Número total de visualizações de páginas

domingo, 12 de outubro de 2014

A casa escura

       
                                                          foto de Lara Rocha 

        Era uma vez uma casa sombria, pintada de negro, com móveis negros e a própria pessoa que lá vivia era igualmente uma figura escura, que se vestia sempre de negro. Tinha ficado assim porque vivia sempre numa grande tristeza, por estar longe da sua casa, da sua família e por não ter amigos. Como ele se vestia sempre de escuro, as outras pessoas tinham medo dele. 
        Ele não era mau. Era apenas uma pessoa triste e solitária. Os seus melhores amigos eram os livros, que tinha às centenas em casa, num quarto com pouco luz. Um dia, o rapaz sombrio saiu, e reparou num lindo arco-íris que tinha acabado de se formar na montanha. Ele nunca tinha visto tal coisa…como passava a maior parte do tempo na sua casa escura.
Fica encantado e parece hipnotizado pelo arco-íris. Desata a correr pelo campo fora até à montanha onde está o arco-íris, mas não consegue apanhá-lo, porque entretanto desaparece. Isto deixa-o muito irritado, e corre mais um pouco. Procura numa gruta, escura onde entra aos gritos, e só vê luzes pequeninas verdes a aparecer.
- O que venha a ser isto? – Pergunta um morcego irritado
- Que barulho é este? – Pergunta outro morcego
- (boceja) Ááááhhh…quem é que nos veio interromper o sono?
        O rapaz está cheio de medo.
- Desculpem…quem são vocês? – Pergunta ele a tremer
        Os morcegos dão uma sonora gargalhada.
- Olha, olha…estamos a ser visitados por um esqueleto! – Comenta um morcego a rir
- E treme! – Diz outro morcego às gargalhadas
- Óh meu…vasa daqui. – Diz um morcego calmo
- Onde estou? – Pergunta o rapaz
- Ora…na nossa casa! – Responde um morcego a rir
- Quem te deu permissão para entrar? – Pergunta uma morcega chateada
- A porta está sempre aberta… - Responde outro morcego
- Áh! Pois é. – Responde a morcega
- Mas parece que ele ou…ela…ainda não percebeu onde está. – Diz outra morcega a rir
        Os morcegos voam à volta do rapaz, nervosos e guincham pela gruta, e expulsam o rapaz de lá, aos gritos, cheio de medo. Ele corre e cruza-se com um cavalo que trava a fundo e levanta uma poeirada.
- Ai, que susto! Isto são maneiras de se andar pelo campo? – Relincha o cavalo  
- Desculpa…não te vi.
- Eu sou bem grande. Quase te passava a ferro…estás louco?
- Não. Só fujo de uma gruta de morcegos…
- Áh! Fino…foste-te meter na toca dos morcegos… (ri) esperto! As coisas não correram bem pois não? Eles odeiam ser perturbados…
- Pois. Eu não sabia que tinha entrado na toca dos morcegos.
- Não conheces a zona?
- Não.
- Áh! E o que vieste fazer por aqui?
- Vim atrás de umas riscas coloridas que vi em cima do monte.
- Riscas coloridas? Ááááááhhhh…tu não estás bom dessa mioleira… os morcegos viraram-te ao contrário. Que riscas coloridas? E logo no monte… (ri)
- Estavam ali. (O arco-íris aparece outra vez) Olha, estão ali outra vez…sabes o caminho para lá?
- Sei, mas para que vais atrás do arco-íris?
- Estou atrás daquelas riscas às cores…
- Sim, e é o arco-íris.
- Áh! Que lindo.
- Nunca tinhas visto?
- Não.
- Em que planeta é que tu vives?
- Na Terra! Como tu.
- Então como é que nunca viste o arco-íris, nem sequer sabias o nome?
- É que eu quase não saio de casa. Vivo numa casa escura, pintada de preto, com móveis pretos…
- Ui! Porquê?
- Porque sou um rapaz triste, vivo na tristeza.
- Isso é muito mau. Devias ter uma casa colorida para te alegrar.
- É por isso que estou atrás das riscas do arco-íris.
- Desculpa desiludir-te, mas nunca vais conseguir agarrar o arco-íris.
- Porquê?
- Porque ele não se agarra…é uma ilusão…quando o sol bate na água…
- Mas se ele aparece e desaparece é porque alguém o tira…
- Não. Ele aparece e desaparece porque quando não há sol na água, não há cores.
- Mas eu quero aquelas cores.
- Queres sair da tristeza?
- Sim.
- Então tens de pintar a tua casa, com cores alegres.
- E como é que eu pinto a minha casa?
- Ora…com pincéis, trinchas…e tintas.
- E onde arranjo isso?
- Numa loja de tintas na cidade.
- Paga-se?
- Claro que se paga…
