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sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Os seres de bolas de sabão

Era uma vez uma vila misteriosa, numa floresta, onde só a natureza e as casas eram reais, não existiam seres humanos, só uns seres muito diferentes de nós, feitos de bolas de sabão, de todos os tamanhos e geralmente transparentes, com o reflexo do arco-íris, eram muito leves, e circulavam por todo o lado.
Não usavam palavras, mas entendiam e falavam a linguagem das emoções. Sabiam muito bem quando se cruzavam uns com os outros, o que sentiam, só pelas cores que as bolas de sabão mostravam. Todos os seres de bolas de sabão tinham aprendido a conhecer as emoções uns dos outros, a respeitar e ajudar quando percebiam que os outros não estavam bem.
Quando eram cores como o violeta, o preto, o cinzento, o azul-escuro, o vermelho escuro, e outras mais pálidas, sabiam que estavam tristes, ou mesmo muito tristes, melancólicos, com medo, confusos. Com estas cores, as bolas de sabão desprendiam-se como folhas a cair das árvores, ao vento, andavam mais devagar e pesados, e algumas até rebentavam como se fossem lágrimas.
Se estavam com raiva ou nervosos, as bolas de sabão agitavam-se muito, soltavam-se, ficavam partidas, despedaçadas, envolviam-se umas com as outras, chocavam-se no ar, rebentavam muitas, e os seres ficavam muito diferentes, mostravam cores fortes, e quentes, ficavam vermelhas, e cor-de-laranja.
Quando tudo estava calmo, sentiam-se bem, voavam leves, sem pressa, brilhantes, ondulantes sem que as bolas se separassem, ganhavam cores suaves como azul-bebé, verde, verde água, amarelo, branco e outras.
Sempre que viam cores tristes, quem estava bem, parava e abraçava os outros, porque já sabiam que estavam mesmo a precisar…e quando trocavam abraços, as bolas de sabão de cores tristes, voavam, indo para o seu lugar, as bolas de sabão de cores claras. A outros seres ofereciam flores coloridas, e sorrisos tão doces que enchiam logo tudo de alegria. Isso deixava-os outra vez felizes, e bem-dispostos.
Curavam-se e ajudavam-se uns aos outros envolvendo-se em abraços, que formavam uma enorme bola de sabão, sorrisos e carinhos…preenchida com cores alegres. Esta era uma regra da sociedade das bolas de sabão...e em qualquer momento, todos precisavam uns dos outros, porque até nós seres humanos, às vezes só precisamos de abraços e sorrisos de alguém que nos faz mudar as cores da alma.
Há abraços que nos devolvem a alegria e o sorriso, e acreditar que mesmo não estando felizes num dia, no dia a seguir, ou alguns dias depois, estamos felizes, e ao contrário.
Porque as nossas emoções são como as bolas de sabão, flutuam, voam livres e leves…umas rebentam, outras fazem-nos mal, outras dão-nos saúde. mas todos são parte de nós.
E vocês?
Que emoções conhecem?
Se pudessem transformar-se numa bola de sabão com uma emoção, qual seriam?
De que cor?
FIM
Lálá

(27/Novembro/2015)

