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quinta-feira, 8 de março de 2012

A boneca Luisinha e os seus novos amigos

A boneca Luisinha e os seus novos amigos marinhos

Desenhada por Lara Rocha 

Personagens:
Narradora
1 Boneca
1 Estrela-do-mar
1 Caranguejo
2 Algas
Mãe
Filha

NARRADORA - Era uma vez uma linda boneca que foi deixada na praia pela mãe de uma adolescente que vivia numa vivenda pequenina em cima da areia. 
    A filha do casal deixou de ser criança, e a mãe resolveu arrumar o quarto dela, quando ela não estava em casa, tirando todos os bonecos que ela lá tinha, incluindo essa boneca de infância que ela tanto adorava. 
    A menina adorava essa boneca, mas a sua mãe não, porque sempre que olhava para ela lembrava-se do ex companheiro, pai da Adolescente. A mãe jurou a si mesma que se havia de livrar dessa boneca. 
    É claro que a menina não permitia que a mãe retirasse a sua Luisinha…a boneca. Muitos dos bonecos foram para o sótão da casa, mas Luisinha não teve sorte. 
    O quarto da menina tornou-se triste, monótono, sem cor…acho que a menina não vai gostar. A mãe pegou na boneca Luisinha e levou-a para a praia, para que fosse levada pelo mar. 
    Aproximou-se das possecas, olhou em volta, e como não estava ninguém a ver, deitou a boneca na areia molhada. 
    Quis dar a entender que foi esquecida por alguma criança.  A mãe olha para a boneca friamente e diz:

MÃE– Finalmente a minha filha cresceu! Vou – me livrar de ti. De ti, e das recordações daquele maldito, imbecil. (p.c) A minha filha já não precisa de ti para nada! (p.c) Já nem se deve lembrar que exististe.
Dá uma gargalhada e suspira aliviada:
MÃE - Ááááhhh…que alívio…! Parece que me saiu uma tonelada de cima das costas…e da cabeça.
NARRADORA - Vira costas e sai. Não vos é familiar, alguém assim…? Má…? Má por tirar a boneca preferida, uma doce recordação da infância, inofensiva…e má…por estar a poluir a praia. 
    Sim, é essa mesma! O mar está muito calmo, o sol está luminoso e escaldante, e a boneca deitada na areia, ainda a dormir. 
  Um caranguejo que passeava preguiçoso, por ali, depois da sua ginástica matinal, distraído, pousa nos cabelos da boneca, pensando que era uma alga, e com as suas tenazes aperta os cabelos dela, e puxa-os, remexe-os. 
NARRADORA - A boneca acorda sobressaltada e dá um grito.
BONECA – Ááááhhh…Aaaaaiiii…!  
NARRADORA - O caranguejo assusta-se e corre para a areia, e ainda assustado, com a respiração ofegante grita:
CARANGUEJO – Ai…! Que susto! (Boneca e caranguejo olham-se fixamente) O que temos aqui…hummm (olha-a de cima a baixo) Uma nova espécie de sereia…ou…peixe…?
NARRADORA - A boneca olha para ele e os dois dialogam um com o outro:
BONECA – És um boneco?
CARANGUEJO – Um quê?
BONECA – Um boneco…como eu…!
CARANGUEJO – Olha não sei o que é isso…sei que sou um caranguejo. E tu?
BONECA – Eu sou uma boneca.
CARANGUEJO – Coitadinha…está a bater um bocadinho mal…diz coisas esquisitas.
BONECA – Desculpa?
CARANGUEJO – Ahh…vamos ao que interessa…desculpa se te magoei…não tinha reparado que estavas aqui. Vim da minha ginástica matinal…repousei acho que nos teus cabelos…pensei que era uma alga…eu estava a acamá-la.
BONECA – Não faz mal…eu estava a dormir…senti alguém a puxar-me os cabelos.
