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sexta-feira, 25 de março de 2016

A felicidade no circo


Era uma vez uma pequena cidade, muito quente, parecia quase um deserto. Nessa cidade havia um rapaz jovem que se sentia muito sozinho.
- Óh! Que tristeza…
            Passou na rua central e viu lá um grupo de alunos de uma escola de artes, muito felizes e divertidos.
- Que felizes, que estes estão. Quem me dera.
            Uma velhinha que estava ao seu lado disse:
- Filho, não te iludas com o ar de felicidade deles. Às vezes, só os de lá de cima sabem o que sofrem.
- Olhe para o ar deles…de certeza que são felizes!
- E tu, não és feliz? – Pergunta a velhinha
- Não.
- Porque não?
- Porque…a minha principal companhia é a solidão. Estou longe dos meus pais, dos meus irmãos, dos meus amigos, da minha aldeia. Aqui não há nada que me faça feliz.
- O quê? Um rapaz desta idade, a falar em solidão? Ai, ai, ai, ai…!
- É verdade. A senhora não se sente sozinha?
- Claro que sinto, filho…muitas vezes, mas ocupo-me sempre o mais que posso, e distraio-me.
- E consegue?
- Consigo. Mas a vida de campo é muito diferente…todos se conhecem não é?
- É. Aqui não sei quem vive no meu prédio, nem ao meu lado. Na minha aldeia conheço toda a gente.
- Compreendo-te. Mas então…porque não voltas para a tua aldeia?
- Não tenho como voltar.
- Porque não?
- Não tenho dinheiro…
- Eu também tenho muito pouco, mas tenho tudo para ser feliz, e sou.
- Como?
- Tenho saúde, tenho o meu corpo inteiro…e os olhos abertos, respiro, sorrio, ando, oiço, vejo…o que mais posso pedir?
- Isso não faz milagres.
- Olha que para muita gente, ter isso já é um milagre…e uma enorme felicidade…tu é que pedes demais.
- Acha?
- Sim. Todos somos muito exigentes.
- Talvez tenha razão. Mas…e o que faz em relação à solidão? Gosta dela?
- Às vezes gosto.
- Eu detesto-a.
- Por isso é que ela te persegue.
- Como assim?
- Devias tratá-la melhor.
- A quem?
- À solidão…
- Mas como? Nem a vejo.
- Não a vês, mas sente-la! E se a sentes, é porque ela está contigo. Deves respeitá-la, porque se pensares bem, a solidão já é uma presença, uma companhia.
- Mas não fala, nem me toca…
- Mas está contigo. Já não estás sozinho.
- Você diz coisas estranhas…
            A velhinha ri-se. Chega um palhacinho ao pé deles, e sorri, faz carinhos à velhinha, aperta a mão ao jovem e faz umas brincadeiras. A velhinha ri mas o jovem não.
- Mas afinal quem é o velho aqui? Sou eu ou és tu?
- Desculpe…
- Anda para a nossa escola. Vejo no teu olhar, o brilho do desejo de experimentar. Anda. Não tenhas medo! A felicidade que procuras está lá. Não a deixes fugir. – Convida o palhaço
- Admiro a vossa arte, mas não tenho dinheiro. – Diz o jovem
- Não é preciso dinheiro para entrar na nossa escola. Basta ter vontade de ser criança. – Diz o palhaço
- Vai rapaz. Eu ia se fosse mais nova. – Incentiva a velhinha.
- Pode vir também. Lá não há idades. – Diz o palhaço.
            A velhinha ri. E os três riem.
- Vou pensar. – Diz o rapaz
- Ele vai. – Diz a velhinha
- Como é que sabe? – Pergunta o jovem
- Pelo brilho do teu olhar…vejo aí a tua criança aos saltos, a gritar para a deixares sair. Aparece…as portas estão sempre abertas. – Diz o palhaço
- Não tenho jeito nenhum para nada.
- Nós também não temos jeito nenhum para nada, mas estamos lá e fazemos tudo. – Diz o palhaço
- Não podes dizer que não tens jeito, antes de experimentares. – Diz a velhinha
