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sexta-feira, 25 de março de 2016

A nova vida da fábrica (adultos)




Foto de Lara Rocha 

     Era uma vez, uma fábrica abandonada, e desativada há muitos anos, que ficava perdida num campo, numa aldeia nos arredores de uma grande cidade. 
        Nessa aldeia, todos os habitantes já tinham muita idade, muita experiência de vida, e acreditavam que aquela fábrica servia de abrigo a animais, monstros, outras criaturas extra planeta terra. 
    Todos tinham medo de lá passar, e ouviam barulhos vindos de lá, que os deixava completamente gelados. Nunca ninguém tinha tido coragem de entrar naquela fábrica, exceto os animais que às vezes usavam as ruínas da fábrica para se proteger do frio e das crueldades humanas. 
    Um dia, um rapaz que estava desempregado, para aliviar a enorme tristeza que tomava conta dele, decidiu ir passear para os arredores, sem pressa, sem rumo. Queria apenas andar e apreciar a paisagem. Inspirou, expirou várias vezes, e apreciou a paisagem. Chamava-se Diogo.
 Áh…que espaço fantástico. Se tivesse dinheiro construía aqui uma casa. - suspira Diogo 
     Todos os senhores que se cruzavam com ele, olhavam-no fixamente, pois nunca o tinham visto por ali. Diogo cumprimentava toda a gente, e respondiam, mas ficavam receosos, pois não o conheciam. Passa um senhor já com alguma idade.
DIOGO – Olhe, desculpe…aqui há trabalho?
SR. – Desculpe?
DIOGO – Perguntei se há aqui sítios para trabalhar…fábricas, ou escolas, ou outra coisa qualquer…?
SR. – Olhe menino…o menino não é daqui pois não?
DIOGO – Não…
SR. – Então volte para o sítio de onde veio, pois aqui não há nada dessas coisas modernas. Só há campos para trabalhar, mas não me parece que venha para trabalhar em campos…o menino é chique demais. Se quiser trabalhar a terra não falta onde, agora fábricas e essas coisas…já houve…mas o tempo levou tudo.
DIOGO – O tempo?
SR. – Claro, menino…o tempo…! Você ainda é muito novo para perceber estas palavras que estou a dizer. O que eu quero dizer é que quem trabalhou nas escolas e fábricas que aqui havia, já não trabalha mais…agora…trabalham nas casas deles, ou…bem…sei lá mais onde…! As coisas não sendo tratadas…o tempo leva tudo pelos ares. Acontece como aquela ruína de fábrica que há muitos anos atrás deu trabalho a muita gente… é triste, mas um dia…a fábrica teve uma avaria, e como não havia dinheiro, tiveram de ir todos para outros sítios. Depois de um castigo dos céus…não houve mais fábrica para ninguém.
DIOGO – Castigo dos céus?
SR. – Sim…uma noite de trovoadas, ventos e chuvas, nunca antes visto. É que foi castigo porque o dono da fábrica traía a esposa e roubava, explorava outras pessoas.
DIOGO – Que horror…mas eu não acredito que tenha sido castigo.
SR. – Olhe que foi.
DIOGO – E porque é que não voltaram a restaurar a fábrica?
SR.  Não havia dinheiro, para concertar todos os estragos que tiveram, nem conseguiam lá entrar.
DIOGO – Porquê?
SR. – Porque…não sei…diz-se muita coisa.
DIOGO – E era uma fábrica de quê?
SR. – De…de…olhe…já nem sei.
DIOGO – Obrigado. Saúde…
SR. – Obrigado jovem. Volte sempre.
DIOGO – Obrigado.
NARRADORA – Mais à frente, o Diogo maravilhado com a paisagem, cruza-se com uma senhora.
SRA. – Boa tarde, menino.
DIOGO (sorri) – Boa tarde!
SRA. – Veio passear?
DIOGO (sorri) – Sim.
SRA. – Faz bem…olhe…só não vá para ali. É perigoso, de resto pode andar à vontade.
DIOGO – Para ali, onde?
SRA. – Para aquela ruína.