NARRADORA - Enquanto a boneca conversa com o caranguejo, num rochedo perto estão duas grandes algas (alga 1; alga 2) a espreitar: 
ALGA 1 – Olha…temos visitas!
ALGA 2 – Naaa…aquilo deve ser uma nova conquista do caranguejo.
ALGA 1 – Um bocado estranha…
ALGA 2 – Sim, não sei onde é que ele foi desencantar aquela espécie de…sei lá o quê…!
ALGA 1 – É uma sereia.
ALGA 2 – Que sereia? Não, não é! Isso sei que não é…não tem cauda de peixe! Tem pernas e braços como as meninas, meninos e crescidos que aqui passam.
ALGA 1 – Hum…pois é…tens razão…! É um ser muito estranho. Será uma nova espécie de peixe? Ou…um ser de outro planeta…ou…uma bruxa disfarçada…ou… (Alga 2 interrompe)
ALGA 2 – Cala-te…! Não estás a pensar no que estás a dizer, com certeza. Um peixe com pernas, braços e cabelo…Naaa…! Óh mulher, tu nem parece que vives no mar…não sabes como são os peixes?
ALGA 1 – Sei sim…mas não conheço todos os que vivem aqui…Tu conheces…todos?
ALGA 2 – Não, claro que não conheço todos.
ALGA 1 – Não é peixe, nem uma sereia…é uma criança…sim…é isso…se calhar foi abandonada aqui na praia…ou…os pais esqueceram-se dela aqui, ou perdeu-se…ai…coitados dos pais, devem estar num sofrimento sem fim…ou…estava num barco e caiu…ou…pior ainda…atiraram-na…! Aaaaaahh…coitada…que horror…
ALGA 2 – É melhor ficares por aqui…cruzes! Que trágica! Tens cada ideia…!
ALGA 1 – Estou só a pensar em pistas para a Investigação deste…abandono.
ALGA 2 – Mas quem é que te garante que ela foi abandonada…se calhar nenhuma dessas tuas hipóteses terríficas está certa.
  Uma Estrela-do-mar fica intrigada com tanto alvoroço das algas e quer saber o que se passa:
ESTRELA - DO - MAR – Meninas…o que é que se passa? Estão muito nervosas.
ALGA 1 – Olha para ali…aquela…que está ali a falar com o caranguejo…
   A estrela-do-mar não vê qualquer problema no que a Alga 1 acabou de dizer e comenta:
ESTRELA - DO - MAR – O que é que tem? Não pode estar a falar com ele?
ALGAS – Sim, pode!
   A estrela-do-mar ri-se e diz com ironia:
ESTRELA - DO -MAR - Estás cheia de ciúmes…ela não lhe vai comer nenhum pedaço por estar a falar com ele.
  A Alga 2 ri-se, mas a Alga 1 fica ofendida mas não assume e disfarça ao responder à Estrela-do-mar:
ALGA 1 – Humm…eu cheia de ciúmes…? Cruzes…! Nem sequer gosto dele…só como amigo…e se lhe comer um pedaço é problema dele. É porque deixou.
  A Alga 2 e a Estrela – do – Mar perceberam bem os ciúmes da amiga e respondem a rir:
ALGA 2 E ESTRELA-DO-MAR – Pois, pois…!
      A alga 1 responde a disfarçar o embaraço:
ALGA 1 – E é verdade…
     A alga 2 e a Estrela-do-mar respondem a rir:
ALGA 2 E ESTRELA-DO-MAR – Sim, sim…nós sabemos!
    A Estrela-do-mar ri e comenta:
ESTRELA - DO - MAR – Claro. É mesmo sedutor este caranguejola…
  A Alga 2 também partilha o seu incómodo pela situação. 
