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sexta-feira, 25 de março de 2016

A lenda da fonte do sol (adultos e adolescentes, crianças)


NARRADORA - Era uma vez um lago com uma fonte perdido no cimo de uma montanha muito alta, muito ventosa e verdejante, que pertencia a um castelo desabitado e em ruínas. Várias pessoas já tinham tentado entrar, mas nunca tinham conseguido. Todos tinham muito medo de lá entrar, pois diziam que ouviam coisas estranhas, e viam. Apesar disso, a fonte era misteriosamente bonita, e servia de inspiração para pintores, poetas, escritores e gente ligada às artes. Um dia, um grupo de mulheres maltratadas fez uma peregrinação a essa montanha, quase arrastando-se e chorando de dores. Elas iam pedir ajuda, e mesmo maltratadas, sentiram uma força extra, muito estranha, como nunca antes tinham sentido, e aceleram o passo, chegando rapidamente ao topo. Dentro do castelo está uma mulher prisioneira, que vivia lá escondida, refugiada, e com um coração enorme, muito bondosa, mas eternamente aprisionada a um desgosto de amor que não tinha ultrapassado, jurando a si mesma que nunca mais olharia para homens, e que defenderia todas as mulheres que dela precisassem. Ninguém sabia desta sua vida misteriosa, e ela tinha poderes. As mulheres ajoelham-se no chão.
MULHERES (gritam em coro, ofegantes) - Chegamos! (abraçam-se)
MÁRCIA - Não sei o que aconteceu, como chegamos tão rápido…! – Diz Márcia.
(Olham em volta e assustam-se com a altura)
CARLA (assustada) - Ai…! Onde estamos…?
MÓNICA – No cimo da montanha.
PRISIONEIRA – O que temos aqui…? (Ouve vozes e espreita pela janelinha) A força vem daqui…mulheres…! Como estão…! Mais umas marionetas nas mãos de…homens…! (estremece)
NARRADORA – A prisioneira levanta os braços, roda-os em direcção ao sol e lança bolinhas de fogo para a água da fonte. As mulheres olham para a fonte, assustadas.
PRISIONEIRA – Não tenham medo. Molhem-se na fonte!
NARRADORA – Elas assustam-se com a voz, estremecem, e olham para o castelo, onde vêem uma sombra de mulher na janela.
FILIPA – Já estou a ver coisas…?
DORA – Deve ser do cansaço…
MARIANA – Eu também estou a ver…
JULIA – Ouviram uma voz?
TODAS – Sim.
SOFIA – A água tem bolinhas…de fogo.
PRISIONEIRA – Não tenham medo. Molhem-se na fonte!
NARRADORA – Elas molham-se a medo, e as suas feridas cicatrizam.
PRISIONEIRA – Entrem no castelo.
NARRADORA – Elas entram a medo e abraçadas umas às outras.
PRISIONEIRA – Entrem! Deixem o medo fora da porta…aqui dentro já há que chegue.
TODAS – O quê?
PRISIONEIRA – Medo…! Entrem e subam as escadas…até onde virem luz.
SARA – Que medo…está tudo escuro.
PRISIONEIRA – Confiem na vossa luz! Deixem que ela vos guie.
SOFIA – A minha luz não existe.
TODAS – A minha também não.
PRISIONEIRA – Existe sim! Se não existisse não teriam chegado cá cima.
LUANA – Não sei se alguma vez tive luz.
DINORA – Por favor acende a luz.
PRISIONEIRA – Não há. Está na hora de reacender a vossa luz. Vamos, mulheres! Vocês têm-na…
NARRADORA – E elas sobem cheias de medo, agarradas, a olhar para todo o lado, e devagar.
PRISIONEIRA – Podem vir devagar…eu espero.
NARRADORA – Elas sobem mais depressa, e encontram uma claridade debaixo da porta.
PRISIONEIRA – Sim, é aqui mesmo. Entrem! Não sou uma visão…sou uma mulher como vocês!
NARRADORA – Elas abrem a porta, e vêem uma linda mulher, elegante, atraente, de longos cabelos escuros, e olhos verdes, vestido verde e capa preta.
PRISIONEIRA – Boa noite! Fiquem à vontade.
NARRADORA – As mulheres estão fascinadas. Ela sorri-lhes.
PRISIONEIRA (sorri) – Que lindas!
TODAS (sorriem) – Tu ainda és mais.
MÓNICA – Há quanto tempo não recebia um elogio.
PRISIONEIRA – Este é sincero, a cada letra que disse.
MÓNICA (sorri) – Sim, senti.
PRISIONEIRA – Vieram aqui pedir ajuda não foi?
TODAS – Sim.
ANA PAULA – Como é que sabes…? Ainda não falamos…
PRISIONEIRA – A fonte curou as vossas feridas…já viram? Vejam-se ali no espelho.
TODAS (gritam) – Espelho não…!
PRISIONEIRA – O espelho não é homem…é espelho. Vejam-se.
