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quinta-feira, 24 de março de 2016

morcegos especiais

Era uma vez um morcego igual a tantos outros morcegos…preto, que dormia de dia e andava pela noite. Mas este morcego não era bem igual a todos os outros morcegos. Este…tinha muito medo do escuro, porque…ele não era um morcego de verdade. Era morcego porque tinha sido transformado por uma bruxa que foi rejeitada por ele, quando ele era um rapaz. Mas os outros morcegos não conheciam a sua história, por isso gozavam-no porque era o único que tinha muito medo do escuro. Os outros achavam-no muito estranho, guiavam-no sempre para campos escuríssimos, descampados onde não havia luz, túneis entre as rochas, grutas profundas intermináveis…tentavam atacá-lo muitas vezes, riam às gargalhadas.
MORCEGOS (a rir) - Áh, áh, áh, áh…
MORCEGO 1 (irónico) - Coitadinho!
MORCEGO 2 (goza) - Que maricas!
MORCEGO 3 (com a mania que é bom) - Deve ser uma morcega…ih, ih, ih…
MORCEGAS (ofendidas) - O quê?
MORCEGO 3 - É a mais pura verdade.
MORCEGA 1 - Nós damos-te a verdade!
MORCEGA 2 - Já cá faltava este!
MORCEGA 3 - Falou o machão! Coitadinho!
MORCEGA 4 - Tu e essa mania que és o melhor…
MORCEGA 5 - Há morcegas melhores que morcegos, seu palerma!
MORCEGA 6 - Um dia destes estás tramado!
MORCEGA 7 (zen) - Deixem, meninas…não se desgastem com quem não vale a pena. Um dia, tudo vai mudar!
MORCEGAS - Como?
MORCEGA (zen, ri) - Um dia…vamos ver quem é melhor! Não se preocupem…não aqueçam por causa de…amostras!
MORCEGO 3 - Que nojo, esta morcega!
MORCEGA 8 (chateada) - Levamos-te já para a luz!
MORCEGO 3 - Ai, não…! Luz não. Desculpem.
MORCEGA (Zen) - Vê se te comportas!
MORCEGO 4 - Ele nem parece morcego!
MORCEGA (zen) - Aquele morcego…
MORCEGO 5 - É impressão minha ou estás apaixonada por ele?
MORCEGA 2 – Lá estás tu com a paixão!
MORCEGA 5 – Mas que cromo!
MORCEGA 8 – E se for paixão, o que tens a ver com isso…
MORCEGA 1 – Fica descansado que não é por ti.
MORCEGA (zen) Ele não é um morcego qualquer!
MORCEGO 5 - Estás mesmo apaixonada.
MORCEGA 1 - Não percebes nada! Alguém está a falar em paixão?
MORCEGO 6 - Olha o entusiasmo dela a falar nele…
MORCEGA - Onde estás a ver o entusiasmo? Ela está calmíssima…
            A morcega zen ri.
MORCEGA (zen) - Estás a precisar de óculos! (Todas as morcegas riem) Eu…apaixonada? Essa é boa! Meninas, quando eu estiver apaixonada, internem-me por favor, sim? Obrigada! – Ri a morcega zen
            Todas as morcegas riem.
MORCEGO 3 (zangado) - Vocês é que precisam de óculos, meninas!
MORCEGAS - Ora essa…!
MORCEGO 3 (convencido) - Claro, com tanto morcego jeitoso à vossa volta e vão para aquele mariquinhas…que mais parece uma morcega!
            Todas as morcegas dão gargalhadas
MORCEGA 4 (gargalhadas) - Não faltava mais nada.
MORCEGA 3 (gargalhadas) - Deves ter comido mosquitos envenenados!
MORCEGO 3 - Não, porquê? Os que eu comi eram bem bons…suculentos, estaladiços, gordinhos…Huummm…!
MORCEGA 6 (a rir) - Estás a alucinar! – Diz outra morcega a rir
MORCEGA 8 (a rir) - Deviam ser mosquitos alucinogénicos – Acrescenta outra morcega a rir
MORCEGA (zen) - Santa ignorância…
MORCEGA 1 - Acham que não temos mais com que nos ocupar!
        A conversa e a troca de piadas entre os morcegos continua. Entretanto, o morcego rapaz consegue fugir por um bocado, muito nervoso, à procura de luz. 
