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segunda-feira, 4 de maio de 2015

NA GAIOLA

                                                                 foto de Lara Rocha 

         Era uma vez um bando de homens sem juízo na cabeça, ambiciosos e esfomeados por dinheiro e pelo mal, que andavam com a ideia fixa e maldosa de caçar pássaros, e vendê-los a preços muito elevados, principalmente aqueles mais raros, maiores e mais bonitos…mas os pequenos também serviam. Eram vendidos em feiras.
        Montaram uma armadilha, muito bem montada, uma enorme cerejeira, de plástico, carregada de cerejas vermelhas também enormes. Eles sabiam que os pássaros adoram cerejas, e o plano era, quando estivessem todos pousados na árvore, lançavam uma rede gigante para os apanhar. Os homens estariam escondidos.
        Infelizmente, o plano deles funcionou na perfeição, e logo de manhã cedo, esconderam-se na floresta onde estava a armadilha. Os pássaros às centenas, que voavam em paz, à procura de comida, não pensaram que estavam ou que podiam estar em perigo…e foram atraídos pelas cerejas…hum…que bom comer cerejas logo de manhã, e logo daquele tamanho.
        Dezenas de pássaros de espécies já em vias de extinção, grandes, pequenos e médios, enormes…de asas muito coloridas… voaram em direção à cerejeira, e quando picaram a primeira cereja, a rede soltou-se e sem demora fechou-se, prendendo -os.
        Os homens aplaudem, festejam aos gritos, com abraços e gargalhadas.
- Conseguimos! – Gritam todos
        Os pássaros estão muito agitados, chilreiam fortemente:
- O que é isto?
- Onde estamos?
- O que aconteceu?
- Acho que caímos numa armadilha.
- Óh não! – Gritam todos os pássaros aflitos
- Como pode ser?
- Malditos!
- E agora?
- Como vamos sair daqui?
        Os homens levam a rede cheia de pássaros para um camião e fecham-nos. Levam-nos para casa de um deles, onde tem uma gaiola enorme com uma porta de ferro para os homens entrarem e saírem, e os pássaros ficam cada um numa gaiola mais pequena, como se fosse um móvel cheio de janelinhas pequenas. Planearam tudo ao pormenor.
        No momento em que começaram a largar os pássaros nas gaiolinhas, estes tentaram de tudo para se libertarem, mas quanto mais se mexiam e mais tentavam arranhar ou picar as mãos dos homens, mais apertados eram. Os bichos fazem um grande barulho.
- Onde estamos?
- Este não é o nosso mundo.
- Claro que não.
- Estamos presos.
        Começam todos a chilrear nervosos.
- Silêncio! – Grita um homem grosso
        Fecham a grande gaiola, e os pássaros olham uns para os outros, tristes.
- Malditos.
- Isto não vai ficar assim.
- Eles que esperam.
- O que é que vão fazer connosco?
- Não sei. Mas isto não é bom.
- Pois não! – Dizem todos
- Eu quero sair daqui. – Grita um
- Eu também! – Dizem todos
        Faz-se novo silêncio
- Estamos todos juntos. – Comenta um
- Que grande vantagem! – Responde outro
- Sim, pode muito bem ser uma vantagem se pensarmos todos juntos, e vamos sair todos juntos daqui.
- Só nos teus sonhos…
- Como?
- Ainda não sei como, mas sei que vamos sair. – Garante
        Um homem vai levar-lhes comida e bebida, e todos metem os bicos e as garras entre as malhas das grades, arranham e picam as mãos deles. Ele grita e sai a correr. Os pássaros comem e bebem.
- Não gosto nada disto!
- Nem eu!
- Mas temos de comer e beber, para ter força e pensar numa maneira de sairmos daqui.
- Sim!
        Depois do papo cheio, ficam calados, quietos e pensativos. Aproxima-se uma matilha de lobos.
- Lobos! – Dizem os pássaros
- Só nos faltava esta.
- O que é que nos vão fazer?
- Também estão feitos com eles?
- Calma…vamos tentar ser amigos deles. – Sugere um pássaro
- Estás louco? – Perguntam todos
- Isso é impossível.
- Vamos ser amigos de quem anda sempre a tentar comer-nos? 
- Vamos agora ser amigos…? Daqueles…? Nem pensar.
- Sim, é claro que vamos ser amigos deles. Qual é o problema? Pensem…esqueçam a parte da caça…eles podem muito bem ser a nossa salvação!
- Salvação? – Perguntam todos
- Claro. Estão lá fora!
- Pois!
- E também não adoram propriamente os homens…
- A não ser que tenham sido mandados por eles.
- Para dar cabo de nós!
- Vamos ter esperança.
- Eles já nos devem estar a imaginar no espeto ou no grelhador.
- Estás mesmo muito nervoso.
- Calem-se um bocadinho…
        Os lobos entram na gaiola grande a cheirar tudo, olham para os pássaros.
- Tantos pássaros aqui! – Comenta um lobo
- Estes são mesmo loucos. – Diz outro lobo
- Quem? Os pássaros ou o homem? – Pergunta uma loba
- Os homens, é claro!
- Primeiro a nós…agora eles… - Diz outra loba
- E quantos já não passaram por aqui! – Diz outra loba
- Felinos, borboletas, insetos, répteis… - Lembra outra loba
- Felizmente estávamos por perto. – Diz um lobo orgulhoso
        Os pássaros engolem em seco de medo e preocupação. O pássaro quebra o gelo:
- Bom dia!
