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segunda-feira, 27 de junho de 2016

A estrela-do-mar e as sereias

                                                                                   foto de Lara Rocha 
                           
Era uma vez no fundo do mar, uma cidade marinha, cheia de casas, mistérios e agitação. Nessa cidade viviam muitos peixes, de todas as espécies e cores, tamanhos, golfinhos, estrelas-do-mar, cavalos-marinhos, caranguejos, lulas, polvos, sereias e espécies raras.
Nesse dia, muitas sereias estavam deliciadas a ler um livro, confortavelmente instaladas em bancos de areias, num grande coral maravilhoso, onde elas adoravam estar.
Cada uma com o seu livro, mas faziam muitas outras coisas, como conversar, rir, pintar, desenhar, fazer rendas, malhas, roupas, jóias, e tudo o que mais gostavam. Esse era um sítio quase secreto.
Uma pequena estrela-do-mar já tinha passado por lá muitas vezes, mas nunca tinha entrada, e ficava sempre muito pensativa, curiosa para saber o que acontecia naquele sítio, o que haveria lá de tão especial, e principalmente…o que era aquilo que elas tinham nas mãos.
Espreitou, e escondeu-se, mas alguém a viu, e convidaram-ma a entrar. Ela ficou um pouco envergonhada, entrou, sorriu, e pediu desculpa. Todas riram, e mostraram o espaço todo. A estrela-do-mar ficou encantada e compreendeu porque é que elas gostavam tanto desse lugar.
Aproveitou e perguntou o que é que elas tinham entre as mãos. As sereias responderam que eram livros, cada uma mostrou o seu. A estrela-do-mar nunca tinha visto livros, nem as palavras, nem as letras, e perguntou o que era aquilo.
Elas responderam que eram letras: umas isoladas, outras de mãos dadas que formavam palavras, e juntas, em filinha, construíam frases. Elas sabiam ler, mas a estrela-do-mar, não, por isso perguntou o que diziam aquelas letras, e aquelas palavras.
Uma sereia perguntou à estrela-do-mar se ela queria aprender a ler, e ela respondeu logo que sim. Cada uma ensinou uma letra e uma palavra do seu livro, a estrela-do-mar desenhou-as num papel, e as sereias festejaram orgulhosas, cada palavra que ela escreveu e leu direito.
Depois, a estrela-do-mar leu cada letra, cada palavra e cada frase, com cada sereia, e ficou encantada…tão feliz, que passou a ir para esse lugar todos os dias seguintes.
Em cada dia, a estrela-do-mar aprendeu a ler várias palavras de cada livro, de cada sereia, umas mais fáceis, outras mais difíceis, umas mais bonitas, outras mais alegres, umas maiores, outras mais pequenas.
As sereias tinham ensinado a estrela-do-mar a ler, e a estrela-do-mar aprendeu a ler como elas, partilharam livros, criaram histórias bonitas e divertidas, juntas. A estrela-do-mar ensinou outras estrelas-do-mar a ler e a escrever, e todas se juntavam para ler e ouvir as histórias umas das outras.
Podemos sempre aprender muito uns com os outros, e ensinar, como as sereias ensinaram a estrela-do-mar, que queria aprender, aprendeu e depois ensinou outras estrelas-do-mar, para isso, e por isso é que devemos ler muito, ouvir ler, partilhar livros, brincar, conversar.  
E vocês? Já ensinaram alguma coisa de especial a alguém? O quê? A quem? Quem é que vos ensinou mais? Gostam de aprender?
FIM
Lálá
(27/Junho/2016)




domingo, 19 de junho de 2016

As botas

Lara Rocha 

Era uma vez uma família de andorinhas que emigrou do seu país de origem pelas alterações climáticas, que tornaram o ar da cidade muito poluído, com ondas de calor insuportáveis daquelas que nem dava para mexer uma pena…e muitos ficaram doentes porque em vez de boa comida e água limpa, passou a haver toneladas de lixo.
Voaram milhares de quilómetros, pararam em vários sítios que gostaram para descansar, mas decidiram continuar, até que chegaram a uma aldeia no meio de uma montanha muito alta, com muito poucas casas, muitas árvores, e gado a pastar.
O vento estava forte, apesar de sol. Viram uma fonte, beberam, refrescaram-se, e pousaram na relva macia, debaixo de uma árvore à sombra. Olharam em volta, respiraram e gostaram do ar, do silêncio quase total que já não ouviam há tanto tempo, sentiram paz, e que era ali!
Tinham encontrado finalmente um sítio que reunia tudo o que queriam, procuravam…quer dizer…só faltava uma casa! Haviam de encontrar, mas primeiro quiseram descansar…estavam tão cansados que nem ouviram os movimentos e as vozes das pessoas. Só acordaram quando a fome apertava, e comida não faltava! Estavam mesmo em paz.
Quando se sentiram mais fortes foram conhecer a floresta à procura de um ninho, e tudo era lindo: as flores, as árvores, as fontes, os animais, os sons e as cores que os rodeavam…até que viraram as cabeças e viram umas botas grandes que tinham ar de ter sido abandonadas! E estavam mesmo abandonadas. Tinham sido deixadas por um dos humanos por estarem velhas.
Elas não sabiam que o que estavam a ver eram botas, só que já tinham visto muitas nas cidades por onde passaram à beira do lixo. Espreitaram, não cheiravam a nada e por dentro estavam boas.
As andorinhas não procuraram mais, pois já estavam habituadas a ter de se desenrascar, inventar e criar habitações, meios de sobreviver e de se protegerem. Aproveitaram o par de botas e puseram-nas encostadas a uma árvore muito grande, velha, com um grande buraco no tronco.
Usaram tudo o que precisavam e mais gostavam para o ninho que ficou dentro do tronco, muito espaçoso e aconchegante, confortável. Uma bota pousada num ramo de uma árvore serviu de teto para tapar o ninho e a outra bota serviu de porta que elas puxavam nos dias de tempestade e frio.
Estavam maravilhosamente bem instaladas e sossegadas, rapidamente conheceram outras andorinhas que também tinham fugido e que se instalaram nas árvores à volta, quase parecia um condomínio fechado, onde todas eram como família, e usavam às vezes a bota da porta para abrigar, quando havia convívios nos dias frios e chuvosos. Todas partilhavam coisas umas com as outras, o que precisavam, todas ajudavam e faziam muitas festas.
Quando chegou a altura de ovos e bebés, a bota de entrada serviu muitas vezes de infantário onde estavam sempre acompanhados e vigiados por adultos que se revezavam enquanto iam buscar comida.
Umas fadas gostaram tanto da ideia das andorinhas que preparam uma surpresa para todas. Arranjaram mais pares de botas que estavam velhas e transformaram-nas em autênticos prédios para andorinhas, espaçosos, climatizados com uma temperatura sempre agradável que todas suportavam bem, com janelas que abriam e fechavam, infantário, parque e centro de convívio para as andorinhas mais velhas…depois, estes prédios abrigaram outros pássaros de outras espécies que eram sempre muito bem recebidos.