         As gargalhadas deles faziam estremecer o pobre rapaz, por isso, ele ficava muito nervoso, a tentar sair dos sítios escuros, e fugir, fartava-se de dar cabeçadas e de chocar com tudo e mais alguma coisa que se cruzava no seu caminho. O pobre morcego rapaz, fugia o mais que podia dos grupos de morcegos, porque não era um verdadeiro morcego, e mesmo assim, perseguiam-no. Ele gritava:
RAPAZ MORCEGO - Maldição! Deixem-me em paz…! Odeio ser morcego. Se eu apanho aquela anormal, dou cabo dela…deixo-a sem gota de sangue, arranho-a toda, trinco-a…lhec…que nojo. Acho que tinha uma intoxicação alimentar. Como é possível haver tão má, que só deseja o mal, e pior ainda consegue fazer aos outros. Aquela peste é que devia ter sido transformada numa coisa horrorosa! Espero que em breve ela tenha o que merece. Nojenta. (O morcego pousou num candeeiro com três lanternas e enrolou as suas asas à volta da luz) Áh! Luz…! Luz…! Luz…! Que maravilha. (suspira) Que saudades da minha casa, da minha família, do meu quarto, dos meus cães…! Áh! Quando é que este pesadelo vai acabar…? (olha para a lua, triste, e as lágrimas começam a cair-lhe. Ele pede um desejo) Quem me dera voltar a ser um rapaz normal…! Estou farto daqueles idiotas.
      Passa no céu uma estrela cadente. De repente, as asas do morcego começam a derreter.
RAPAZ MORCEGO - Ui, que calor…! Áh…as minhas asas estão a derreter? O que é que está a acontecer? Será da luz?
     Atrás das asas derrete a pele, e fica em esqueleto. O rapaz morcego começa a ficar muito assustado. A estrela cadente transforma-se numa mulher, e tira-o do candeeiro. Quando o pousa no chão, forma-se muito fumo, e o morcego desaparece, e reaparece o rapaz. Ele está muito baralhado, e olha para todo o lado.
RAPAZ MORCEGO - Óh…o que é que aconteceu? Sinto-me tão estranho! – Pergunta o rapaz.
ESTRELA CADENTE - Boa noite! (sorri a estrela cadente) O teu desejo realizou-se! Voltaste a ser rapaz. – Diz a estrela cadente.
RAPAZ MORCEGO (feliz) - Áh! A sério? (o rapaz salta de felicidade, ri, e abraça a estrela cadente) Que maravilha. Muito obrigada! Já não podia mais com aqueles.
ESTRELA CADENTE - A bruxa aprendeu uma grande lição!
RAPAZ MORCEGO - A sério? Falaste com ela?
ESTRELA CADENTE - Sim! Ensinei-a a respeitar os sentimentos dos outros. Tu não gostavas dela, não eras obrigado. Ela gostava de ti, mas nunca te poderia ter obrigado a gostares dela, nem tinha que te castigar por isso. Não mandamos no coração.
RAPAZ MORCEGO - Sim, quer dizer…eu até gostava dela, mas não como ela gostava de mim. Ela queria que eu fosse namorado dela, e sufocava-me, eu não queria!
ESTRELA CADENTE - Claro, ninguém gosta de estar preso!
RAPAZ MORCEGO - Achas que lhe devo pedir desculpa?
   Aparece a Bruxa, e os morcegos estão silenciosos escondidos atrás de uma árvore, transformados em rapazes, vestidos de preto, a ouvir a história.
BRUXA - Não, não precisas de me pedir desculpa, eu é que tenho de te pedir desculpa!
            (O rapaz olha surpreso para ela).
RAPAZ MORCEGO - Não!
BRUXA - Sim! Eu estava a ser possessiva…queria-te só para mim, mesmo sabendo que não sentias o mesmo…! Fui muito injusta contigo…não foi por mal, acredita. Mas num momento de raiva sem querer transformei-te num morcego…na esperança que talvez assim viesses ter comigo e me fizesses companhia.
RAPAZ MORCEGO - O quê?
BRUXA - Sim! Eu sinto-me muito sozinha…esqueço-me muitas vezes que tenho poderes, e mais uma vez, esqueci-me que quando estou com raiva, desperto os poderes.
RAPAZ MORCEGO - Eu fui mal tratado por aqueles morcegos idiotas.
