Número total de visualizações de páginas

sexta-feira, 9 de março de 2012

A lição do domador

Era uma vez um circo, cheio de figuras que toda a gente conhece: palhacinhos, bailarinas, trapezistas, animais amestrados, e muitos outros. De entre os palhacinhos trapezistas. Há um que é muito medroso, e todos o gozam por isso.
Certo dia, num ensaio, todos os trapezistas que sobem às cordas desafiaram o palhacinho medroso a subir e a andar nas cordas e baloiços suspensos. Eles desafiaram, mas o palhacinho interpretou isso como uma provocação. Farto de ser gozado e apesar do seu medo, o palhacinho subiu as escadas para provar que era capaz.
Começaram todos a gozar com ele, mas os amigos respondem às provocações para defender o palhacinho:
T1 – Olhem, olhem…áh, áh, áh…
P.M. (nervoso) – Ai…que medo…! Ainda por cima eles a rirem-se…não vou conseguir…!
P1 – Onde é que está a piada…?
T2 – Áh, áh, áh…vai – se esborrachar todo…!
P.M. (nervoso) – O pior é que eu acho que vou mesmo esborrachar-me todo!
P2 – Calem-se, se não daqui a pouco quem vos esborracha somos nós!
P.M. – Boa…obrigado amigos…
TRAPEZISTAS (gargalhadas) – Uuiii…que medo…! Áh, áh, áh…!
P3 – Vai…força…!
P4 – Isso não cai.  
T3 – Áh, áh, áh…já está todo cagado! 
T4 – Áh, áh, áh…até me cheira mal!
P5 – Calem-se estúpidos…!
T5 – Áh, áh, áh…parece uma vara verde!
P6 – Daqui a pouco vocês é que levam com uma vara…palermas.
P1 – Atira-te…
P2 – Podes confiar em nós…vai!
P3 – Tu és capaz!
P.M. (nervoso, com medo) – Ai…ai, ai, ai…eu não sou capaz…! Isto é tão alto…
P4 – Não olhes para baixo…! Olha para a frente.
T1 – Olhem, olhem…áh, áh, áh…não sai dali nem amanhã…
T2 – Precisas de um empurrãozinho óh cromo…?
T3 – Áh, áh, áh…
P5 – Vocês vão ver o empurrãozinho…onde vão parar…!
P6 – Avança amigo…tens a rede por baixo…!
P6 – Vai rapaz…!
P1 – Cala estes abortos…
P.M. (grita) – Não consigo!
TRAPEZISTAS (a rir) – Ááááhhh…
T1 (a rir) – Que novidade…
T2 (a rir) – Só atingiste agora…?!
T3 (a rir) – Além de cagarolas é burro…coitado…
P.M (nervoso) – Estúpidos.
PALHAÇOS (gritam) – Claro que consegues!
P.M. – Venham também cá para cima!
         Os palhaços sobem para as escadas, e estas abanam. O palhacinho grita assustado:
P.M. – Aaaaaahh…isto está a tremer tanto…!
P4 – Claro que está a tremer, nós estamos a subir...mas não tenhas medo, isto não cai.
P.M – Aaaaaiiii….que isto vai-se desprender e vamos todos parar ao chão…!
PALHAÇOS – Não vai nada!
P6 – Avança.
P2 – Vai, nós estamos contigo.
T2 – Olhem…vai ser ainda mais giro agora…
T4 (a rir) – Pois…agora vamos ver uma série deles a esborrachar-se…! Que fixe…
T3 (a rir) – Já estou mesmo a ver…vai ser como tordos a cair…pa, pa, pa…
(todos riem)
         O palhacinho medroso, muito assustado e nervoso atira-se e cai na rede aos gritos e diz:
P.M. – Gosto muito de vocês, amigos…gostei muito de vos conhecer…! Ááááááhhhh…
Os palhacinhos ficam assustados, gritam com ele, preocupados, mas no fim olham para o amigo e batem-lhe palmas a sorrir, e elogiam o amigo:
PALHAÇOS (sorriem) – Boa!
P1 – Vês como conseguiste?!
P2 – Nós dissemos que podias avançar.
P3 – Sim, e também dissemos que estávamos contigo!
P4 – Muito bem, provaste àqueles totós que és capaz.
P.M. – Ai, que vergonha…!
Os outros trapezistas desatam a rir e gozam:
T1 – Que cromo…!
T2 – Que jeitinho…
T3 (a rir) – Parecia um mariquinhas…
T4 – Olhem se saltássemos como ele! Que vergonha.
T5 – Despediam-nos logo.
T6 – Sai daí óh troglodita…já que não sabes saltar, sai daí e deixa-nos trabalhar.
P1 – Calem-se carrapatos…ogres…sapos ranhosos…
