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sexta-feira, 25 de março de 2016

A mulher de gelo (adolescentes e adultos/as)


                                                                            desenhado por Lara Rocha 


            Era uma vez uma linda e jovem mulher, que vivia nos subúrbios de uma grande cidade. Era uma mulher simples, como as outras mulheres, de carne e osso, que andava pela multidão, muitas vezes solitária e pensativa. 
        Toda a gente a achava muito estranha, fria, distante, de poucas falas, não sorria muito, andava quase sempre devagar, e todos os dias ia até à praia depois do trabalho. Por ser assim…todos a chamavam de mulher de gelo. 
      Ninguém sabia porque é que ela era assim, nem tão pouco se preocupavam com ela, ou perguntavam – lhe coisas sobre si…só porque ela era assim, não se aproximavam. Tinham medo da reação dela. 
         Ela era assim porque cansou-se de sofrer deceções…de dar amor aos outros e não receber nada em troca, nem ser reconhecida…muito pelo contrário…ainda levavam a mal, todo o carinho que ela dava, tudo de bom que ela fazia pelos outros, e depois de tanto desgosto tornou-se uma mulher fria.
         Mas era só por fora, porque no seu interior, ela era verdadeiramente amorosa, bondosa, amiga, gostava de ajudar, e sentia-se sufocada, triste…por não poder libertar todo o amor que ela tinha no coração! Era por isto que ela parecia sempre triste, e de poucas falas. 
         Não se entregou mais aos outros para não sofrer mais, com tanta ingratidão. Ela canalizava esse amor que estava preso…para as suas flores, plantas, animais e natureza, e para a sua família que estava noutra cidade. 
         E lá ia vivendo…sempre na esperança de que no dia seguinte, pudesse finalmente libertar todo o seu amor, mesmo desiludida com o Mundo e com as pessoas. Um dia, em pleno Inverno, a jovem saiu de casa, devidamente equipada, e foi dar uma volta até à praia como fazia todos os dias….a chover ou a dar sol. 
        Sentou-se na areia a olhar para o mar, e quando regressou a casa…apanhou o maior susto da sua vida! Ouviu um choro perto…não estava à sua porta, mas ouvia-se muito bem. Ela fica gelada de susto. Olha em volta discretamente, e dá uns passos, dirigindo-se para os contentores de lixo. 
        Tudo indicava que o som vinha de lá. Dos caixotes do lixo, ou do armazém de sucata. Não podia acreditar…o choro vinha mesmo de um caixote do lixo…onde tinha um bebé recém-nascido…despido, e descoberto. 
        A jovem olha para todo o lado, para ver se está a mãe do bebé por lá, mas não vê ninguém. E num impulso, sem pensar…despe a gabardina, pega no bebé ao colo, deita-o sobre a gabardina com cuidado, carinhosamente, cobre-o, e encosta-o a si. Vai para dentro de casa.

 E agora? O que é que eu faço? Mas…como é que alguém foi capaz de fazer isto? Vou…primeiro dar-te um banhinho…e…leite…mas…eu não tenho leite de bebé…vou ter de ir à farmácia…e…biberões…e…chupetas…roupas…? Onde tenho? Sim…as minhas…estão na arca…

          A Jovem dá um banho ao bebé, cuidadosamente, e envolve-o na toalha. O bebé chora. A jovem vai à sua arca de infância, e tira uma camisola interior, duas fraldas de pano, uma fralda de plástico protetora das de pano, umas meias calças, um fatinho de bebé, um casaquinho. 
        Acaricia o bebé, e sai de casa com ele ao colo. Vai à farmácia e pede tudo o que precisa. Volta a casa e prepara o leite em pó para o bebé, e este segura a chupeta calmamente. Depois do leite pronto, pega no bebé, e dá-lhe o biberão. O bebé toma o leite todo, sofregamente, e quase adormece. A jovem sorri deliciada a olhar para o bebé. Enquanto o põe a arrotar, acaricia-o e fala com ele.

 Coitadinho…estavas mesmo com fome. Pobre anjinho…quem te deixou naquele sítio…? Tu tinhas era que estar no colo da mãe, a sentir o seu calor, o seu abraço, o seu cheiro…e o seu coração! A tua mãe…é que devia dar-te o leite do seu peito…cheio de coisas boas para te alimentar e para te dar defesas… Que pouca sorte, filho! Boa! Estás satisfeito.

        Vira o bebé para si, e deita-o no colo dela. Olha para ele, sorri-lhe, dá-lhe o dedo, e ele agarra com segurança, sorri levemente.