sexta-feira, 20 de novembro de 2015

O grilo


Desenho e foto de Lara Rocha 

        Era uma vez um grilo que fugiu de um país muito quente, onde deixou de haver árvores…foram todas queimadas pelas mãos de homens ambiciosos, não havia mais erva, porque também deixou de existir água, por isso, todos os animais tiveram de sair com grande tristeza e à pressa.
Todos caminharam muitos e muitos quilómetros, os que se cansavam depressa ficavam no primeiro sítio onde se sentiam bem, com sombra, água fresca e ar puro, outros andaram mais um pouco porque sentiam que mais à frente poderia ser mais seguro, e ainda outros continuaram.
Um grilo caminhou e encontrou um repouso, quando apanhou uma tempestade e teve de se abrigar…escolheu debaixo de um cogumelo grande e largo, que vivia num jardim de uma casa. Estava muito frio e ele sentia fome.
Uma coruja que estava sempre pousada na enorme árvore que abrigava o cogumelo, fazia a sua ronda nocturna com os seus olhos gigantes, e sentiu alguma coisa estranha. Pareceu-lhe ter visto uma sombra pequenina e muito frágil passar no jardim. No inicio não ligou…estava a chover muito, frio e muitos animais passavam por ali. Como não perturbavam, ela deixava-os ficar. Entretanto, quando olha para baixo, o cogumelo chamou-a.
- Está tudo bem aí em baixo, cogumelo? – Pergunta a coruja
- Temos uma visita… - Diz ele baixinho
- Quem?
- Anda cá ver.
A coruja desce, e pousa no solo. Debaixo do cogumelo está o frágil grilo, que traz consigo um instrumento musical e um saco com algumas coisas. Ele estava muito cansado e a tremer tanto que não conseguia abrir o saco para tirar de lá comida, água e roupa. As poucas coisas que ele tinha conseguido levar.
- O que temos aqui…? – Pergunta a coruja
O grilo treme ainda mais e deixa-se cair, todo encolhido.
- Um grilo… - Observa a coruja
- Sim…vais comer-me? Bom proveito…não sei se vais gostar. – Diz o grilo
- Óh, que disparate…eu…comer-te? Não… estou preocupada.
- Sou um grilo da paz. Mas se quiseres manda-me embora.
- Tu já costumas vir para aqui?
- Não. Só quero um sítio para me abrigar e descansar…estou…muito fraco. Já venho de muito longe.
- De onde?
- De uma terra que se transformou num deserto, sem água, sem árvores, sem relva… por mãos maldosas, gente ambiciosa que destrui tudo…
- Mas que horror!
- Já andei muitos quilómetros…acho eu…não sei quantos.
- Óh, fica à vontade. Não estás nada bem. Olha para ti…precisas de ajuda? Claro que sim… (abre-lhe o saco) Acho que precisas disto…e…disto…não…espera…vou arranjar-te algo melhor.
- Óh, não quero incomodar. Só quero descansar…e quando acordar procuro outro sítio. Por favor…deixe-me ficar aqui, só esta noite.
- Não te preocupes…podes ficar sempre aqui…esta pode ser a tua casa, se gostares do sítio. Ninguém se vai incomodar. Espera aí…
O grilo deita-se encolhido, a coruja arranca umas folhas grandes da árvore, umas cascas e volta a descer.
- Ora levanta-te…por favor.
O grilo levanta-se com muita dificuldade, a coruja faz uma bela e confortável cama para o grilo, pondo a casca da árvore por baixo, em forma de barco, duas grandes folhas da árvore.
- Deita-te, e experimenta se está confortável. – Diz a coruja
O grilo deita-se, surpreso e diz com um grande sorriso:
- Está maravilhosa…mais que confortável…perfeita.
A coruja sorri, e voa outra vez, vai buscar pedaços de musgo e penas de pássaros que se amontoaram no jardim. Volta e vê que o grilo está a comer e a beber o que lhe restava.
- Boa. Quando quiseres deita-te.
No fim de comer, o grilo deita-se, e a coruja cobre-o delicadamente, com a roupa que ele trazia, mais o musgo enrolado numa folha grande, e as penas presas.
