Número total de visualizações de páginas

quinta-feira, 24 de março de 2016

as palavras claustrofóbicas (adolescentes e adultos)


NARRADORA - Era uma vez umas palavras bonitas, cheias de cor, e de qualidades, mas viviam infelizes, porque estavam presas em corações, gargantas e cabeças, de pessoas que viviam em cidades. Sim, viviam presas, porque as pessoas eram dominadas e perseguidas pelo medo, pela desconfiança uns dos outros, pela raiva, pelo ódio e competição, pela inveja e pela fofoca! As palavras bonitas que viviam presas, começaram a enfraquecer por não serem usadas, muita gente esquecia-se delas…Mas apesar de fracas, as palavras presas tinham alguma força e gritavam de dentro das suas casas.
PALAVRAS – Socorrrrooooo…!
NARRADORA – Mas ninguém as ouvia. Elas voltaram a gritar, agora mais forte, tão forte como a vontade delas saírem.
PALAVRAS – Socorro! Queremos sair…socorro! Queremos respirar.
NARRADORA – Mas nada! As palavras continuavam presas e estavam a enlouquecer, pois gritavam, queriam respirar e não conseguiam. Um dia, quando as palavras estavam prestes a desaparecer, dois olhos, fartos de ouvir os gritos desesperados das palavras, pediram ajuda ao coração.
OLHOS – Ei…
OLHO DIREITO – Óh vizinho aí de baixo…do lado esquerdo…
CORAÇÃO – Eu…?
OLHOS – Sim…!
OLHO DIREITO – Por favor…precisamos da tua ajuda.
OLHO ESQUERDO – Ajuda-nos!
NARRADORA – Mas o coração estava meio congelado e vazio de palavras bonitas, embora carregado de palavras feias, responde aos olhos.
CORAÇÃO – Desculpem, não posso ajudar-vos!
NARRADORA – Mesmo assim, os olhos insistem.
OLHOS – Por favor…!
OLHO DIREITO – Ajuda-nos…o mundo está horrível!
OLHO ESQUERDO – As palavras bonitas estão presas, quase a sufocar…
OLHO DIREITO – Por favor, ajuda-nos a libertá-las.
OLHO ESQUERDO – As pessoas estão a ficar loucas…
OLHO DIREITO – Doentes!
OLHO ESQUERDO – Violentas umas com as outras!
OLHO DIREITO – Frias!
OLHO ESQUERDO – Estão sempre zangadas umas com as outras…
OLHO DIREITO – Estão impacientes!
OLHO ESQUERDO – Tristes, revoltadas, deprimidas.
OLHO DIREITO – Não há amor entre elas!
OLHO ESQUERDO – Nem respeito.
OLHO DIREITO – Nem amizade sincera!
OLHO ESQUERDO – Só há falsidade, interesse…
OLHO DIREITO – As pessoas não estão a olhar para dentro!
OLHO ESQUERDO – Só olham para fora!
OLHO DIREITO – O que oferecem umas às outras são coisas materiais…em vez de oferecerem amor, carinho, amizade, simpatia…
OLHO ESQUERDO – Os valores estão a desaparecer.
OLHO DIREITO – A boa educação também.
OLHO ESQUERDO – Já para não falar no respeito uns pelos outros.
OLHO DIREITO – As palavras simpáticas, agradáveis e sinceras também não se ouvem.
NARRADORA – O coração grita aos olhos.
CORAÇÃO – Cááááááááálllleeeeeeeemmmmmmmmmm-sssseeeeeeeee…!
NARRADORA – Os olhos calam-se, assustados.
OLHO DIREITO – Isso é maneira de falar connosco?
OLHO ESQUERDO – Até tu estás transformado! Eras tão bom.
CORAÇÃO – Como não hei-de estar transformado…?
OLHO DIREITO – Pois.
OLHO ESQUERDO – Claro, não admira…só tens esses habitantes monstruosos…!
OLHO DIREITO – Pobre coração…como tu estás!
CORAÇÃO – Estou bem.
OLHO ESQUERDO – Já não és nada do que eras quando te conhecemos.
CORAÇÃO – Nunca somos da mesma maneira sempre. Vocês os dois também não são os mesmos.
OLHOS – Pois não.
OLHO DIREITO – Mas queremos voltar a ser…
OLHO ESQUERDO – E vamos lutar por isso.
OLHO DIREITO – Para isso contamos contigo!
CORAÇÃO – Esqueçam. Não tenho nada a ver com isso.
OLHO DIREITO – A felicidade das pessoas…onde anda?
CORAÇÃO – Não sei, nem me interessa. Isso é lá com elas.
OLHO ESQUERDO – E as lágrimas de felicidade, onde estão?
