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terça-feira, 19 de outubro de 2021

As companhias dos bancos solitários

     

 

  









Era uma vez um jardim com bancos, solitários, tristes que viviam num silêncio também ele triste e solitário. Um dia conversam uns com os outros, cansados dos silêncio: 

- Desculpem... - tosse um banco 

- O que fizeste para pedir desculpa? 

- Nada! 

- Então não tens que pedir desculpa. 

- Tenho, porque fui interromper o vosso silêncio! 

- O nosso silêncio é o mesmo que o teu silêncio, estamos no mesmo sítio! - comenta outro banco 

        Todos riem 

- Essa está bem vista! - ri outro banco 

- Estou farto deste silêncio! - suspira outro banco 

- Eu também. - dizem todos 

- É um silêncio tão assustador, às vezes! - suspira um banco 

- Assustador? - perguntam todos

- Sim, este silêncio todo faz-me pensar em...coisas...más! 

- Áh! Sim, a mim faz-me pensar em coisas tristes! - comenta outro banco 

- Antes este parque era uma festa! - acrescenta outro banco 

- Tens toda a razão! - dizem todos 

- Pois era. - dizem outros bancos 

- Como eu era feliz! - suspira um banco 

- Eu também. - dizem todos 

- Nós éramos tão visitados, sentavam-se, pedia-se em namoro, dava-se a mãozinha, metia-se anéis nos dedos, cantava-se, juntamente com beijinhos e risinhos! 

- Era tão bonito! 

- Porque será que isso deixou de acontecer? - pergunta outro banco 

- Não sei! - Dizem todos 

- Parece que andam todos fugidos. 

- É verdade. 

- Até gatos se esbarrigavam em cima de nós...

- Artistas pitavam-nos, e sentam-se horas a apreciar a paisagem. Tenho saudades deles. 

- E do riso das crianças, das mamãs que lhes cantavam e que os embalavam. 

- Era tão bonito de ver. 

- Agora não passa ninguém! Nem gaivotas! 

- Esperem...estou a ouvir alguma coisa... - repara um banco que ouve passos 

            Passa um senhor com alguma idade, para e olha para os bancos. Senta-se num dos bancos, que abrem um sorriso de orelha a orelha.

- Finalmente alguém! - grita um banco feliz 

- Desculpe, senhor...quem é? - pergunta o banco onde o senhor está sentado 

- Sou um velho solitário. 

- Óh! - dizem todos 

- Nós também somos solitários. - comenta um banco 

- O que espera daqui? - pergunta outro banco 

- Espero...alguém! - responde o senhor 

- Desculpe, não sei se vai encontrar alguém aqui! - diz outro banco 

- Vou sim...nem que seja...um gato. - diz o senhor 

            E aparece um gatinho vadio. Os bancos ficam arrepiados e em silêncio. O senhor, chama o gato, carinhosamente, pega nele ao colo, faz mimos, o gatinho mia, lambe-o. 

- Conhece esse gato? - pergunta outro banco 

- Conheci agora! Mas vou levá-lo comigo se ele quiser vir. - responde o senhor 

           Levanta-se com o gato, a fazer festas e a conversar com ele, e sai do parque. 

- Viram isto? - pergunta um banco assustado 

- O senhor deve ter poderes! - comenta outro banco 

- Ou então estava mesmo à procura do gato! 

- Mas ele diz que só o conheceu aqui. 

- Pois. 

- E lá voltamos nós ao silêncio. 

            Ouvem-se novamente passos. 

- Vem aí outra vez, querem ver? Se calhar vem buscar outro gato. 

- Não. Não é o mesmo. 

- Este deve vir buscar uma namorada. 

            Todos riem. O rapaz senta-se noutro banco. 

- Rapaz, o que fazes aqui neste parque tão silencioso? - pergunta um banco 

- Vens buscar uma menina? 

- Lamento, mas acho que aqui não vaias conseguir.  

- Vim...buscar o sol, para reforçar a minha luz interior. - responde o rapaz

- Mas que língua é que ele fala? - pergunta um banco 

            Todos riem 

- Como vais fazer isso, amigo? 

- Apenas...olhar para o...horizonte...deixar que os meus olhos absorvam aquelas cores maravilhosas do sol, na água! Áh! Que coisa tão bonita. - diz o rapaz a sorrir 

- Mas, ele está com algum problema, não? - pergunta outro banco 

- Não, sou poeta. - responde o rapaz 

- Áh! - suspiram todos surpresos 

- Então isso consegues. 

            Aproxima-se uma menina, e senta-se noutro banco. Fecha os olhos. 

- Éh lá...- diz um banco entusiasmado 

- Vamos voltar ao antigamente? - comenta outro a rir 

            Os dois olham-se, sorriem. 