- Estás confortável? – Pergunta a coruja
- Maravilhosamente confortável. – Responde o grilo
- Quente? – Pergunta a coruja
- Muito quente. Muito obrigada. Quer dizer…obrigado é pouco para tudo isto que estás a fazer por mim.
- Não te preocupes com isso! O que eu quero é que estejas bem. E qualquer coisa que precises, estou nesta árvore. Aqui estás protegido do frio, do vento e da chuva. Mesmo assim, se sentires frio ou precisares de alguma coisa diz-me… ou ao cogumelo. Agora…descansa!
- Combinado. Muito, muito obrigado.
A coruja voa para a sua toca, sempre atenta a tudo, e o grilo dorme a noite toda, e nos dias seguintes, só acorda quando sente fome, vai buscar comida, recomendada pelo cogumelo, e volta a dormir. A coruja está sempre de vigia.
Uma semana depois, o grilo está como novo. Alimenta-se, e sai da sua casa:
- Sim, eu quero ficar aqui. – Diz o grilo
E vai explorar todo o jardim. Fica encantado! Mete logo conversa com as flores e outros animais que por lá andam, muito simpático, faz grandes amigos, que lhe dão coisas que ele precisa, mesmo sem ele pedir.
Uns dias mais tarde, ele sente saudades do seu instrumento musical, acompanhado do seu belo canto, e começa a tocar timidamente para não incomodar. Muitas cigarras e outros grilos saem das tocas, muito curiosos para ver quem estava a tocar daquela maneira, o cogumelo fica a ouvir deliciado, e de repente o grilo pára.
- Áh! – Exclamam todos
- Que lindo… - Suspira uma cigarra
Todos aplaudem. 
- Continua mano… - Diz outro grilo
- Tanta timidez para quê? – Pergunta outro grilo desafiador mas simpático
- Toca mais… - Diz outro grilo
- Sim… - Incentivam todos
- Obrigado! – Diz o grilo a sorrir
Todos querem saber tudo sobre ele e fazem-lhe muitas perguntas, ele responde de forma simpática e delicada a todos. Todos se oferecem para o ajudar, acolhem-no e integram-no como mais um da família deles. ele fica muito feliz.
- Porque paraste, amigo? – Pergunta o cogumelo
- Não quero incomodar…desculpa! Tive saudades do meu instrumento…
- Mas não incomodas nada. Continua. Eu estava a gostar tanto. Que instrumento é esse?
o grilo sorri:
- A sério? Pensei que te ia incomodar…
- Não…
- É um violino.
- Violino? Huummm… nunca ouvi falar.
- Há umas meninas com asas que também tocam muito bem este instrumento.
- As fadas.
- Isso. Conheces?
- Sim, muito bem…sou um grande amigo delas. Elas vêm aqui muitas vezes…vão adorar conhecer-te e saber que tocas o mesmo que elas…Adoro esse som. Não tenhas vergonha de o tocar. É tão lindo…tão bom ouvi-lo.
- Obrigado.
- Toca mais…por favor!
O grilo fica tão feliz que toca alegremente, e o cogumelo dança, ri, e aplaude. As fadas ouvem e aproximam-se. O grilo sorri envergonhado, mas depressa fica à vontade, porque elas pedem-lhe para tocar mais, e acompanham-no.
Cresce logo entre eles uma linda amizade, e dias depois dão fantásticos concertos de música a tocar todos juntos…todos os animais e flores do jardim adoram esses momentos musicais, dançam, convivem, conversam, brincam, cantam, aplaudem e deixam-se levar pelas músicas.
Num instante, todos ficaram a conhecer o grilo. Até a menina da casa foi conhece-lo e pedia-lhe para ele tocar…enquanto ele tocava, ela sonhava, e brincava com as fadas, fazia os seus trabalhos da escola muito mais feliz e muito mais bonitos.
A coruja estava sempre a tomar conta dele e a aquece-lo quando caiu neve, e a menina também cuidava da casinha dele, com todo o carinho, tal como as fadas. Era tratado com muito carinho por todos, era muito feliz e fazia os outros muito mais felizes. 
Já imaginaram um grilo a viver no vosso jardim?
Já o ouviram cantar?
Fim
Lálá
19/Novembro/2015
   