P2 – Vamos fazer queixa de vocês…
TRAPEZISTAS – Áh, áh, áh…
T1 – Que medo…!
P3 – Vocês também só sabem fazer isto…que limitação. Nós e o nosso amigo sabemos muitas mais coisas que vocês.
TRAPEZISTAS (a rir) – Áh, áh, áh…!
T2 – Que grande vantagem saber mais coisas…nós também sabemos.
P6 – Sabem muita estupidez, agora coisas de jeito…e boas…não sabem!  
T3 – Não sei como te contrataram…não tens jeito para nada.
PALHAÇOS (gritam) – Calem-se parvalhões! 
P5 – Alguma vez se viram ao espelho…óh ridículos…?
TRAPEZISTAS – Sim, muitas vezes…
T4 – Porquê?
P5 – Não parece…não valem nada.
P4 – Vão ter o que merecem, e não tarda muito.
T6 (a rir) – Olha os franganotes a ameaçar…
TRAPEZISTAS (a rir) – Áh, áh, áh…
T2 – Alguém ficou com medo?
TRAPEZISTAS (a rir) – Uuuuuuiiii….muito!
T5 – Aquele idiotinha a saltar até podia ser uma inovação aqui no circo…!
TRAPEZISTAS (a rir) – Sim, pois era…
T2 – Bem pensado!
T3 – Toda a gente se ria.
P2 – Acham que toda a gente é cabeça vazia como vocês…?
P6 – Coitados, acham-se o máximo!
P4 – Fiquem sabendo que é a variedade do circo que lhe dá piada!
P5 – Realmente…já viram se fizessem todos o mesmo…que coisa feia…!
T4 – Que monotonia…se fossemos todos palhaços…
T1 – Era uma concorrência muito directa…
T6 – Pois…ninguém reparava em nós…!
P1 – Vocês já são uns palhaços idiotas! Nem precisam de se mascarar…!
         Envolvem-se todos numa grande discussão, aos gritos, ao mesmo tempo uns contra os outros, há alguns encontrões, e puxões de cabelos, umas sapatadas, até que chega o domador de leões, assobia, e todos se calam.
D – O que é isto?
TODOS – O quê?
D – Estes gritos todos!
P.M. – Estes imbecis estavam a gozar-me, e agora estavam metidos a bons…!
P2 – Há gente estúpida que se aproveita da bondade dos outros para que reparem nelas…como estes cabeças de vento.
D – Sim, infelizmente tens toda a razão. Mas…a gozar de quê?
P.M. – Por eu ter medo de subir às cordas e aos baloiços…eu subi…e gozaram-me por eu estar a tremer…começaram a mandar piadinhas e a insultar-me, para me enervar e para que eu não saltasse.
T1 (a rir) – Subiu, mas parecia uma vara verde, atirou-se aos gritos…! Caiu na rede. Não foi capaz…! Coitado…
TRAPEZISTAS – Daaahhh…
T2 – Nem sei como é que os contrataram…!
D – Olhem só os corajosos…! E vocês não têm medo de nada, querem ver?
TRAPEZISTAS – Não.
D – Naaaaa…. Quem fala nisso…! Nem dos meus bebés…!?
TRAPEZISTAS (a tremer, disfarçam com o riso) – Naaaaa… (riem nervosos) nem desses!
T2 – E logo desses…felpudos…dentarrudos…meigos! Naaaaa…!
D – Claro…eu acredito mesmo!
         Ele assobia e aparece um leão no palco. Os trapezistas desatam todos a correr assustados, até se empurram a subir as escadas e atiram-se para a rede aos gritos. Os palhaços riem, e o domador acaricia o leão a rir.
D – Com que então…não tem medo…
TRAPEZISTAS – Naaaaa… (a tremer)
D (a rir) – De nada…!
TRAPEZISTAS (a tremer agarrados uns aos outros) – De nada…!
 D (a rir) – Claro que não tem medo de nada…! Foi por isso que desataram a fugir por aí acima…e…não saem da rede! (p.c) E é por isso que estavam a gozar o palhacinho…por ele ter medo das alturas…!
TRAPEZISTAS – Pois… (nervosos) Ahhh…
T1 – É que…as alturas não metem medo a ninguém…os amigos dele também tem medo.
D – E vocês?! Não tem medo de alturas, mas têm medo por exemplo dos meus bebés…certo?!
TRAPEZISTAS (nervosos, a rir) – Naaaaa…!
D (a rir) – E se…agora…eu vos obrigasse a brincar com os meus bebés…e vos gozasse…como vocês estavam a fazer com o palhacinho?
T2 – Eras muito mauzinho…!