ALGA 1 – O que nos incomoda realmente não é ele estar a falar com ela, até porque ela não mexeu connosco…mas…não sabemos o que é que ela é…
ALGA 2 - Nem de onde veio…
ALGA 1 - Não sabemos se é uma espécie nova de peixe…
ALGA 2 – Uma sereia também não é…mas pode ser uma criança abandonada pelos pais, ou atirada de um barco…
   A Estrela – do – mar ri-se das ideias das amigas e comenta:
ESTRELA-DO.-MAR – Cruzes…estás a delirar…ou a ter um pesadelo…?!
     A Alga 2 ri-se 
ALGA 2 – Ainda tu não sabes da missa a metade…o que eu já ouvi desta maluca…!
    A Alga 1 mostra-se preocupada e tenta justificar os seus ciúmes de outra maneira:
ALGA 1 – O nosso amigo pode estar em perigo…!
ALGA 2 – Ele e nós…
  A Estrela-do-mar conhece muito bem o amigo caranguejo e para tranquilizar as amigas diz-lhes a rir:
ESTRELA - DO - MAR – Ele sabe defender-se muito bem, não se preocupem! E sabe defender-nos, se for preciso! (p.c) Tenho a certeza que é uma boneca deixada…esquecida por alguma criança.
   As algas suspiram de alívio, mas ainda não estão muito convencidas e dizem em coro:  
ALGAS – Ááááhhh…!
ALGA 1 – Uma das minhas pistas de investigação está correta.
     A Alga 2 ri-se e diz à Estrela-do-mar:  
ALGA 2 – Não ligues Estrela…
NARRADORA - A boneca levanta-se, meia atordoada, a esfregar os olhos, o caranguejo acompanha – a até ao rochedo onde estão as amigas. Ela está confusa e não sabe onde está…nunca esteve naquele sítio…pelo menos que se lembre…e questiona-se:
BONECA – Ai, ai…onde estou? (Olha a toda a volta) Este não é o sítio onde costumava estar…ah…tanta água…mas…o sítio onde eu costumava estar não tinha água, nem…ei…tanta luz…! E…este chão…não é igual ao chão onde eu estava…Óhhh… (triste) mas…onde é que eu estou…? (p.c) Como é que eu vim aqui parar…?! (p.c) Óhhh…onde está a minha amiga…?!
CARANGUEJO – Apresento-vos uma nova amiga. Aaahhh…como te chamas mesmo…
BONECA – Luisinha.
    Todas sorriem
TODAS – Olá, muito gosto…!
   A boneca está mais preocupada em saber onde está e volta a perguntar:
BONECA – Que sítio é este? 
CARANGUEJO – Já me perguntaste isso há bocado, e eu já te disse há bocado…!
    A Alga 1 segreda para a Alga 2:
ALGA 1 – Ela é muito estranha…devemos ter cuidado com ela…nem sabe que sítio é este!
CARANGUEJO – Estamos na praia.
     A boneca já ouviu falar nesse nome e responde:  
BONECA – Sim, é isso.
  A Estrela-do-mar quer saber mais sobre ela e pergunta:
ESTRELA - DO  - MAR – E tu, de onde vens?
ALGA 1 – Como é que vieste aqui ter?
NARRADORA - Como a boneca estava a dormir quando foi deixada na praia, não sabe como foi lá parar e responde:
BONECA – Eu não sei como vim aqui parar…!
ALGA 1 – Se não conhecias os sítios não devias ter saído de onde estavas. Fugiste de casa?
    Isso a boneca tem a certeza e responde com firmeza:
BONECA – Não.
  O Caranguejo não gostou deste comentário da amiga e responde:
CARANGUEJO – Alguinha…não estás a ser muito simpática…
ALGA 1 (zangada) – Cala-te, mal agradecido…só estou preocupada contigo…e connosco…! Arranjas-nos cada peça…
CARANGUEJO – Mas o que é que te deu…?
ESTRELA - DO - MAR – Luisinha, não ligues…estes dois adoram-se…só que não admitem.