    

terça-feira, 10 de novembro de 2015

A pintora desajeitada

foto de Lara Rocha 



Era uma vez uma fada toda feita de nuvens que vivia nas nuvens, numa casa feita de nuvens com a sua família de nuvens. Um dia estava muito amuada, irritada e triste, porque estava farta de chuva na sua zona. Ela olha pela janela.          
- Não posso acreditar! – Grita ela com os dentes cerrados e a gritar
- O que foi? – Pergunta a sua mãe
- Não me faças perguntas… - Resmunga ela
- Tu não falas assim comigo! – Diz a mãe, muito séria
- Ei…estás séria como o céu…
- E vou ficar ainda pior. Ouviste a maneira como me respondeste? Isso são maneiras de falar com a tua mãe?
- Desculpa. Estou de mau humor.
- Ai… que paciência. Vai apanhar ar lá fora.
- Está a chover outra vez. – Grita a fada
- E que culpa tenho eu…? Ou…nós?
- Nenhuma. Mas é que… bem… acho que vou mesmo lá fora. Vou ter uma conversinha com alguém.
- É. Vai. E deixa a raiva lá fora…vai apanhar ar.
    Ela sai a porta a resmungar sozinha.
- Detesto este céu, desta cor. – Grita ela no dobro do seu tamanho de tão zangada que estava. 
    Pegou na sua palete de cores e começa a saltar em cima dos tubos de tinta que lançam um enorme jato de todas as cores. 
    As cores gritam, dão as mãos, dançam, misturam-se e fazem um enorme e lindo círculo de arco-íris.
- Áh! Assim sim, já gosto mais deste céu. Mas mesmo assim, ainda não gosto.
As cores, que estavam felizes, ficam tristes com o comentário, dissolvem-se nas suas próprias lágrimas, e juntam-se numa nuvem negra assustadora.
- Ei…onde é que vocês foram?
Não há resposta nem barulho. A fada fica triste. Pega outra vez na sua paleta de cores, mistura-as, mas vem uma rajada de vento muito forte que a faz rodar muito rápido, e ela sem largar os pincéis e as cores grita. 
O trabalho final não é nada bonito, mas há muitas cores. 
O vento desata às gargalhadas.
- Já viste o que fizeste? – Pergunta ela muito zangada
- Tu é que és a pintora, mas não fazes obras nada bonitas.
- O quê? Tu é que és um insensível.
- Não. Tu é que não tens mesmo gosto nenhum, nem jeito.
- Áhhhh!
- É verdade.
- Mas…
- Sim, enquanto estiveres nesse estado, não vais fazer nada de jeito.
- Que estado?
- Assim, quase a explodir…tu é que pareces uma ventania.
- Huummm…estou muito zangada.
- Já reparei. Mas posso saber porquê?
- Não.
- Pronto, está bem…então fica lá com o teu mau humor, e a tua irritação. (o vento afasta-se ligeiramente) Desculpa! Acho que estraguei as tuas obras. (afasta-se mais um bocadinho) Deve ser por isso que estás tão zangada…
- Não. Espera…talvez me possas ajudar.
- Eu? Ajudar-te? (ri) Tu é que costumas ajudar os outros, não sou eu. Eu sou vento, tu és fada.
- Mas as Fadas também precisam de ajuda…às vezes!
- Precisam?
- Claro! Tu também precisas?
- Sim, claro.
- Detesto este céu. Estou farta da chuva, farta de ver estas nuvens escuras…queria dar-lhes outras cores mais bonitas, alegres… sem cores fico muito triste.
- Eu também gosto muito de cores. E mesmo as nuvens escuras, e a chuva…têm cor.
- Sim, é verdade. Mas são muito escuras…eu gosto mais de cores alegres.
- Mas não podes mudar as cores que elas têm.
- Porque não?
- Isso é com o sol.
- Eu vi o arco-íris, mas desapareceu. Saltei em cima dos tubos de tintas, um de cada cor… delas saiu um grande jato de cores, elas deram as mãos, dançaram, misturaram-se e formaram o arco-íris, mas…desapareceram…Acho que ficaram tristes, por uma coisa que eu disse.
