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segunda-feira, 23 de julho de 2012

O ACORDO DA MENINA COM O PASSARINHO




Era uma vez uma jovem rapariga que vivia numa aldeia pequenina, onde cada casinha tinha um jardim com flores e uma pequena hortinha e os animais andavam à solta. A jovem estava feliz porque tinha acabado de plantar uma série de sementes, de várias flores e legumes, e tinha regado.
            Um passarinho que estava pousado numa cerejeira a tentar debicar umas tentadoras e lindas cerejas, e já tinha sido expulso pela jovem por ter andado a picar várias frutas, voltou a aparecer. Mas a jovem não reparou nele, porque este estava silencioso. A rapariga murmura.
RAPARIGA – Ai…! Já está um calor a esta hora! (p.c) E ainda não é a pior hora…Pfff…que calor! (Pega num caneco e bebe água que tinha levado). Áh! Que fresca!
PASSARINHO (murmura) – Ai, água fresca…que bom…quem me dera…esta invejosa, nem quer saber dos animais…nós aqui a desidratar, e ela ali a saborear a água…hummm…ao menos ainda há casas com fontes onde podemos beber à vontade! (p.c) Os humanos têm uma sorte…! Depois ainda se admiram e ficam chateados quando nós pássaros comemos coisas deles, ou bebemos…claro…não se lembram de nós, temos de nos desenrascar…mas não é uma vida fácil. (p.c) Os humanos odeiam-nos…esquecem-se de nós…desgraçados. (p.c) É por isso que temos de nos mostrar…! (p.c) Para ver se se lembram que não são os únicos a viver na terra.
RAPARIGA – Ahhh…! Que boa…benditas fontes!
PÁSSARO (baixinho, chateado) – Sim, bem podes dizer! Nós também achamos…mas ela é só vossa…! Estes humanos são uns egoístas…só pensam neles. Os animais não têm direito a beber…só eles…!
RAPARIGA - Vou para dentro fazer o almoço. Só espero que aquele pardelho atrevido não volte! (p.c) Não sei o que lhe faço se o vejo outra vez.
            A rapariga vai para dentro. O passarinho ouviu tudo e murmura chateado:
PASSARINHO – Aleluia! Já estava a desidratar. Merecias que eu te espetasse aí umas belas bicadas nesse traseiro, ou nesse nariz…mázona…chutaste-me só porque eu andava a matar a minha fome e a dos meus filhos…vais ver o que vai acontecer às tuas queridas sementes…sua bruxa. (p.c) Não te lembras de mim a bem…lembras-te a mal.
            E enquanto a rapariga prepara o almoço, o pássaro esgravata a terra, debica e come todas as sementes que a jovem deitou na terra. E comeu tantas que quase não conseguia voar outra vez para a cerejeira.
PASSARINHO – Ai…eu tenho que dar de comer aos meus filhotes…mas não sei o que lhes vou dar…! (p.c) Não sei o que se passa comigo, mas não consigo voar…Aiiii…estou tão pesado…! (preocupado) Aiiii…comi tudo…e agora…?! (p.c) Os meus filhotes vão ficar sem comer…! Se ao menos a minha esposa aparecesse,..mas lembrou-se que tinha de ir às compras com as amigas! (p.c) Ai que sorte a minha…! (p.c) Que pai tão irresponsável que eu sou! (p.c) Que vergonha…! (p.c) Os meus filhos…ainda são tão pequenos…! Como é que eu vou fazer agora para lhes dar de comer…?! (p.c) Ai…socorro… (p.c) Mas onde é que eu estava com a cabeça para comer tanto! (p.c) Acho que foi mesmo castigo pela minha vontade de vingança…! (p.c.) Aaaaaiiii…!
            O pássaro começa a chorar e escorrega pelo tronco da cerejeira aos bocadinhos, de tão cheio que está e aterra na terra, quase sem se mexer, a gritar por socorro.
PÁSSARO – Socorrrrooooo…!
            A jovem, no fim do almoço e da soneca da tarde, volta ao jardim e não acreditar no que está a ver: a terra está toda remexida, e as sementes desapareceram. E o pássaro a rebentar de tanto comer, a gemer.
RAPARIGA – Mas…eu ainda estou a sonhar…quer dizer…a ter um pesadelo…ou estou acordada e a ver o que eu acho que estou a ver…?! E não queria ver…! (p.c) O que é que aconteceu aqui…? Andam toupeiras a esburacar tudo…? (p.c) Aaaaaiiii…! Vou ter que ser mazinha.