    Todos riem. Alga 2 tenta ajudar a boneca a lembrar-se do sítio de onde vinha e pergunta:  
ALGA 2 – Mas como era o sítio onde estavas?
BONECA – Eu não fugi de casa…alguém me tirou de lá.
ALGA 1 – E não viste quem foi? 
BONECA – Acho que foi a mãe da minha amiga que disse que eu ia para o lixo.
     O Caranguejo fica chateado e responde:  
CARANGUEJO – Mas aqui não é o lixo! Aqui é o mar…a praia…
ESTRELA-DO-MAR – Sim, aqui infelizmente há lixo por todo o lado porque as pessoas não têm respeito por nós…mas não é o lixo! Nem a lixeira.
ALGA 1 – Mas como é que é possível a mãe da tua amiga dizer-te que vais para o lixo? Que maldade.
CARANGUEJO – Não devia gostar de ti!
BONECA (triste) – Mas eu gostava tanto delas…
     A Estrela-do-mar tenta aliviar a tristeza da boneca e sugere-lhe:  
ESTRELA-DO-MAR – Bem…senta-te aí no rochedo para secares e para te protegeres.
    A boneca pensa procurar um sítio para ficar e pede ajuda:  
BONECA – Conhecem algum sítio onde eu possa ficar abrigada?
CARANGUEJO – Não te preocupes, nós vamos encontrar.
ALGA 2 – Sozinha já não estás.
CARANGUEJO – Sim, nós estamos contigo.
ESTRELA-DO-MAR – Sim, somos teus amigos. Estamos e estaremos sempre por aqui.
BONECA – Obrigada! E vocês moram aqui…com o caranguejo? Neste sitio que chamam mar…e…praia…?  
TODOS – Sim.
ALGA 1 – Eu e ela somos algas! A nossa família está espalhada por toda a praia…
ESTRELA - DO- MAR – Eu também tenho família por aí…sou uma estrela – do – mar.
BONECA – O sítio onde eu vivia era em pedra, fechado, toneladas de pó e…silencioso…só quando os outros que lá estavam se lembravam de sair das caixas e faziam festas…era muito animado quando isso acontecia! (p.c) Gostam de viver aqui?
TODOS (sorriso aberto) – Sim.
CARANGUEJO – Também não conhecemos outros sítios. 
ALGA 1 – Aqui temos liberdade, paz, luz…
ALGA 2 – O teu sítio devia ser horrível…! Acho que não queria viver lá!
ESTRELA-DO-MAR – Eu também não! Só de te ouvir descrever, fiquei com falta de ar…!
BONECA – Eu também não achava o melhor sítio! Gostava mais quando estava no quarto da minha amiga…pequenina! Depois ela mandou-nos para aquele sítio! Cresceu!
     Todos ficam com pena da boneca
TODOS – Óhhh…coitadinha…!
CARANGUEJO – Desculpa dizer-te isto, mas ela não era uma verdadeira amiga!
ALGAS – Pois não!
ALGA 1 – Se ela fosse tua verdadeira amiga não te abandonava, nem te mandava para aquele sítio feio.
BONECA – Sim…também acho!
ALGA 1 - Os verdadeiros amigos, nós vemo-los aqui na praia…!
ALGA 2 - Pois é, as crianças vêm para a praia com as suas amigas bonecas…
BONECA - Eu considero que sempre fui uma boa amiga da minha amiga…! Pelo menos era o que ela dizia…andávamos sempre juntas, passamos momentos muito felizes…e quando ela estava triste procurava-me, abraçava-me, contava-me tudo…não percebo porque é que ela me abandonou do nada…sem qualquer justificação.
   O Caranguejo constrói uma frase muito bonita e diz com ar meditativo, profundo, poético:
CARANGUEJO - Pois é, querida…a amizade é uma flor delicada…se uma pétala fica murcha, as outras vão atrás. E tu és uma flor delicada…com certeza, depois da tua amiga te abandonar, deves ter ficado com uma pétala murcha…mas rega de novo a terra em que está plantada a tua flor, com a nossa amizade, e não permitas que as gostas de chuva que caem dos teus lindos olhos, acabem de murchar as outras todas…sorri e rega a tua flor com o chafariz da nossa amizade!