O que alguns deitam fora só porque estão com um aspeto menos bonito, outros aproveitam!

                                                           FIM
                                                           Lálá
                                                    (17/Junho/2016)
   

   

segunda-feira, 13 de junho de 2016

A aldeia de croché

Era uma vez uma senhora muito velhinha, há muitos anos atrás que se lembrou de ocupar o seu tempo livre, desde que era criança, e enquanto foi mais jovem, até as suas mãozinhas começarem a ficar encarquilhadinhas e doridas, fazendo peças em croché.
Esta atividade tinha começado com a sua bisavó, que já tinha ensinado á sua avó e à sua mãe, e esta última à senhora, muito comum na maioria das famílias. Todas as mulheres se reuniam na aldeia, de todas as idades, nas casas umas das outras, e nas eiras à sombra, ou nos campos, nos intervalos de outros trabalhos.
Era lindo ver tanta geração a fazer coisas tão bonitas, com tanta delicadeza, amor, gosto e perfeição, enquanto conversavam durante horas, riam, rezavam, cantavam, e depois de fazerem mais mil e uma coisas.
Cada uma fazia o que queria…toalhas, almofadas, rendas, apoios, lençóis, cobertas, paninhos para cestinhos, até que as gerações mais novas começaram também a inventar «pessoas» em croché, e a juntar outras materiais, para fazer bonecas de todo o tipo, lindas.
As bonecas pareciam mesmo «pessoas» umas enormes, outras médias e mais pequenas, com todos os pormenores: cabelos, olhos, nariz, boca, braços, mãos, dedos, pernas… almofadavam com espuma, penas ou restos de lãs, e tecidos, vestiam-nas com roupas em croché de outras cores, e até tinham sapatinhos em croché de todas as cores.
Nenhuma boneca era desperdiçada, mesmo aquelas que não eram tão perfeitas, ou que tinham alguns «erros» de construção, porque como quem as construía dizia…a sociedade também tem pessoas imperfeitas.
Esta ideia inspirou-as e construíram bonecas em croché com cadeiras de rodas, andarilhos, muletas, bengalas, óculos, membros mais curtos que outros…tal como elas viam entre as pessoas da cidade, e na própria aldeia.
Depois lembraram-se de experimentar fazer casas e meios de transporte, árvores, flores, montanhas e animais em croché. Gostaram tanto da experiência que foram experimentando cada vez mais coisas novas, e conseguiram construir uma verdadeira «cidade em croché».
Num dia em que se lembraram de juntar todas as peças que já tinham feito, perceberam que já tinham uma cidade, e quiseram expor. Todos ficaram muito surpresos e maravilhados.
As fadas foram as primeiras visitantes e adoraram, decidiram dar um prémio pela dedicação delas, e gosto, as peças de croché não eram simples pedaços de croché expostos e imóveis, puseram logo tudo em movimento com os seus poderes mágicos!
Todas as peças mexiam e faziam sons, principalmente as peças da natureza, parecia um presépio animado, e todas as mulheres que construíram esta cidade de croché ficaram muito felizes, parecia que tinham voltado a ser crianças.
O Presidente da Câmara divulgou pelas cidades, e a aldeia encheu-se de milhares de visitantes que fotografavam, queriam comprar tudo…mas como elas não queriam vender, os visitantes encomendavam e pagavam bem. Não tiveram mais sossego, mas também ganharam muito dinheiro.
Com esse dinheiro ajudaram-se uns aos outros, porque era uma aldeia pobre, no inicio, construíram coisas que faziam falta, melhoraram as condições das casas, mesmo assim continuaram a ser as pessoas simples que sempre foram, e a dedicar-se ao croché.
Foi assim que nasceu a Aldeia de Croché que fez para sempre as delícias de quem visitava…que pareciam voltar à infância e à magia. Mulheres inspiradoras, com mãos de fada, e amor pelo que faziam.     

E vocês?
Conhecem croché?
Conhecem alguém que faça croché?  
Conseguem imaginar uma cidade com pessoas e casas…tudo feito em croché?
Gostavam de visitar essa cidade?

FIM
Lálá

(13/Junho/2016)