T3 (a rir, nervoso) – Mas também…não eras capaz de fazer isso com os teus amiguinhos pois não…?
D – Eu…era mauzinho…? (ri) Claro que fazia isso com os meus…amiguinhos… (ri) Naaa…eu estava só a desafiar-vos…já que são tão corajosos…
T4 – Nós… (a rir) Só estávamos a…a…tentar que o palhaço perdesse o medo das alturas…! Não era meninos…?
TRAPEZISTAS – Aaaa…ss…sim…, sim, claro…
T6 – Ele é nosso amigo…nós…preocupamo-nos com ele…!
PALHAÇOS – Mentirosos!
P.M. – Cínicos…falsos…hipócritas…queriam usar o meu medo para um novo numero de circo…para toda a gente se rir de mim…e gozar… para divertir quem via.
PALHAÇOS – Pois era.
D – Pois…! Tão queridos…! Tão bonzinhos que vocês são não é…?!
TRAPEZISTAS (a rir nervosos) – Sim…somos.
D – Pois…! Até fico emocionado com a vossa bondade! (p.c) Ora…subam outra vez para as escadas! Eu rio-me cá de baixo! Ou ponho-vos a brincar com os meus bebés…?! Escolham…!
TRAPAZISTAS – Então...
T1 – Nem uma coisa…nem outra…!
D – Porquê?
T2 – Porque tu vais gozar-nos!
D – Eu…?! Gozar-vos…? Naaa…nem sei o que é isso!
T3 – Vá lá…arruma lá esse teu…bebé…
D (irónico) – Mas…coitadinho…estão a mandá-lo embora…?! (p.c) Ele vai ficar muito triste e…muito mau…!
         Os trapezistas abraçam-se e gritam a tremer na rede.
T4 – Por favor, arruma para lá esse teu monstro para sairmos da rede!
D – Então…?! Onde está a vossa coragem?! Saiam à vontade…não têm medo deles…eles também não vos vão fazer mal…! (p.c) Já viram se fossemos todos iguais…?! Não havia circo pois não?
TRAPEZISTAS – Não.
D – Então, porque é que gozam com quem é diferente…?!
         Os trapezistas não respondem, e o domador faz um aviso muito sério e zangado:
D – Oiçam bem o que vos vou dizer… (p.c) Só vou falar uma vez…! (p.c) somos todos diferentes…uns gostam de umas coisas…outros não…uns gostam doutras coisas…outros doutras…felizmente somos todos diferentes…até fisicamente! (p.c) A única coisa em que todos somos iguais é que somos pessoas…seres humanos…uns tem jeito para umas coisas, outros para outras e é isso que faz a beleza e a magia do circo! (p.c) Por isto tudo, temos que nos respeitar uns aos outros…todos temos que aceitar que somos diferentes, e ainda bem que somos! Ninguém tem que ser igual a vocês, nem a mim…mas todos têm que ser acolhidos, bem aceites e integrados na família do circo! (p.c) Já andam a gozar com este palhacinho há uns tempos…eu sei…mas já chega…! (p.c) Nem deviam ter começado…já que insistem… (p.c) Se voltam a gozar com quem quer que seja…eu…faço-vos uma que nem sabem onde vão parar…passam a ser a nova atracção do circo… (p.c) ponho-vos a fazer habilidades sabem onde…?! (p.c) Em cima dos meus bebés…ou na boca deles…de preferência quando eles estiverem esfomeados! (p.c) Entendido…?!
         Os trapezistas engolem em seco, assustados, a tremer…
T1 – Ai…não nos faças isso!
D – Peçam desculpa ao palhacinho.
TRAPEZISTAS (cheios de medo) – Desculpa!
D – Não ouvi!
TRAPEZISTAS – Desculpa…
D – Eu quero que digam isso aqui em baixo, à beira dele…de joelhos…
T4 (nervoso) – Ai, ai, ai, ai…já estás a abusar!
D – Atreves-te a falar assim comigo…?! (p.c) Vais ser o primeiro a brincar com os meus bebés…!
T3 – Mas estás-te a passar ou quê?!
D (zangado) – O quê? (pega no chicote e bate com ele no chão zangado, com força). Os dois…já aqui! (p.c) Rápido! (p.c) Aliás…todos aqui! (p.c) Seus mal-educados…eu sou da vossa família do circo…sou vosso amigo…gosto de vocês…mas não vos admito que passem dos limites…muito menos que faltem ao respeito, a mim, ou aos outros…! (p.c) Já…aqui!