    Faz-se silêncio, ficam todas de boca aberta, batem palmas e comentam admiradíssimas:
ALGA 1 - Áh…estou parva…!
ALGA 2 - Este não é o Caranguejo que conhecemos pois não?!
ESTRELA - DO MAR - Que coisas tão bonitas que disseste…!
ALGA 1 - Tens é muita treta.
ALGA 2 - Onde e o que andaste a ler?
     O Caranguejo responde vaidoso e importante:
CARANGUEJO - Mau…já estás a querer saber demais…! Não li em lado algum…apenas…senti…esta boneca que está aqui é que me inspirou!
  A boneca ri-se. As Algas já conhecem a peça e abanam a cabeça. A Estrela-do-mar pergunta:
ESTRELA - DO - MAR – Então tu…és uma boneca…!
BONECA – Sim! Como é que sabes?
     A Estrela – do – mar sorri e recorda:  
ESTRELA-DO-MAR – Há muitas crianças que deixam aqui as amigas perdidas!
     A boneca muito surpresa pergunta:
BONECA – Ááááhhh…ai sim?
TODOS – Sim.
    A boneca identifica-se com a tristeza que as meninas sentirão…e as outras bonecas também, e pergunta:
BONECA – Mas, ninguém as vem buscar?
ESTRELA-DO-MAR – Às vezes ainda procuram, mas as bonecas escondem-se…porque algumas são maltratadas. 
BONECA – Eu…era bem tratada…quer dizer…mais ou menos…comparando com outras bonecas…coitadas! Eu até tinha pena delas! Algumas eram agarradas pelo pescoço…pelos cabelos…!
ALGA 1 – E...se a tua amiga pequena te vier buscar, tu vais com ela outra vez?
BONECA (triste) – A minha amiga já é grande…se calhar já nem se lembra de mim! Já não lhe deve interessar onde estou!
ALGA 2 - Não…se ela é tua amiga mesmo, nunca te esquece!
TODOS - É verdade!
  A Alga 1 mostra a sua felicidade de ser como é e responde:  
ALGA 1 – Fico feliz por ser uma alga…
ALGA 2 – Eu também!
ESTRELA-DO-MAR – Também gosto de ser como sou…!
BONECA – Não gostavam de ser humanos?
TODOS – Não!
CARANGUEJO – Eu não trocava esta vida por nada!
    A boneca olha em volta, sorri e comenta:
BONECA – Este sítio é mesmo bonito…! (p.c) Está decidido…não vou sair daqui…!
    Todos sorriem, batem palmas e respondem em coro felizes:
TODOS – Fixe!
CARANGUEJO -  É uma excelente escolha!
ESTRELA-DO-MAR – Queres vir connosco, conhecer melhor este espaço maravilhoso?
BONECA – Sim!
ALGA 1 – Então…acompanha-nos…vais adorar.
NARRADORA - O Caranguejo, as algas e a estrela – do – mar acompanham e guiam a boneca, andam pela praia alegremente, numas conversas muito animadas, mergulham, brincam uns com os outros, riem…entretanto, a adolescente que era amiga da boneca está em casa á procura dela e tem uma conversa com a mãe
ADOLESCENTE – Mãe…o que é que aconteceu aqui?
MÃE – Estive a arrumar o teu quarto! Já estás crescidinha, já não precisas de ter bonecas aqui…estão lá em cima!
ADOLESCENTE – Este quarto está…horrível… (zangada) quatro paredes brancas…uma cama…móveis…sem cor… (p.c) por alma de quem é que tiraste os bonecos…? (p.c) vou buscá-los outra vez lá cima.