- Pois! Estou a ver…
- Quem? O arco-íris?
- Não. O que tu fizeste…
- Foi mau, não foi?
- Foi. Mas o que é que tu querias pintar?
- Nada de especial…e…tudo à minha volta…para ficar colorido...para dar cor a estas nuvens tão escuras.
- As nuvens escuras são importantes…e têm a sua beleza.
- É. Mas cansam depressa. Eu não gosto de tudo tão escuro.
- Mas também não podes mudar a cor…podes pintar com outras cores, mas em desenhos, ou nos teus sonhos.
As cores gostaram tanto do que o vento disse, que voltam a aparecer em forma de arco-íris entre as nuvens a sorrir. A fada tenta agarrá-las, mas elas escondem-se.
- Porque é que fogem?
- Porque não fomos feitas para sermos agarradas…
- Só…olhadas.
- E apreciadas.
- De longe!
- Para sermos vistas…
- Sentidas…
- Tocadas com os olhos.
- E vocês gostam dessas nuvens tão escuras?
- Sim! – Respondem todas
- Eu não gosto. E quero pintar tudo à minha volta com outras cores.
As cores desatam a rir às gargalhadas.
- Achas que mandas nisto…
Aparece um raio de trovoada e faz um estrondo.
- Vai-te embora. – Grita a fada
- O quê? – Pergunta o raio
- Eu não gosto de ti. – Resmunga a fada
- Olha para a minha cara de preocupado… (responde o raio a rir) tu ficas aí, que eu fico aqui… e está tudo bem.
- Tu não me dás cores…não gosto de ti.
- Quero lá saber. Não tenho nada a ver com cores…só com…luz.
A fada fica mesmo furiosa. Aperta os tubos de tintas aos gritos, roda, salta…todos a mandam calar. O vento prende-a.
- Pára quieta e pára de gritar, criatura irritante. Já me estás a deixar muito nervoso…e olha que eu até sou calmo…
Aparece o sol.
- Mas o que é que se passa?
- Esta criatura só grita… reclama por cores. Diz que detesta nuvens escuras, que está farta de nuvens escuras e de chuva. – Explica o vento
O sol ri.
- Sou pintora. – Grita a fada
- Pintora? – Todos desatam a rir
- És uma pintora muito desajeitada. – Brinca o vento
- É verdade. – Confirma o sol
- Tu queres pintar o quê? – Pergunta outra nuvem
- Quero encher isto tudo de cores.
- Não podes.
- Porquê?
- Eu é que mando…
- Porque é que me roubaste as cores?
- As cores estão mesmo diante de ti. – Mostra o sol
- Mas eu vejo tudo igual…e não gosto destas cores.
- Enquanto estiveres assim tão irritada, eu não te ajudo. – Diz o sol
- Porque não?
- Porque não são maneiras de tratares a natureza.
- Mas ela é quem manda?
- Claro.
- Pensei que eras tu!
- Não. Eu faço parte dela, mas é ela quem decide tudo. Não sou eu…eu só obedeço…ou apareço ou não…e onde…quando ela quer…ou manda.
- Mas…ela não entende que ficamos tristes quando tu não estás?
- Entende. Mas é porque ela acha que sou mais preciso noutros lugares.
- Óhhh…
- Não posso contrariar as ordens dela. Nem vai ser por tu ficares tão irritada que ela vai mudar as coisas.
- Não?
- Não!
- Eu só quero cores…
- Vais tê-las aqui fora, quando a Natureza entender…
- Mas…
- E é melhor não discutires com ela.
- Porquê?
- Ela não gosta…e não é para brincadeiras.
- É pior do que eu?
- Muito pior.
- Não pode ser.
- É.
- Achas que se falares com ela, ela vai fazer-me a vontade?
- Não. Isso tens de ser tu a pedir, e mesmo assim é melhor não teres muita certeza que ela vai realizar o teu desejo.
- Eu quero cores…
A voz da natureza soa:
- Pinta, e cala-te um bocadinho, por favor. Já estou cansada de te ouvir.