- Gostar é o primeiro passo. – Diz o palhaço
- O que vocês fazem é bonito, mas não é fácil. – Diz o jovem
- Como é que sabes? Já experimentaste? – Pergunta a velhinha
- Segundo passo: acreditar no que se está a fazer. – Diz o palhaço
- E deixar a magia fluir, não é? – Pergunta a velhinha
- Isso mesmo! – Diz o palhaço sorridente  
- Mas… - Diz o rapaz
- Terceiro passo: não há mas…há observar, há fazer, há errar muitas vezes, há nunca desistir, e há tentar sempre…até…finalmente conseguir.
- É difícil.
- Quarto passo: nada é impossível, nem difícil…tudo é possível e tudo conseguimos…só temos de deixar a nossa criança livre.
- Que criança?
- A que fomos um dia…
- Eu ainda sou! – Ri a velhinha
- Muito bem…e é uma criança linda. – Diz o palhaço
- Sim, ainda sou uma velha linda… - Os três riem
- Muito linda, não tenha dúvida disso. – Elogia o palhaço
- Se já fomos, ela não volta. – Diz o rapaz
- Quinto passo: querer ser sempre criança, querer sempre brincar, rir, rebolar, cair, sonhar. É claro que ela volta…nunca saiu daí… - Diz o palhaço
- Eu sempre fui criança, mesmo debaixo desta carcaça velha. – Diz a velhinha
            Os três riem.
- A sua está bem à mostra. – Diz o palhaço
- Eu sei! Com todo o orgulho. – Diz a velhinha a sorrir
- De onde vem essa criança? – Pergunta o jovem
- Do teu coração. – Responde o palhaço
- Mais alguma coisa…?
- O resto aprenderás lá.
- Vai, filho…a tua felicidade espera-te…está mesmo diante dos teus olhos. Depois conta-me como correu… - diz a velhinha
            O rapaz sorri, e aprecia o espectáculo deliciado. No fim, decide ir à escola de artes, informar-se. Entrou de imediato para experimentar. Adorou. Já não parecia o mesmo jovem.
            Ele vai visitar a velhinha, abraça-a e beija-a sorridente:
- Tinha razão, minha…doce senhora…a felicidade estava mesmo lá.
- (feliz) Eu disse-te! Já sabia que ias adorar. Que bom, filho…estás mesmo feliz! Que lindo que estás…com esse brilho no sorriso e nos olhos!
- Não sei como lhe agradecer!
- Ora, nem penses nisso…agora…vê se me vens visitar de vez em quando… - Pede a velhinha
- Claro que venho…muitas vezes, vai ver! – Diz o jovem
- Espero bem. Tens as portas sempre abertas da minha casa.
- Muito obrigado.
            Trocam abraços, carinhos, tomam chá e têm uma longa conversa. A velhinha passou a ser uma Avó para ele, a quem visitava todos os dias. Agora estava feliz, com um sorriso de orelha a orelha, leve como as crianças, experimentou tudo, e divertiu-se muito. Como ele estava diferente!
Foi muito bem recebido e fez grandes e verdadeiros amigos, que o ajudaram e ensinaram muita coisa. Ensaiou todos os dias, com os artistas, e fez centenas de espectáculos com eles. Juntou muito dinheiro, e ganhou uma segunda família…a do circo para onde foi trabalhar depois do curso.
Levou todos os seus amigos a passar férias para a sua casa da aldeia e conhecer a sua família, que ficou muito feliz. Depois desta sua nova vida, o jovem já não se sentia sozinho, nem triste, e a velhinha também não…e às vezes até gostava de estar algum tempo sozinho, para descansar.
Se pensarmos bem…muitas vezes, a nossa felicidade pode estar, e está nas coisas mais pequenas e mais simples, mesmo diante dos nossos olhos, só que outras coisas, impedem-nos que a vejamos.

FIM
Lálá
(9/Abril/2014)  

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