CAROLINA – Ai, não quero ver-me…
FILIPA – Nem eu…
GRAÇA – Sou demasiado feia…
PRISIONEIRA (ri) – Acordem meninas…olhem para o espelho. Não entraram aqui por acaso, e entraram…nem todos entram.
RITA – Isso foi o que ouvimos dizer…mas ouvimos dizer que esta fonte faz milagres.
PRISIONEIRA – Sim, e já se molharam na fonte…vejam o milagre que aconteceu…
NARRADORA – Elas olham a medo para o espelho. Ficam boquiabertas.
TODAS – Uau! Foi mesmo um milagre! Não temos nada…
LÚCIA – Realmente…!
PRISIONEIRA – Estão a ver?!
GRAÇA – Porque é que nós entramos?
PRISIONEIRA – Porque estão em sofrimento…com os mesmos sentimentos que eu!
TÂNIA – Mas…tu vives aqui?
PRISIONEIRA – Vivo. Desde que tive um grande desgosto de amor.
NARRADORA – Ela conta a sua história. Todas choram.
PRISIONEIRA – Não tenham pena! Nem fiquem tristes! Esta é uma oportunidade para vocês conhecerem a vossa força de vulcão! Amanhã, quando o sol nascer…serão umas novas mulheres! Esta madrugada…antes do sol nascer…mergulhem na água do lago, e recebam os raios de sol. Mas agora…descansem! Há aqui muito espaço.
SARA – Acho que esta dor nunca vai passar…
PRISIONEIRA – Minha querida…o que restará amanhã…será apenas uma cratera adormecida, que só com o tempo, e quando as lágrimas secarem, é que se transformará numa cicatriz. Mas vai passar! Quanto tempo…tudo depende da vossa força…da forma como se virem no espelho. Uma coisa é certa: não voltarão a ser marionetas nas mãos de homens! O vosso coração ficará adormecido, até que um amor verdadeiro o desperte novamente, e outra cratera se abrirá se esse amor acabar…e voltará a cicatrizar…! Mas tudo será diferente…a dor será diferente…a cicatrização será mais rápida…basta nunca deixar esmorecer ou petrificar a vossa força. Libertem amor por quem está disposto a recebê-lo. Não entreguem o vosso tesouro maior, para o primeiro que vos conquista com palavras bonitas.
ANA PAULA – Mas como vamos prever se as coisas vão dar certo ou não…? Se soubéssemos isso, não nos tínhamos entregue àquelas bestas.
PRISIONEIRA – A partir de agora saberão. Confiem na vossa luz, e na vossa sensibilidade.
GRAÇA – Não tenho sensibilidade nenhuma. Ele acabou com tudo.
PRISIONEIRA – Amanhã, com os raios de sol, tudo voltará…uma nova força…uma nova sensibilidade, uma nova luz…! Estarei convosco, amanhã. Boa noite…!
TODAS – Boa noite!
NARRADORA – Elas estão mesmo exaustas. Deitam-se e dormem. A prisioneira também dorme, e ao amanhecer, ela desperta as outras. Todas seguem para a fonte, e as mulheres mergulham na fonte. A prisioneira levanta as mãos viradas para os primeiros raios de sol, e condu-los para a água. A água começa a fervilhar, e fica amarela. Os raios de sol atravessam a pele das mulheres, e estas sofrem uma grande transformação interior, enquanto gritam e choram, giram na água, mergulham, e desaparecem.
PRISIONEIRA (sorridente) – Umas novas mulheres…! Com a força de um vulcão, para que não vivam eternamente prisioneiras, mesmo que uma parte do vosso coração tenha de ficar aprisionado, que seja temporário, e que o resto esteja livre para amar quem vos merece, para distribuir carinho. E saberão quem são!
NARRADORA – E a prisioneira tinha toda a razão. Elas transformaram-se numas lindas e poderosas mulheres, atraentes, com amor-próprio, respeitadas, independentes, felizes, orgulhosas, e livres. Todos nós temos na nossa vida, alturas em que desaparecemos de nós mesmos, fugimos, destruímo-nos, entregando-nos demais, e amando demais, a ponto de deixarmos de saber quem somos. Com isso abrimos crateras no coração que custam muito a fechar. O importante é que deixemos que os raios de sol do amanhecer, entrem no nosso coração e adormeçam a cratera da dor, até que outra se abra, sem nunca perdermos a força de vulcão que há em cada uma de nós. Que tenhamos sempre uma fonte do sol em nós.  

FIM
Lálá 
                                                                12/Outubro/2013

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