- Ãh? – Pergunta a fada
- É a mãe. Respeita-a…- diz o sol
- Ela está a mandar-te pintares. – Diz o vento
- Mas vou pintar onde?
- Na tua casa…sossegada, calada… e bem comportada. Em papel branco, com as tuas tintas. – Manda a natureza
- Mas…
- Vai já para casa. – Ordena a natureza
A fada obedece, triste e um pouco assustada. Senta-se em frente ao apoio das folhas de desenho, e olha para as tintas.
- O que é que eu vou pintar?
- O que tu quiseres… - soa a voz da natureza
Ela faz um desenho cheio de riscos, pintas, borrões com várias cores.
- Está bem?
- Não! – Respondem todos
- Está muito mau. – Diz o vento
A fada quase explode.
- Nem te atrevas…respira…- Ordena a natureza – Eu não faço obras dessas
Ela respira muito zangada, e faz outro desenho, ainda mais trapalhão. A natureza ri-se.
- O que é isso?
- Faz um desenho como deve ser. – Sugere o vento
Ela tenta outra vez, muito zangada. Uma mancha de tinta salta da folha e transforma-se em gota gigante. Fica a olhar para ela.
- Isso é coisa que se apresente, menina?
- Ai, que susto. De onde saíste?
- Daqui. Desta salsichada que chamas desenho. Olha para isto…? Que coisa é esta…? Não tem pés, nem cabeça.
- O quê? Mas…que indelicada…Eu não estou a desenhar salsichas. 
- Estou a ser muito sincera. Tu não sabes pintar.
- Sei.
- Não. Muito menos quando estás nervosa. Olha para isto…? Que bagunça. A natureza não gosta disto…nem ela nem ninguém.
- Óh!
- É verdade.
A mancha dá uma longa lição de pintura à fada, explica tudo passo a passo de como fazer a pintura.  Mostra cores, fala com elas, elas dizem as suas funções, explica quais as cores que se podem misturar, e as que não podem 
Pega nas mãos da fada e põe-nas a desenhar como deve ser. Quando ela começa a desenhar coisas bonitas, e a ficar muito bem-disposta com a mancha, a natureza à sua volta começa a ganhar uma nova vida. 
As nuvens mudam de sítio, aparece o sol, as gotinhas escorregam das pétalas das flores, e dos troncos das árvores, e todas as cores de tudo o que parecia ser pintado com a mesma, sorriem.
A fada sai a correr de casa, toda feliz, com um grande sorriso, e corre solta pelo espaço.
- Finalmente…sol! Luz…muito obrigada… obrigada Natureza… obrigada, mancha de tinta…por me teres ensinado a pintar.
- Mas lembra-te de respeitar também a chuva, porque até ela tem a sua beleza…e é muito necessária. – Aconselha a Natureza
- Sim, já percebi.
E a fada volta a brincar com as cores. Quando estava chuva, ela deixou de ficar zangada, e aprendeu a pintar de verdade…até a chuva ela pintou. 
Quadros lindíssimos, da Natureza, com todos os belos e pequeninos pormenores, pois adorava tudo o que via, e via com olhos bem abertos para captar tudo…
Sonhava, e passava todos os seus sonhos para o papel, enquanto viajava pelo mundo das cores, que às vezes era só seu.
Era de certeza um mundo lindo, porque todos os seus quadros passaram a ser muito apreciados por todos. 
Até lhe pediam para fazer quadros especiais, quando queriam oferecer alguma coisa muito especial a alguém.
A pintora que era desajeitada, aprendeu a pintar e a não ficar zangada quando estava a chover. Com sol ou chuva, a Natureza é mesmo assim, e ela merece sempre a nossa admiração, não é?

                                               FIM
                                          Lara Rocha 
                                  (9/Novembro/2015)