BRUXA - Eles não sabiam a tua história…podias ter-lhes contado! Eles iam compreender-te de certeza.
RAPAZ MORCEGO - Os morcegos não têm sentimentos.
MORCEGOS - Temos sim!
            (Ele olha para eles)
RAPAZ MORCEGO - Estavam aqui?
MORCEGOS - Sim! 
RAPAZ MORCEGO - A perseguir-me outra vez?
MORCEGOS - Não!
MORCEGO 1 - Quer dizer…sim, mas agora ouvimos a tua história!
MORCEGOS - Desculpa! (em lágrimas)
MORCEGA 2 - Nós somos amigos dela!
MORCEGO 2 - Não sabíamos da tua relação com ela…
MORCEGA (zen) - Eu bem dizia que aquele não era um morcego qualquer, e um dia tudo ficaria esclarecido. 
RAPAZ MORCEGO - Vocês também são humanos? 
MORCEGOS - Sim! 
MORCEGO 6 - Às vezes!
MORCEGA 8 - Desculpa a forma como te tratamos!
RAPAZ MORCEGO - Eu tinha muito medo do escuro…
MORCEGA 1 - Nós…na verdade também temos…mandávamos-te para aqueles buracos, mas na verdade também tínhamos muito medo.
RAPAZ MORCEGO - A sério?
MORCEGOS - Sim! 
MORCEGO 4 - Tal como tu, também nós somos morcegos humanos…
MORCEGA 2 - São os nossos poderes!
MORCEGA 5 - E tal como ela…sentimo-nos muito sozinhos.
MORCEGA 6 - Nós só fizemos aquelas coisas contigo, para brincar, para tentar integrar-te!
MORCEGA 1 - Mas foi uma estupidez.
MORCEGO 5 - Claro! O que fizemos contigo, não é maneira de integrar ninguém.
BRUXA - Pois não! Eu queria vingar-me de ti, por me teres rejeitado, mas também te transformei num morcego, para teres liberdade, e para fazeres novos amigos! Claro que eles não o fizeram da melhor maneira, mas fizeram como entenderam que seria melhor… – Diz a bruxa
RAPAZ MORCEGO - Áh! 
BRUXA - Eu não te posso prender a mim…! Nem posso obrigar-te a gostares de mim, como eu gosto de ti…não posso querer-te para mim, se não me queres! Foi tudo um momento explosivo…desculpa! És capaz de me perdoar, e podemos ser amigos?
            (O rapaz sorri)
RAPAZ MORCEGO - Sim! Eu sou capaz de te perdoar, e podemos ser amigos, claro que sim. Era o que eu queria…era a tua amizade…mas tu querias mais e isso assustou-me! Desculpa. Mesmo assustado, fui muito injusto contigo, porque não tinha nada que te rejeitar, ou afastar-me de ti…só porque gostavas muito de mim.
            (Todos aplaudem a sorrir)
MORCEGOS - Lindo momento!
BRUXA - Sim, é verdade! Eu percebi que fizeste por medo…vocês têm medo das mulheres…! Querem-nas mas ao mesmo tempo, têm medo delas…porque não são sentimentais como nós!
MORCEGO 2 - Tens razão. Nós nunca reconhecemos, mas temos medo de vocês…!
MORCEGA 8 - Claro. Dão prioridade e valor a outras coisas. – Acrescenta outra rapariga.
MORCEGO 7 - É verdade!
BRUXA - Mas isso não nos impede de sermos amigos, porque a mulher tem capacidade de suportar e ultrapassar a dor, a rejeição…e de seguir em frente.
MORCEGA 2 - E nós conseguimos ser amigas de quem nos magoa, mesmo feridas!
MORCEGA 3 - Às vezes é melhor que estas coisas aconteçam antes de haver mais mágoas e rancores.
MORCEGOS - Claro que sim!
BRUXA - E que tal se formos festejar e conhecermo-nos melhor? Reforçar a nossa amizade e acender uma nova luz?
RAPAZ MORCEGO (sorridente) - Já ontem era tarde…!
MORCEGOS - Vamos!
       Abraçam-se todos ao rapaz, e seguem de braços dados para a casa da bruxa, onde festejam, confraternizam, brincam, riem, falam, dançam, trocam carinhos, e tornam-se grandes amigos, durante toda a noite, e dessa noite, para sempre.

FIM
Lálá 
(19/Janeiro/2014)

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