- Bom dia! – Respondem todos os lobos
- Para vocês não deve estar bom…aí metidos! – Diz uma loba
- É verdade! – Dizem pássaros e lobos
- Fomos apanhados numa armadilha! – Conta outro pássaro
- Nós também! – Dizem os lobos
- Também? – Perguntam os pássaros
- Sim.
- A nós puseram-nos pedaços de carne espalhados pela floresta, apetitosos, atraentes, suculentos…e apanharam-nos.
- A nós puseram uma cerejeira, com lindas cerejas vermelhas, mas era tudo falso! – Comenta o pássaro
- A maldade destes monstros não tem limites. – Diz outro lobo
- E depois, como é que conseguiram sair?
- Unimos as nossas forças, em pensamento e pedimos ajuda aos nossos, e eles vieram ter connosco. Atacaram esses miseráveis, malditos e abriram-nos as gaiolas. – Conta o lobo
- Mas vocês não vão precisar de fazer isso porque estamos nós aqui! – Diz outro lobo
- Vamos tirar-vos daí. – Garante outro lobo
- Já sabiam que estávamos aqui? – Pergunta um pássaro
- Sabíamos… - Respondem os lobos
- Sentimos as vibrações dos vossos pensamentos, e do perigo! – Diz uma loba
- Boa! E o que querem em troca? – Pergunta um pássaro
- Nada! – Respondem os lobos
- Queremos a vossa liberdade! Já estivemos aí, sabemos como é horrível… - Diz outro lobo
- Para agradecer aos nossos prometemos tirar daqui todos os animais que cá viessem parar. – Conta outra loba
- Há muita maldade, mas também ainda restam alguns corações bons. – Diz um pássaro emocionado
- Claro que sim! – Dizem os lobos
- Pensaram que vos íamos comer não? – Pergunta um lobo
- Sim. – Respondem todos os pássaros
- Não! Fiquem descansados! – Dizem os lobos
- Óh! Que lindo… - Dizem os pássaros
- Eu disse que íamos sair daqui. – Relembra o pássaro
- Não vamos saber como vos agradecer… - Diz outro pássaro
- Não se preocupem. – Dizem os lobos
        E cada lobo atira-se a uma gaiola, com as patas ou a boca, rodam as chaves, e as portas abrem. Os pássaros saem e também ajudam os lobos a abrir as outras. Os homens aparecem, os lobos com os dentes bem aguçados à mostra, a rosnar e a com as garras das patas bem esticadas encurralam os homens e estes como não têm por onde fugir, cheios de medo, metem-se nas gaiolas e todos os animais fecham as gaiolas com eles lá dentro. Eles gritam revoltados, nervosos, abanam as grades.
        Os lobos e os pássaros apreciam deliciados, às gargalhadas.
- Mas que espécie tão estranha…! – Comenta um lobo a rir
- Desgraçados! – Gritam os homens
- Vamos acabar convosco… - Grita um homem
- Não posso acreditar nisto…se eu vos apanho, desfaço-vos! – Diz outro homem
- Tirem-nos daqui… - Diz outro homem
- Vão para o forno. – Ameaça outro homem
        Todos os lobos riem e os pássaros também.
- Ouviram alguma coisa…? – Pergunta um lobo a gozar
- Talvez…uma varejeira… será? – Responde outro lobo a gozar
- Sim…
- Que medo…! – Diz outro lobo a rir
- É por isso que me cheira mal. – Diz outro lobo a rir
        Todos desatam às gargalhadas. 
- Esta espécie custará muito dinheiro? – Pergunta outro lobo irónico
- Acho que nem para um casaco serviam… - Diz uma loba
- São tão feios…! – Comenta outra loba a rir
- Isso não vale nem um cêntimo! – Diz outra loba
- Que raça tão fraca. – Comenta outro lobo
- Mas que bem que vocês ficam aí… - Goza outra loba
- Realmente… - Dizem todos os lobos e pássaros
- Nem para exposição vocês servem! – Diz outra loba
- Tirem-nos daqui! – Grita um homem grosso
- Descansem…vão para uma gaiola ainda maior… - Goza outro lobo
- É. Vão ver como é bom estar preso… - Diz outro lobo a gozar
- Abram isto, bichos malditos… - Gritam todos os homens
- Óh…que pena… - Dizem todos a gozar
- Nós até vos tirávamos daí, mas…infelizmente não sabemos abrir as gaiolas. – Diz outro lobo
- Algum de vocês sabe? – Pergunta uma loba a gozar
- Hum…não! – Respondem todos
- Mas que chatice… somos animais… - Comenta um pássaro
- É! Não podemos ter tudo. – Comenta outro pássaro
- É mesmo engraçado ver-vos aí metidos! – Goza uma loba
        Todos desatam às gargalhadas e viram costas. Os homens ficam fechados nas gaiolas aos gritos e a abanar as grades, até que as mulheres dão por falta deles e vão á procura. Os animais seguem felizes e divertidos para a floresta.
Pássaros e lobos tornam-se grandes amigos uns dos outros e passaram a trabalhar juntos, na salvação de outros animais que eram apanhados nas armadilhas dos desgraçados, e não foram poucas vezes. Eles não tinham sossego, mas os bichos conseguiam sempre voltar à liberdade. 
A gaiola era habitada por muitas espécies, mas desde que os lobos e os pássaros se uniram, não ficavam lá muito tempo. A maldade dos homens e as ideias fixas não tinham limite, mas a força e a união dos bichos que lutavam pelo mesmo objetivo também não!
O homem também deveria ser assim…não era? Unir-se pelo bem, pela paz… e lutar em conjunto contra o mal, sem fazer o mal.

FIM
Lálá
(2/Maio/2015)


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