DIOGO – Áh…estou a ver, mas é perigoso porquê?
SRA. – Porque…é…bem…é melhor para si não se aproximar. Acontecem lá coisas estranhas.
DIOGO – Era uma fábrica de quê?
SRA. – De…têxteis…e depois de…papel…
DIOGO (sorri) – Áh. Muito bem!
SRA. – Mas não vá para lá…se quer ir para aquele campo, vá em frente, e depois entre por um portãozinho que tem lá em cima. Mas tenha muito cuidado. Se quiser produtos da terra, bons…a minha casa é aqui, e eu vendo.
DIOGO – Está bem, obrigado pelo conselho. Até logo. Mais tarde passo aqui para comprar alguns produtos.
SRA. – Sim, senhora. Até logo, filho…
DIOGO (sorri) – Até logo. 
        O Diogo caminha, e vai lá ao terreno. Não deu ouvidos ao que as pessoas disseram, pois sabia que tudo o que está em ruínas, desperta a imaginação e o medo das pessoas. Estava realmente tudo muito abandalhado, com gatos a desfilar e a descansar preguiçosos ao sol. Mas mesmo assim, ele entrou. Observou todo o espaço, cuidadosamente, e de repente surge uma luz na sua mente, e um trevo de quatro folhas voou do campo e pousou na sua camisola. Ele sentiu que caiu qualquer coisa, e quando olha…
DIOGO – Um trevo de quatro folhas…? Uau, que coisa rara…de onde veio?
        Uma borboleta pousa no seu nariz. Diogo sopra. Ela afasta-se um pouco e olha-o fixamente.
DIOGO – Uma borboleta…um trevo…mas o que é isto?
BORBOLETA – Tens uma missão…
DIOGO – Uma missão? Eu…?
BORBOLETA – Este espaço é teu. Faz dele o que quiseres…
DIOGO – Mas…isto está tudo desmontado.
BORBOLETA – Reconstrói-o…
DIOGO – Isso gostava eu, se tivesse dinheiro.
BORBOLETA – O dinheiro aparecerá. Primeiro…imagina na tua mente, o que queres fazer deste espaço…depois…desenha…depois…fala com alguém de confiança…depois vês o que se pode fazer.
DIOGO – Mas…porquê eu?
BORBOLETA – Porque conseguiste entrar aqui.
DIOGO – Claro…qualquer pessoa entra aqui.
BORBOLETA – Não…houve muita gente a tentar entrar aqui, com projetos gigantes, com ambição de ganhar muito dinheiro…mas esta fábrica sempre pertenceu a pessoas humildes, de coração bom, que faziam as coisas com alma, com vontade e alegria.
DIOGO – Está bem, mas o que é que eu tenho a ver com isso…? Não sou da família deles…
BORBOLETA – Mas tens uma alma linda, um coração bom, és de uma família humilde...
DIOGO – Sim, isso é verdade…e estou no desemprego, por isso, sem ganhar dinheiro.
BORBOLETA – Não tens emprego, mas tens os teus pais, certo?
DIOGO – Sim, felizmente, tenho uns pais maravilhosos, que me sustentam, e que me amam…que me acolhem…mas eu não me sinto bem com isso, porque já sou adulto, e devia ser independente.
BORBOLETA – E serás, mas enquanto isso, tens os teus pais, que estão aí para tudo o que precisas. E tens irmãos?
DIOGO – Sim, dois.
BORBOLETA – Eles também são importantes.
DIOGO – Sim.
BORBOLETA – Tens um teto para te abrigar, comida, roupa, companhia, amor…saúde…estás vivo…o resto vem por acréscimo, a seu tempo. E a tua família tem valores muito bonitos.
DIOGO – Sim, são pessoas com um grande coração, maravilhosos, com sentimentos muito bonitos.
BORBOLETA – Exatamente. Por isso é que foste escolhido. Esta fábrica é para ti. Faz dela o que entenderes.
DIOGO – Mas de que adianta fazer planos, se não há dinheiro para os pôr em prática?
BORBOLETA – Esquece o dinheiro…primeiro…faz o que te disse…pensa em algo que gostasses de fazer, por esta sociedade, por exemplo, ou pelo mundo…desenha…e fala com pessoas da tua confiança, igualmente humildes, e de coração bom.