MÃE – Nem te atrevas…deu-me um trabalhão arrumá-los…aqui só atrapalham.
ADOLESCENTE (zangada) - Arrumaste porque quiseste…eu não te pedi…para mim, o quarto estava muito bem como estava…!
MÃE – Parecia uma feira! O quarto é para repousar…não é para estar cheio de quinquilharia…eu não tinha nenhum no meu quarto! A tua avó tirou-mos todos quando fui adolescente!
ADOLESCENTE (zangada) - E ficaste feliz por isso?
MÃE – Tive de ficar…! Não me adiantava de nada ficar chateada. Eu sabia que era para meu bem.
ADOLESCENTE (zangada) - Sim, fez – te tão bem que te espetaste logo de cabeça com o meu pai…!
MÃE (zangada) - Cala-te…tu não sabes o que estás a dizer…
ADOLESCENTE (zangada) - Gostaste do teu quarto sem bonecos?
MÃE – Tive de gostar. Mesmo que não gostasse, tinha de fazer a vontade à tua avó.
ADOLESCENTE – Que coisa mais sem pés nem cabeça…que tristeza…onde é que já se viu…! (p.c) Os meus bonecos preferidos vão voltar para aqui!
MÃE – Então passas tu a arrumar o teu quarto. Ou chiqueiro…
ADOLESCENTE – Está bem! (quando a filha sobe, a mãe murmura) A esta hora já deve estar bem longe…na boca de um cão…ou nas mãos de uma criança…ou no fundo do mar…! (gargalhadas) procura, procura…não tens que fazer…
NARRADORA - A rapariga vai ao sótão e vasculha os caixotes, nervosa, tira alguns bonecos, abraça-os felizes, mas não encontra a sua boneca Luisinha. Volta para o quarto com os bonecos ao colo e pergunta à Mãe e voltam a discutir.
ADOLESCENTE – Mãe…onde está a Luisinha?
MÃE – Que Luisinha?
ADOLESCENTE – Aquela boneca linda que andava comigo para todo o lado.
MÃE – O mar levou-a…!
ADOLESCENTE (zangadíssima) - O quê? (p.c) Ainda ontem a vi aqui, e não a vi lá em cima!
MÃE (fria) - Deitei-a ao lixo!
ADOLESCENTE (zangadíssima) - O quê? (p.c) Mas o que é que te deu?! Deitas os meus brinquedos fora sem a minha autorização? Onde é que a deitaste fora?
MÃE (fria) - Na praia! Aqui em frente. E já devia ter feito à mais tempo!
ADOLESCENTE - Sim, pois era a tua vontade já há muito…bem sei…
MÃE - Só não o fiz antes porque tu eras muito pequena e disseste que ias atrás dela nem que te afogasses. É claro que uma mãe não gosta de ouvir isso de uma filha…
ADOLESCENTE (chateadíssima) - Na praia…? Mas que monstruosidade! Estás a poluir a praia…o que é que ela te fez para a deitares ao lixo?
MÃE (chateada e fria) - Não gosto dela! É do tempo do vagabundo, traidor do teu pai…traz-me más recordações!
ADOLESCENTE (chateada) - Então também tens que me deitar ao lixo, eu sou filha dele…não é a Luisinha. Nem foi a Luisinha que o mandou fazer o que fez…! (p.c) Se tu tivesses continuado com as tuas amigas bonecas já tinhas esquecido o que o meu pai fez de mau! (p.c) Eu…ainda nem acredito que arrumaste uma boneca de infância…! Acabaste de me matar…
MÃE (zangada e fria) - Não digas disparates…já não tens idade para ter bonecos.
ADOLESCENTE – Preferes que eu te dê netos verdadeiros é?
MÃE (embaraçada) - O quê…? Estás louca? Nem penses numa coisa dessas. Lá virá o tempo, agora não…quer dizer…se os fizeres agora assumes a responsabilidade. Pensas que é alguma brincadeira?