CORAÇÃO – Se vocês não sabem delas, eu muito menos…! Seus desorganizados.
OLHO DIREITO – Roubaram-nas.
CORAÇÃO – Tenho pena mas não sou polícia, portanto não posso fazer nada…!
OLHO ESQUERDO – E o brilho dos olhos?
CORAÇÃO – Procurem por aí…não faço ideia onde possa estar…! Vocês é que tem de saber.
OLHOS – Por favor…ajuda-nos!
CORAÇÃO (agressivo) – Não posso!
OLHOS – Porquê?
CORAÇÃO (zangado) – Não tenho nada a ver com essas coisas que estão para aí a dizer…por isso também não vos posso ajudar.
OLHO DIREITO (indignado) – Como não podes ajudar-nos?
CORAÇÃO (indiferente) – Se são desorganizados, o problema é vosso. Tenho mais o que fazer, do que andar à procura do que vocês perdem. (p.c) Nada do que vocês dizem que estão à procura, está aqui.
OLHOS – Já reparamos.
OLHO DIREITO – Não estão aí, mas tu é que és responsável por elas.
CORAÇÃO – Estou atulhado de trabalho, e ainda tenho que vos aturar. As minhas habitantes andam aflitas…!
OLHO DIREITO – É por isso que estás nesse estado!
CORAÇÃO – Já disse que estou normalíssimo. O que é que as habitantes têm a ver com isso?
OLHO DIREITO – Elas é que te poluem.
OLHO ESQUERDO – Mas como é que deixas sair as palavras horríveis, e as coisas feias, os sentimentos maus…?
CORAÇÃO – Esse é o trabalho de qualquer coração hoje em dia.
OLHO DIREITO – O quê?
CORAÇÃO – Sim, todos os corações estão a ser habitados por estes hóspedes. (p.c) Se eles e elas são feias ou bonitas, não me interessa. Vem aqui parar, tenho de as acolher. (p.c) Estou só a fazer o meu trabalho.
OLHO DIREITO – E tu gostas delas?
CORAÇÃO – Isso não interessa…! (p.c) Não conta para o meu trabalho.
OLHO ESQUERDO – Olha lá…tu és feliz assim?
CORAÇÃO – Para que é que queres saber?
OLHO ESQUERDO – Responde. És feliz, com esses hóspedes aí?
CORAÇÃO – Isso vai mudar alguma coisa…? Não vai!
OLHO ESQUERDO – Responde!
CORAÇÃO – Feliz…eu? (p.c) Sim, claro que sim.
OLHOS – Tens a certeza?
CORAÇÃO – Sim.
OLHOS – Estás a mentir.
CORAÇÃO – E porque haveria de mentir? (p.c) Não sei porque me estão a perguntar isso, e ainda por cima a duvidar da minha resposta.
OLHO DIREITO – Porque nós vemos quando estás a mentir!
OLHO ESQUERDO – Lembra-te que somos dois! e dois vêem muito melhor que um.
OLHO DIREITO – Pois…tu podes enganar esses teus hóspedes…quem quiseres…mas a nós, olhos…não enganas!
OLHO ESQUERDO – Tu até podes fazer de conta que sentes alguma coisa…mas nós…não usamos máscaras.
OLHO DIREITO – Pois não. Embora muita gente ache que usamos máscaras, ou que nos conseguem ocultar…o que tu fazes sentir…! Estão muito enganados.
OLHO ESQUERDO – A nós…mais cedo ou mais tarde…acabam por nos descobrir…porque estamos mais expostos. A ti…como estás dentro…podes enganar. Mas não por muito tempo.
OLHO DIREITO – E ainda achas que és feliz?
CORAÇÃO (envergonhado) – Pois…vocês fazem sempre de tudo para descobrir as carecas…! Acabam sempre por me mostrar…são horríveis.
OLHO ESQUERDO – Pára lá com essa conversa…não foi isso que te perguntei.
OLHO DIREITO – O que achas de nós, não nos interessa…!
OLHO ESQUERDO – Estás a fugir à pergunta, coração.
OLHO DIREITO – Já sabes que a nós não nos enganas.
OLHO ESQUERDO – Nós vemos que não estás feliz!
OLHO DIREITO – Pois! Porque é que estás a usar máscaras…?
OLHO ESQUERDO – Tira logo as máscaras, e solta as palavras bonitas!
OLHO DIREITO – Elas têm de sair.
OLHO ESQUERDO – O mundo precisa urgentemente delas lá fora…não é…presas nas gargantas, nos pensamentos e aí!
CORAÇÃO (resmunga) – Outra vez…?!
OLHOS – E quantas mais vezes forem precisas!
OLHO DIREITO – Até que libertes as boas, e prendas as más.
