixar nos comentários. 

Quando a realidade não faz sentido

 Quando a realidade não faz sentido, a realidade interna e , ou realidade externa não faz sentido, sentimo-nos sem sentido, vivemos no sem sentido, mas passa a ter todo o sentido. 

Quando pensamos na realidade interna, e ou, externa sem sentido, encontramos algum sentido, numas coisas  e outras continuam sem qualquer sentido. 

Quando a realidade interna, e, ou a realidade externa deixa de ter sentido, encontramos algum sentido, em algumas coisas, pessoas, acontecimentos ou pensamentos, ações, sem sentido, que fazem todo o sentido. 

Fazem-nos sentir, que temos sentido, mesmo nas pequenas coisas, ou grandes coisas, que não têm sentido. 

Quando a realidade não tem sentido, pela Guerra sem sentido, pelas doenças sem sentido, pela fome sem sentido, pelas reclamações sem sentido, pelo luxo sem sentido, pelos pensamentos sem sentido, pelos medos com, ou sem sentido, pelas alterações climáticas, por tudo o que não tem sentido, mas existe, queremos encontrar coisas com sentido. 

Uma flor tem sentido, um lindo pássaro tem sentido, o voo dos pássaros e os seus bailados, os seus ninhos, as suas penas, os seus cantos e piares têm sentido, a leveza das suas patinhas têm sentido. 

Uma árvore com uma forma diferente, tem sentido, as suas raízes têm sentido, os troncos têm sentido, as suas crateras, têm sentido, os seus ramos com e, ou sem folhas têm sentido. 

Os mochos, as corujas, as joaninhas, as cigarras, as abelhas, os cães, os gatos, os patos têm sentido, todas as aves, todos os peixes nas suas diferentes cores, tamanhos, espécies, têm sentido, todas as rochas têm sentido, toda a vegetação aquática tem sentido, todos os animais, têm sentido. 

O sol tem sentido, o mar tem sentido, a água tem sentido, as ondas têm sentido, as pedras, as conchas, os búzios, a areia, as algas, têm sentido. 

As montanhas têm sentido, a terra tem sentido, o vento tem sentido, a trovoada tem sentido, as nuvens com formas e cores diferentes, têm sentido, as cascatas têm sentido.

As ervas que dançam ao sabor do vento, têm sentido, os girassóis que se movem e acompanham o sol, têm sentido, o vento que sopra entre os pinheiros, a brisa ligeira, que canta suavemente, tem sentido. 

O frio tem sentido, a chuva tem sentido, a neve tem sentido, as sementes que ficam protegidas pela terra e vão revelando as suas surpresas, têm sentido, as mudanças de estação do ano, têm sentido. 

As bolas de sabão, toda a sua leveza, tamanho e cor, têm sentido, o ar que respiramos, tem sentido, os brinquedos têm sentido, a música e a dança têm sentido. 

As casas têm sentido, a amizade verdadeira e sincera tem sentido, a gratidão tem sentido, a família tem sentido, o amor sincero, puro, verdadeiro, espontâneo, livre, os abraços acolhedores, os sorrisos, a música, a nossa paz, tem sentido, o conforto da nossa casa, tem sentido, o conhecimento tem sentido. 

A pintura tem sentido, o desenho tem sentido, toda a arte, mesmo sem sentido, tem sentido, aquele que cada um de nós lhes dá, conforme o sentido interior e, ou sentido exterior. 

As emoções têm sentido, o carinho tem sentido, a felicidade tem sentido, aquele que cada um atribui. 

O sorriso tem sentido, os abraços têm sentido, as lágrimas têm sentido, as dores têm sentido, as recordações têm sentido. 

Os corações partidos têm sentido, o dormir tem sentido, o acordar tem sentido, o sonhar sem sentido, tem sentido. 

O escrever tem sentido, o ler tem sentido, o imaginar tem sentido, o cantar tem sentido, o rir e o chorar têm sentido, as crianças têm sentido, a sua inocência, as suas gargalhadas, as suas brincadeiras têm sentido, a sua alegria tem sentido. 

Tanta coisa que tem sentido, quando a realidade parece não ter sentido, a vida tem sentido, em coisas com sentido, que parecem não ter sentido. 


                                FIM 

                            Lara Rocha 

                            21/Março/2024 

E para vocês, que coisas sem sentido, fazem sentido, quando a realidade não faz sentido? 

Podem deixar nos comentários.