- Olá! - diz ele 

- Olá! - responde ela 

            Os bancos ficam com risinhos nervosos 

- Posso perguntar-te o que fazes aqui? - diz ele 

- Vim sentir o vento, deixar que ele leve os meus maus pensamentos, e deixar que esta luz do sol, estas cores me renovem! - diz ela 

- Áh...não posso crer... eu vim atrás do sol, das cores. És poetiza? 

- Também. E tu? 

- Sou! 

            Os bancos sorriem, os jovens aproximam-se, e o rapaz declama uma poesia inspirada pelo momento. A rapariga sorri, ouve encantada, aplaude, e responde com outra poesia. Os bancos assobiam e aplaudem, encantados, com umas lagriminhas e sorrisos. Os dois levantam-se e vão conversar para outro sítio. 

- Ai, como eu gostei do que ouvi! - suspira um banco a sorrir 

- Eu também. - respondem todos

- Acho que acabei de ver nascer uma linda amizade, ou.., algo mais! - dizem os bancos a sorrir 

- Quem sabe! - dizem todos 

- Mas tinham muito jeito. 

            Chega uma jovem muito chorosa, triste, senta-se num banco, e os bancos ficam com pena dela. 

- Então, menina, porque choras tanto? 

- O meu namorado acabou comigo. 

- Óh! - dizem todos 

- Deixa lá, é porque vem aí algum melhor.

- O que vens aqui fazer? 

- Vim secar as minhas lágrimas, curar a minha dor. 

- Desculpa, acho que não vai ser possível. 

- Sim, vou abraçar uma árvore! 

             Todos sorriem, e a jovem fica abraçada a uma árvore como se fosse uma pessoa, a chorar. 

- Coitadinha! Estou com pena dela. - diz um banco 

- Aquilo deve passar. 

- Claro. 

- Está a ficar movimentado. 

- Quem vem lá? 

- Um casal de Avós... 

- Será que se vão sentar aqui? 

            E sentam-se, abraçados, a conversar alegremente, a ver a paisagem e a relembrar tempos em que eram mais novos, naquele parque, com muita gargalhada pelo meio. 

- Foi aqui que me pediste em casamento! - diz ela 

- Pois foi! - diz ele 

- Acho que me lembro deles...estão fisicamente um bocadinho diferentes, mas dá para ver que o amor ainda está lá. - diz o banco que assistiu na altura. 

- Estes vieram atrás das memórias felizes! Que bonitos que estão! - comenta o banco a sorrir 

            O casal foi embora, a menina também. E o parque voltou a ficar silencioso e triste. Ao fim de alguns dias, num dia cinzento, ventoso e chuvoso, o parque é invadido por muitos jovens vestidos de maneiras diferentes, com música alta, bebidas, a cantar, e instalam-se no parque. Ligam a música alta, começam a dançar, a rir, a cantar, a bater palmas, a beber, e começa uma chuva torrencial. Os bancos deixam-se contagiar pela alegria deles.

- O que vieram à procura no parque? - pergunta um banco 

- Da chuva! - diz uma 

- Do vento! - diz outro 

- Da trovoada! - diz outra 

- Da liberdade! - diz outro 

- De nós! - diz outra 

- Da amizade! - dizem todos 

- Da natureza! - diz uma 

- Da música! - diz outra 

- Viemos fazer-vos companhia. - dizem todos 

- Achamos que estão muito isolados, solitários. 

- Podemos ficar? 

- Claro que sim!

- Trouxemos tendas impermeáveis, cobertores, almofadões...

         Os bancos dançam com eles, riem com eles, noite dentro, mesmo com uma sonora e valente tempestade, muita música, alegria, brincadeira, e de manhã, os jovens vão dormir nas tendas, os bancos fazem um círculo, juntam-se, para que as tendas fiquem protegidas, e eles fiquem todos juntos, cada um na sua tenda, dormem até tarde. 

        Aqueles bancos nunca mais voltaram a sentir solidão, nem tristeza. Cada pessoa que lá ia, procurava o que mais gostava, o que mais precisava ou preenchia, mas os bancos eram sempre amigos e acolhedores. 

        Os bancos daquele parque voltaram a assistir a pedidos de namoro, e de casamento, a poetas que procuravam inspiração, a pintores que aproveitavam as imagens e passavam várias horas a pintar, a desenhar, a fotógrafos, e até cantores, dançarinos, artistas de circo e casais a passear os filhotes. 

     Rapidamente encheram-se de companhias diferentes com quem falavam e também eram ótimas companhias. 

                                                                                FIM 

                                                                            Lara Rocha

                                                                            19/Outubro/2021  

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