– Ai, que sorriso tão lindo! Sim! (sorridente)  É! Tenho pena que tenhas sido abandonado, mas vieste ter a mim…nada te faltará a partir de agora! Vou ser para ti…a tua mãe! É isso mesmo! Vais ter colo…muito carinho…muito mimo…regras…comida…roupa…estudos…saúde…proteção…tudo! Ainda bem que guardei todas estas roupas de bebé! Eu tinha guardado, só porque gostava muito dela…porque era uma recordação feliz da minha infância…a uma altura queria ser mãe…como qualquer mulher…tem esse sonho, mas sabes…às vezes a vida não é fácil, e acontecem coisas que não podemos evitar, mas alteram-nos tudo o que desejamos e planeamos…eu deixei de ter esse desejo depois de ter tido tanta deceção…tanto desgosto…com uns homens…e olha…decidi que não queria mais homens, nem ser mãe! Agora…sem estar à espera…apareces-me tu! Não sei de onde…nem de quem…! As roupas são para ti! Vão sair da arca. Provavelmente, quem te deixou aqui não queria fazê-lo…deve ter tido razões muito fortes! Embora, eu ache que não se justifica fazer uma coisa destas…abandonar um ser indefeso, frágil, dependente…inofensivo…! Se vieste aqui parar…é porque tinha que ser! Tu vieste…libertar-me! Ai meu filho…vieste para um mundo de loucos…mas de uma coisa podes ter a certeza…vou tratar de ti, como se fosses mesmo meu filho! Vais ter tudo o que um filho tem direito…que lindo! 

          A jovem tem uma longa conversa com ele, acaricia-o, aconchega-o, encosta-o a si, deita-o, cobre-o, beija-o, e liga aos seus pais a contar a novidade. O bebé dorme tranquilo. No dia seguinte, a jovem leva o bebé ao médico, e fica feliz por estar tudo bem com ele. 
        Por onde passa, toda a gente repara nela, boquiaberta, e muito surpresos. Todos comentam uns com os outros, como é que aquele gelo…tem agora um bebé…? Coitadinho do bebé…mas ela nunca esteve grávida…só se escondeu a gravidez…! Ou será que adotou…? Que pouca sorte a do bebé…e outros comentários maldosos. 
          A jovem não se importa com o que dizem…vai com o bebé, muito feliz e sorridente, e regressa a casa. É uma verdadeira mãe, e tem a presença e ajuda dos pais e irmãs e irmãos, que vão para casa dela, para a ajudar, maravilhados com o bebé. 
          Tratam-no como um verdadeiro neto. O bebé cresce, lindo, saudável, feliz, cheio de amor de toda a gente. Este bebé fez derreter o gelo interior da mulher, a quem toda a gente chamava de mulher de gelo…pois, ela pode novamente libertar todo o amor, carinho e bondade, que todos recusavam, para o bebé, e para a sua família, que se mudou para o mesmo bairro, e todos amam o bebé.

 Agora sim…estou feliz, completa, livre! Obrigada, querido filho…meu anjinho, minha preciosidade! 

VOZ - OFF - Quando somos obrigados, ou quando queremos prender as coisas boas dentro de nós, como o amor, o carinho, a dedicação, a amizade…a bondade…sufocamos, ficamos doentes e tristes…todos temos necessidades de nos sentirmos amados, queridos, desejados, valorizados...bebés, crianças, adultos, avós…animais...e até plantas! Infelizmente vivemos numa sociedade de aparências, e de exterior…onde todos se esquecem de ver e de dar valor ao que de melhor cada um tem…esquecem-se de partilhar com o outro, ou com os outros, coisas boas, gestos simples de carinho e simpatia, sem ser mal interpretados…todos precisamos! Vivemos numa sociedade em que dizem não haver tempo para nada…é tudo a correr…mas para o amor, para o carinho, para a amizade, para abraços e risos, e gargalhadas, e mãos dadas, e companhia…deve haver sempre tempo. Cada um de nós pode contribuir para isso, e evitar que esta seja uma sociedade de ilustres incógnitos…e mestres da maldade. O mundo não precisa de guerra, nem de competição, muito menos de isolamento…o mundo precisa de paz, de amor, de companheirismo, dedicação, valorização…O mundo precisa de tempo…para o amor! Para o ser humano! E cada um de nós pode fazer o mínimo que seja para que este se transforme num mundo onde vivem seres humanos, e não um mundo onde vivem robots desaparafusados, programados para o mal, para a destruição…O mundo precisa de união, e não de separações…o mundo precisa de coletividade, e não de cada um por si…o mundo precisa de cooperação, e não de competição…o mundo precisa que todos demos as mãos, para que todos os corações batam juntos por um mundo melhor.
DEMOS AS MÃOS AGORA, POR UM MUNDO MAIS HUMANO…UM MUNDO MELHOR!

FIM
Lara Rocha 
(21/Abril/2013)



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