PÁSSARO – Por favor…ajuda-me…!
RAPARIGA (preocupada) – Óh…coitadinho…caíste da árvore?
PÁSSARO (envergonhado, triste e aflito) – Óh…não, não tenhas pena de mim! (p.c) Se tiveres água e umas migalhinhas…dá-as aos meus filhotes. (p.c) Eu…não consigo voar!
RAPARIGA (com pena) – Mas…estás ferido…? (p.c) Deixa-me ajudar-te (p.c) E se os teus filhotes aparecerem dou-lhes umas migalhinhas e água, e a ti também!
PÁSSARO (envergonhado, e triste) – óh! Não…eu não mereço a tua bondade.
RAPARIGA – Mas…porquê?
PÁSSARO (envergonhado) – Fui eu…eu…eu é que comi as tuas sementes! (p.c) Comi tantas, que quase não me mexo.
RAPARIGA (chateada) – O quê? (p.c) mas…eu tinha acabado de as plantar com aquele calor…e agora…tu comes-me tudo? (p.c) Tu merecias era que te depenasse…seu gulotão atrevido! Porque é que comeste as sementes todas? Não te chegava teres comido aquela fruta toda? (p.c) Não deixaste nada para os teus filhos! (p.c) Que egoísta. (p.c) É por isso que agora quase não te mexes, nem consegues voar! (p.c) Porque é que não sais deste jardim e desta horta?
PÁSSARO (envergonhado) – Tens toda a razão em estar chateada…sim, eu fui mesmo muito egoísta (p.c) Queria vingar-me de ti, por me teres mandado embora, quando eu estava muito fraco, com fome e à procura de comida para os meus filhos! (p.c) Fui chutado de todos os outros jardins e hortas, até me atiraram pedrinhas e outras coisas que nem sei bem o que era, e riam-se na minha cara, ao ver-me cair. (p.c) Sempre que ia para as janelas e pátios das casas…não via uma única migalha…e bem me viam a voar por lá…! (p.c) Do milho era muito difícil aproximar-me, porque estavam logo em cima de mim…prestes a acabar comigo! (p.c) Percebes? (p.c) Como é que eu ia sustentar os meus filhos? (p.c) Ao menos tu, enquanto não me apanhaste, também não me maltrataste. E como não estavas lá a ver, eu aproveitava! (p.c) Eu sei que fiz mal…e não devia ter feito isto…mas…não pensei! (p.c) Desculpa! (p.c) Eu não fiz por mal, foi por sobrevivência!
RAPARIGA – Então foste tu que me deste cabo de uma série de culturas…frutas…e tudo o que eu tinha?
PÁSSARO – Sim…! (p.c) Sinto-me muito envergonhado! (p.c) Não precisas de me dar comida, dá aos meus filhos, por favor!
RAPARIGA (zangado) – Desgraçado…malvado…!
PÁSSARO (a chorar) – Por favor…eu sei que te fiz mal, mas os meus filhos…não têm culpa…ajuda-os…! Por favor! (p.c) Estou muito mal disposto…não sei o que me vai acontecer…talvez eu não aguente…! Por isso…peço-te…alimenta os meus filhotes…e…perdoa-me por todo o prejuízo que te dei… (p.c) por ter estragado as tuas plantações.
RAPARIGA (com pena) – Não…calma…! (p.c) Tu…estragaste-me muita coisa, é verdade, mas foi por necessidade…não foi por maldade tua!
PÁSSARO (triste) – Sim, foi mesmo por necessidade, mas eu também não tinha esse direito, de estragar as tuas coisas… (p.c) Isto foi castigo!
RAPARIGA (com pena) – Não, não foi castigo! (p.c) Não precisavas de me estragar tudo…bastava que me tivesses dito e pedido…
PÁSSARO (triste) – Eu tive medo…e vergonha…!
RAPARIGA – Medo e vergonha de quê?
PÁSSARO – Medo que acabasses com a minha raça…e vergonha…de te pedir.
RAPARIGA – Não entendo porque tens vergonha de pedir…! Nem porque é que eu haveria de acabar com a tua raça…! (p.c) Mas olha, eu vou ajudar-te…a ti e aos teus filhotes.
PÁSSARO (triste e envergonhado) – Não! Eu não mereço que tenhas pena de mim…sinto-me muito envergonhado por ter estragado o teu jardim. Desculpa.