T6 – Tira essa coisa daí, e nós descemos!
         Bate outra vez com o chicote no chão, o leão ruge, eles encolhem-se e desatam a fugir, o domador agarra-os, faz sinal ao leão para sair. O leão sai, e eles tremem como varas verdes, nervosos e muito assustados. O domador grita-lhes:
D – De joelhos, já…seus selvagens…macacos vádios…! (p.c) se não…o chicote vai cair nos vossos rabos…!
         Eles ajoelham-se, a tremer, cheios de medo, e pedem desculpa.
TRAPEZISTAS – Desculpa palhacinho!
T1 – Ai, que humilhação…
T2 – Nunca pensei que ia passar por isto…!
D – Coitadinhos…estou cheio de pena da vossa humilhação…seus ridículos… (p.c) E a mim…?!
T6 – Tu estás a ser muito mau!
         O domador bate outra vez com o chicote no chão, eles encolhem-se e tremem, ele grita-lhes:
D (zangado) – Lá porque andam nas alturas acham que já são superiores aos outros…?! (p.c) Não faltava mais nada…! Vamos…peçam desculpa… (p.c) Que falta de respeito…ai, os pimpolhos a levantarem as cristas… (p.c) está bonito! (p.c) Comigo não!
TRAPEZISTAS – Ai…desculpa!
D – Ai de vocês que façam outra…ai de vocês que eu saiba que andam a gozar com qualquer um de nós…da nossa família do circo, seus galos depenados… (p.c) vão para o vosso trabalho…ensaiem…e nem um pio! Ponham-se a andar!
         Os trapezistas desatam a correr, a guinchar e a tremer e vão para a sua zona de treino.
T1 – Ai, pensei que era o meu fim!
TRAPEZISTAS – Eu também.
T2 – Aquele desgraçado estragou tudo.
T3 – Agora não podemos fazer mais nada…
T4 – Áh pois não…ele vai andar em cima de nós!
TRAPEZISTAS – Pois…
T5 – Que pouca sorte a nossa!
T6 – Estava a ser tão divertido…!
TRAPEZISTAS – Pois estava!
         Enquanto estes falam uns com os outros, os palhacinhos falam divertidos com o domador.
D (a rir) – Acho e espero que aqueles tenham aprendido a lição!
PALHACINHOS – Acho que sim!
P.M. – Eu já não podia ouvi-los, sempre a gozar comigo…
D – Viste como eles ficaram cheios de medo…armam-se em fortes valentes, muito corajosos…mas no fundo são uns idiotas…debaixo daquela máscara de fortes, estão uns jovens fracos que gostam de se armar para repararem neles, e aproveitam-se dos mais educados, dos mais sensíveis, dos mais tímidos…
P.M. – Eu disse que eles ainda iam engolir um sapo. Apeteceu-me muitas vezes partir-lhes a cara…sempre que me gozaram…mas depois, acho que também tinha um bocado de medo deles…por isso nunca lhes bati….
D – Não te preocupes com o que eles dizem! Falam com dor de cotovelo! Cada um tem o seu valor! (p.c) Bem…vamos ao trabalho…que a seguir…há espectáculo.
P.M – Muito obrigado.
D (sorri) – Ora, não tens que agradecer…eu vou andar em cima deles, e eles não vão voltar a gozar contigo, prometo-te! (p.c) Até já me podias ter dito antes que eles andavam a armar-se em garanhões… (p.c) Qualquer coisa que precises de mim daqui para a frente, diz-me!
P.M. – Obrigado.
D – Até já…
PALHAÇOS (sorriem) – Até já.
P.M. (sorridente) – Obrigado amigos!
         Abraçam-se todos, sorriem, cada grupo ensaia os seus números, divertidos e à noite têm um espectáculo. A partir desse dia, os malandrecos passaram a respeitar o nosso palhacinho e até o apreciavam. A partir deste dia, a família do circo tornou-se mais unida e mais feliz.
         Grande lição que o domador deu aos fanfarrões maliciosos, que chatearam e gozaram com o humilde palhacinho medroso.

FIM!
Lálá
(8/Dezembro/2011)




Sem comentários:

Enviar um comentário

Muito obrigada pela visita, e leitura! Voltem sempre, e votem na (s) vossa (s) história (s) preferida (s). Boas leituras