ADOLESCENTE – Então deixa os meus bonecos em paz…aqui no meu quarto. É por isso que estás carregada de rugas…!
MÃE (ofendida, passa as mãos na cara) - Estás a chamar-me velha?
ADOLESCENTE – É! É como tu estás…! Já te viste bem ao espelho? Estás horrível.  
MÃE – Que atrevimento. Aliás…se tenho assim tantas rugas foste tu que mas puseste…
ADOLESCENTE - Ai eu é que te pus as rugas…claro…olha…sempre deve ser melhor levar com rugas na cara do que levar com um par de cornos na testa…!
MÃE - Miserável… (dá-lhe uma sapatada e resmunga chateada) És ordinária como o teu pai. É ele que te ensina essas coisas…?
ADOLESCENTE (zangada) - Atrevimento tiveste tu…em deitar fora as minhas bonecas, e uma em especial.
MÃE - Vê lá como falas comigo…sou tua mãe…ainda estás em idade de levar uns bons sopapos.  
ADOLESCENTE (grita) - Bruxa.
MÃE (grita chateada) - Espera até seres mãe, que tu vais ver o que é bom…! Estafermo…sai mesmo ao vagabundo do pai…ai…o que é que eu fiz para merecer isto…?
NARRADORA - A Adolescente sai disparada a chorar e vai para a praia em frente a casa olha para as dunas, anda de um lado para o outro, não vê a boneca…a mãe aprecia da janela a rir e diz orgulhosa e fria:
MÃE – A esta hora já deve estar bem longe, no mar alto, na boca de um peixe, no bico de uma gaivota ou…com sorte…nos braços de uma criança. (gargalhadas e vai para a cozinha). 
NARRADORA - A Adolescente vai para a beira do mar muito triste. A boneca já voltou, para o mesmo sítio, está a falar com os amigos. A adolescente vê-a e grita com lágrimas nos olhos mas a sorrir:
ADOLESCENTE – Luisinha…
  Corre para a boneca, pega nela contentíssima, abraça-a, a sorrir, dá-lhe beijinhos e diz:
ADOLESCENTE - Luisinha…estás aqui…à minha espera…que bom!
    A Estrela-do-mar intrigada exclama:
ESTRELA - DO - MAR – Encontraste rápido uma nova amiga!
ALGA 1 – Se fores maltratada foge e anda para aqui.
   A boneca está feliz por ter visto de novo a sua amiga e diz às amigas a sorrir:
BONECA – Não! Esta é a minha amiga. A menina crescida de que vos falei.
    O Caranguejo sorri um pouco emocionado e diz:
CARANGUEJO – Boa! Eis um excelente exemplo do que é uma verdadeira amizade!
   A Alga 2 está feliz pela amiga, mas também tem pena que ela vá embora e pergunta:
ALGA 2 – Então…já vais embora…!
    A boneca informa os amigos da sua vontade de ficar:
BONECA – Óóóhhhh… mas…eu queria ficar aqui convosco!
  A Adolescente sente-se envergonhada pelo que a mãe fez à sua boneca e tenta pedir desculpa à boneca dizendo:
ADOLESCENTE (a sorrir) - Que bom que estás aqui…a minha mãe foi muito má comigo e contigo! Vou voltar a levar-te.
  Embora a boneca esteja feliz com o reencontro, ela sente-se a mais na casa da amiga, e ficou magoada com a mãe da menina. Ela diz:
BONECA – Mas eu não quero ir.
ADOLESCENTE – Gosto tanto de ti, Luisinha. Desculpa o que a minha mãe fez contigo.
   A boneca não consegue esquecer o que lhe fizeram, e não quer ir. Ela diz:
BONECA – Mas, eu não quero ir contigo! Tu vais voltar a meter-me naquele sítio horrível!
ADOLESCENTE – Vais ficar no meu quarto…não vais para o sótão!