DIOGO – Está bem…se é essa a minha missão.
BORBOLETA – Sim. Pensa com o coração, com os sentimentos, com os bons valores que os teus pais te transmitem.
DIOGO – Está bem!
BORBOLETA – Voltarei.
           A borboleta dá um beijo sonoro ao Diogo, ele sorri, e fica pensativo. Olha em volta, várias vezes, olha para cada pormenor, e começa a pensar em coisas que possa construir naquele espaço. Depois de tanto pensar, surge na sua mente…um centro de convívio com todas as condições para que as pessoas da aldeia se pudessem juntar e conviver. 
        É mesmo isso. Desenha, e fala com amigos, de diferentes profissões: engenheiros, arquitetos, psicólogos, assistentes sociais, médicos, enfermeiros, animadores culturais, professores, cozinheiros. Todos os seus amigos aceitam fazer parte do projeto, e mesmo com poucos recursos, todos põem mãos à obra. 
        Cada um leva familiares e amigos, e todos começam por limpar os terrenos, à volta e por dentro, arrancar ervas, queimar, plantar produtos da terra, regar, plantar flores, sempre numa grande alegria, e com a ajuda também dos agricultores que lhes emprestam os utensílios do campo, sementes, e ensinam como fazer. 
        Outros, limpam por dentro, rapam as ervas daninhas, alisam a terra, lavam e limpam as pedras todas, com máquinas especializadas e à mão, cedidas por amigos e familiares. Fazem piqueniques alegremente, riem muito, cantam enquanto trabalham, e brincam uns com os outros. 
          Pouco depois, começam as obras que os engenheiros planearam, e mais uma vez, todos os amigos de Diogo, e entendidos ajudam no que sabem, e seguindo as instruções dos entendidos. Cimentam o chão, reconstroem paredes, fazem divisórias, e num instante, com todos a colaborar o projeto de Diogo vai ganhando forma, e são criadas todas as condições para uma verdadeira casa, com salas grandes, e quartos, cozinha, casas de banho…instalação elétrica, por dentro tudo começa a ficar muito organizado, e a ter mais conforto. 
         Pintam as paredes por dentro, e fazem as obras para montar o telhado. Quase num piscar de olhos, em pouco tempo, está construído um belo e maravilhoso centro de dia e de convívio para a população. Os habitantes estão estupefactos, e completamente fascinados. 
        As obras de melhoramento continuam, por dentro e por fora, e os amigos fazem campanhas de solidariedade na grande cidade para angariar fundos, e bens necessários. Todos colaboram de bom grado, e as campanhas que fazem são um grande sucesso. 
        Com a bondade das pessoas, o centro abre. Já não parece o mesmo. Está tudo muito limpo, muito bonito, muito confortável, mobilado, e com uma excelente luz, uma paisagem fantástica, com sol, e todos os habitantes frequentam o centro, desde o dia da inauguração. 
        Todos estão felizes e orgulhosos, e sentem-se muito bem. Aquela aldeia nunca mais foi a mesma! Ganhou uma nova vida, as pessoas ganharam uma nova alegria, e mais saúde, e Diogo reforçou as amizades, sentiu-se realizado, e ganha muito dinheiro com esta obra. 
      Quando há boa vontade, e bondade, tudo se vai consegue. Sozinhos não conseguimos nada, e quanto mais ambição pelo dinheiro tivermos, mais as coisas demoraram a acontecer. O primeiro passo deve ser sempre a vontade e os sentimentos…o resto, tudo o que precisarmos virá por acréscimo, quem sabe, como um prémio.

FIM
Lara Rocha  
(22/Maio/2013)




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