- Mas eu não tenho dinheiro. Nunca vou conseguir pintar a minha casa de cores…
- Não digas essas coisas tão tristes. É claro que vais conseguir. Não é assim tão caro, e podes sempre pedir aos teus amigos ou familiares…
- Estão muito longe.
- Vá lá, não inventes obstáculos. Hás-de encontrar uma maneira. Anda…vou levar-te a conhecer a área.
- (sorri) Óh…não tens medo de mim?
- Medo? Eu?
- Sim.
- Porque haveria de ter medo de ti?
- Porque estou vestido de negro. Toda a gente foge.
- Não sei porquê! É só a tua roupa. O meu pêlo também é de cor preto…é só uma cor que tu gostas. Não mete medo nenhum.
- Obrigado! – Diz o jovem a sorrir
- Sobe. – Diz o cavalo
        Ele sobe, e os dois vão passear sem pressa, a conversar e a ver a paisagem. O rapaz sente-se muito feliz. Ao fim do dia, os dois tornam-se grandes amigos, e o cavalo quer ajudar o amigo.
        Depois de o deixar em casa, vai de porta em porta, pela aldeia, e fala com as crianças e com adultos. Pede tintas de cores alegres e pincéis. Ele conta a história do rapaz, e já todos sabem que está a falar do rapaz que vive na casa de cor preta, e que anda sempre de roupa preta.
        Todos se prontificam a ajudar o rapaz. Juntam-se, e reúnem todo o material que necessitam para pintar a casa. No dia seguinte, o cavalo vai ter com o rapaz e convida-o para ir ao monte. O rapaz aceita logo, feliz.
        Enquanto os dois vão sem pressa passear e a conversar alegremente, ainda de madrugada, todos os habitantes se juntam e decoram a casa do jovem.
        Pintam em alguns pedaços da parede preta, vários e enormes arco-íris, sóis, céus azuis, praias, paisagens...cada um faz o desenho que mais gosta. Pintam os móveis de cores claras, e ao fim do dia, a casa estava nova.
        O cavalo volta com o jovem já quase à noite, e todos os habitantes estão escondidos dentro da sua casa. Quando ele abre a porta, aparece uma criança com uma lanterna virada para a sua cara e diz:
- Bem-vindo ao mundo da luz!
        Ele fica gelado com o susto.
- O que é que está a acontecer?
        De repente acendem-se luzes por todo o lado, fortes. Os habitantes fizeram a instalação eléctrica em toda a casa, e lâmpadas em todas as divisões, com uma luz forte.
        O rapaz estremece, solta grandes exclamações, olha para todo o lado, e abre um grande sorriso:
- Não acredito!
- Gostas da tua nova casa da luz? – Pergunta o cavalo
- Adoro…está maravilhosa…linda…! Quem fez isto?
        Aparecem todos os que pintaram a casa dele, os que fizeram os desenhos e encheram uma casa escura de luz, claridade, cor e brilho. Todos o abraçam e dão as boas vindas.
- Óh…até estou emocionado! Muito obrigado…são maravilhosos!
        Entram umas avós com bolos e um belo jantar.
- Óh, que honra…! Sintam-se na vossa casa…
        Eles juntam mesas que levaram, cadeiras, pratos, talheres, e copos, e festejam a nova versão do rapaz da casa escura. Conversam alegremente, riem muito, dançam, brincam, tiram fotografias, e comem bem.
Desde esse dia, o rapaz de escuro, que vivia na casa escura, encheu-se de bons amigos, que estavam sempre a convidá-lo e a conviver com ele, passou a vestir roupas mais claras, e a ser feliz…sempre com um sorriso iluminado, contagiante, e ajudava sempre os seus amigos, vizinhos, como forma de lhes retribuir a nova decoração. Passou a estar muito tempo fora de casa.
Que grande transformação! Não teve o arco-íris que ele queria…o natural que via no monte, mas ganhou muitos arco-íris na sua vida.
Teve na mesma o arco-íris na sua casa, e o sol pintados nas paredes, que tornavam a casa muito mais luminosa e clara. O rapaz que vestia roupa escura e que vivia numa casa escura, tornou-se um rapaz cheio de cor e de luz, com um sorriso que encantava todas as meninas e senhoras que o viam. Ele tinha um arco-íris gigante dentro de si.
As cores e as luzes fazem-nos muito bem. Dão-nos alegria, leveza, vida, e saúde.
FIM
Lálá
(12/Outubro/2014)
         



Sem comentários:

Enviar um comentário

Muito obrigada pela visita, e leitura! Voltem sempre, e votem na (s) vossa (s) história (s) preferida (s). Boas leituras