CORAÇÃO (grita, indignado) – Já disse que não tenho nada a ver com isso!
OLHO DIREITO – É melhor para ti, e para o mundo, que as libertes…e que dês uma folga a essas monstruosas!
OLHO ESQUERDO – Prende essas malditas!
CORAÇÃO (agressivo) – Não posso! E não vou fazer isso!
OLHO ESQUERDO – Para que é que insistes em armar-te que estás feliz com essas aí?
OLHO DIREITO – Não podes estar feliz.
CORAÇÃO – Não sou eu que as ponho aqui! As pessoas é que as põem!
OLHOS (gritam) – Francamente!
OLHO DIREITO – As pessoas não estão para ter esse trabalho de seleccionar o que devem ou não fazer, dizer e sentir!
OLHO ESQUERDO – Alguém tem de escolher por elas, neste momento!
OLHO DIREITO – Sim! Se uma começar…as outras vão reagir da mesma maneira.
CORAÇÃO (grita) – Isso é problema delas!
OLHOS – E nosso também.
OLHO DIREITO – Vá lá, coração…o exemplo deve começar por ti!
OLHO ESQUERDO – Ajuda-nos!
OLHO DIREITO – Sempre foste nosso amigo!
OLHO ESQUERDO – Vivemos aqui juntos…!
CORAÇÃO – E o que é que isso tem de especial? Não posso ajudar-vos…!
OLHOS (gritam) – Podes sim!
CORAÇÃO – Não posso!
OLHOS – Podes sim!
CORAÇÃO – Não posso fazer nada, já disse!
OLHOS – Podes!
CORAÇÃO – Já disse que não!
OLHOS – Vais ajudar-nos!
CORAÇÃO – Não, não vou ajudar-vos!
OLHOS – Vais!
CORAÇÃO – Não vou!
OLHOS – Vais!
CORAÇÃO – Não vou! Não posso ajudar-vos, nem tenho nada a ver com o mundo lá fora.
OLHOS – Vais ajudar-nos.
CORAÇÃO (zangado) – Não vou e ponto final! (p.c) Façam vocês alguma coisa.
OLHOS – Ajuda-nos.
CORAÇÃO – Não ajudo. Não depende de mim. Nada depende de mim!
OLHOS – Tudo depende de ti.
CORAÇÃO – Não.
OLHOS – Sim.
CORAÇÃO – Não…que chatos!
OLHOS – Vais ajudar-nos…sim!
CORAÇÃO – Não.
OLHOS – Sim.
CORAÇÃO – Irra…que insistência!
OLHOS – Vais ajudar-nos.
CORAÇÃO (zangado) – Outra vez…? Já disse que não.
OLHOS – Vais sim…
CORAÇÃO – Não!
OLHOS – Vais!
NARRADORA – O coração cede…
CORAÇÃO – Pronto…vou ajudar-vos, mas é só porque já não vos posso ouvir!
NARRADORA – Os olhos sorriem e respiram aliviados, comentando.
OLHO DIREITO – Tu és difícil…!
OLHOS (sorridentes e felizes) – Boa! Muito bem!
OLHO DIREITO – Foi o melhor que podias ter feito, querido coração!
CORAÇÃO – Ai, sou mesmo um fraco! Cedi à vossa pressão. Obrigaram-me a ceder…mázonas.
NARRADORA – Os olhos riem vitoriosos.
OLHO DIREITO (sorri) – Não és fraco…! És muito bom.
OLHO ESQUERDO (sorri) – Pois…e estás a sofrer.
OLHO DIREITO (sorri) – E não queres continuar a sofrer…queres continuar a ser feliz, e queres libertar-te também desses hóspedes…!
OLHO ESQUERDO (sorri) – E não adianta dizer-nos que não é isso. Nós sabemos muito bem que é isso que sentes.
OLHO DIREITO (sorridente) – Tu é que finalmente e felizmente, percebeste que tínhamos razão e que era mesmo o melhor para ti…para nós…e para o Mundo.
OLHOS (sorridentes) – Muito bem!
OLHO DIREITO – Gostamos desta tua atitude.
OLHO ESQUERDO – Nós sabemos que não estás feliz. Lembra-te que a nós não nos enganas.
CORAÇÃO (suspira) – Ai, ai…elas vão ficar chateadas comigo, porque vou corre-las.
OLHO DIREITO – Não te preocupes…elas não te merecem.
OLHO ESQUERDO – Não te fazem falta nenhuma…nem a ninguém.
CORAÇÃO – Então…o que é que eu tenho de fazer?
OLHO DIREITO – Tens de mandar embora esses habitantes…essas palavras horríveis.
OLHO ESQUERDO – Sim, arrumar a casa, para receber as palavras bonitas.
OLHO DIREITO – Junta essas monstrengas aí num canto…e deixa todo o espaço para as palavras boas, para os sentimentos bons, como a amizade, a alegria, o carinho, o respeito, o amor, a simpatia, a delicadeza, o sorriso…
CORAÇÃO – Ei…são tantas!
OLHO DIREITO – Tens espaço para todas, descansa!