RAPARIGA – Não te preocupes! (p.c) Tu vais ficar bem…eu perdoo-te e vou ajudar-te! (p.c) Vamos fazer um acordo: eu perdoo-te, tu passas a ajudar-me aqui, e eu dou-te de comer…a ti, e aos teus filhos. Aceitas?
PÁSSARO (envergonhado) – Óhhh…mas…não me vais castigar, nem depenar…nem desfazer-me?
RAPARIGA – Não! (p.c) Vou pôr-te a trabalhar aqui, e assim dou-te de comer…a ti e aos teus filhos! (p.c) Até te dou abrigo, se cumprires o nosso acordo…se não voltares a estragar as minhas plantações e a comer as minhas sementes. Estamos de acordo? (p.c) Aceitas?
PÁSSARO (sorri) – Óóóhhhh…mas isso era maravilhoso…! (p.c) Que rapariga tão bondosa…como consegues ser tão boa comigo, depois de eu ter sido tão mau contigo…de te ter estragado tudo e comido as sementes?
RAPARIGA (sorri) – Eu já te disse que te perdoo se trabalhares para mim.
PÁSSARO (sorri) – E tu…confias em mim…para te ajudar?
RAPARIGA (sorri) – Confio! (p.c) Aceitas ou não? Se não quiseres aceitar, não és obrigado, mas por favor…pelo menos não voltes a estragar as coisas que planto aqui com tanto amor e carinho…se as planto, também gosto de as ver crescer e ficar lindas…tal como acontece contigo, em relação aos teus filhos.
PÁSSARO (sorri) – Eu…até aceitava, mas…não sei fazer nada!
RAPARIGA (ri) – Não te preocupes com isso…! (p.c) Tenho a certeza que sabes, e o que não sabes fazer, vais aprender rapidamente. (p.c) Aceitas ou não?
PÁSSARO (sorri) – Aceito! (p.c) Se confias em mim…e se me ajudas… (p.c) já que me perdoaste, também farei tudo por ti! (p.c) Ai…até fico envergonhado…sem jeito…tão imbecil…!
RAPARIGA (ri) – Não tens razões para isso. Esquece…começas já…assim fazes a digestão, pode ser?
PÁSSARO – Vou…chamar os meus filhos, eles também te vão ajudar.
RAPARIGA (sorri) – Muito bem…são muito bem-vindos!
PÁSSARO (sorridente e aliviado) – Muito obrigado…princesa…vou cantar para ti…e ser teu escravo! Farei tudo o que me pedires, como forma de agradecer tudo o que estás a fazer por mim, mesmo depois do que te fiz. (p.c) Muito, muito obrigado por me perdoares e por não me fazeres mal…és muito boa menina.
RAPARIGA (sorri) – Pára de te desculpares, chama lá os teus filhotes, a tua mulher…e canta para mim.
PÁSSARO (sorri) – É para já.
            A rapariga pega no pássaro, carinhosamente, ele chama os filhotes (mais quatro passarinhos), e ouvem as explicações da rapariga. Os passarinhos entendem o que têm de fazer, e pouco depois, o Pai pássaro e os filhotes ajudam a rapariga a plantar de novo, pegando nas sementes com o bico, deitando na terra e cobrindo com as patinhas, entre cantorias de belas e doces melodias vindas dos passarinhos. Ela rega e aplaude, deliciada a ver a delicadeza e o requinte do trabalho dos passarinhos.
Como prometido, depois de várias plantações, a rapariga acolhe a família dos passarinhos (a esposa, o pássaro e os filhotes) num espaço amplo, protegido, na sua casa, onde os passarinhos constroem o ninho, grande, e onde têm disponível água e comida. O pai pássaro conta à sua esposa como foi ali parar. A esposa fica um pouco envergonhada, mas feliz, agradecida e orgulhosa.
E a partir deste dia, esta família de passarinhos passa a fazer parte da família da rapariga, que não vivia com os pais, porque estes estavam noutra aldeia, passaram a trabalhar com ela, e a ajudá-la em tudo o que podem. Ela recompensa-os com carinho, atenção, dedicação, protecção, comida e bebida, e trabalho. Os passarinhos estão felizes, recompensam a jovem por tudo de bom que ela lhes dá, e a jovem também está muito feliz com eles.
A bondade nesta história deu frutos…o passarinho reconheceu que não devia ter destruído as plantações da menina, nem devia ter comido as sementes…pediu desculpa…foi humilde…e a rapariga perdoou-o, e ainda os ajudou.

FIM!
Lálá
(15/Fevereiro/2012)






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