   O Caranguejo apesar de ter ficado triste incentiva a boneca:
CARANGUEJO – Vai com ela!
BONECA – Estava aqui tão bem!
ALGA 2 – Nós também estávamos a gostar tanto de ti…! Óóóhhhh… que pena!
ADOLESCENTE (sorri) – Vamos…vou-te vestir, pentear-te, pôr-te a secar e ficas em cima da minha cama!
  A Estrela-do-mar repara que a Adolescente ainda gosta muito da boneca e diz:
ESTRELA - DO - MAR – Ela gosta mesmo de ti!
BONECA – Estou para ver se é mesmo assim. Se me puseres naquele sítio nojento…eu fujo! (p.c) Até breve, queridos! Obrigada, e venho visitar-vos…
   Todos estão com pena que a amiga vá embora, mas dizem a sorrir:
TODOS – Está bem…até breve! 
   A adolescente vai abraçada á boneca contente. 
ALGA 1 – Fico contente que ela tenha reencontrado a sua amiga!
ALGA 2 – Eu também. Menos lixo vem para o mar.
ALGA 1 – Afinal tinha uma ideia errada dela…
ESTRELA-DO-MAR – Espero que ela nos venha visitar em breve.
CARANGUEJO – Sim, ela vive aqui em frente…naquela casa! Bem pode vir aqui visitar-nos.
Quando a mãe vê a adolescente a entrar em casa com a boneca ao colo, nem quer acreditar e fica a ferver.
MÃE (furiosa, grita) - Maldição…!
     A Adolescente diz irónica:
ADOLESCENTE – Lamento…mas os teus planos de te livrar da minha amiga foram por água abaixo…ela estava à minha espera. Isto sim…é uma verdadeira amiga.
    A mãe fica possessa e grita furiosa:
MÃE – Maldita boneca! (p.c) Ainda vou acabar com ela um dia destes.
    A boneca não entende o porquê de tanta raiva que a mãe da rapariga lhe tem, e pensa para si mesma:
BONECA – Que raio de mulher…! Nunca lhe fiz mal, para que é que ela quer acabar comigo?
    A Adolescente defende a boneca e diz à mãe:
ADOLESCENTE – Antes de acabares com ela, vais ter de acabar comigo!
    A boneca chateada murmura:
BONECA – Não é preciso…fica com ela…eu salto pela janela!
   A mãe não aceita este gosto da filha pela boneca e critica-a ironicamente:
MÃE – Queres uma chupetinha…?! (chateada) Que tristeza…é preciso tanta coisa por causa de uma porcaria de uma boneca…com esta idade.
     A boneca pensa para si mesma:
BONECA – Está cheia de inveja de não ser como eu…! Linda…
   A adolescente põe a boneca à janela a secar, penteia-a e a boneca grita:
BONECA – Amigos…estou aqui…!
NARRADORA - Eles sorriem e acenam. Depois de seca, a adolescente veste a boneca e põe-na em cima da cama, trata-a com carinho. 
    Quando a menina não está em casa, a boneca sai pela janela e vai para a praia brincar alegremente com as algas, a Estrela – do – Mar e o Caranguejo.
   A adolescente também fica mais feliz por ter a boneca de volta e por ter o quarto mais colorido, mais bonito…a adolescente está no quarto, olha para as bonecas, pega na Luisinha ao colo, sorri e diz:
ADOLESCENTE – A infância é a fase mais bonita da nossa vida…e mesmo quando crescemos, essa fase deve estar presente seja através dos bonecos no nosso quarto seja através dos bonecos no nosso quarto seja de outra maneira…eles dão cor aos espaços e alegria ao nosso coração! (p.c) Mesmo em adultos, nunca se separem dos bonecos ou das boas coisas da infância…isso não deixa envelhecer…! Mesmo que apareçam as rugas na cara, o mais importante é que o vosso coração não as ganhe.
FIM
Lara Rocha 
(7/Abril/2011) 
                                                             

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