OLHO ESQUERDO – Vá lá…arruma aí a casa.
OLHO DIREITO – Prende-as bem aí num canto…
OLHO ESQUERDO – Bem pequeno.
OLHO DIREITO – Tranca-as bem!
OLHO ESQUERDO – Nós ajudamos-te.
NARRADORA – O coração e os olhos trabalham em conjunto e, apesar da resistência, dos gritos e da luta das palavras feias e más, os olhos e o coração conseguem empurrá-las para um canto do coração, trancam-nas bem trancada. No coração fica muito mais espaço, e este está agora, muito mais feliz, aliviado, relaxado…Os olhos tornam-se muito mais transparentes, brilhantes, felizes…e sorridentes. Abrem as portas às palavras felizes, boas, simpáticas, meigas, doces, carinhosas que estavam presas nas gargantas, nos pensamentos, e nos corações, e convidam-nas a entrar no coração limpo. As palavras numa grande alegria saem de onde estavam e entram no coração, instalam-se, livremente…
OLHO DIREITO – Agora sim…podem respirar!
NARRADORA – As palavras boas libertadas estão mesmo felizes, passeiam livremente. O coração sorridente comenta.
CORAÇÃO – Muito bem-vindas!
NARRADORA – Enquanto as palavras boas estão livres, as palavras más e feias que foram trancadas num canto do coração, gritam, esperneiam e protestam num grande alarido, lutam umas com as outras e não saem. As palavras que acabaram de chegar, os olhos e o coração riem felizes ao ver as outras trancadas. Num toque de mágica, as palavras boas começam a espalhar-se e a sair através dos olhos, das bocas, dos braços e das mãos, e dos sorrisos. Nesse mundo, as pessoas tornaram-se mais felizes, mais carinhosas umas com as outras, mais amigas e simpáticas umas com as outras, mais delicadas, dedicadas e amorosas. Já imaginaram como o nosso mundo seria muito melhor se as boas palavras e os bons sentimentos andassem à nossa volta, se esses fossem libertados das nossas gargantas, corações e pensamentos? E como seria bom se prendêssemos mais os sentimentos maus, as palavras feias e más, essas que agora andam mais à solta…Cabe a cada um de nós…procurar fazer alguma coisa nesse sentido… de tornar o mundo à nossa volta um bocadinho melhor! De que maneira? Se cada um de nós for melhor com quem está ao nosso lado, nas nossas casas e fora delas, e com as pessoas especiais para nós…como a família, os amigos e porque não…com os animais! Se não se gosta dos animais também não é preciso ser-se mau com eles…basta deixá-los em paz, no canto deles! Cada um de nós pode ser um exemplo bom a seguir pelos outros, e assim…o mundo poderá vir a ser um local bem melhor para viver! Por isso…é bom que não tranquemos as palavras boas…os bons sentimentos…como a bondade, a paz, o amor, o carinho, o respeito pelos outros e por nós mesmos, a amizade, a sinceridade, a dedicação, a alegria, e muitas outras. Elas devem sair sempre, e devem ocupar a maior parte do coração…as outras, que ultimamente têm tido demasiada exposição…como a guerra, a violência, o ódio, a vingança, a inveja, a competição, a indiferença, o desrespeito, o uso e o abuso, a maldade em geral, e outras, essas podem e devem ficar bem trancadas, viver apenas num cantinho do coração…bem pequeno, o mais tempo possível…! O mundo anda pobre de bons sentimentos…de carinho, de amor, de amizade, de respeito, de delicadeza, e de felicidade. E cada um de nós não precisa de ter muito trabalho para mudar isso! Basta cada um de nós libertar os seus sentimentos bons, para que o outro siga o exemplo…e a seguir o outro…e o mundo será melhor!

FIM!
Lálá
16/Novembro/2012

Sem comentários:

Enviar um comentário

Muito obrigada pela visita, e leitura! Voltem sempre, e votem na (s) vossa (s) história (s) preferida (s). Boas leituras