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quinta-feira, 15 de outubro de 2020

Afago na alma

        
                                       Foto de Lara Rocha 


        Era uma vez uma rapariga ainda jovem, solitária, que tinha ido viver para outra cidade, para trabalhar. No início não conhecia ninguém, passeava pelas ruas, às vezes parava, triste por estar mais longe dos seus pais e família, mas feliz porque trabalhava. 
        Ao fim da tarde, num desses passeios depois de um dia cheio de trabalho, a jovem foi para o parque da cidade, cheio de gente a correr, a praticar desporto, a ler, a desenhar, e a descansar. Ela caminhou lentamente e parou várias vezes para apreciar as árvores, tocar-lhes nos troncos carinhosamente, abraçá-las. 
        Sentiu todas as irregularidades dos troncos, viu cada cor das folhas, sorriu, apanhou uma folha de cada cor, e guardou-as para as pôr a secar. Apreciou os casais com filhos pequeninos e outros maiores, a simplicidade e a felicidade nos seus rostos, a leveza das folhas a dançar levemente com a brisa, sentiu o calor do sol, deliciou-se com o silêncio que parecia falar com ela, e ela entendia. 
        Ficou maravilhada com os espelhos de água, os vários reflexos e cores, ouviu os cães a ladrar, viu a alegria com que os animais corriam, saltavam, abanavam o rabo e ladravam, viu casais românticos, e pessoas mais velhas sentadas nos bancos. 
        Mesmo na cidade, aquele parque tinha muitas coisas bonitas para ver, tinha acabado de descobrir que a fazia sentir-se mais próxima da sua terra, na companhia da Natureza, e prometeu a si própria que voltaria sempre que pudesse. 
        Quando se preparava para sair do parque quase ao pôr do sol, lembrou-se que na sua terra, os pássaros voavam às dezenas e centenas e faziam um bailado. Era um espetáculo visto diariamente, que adorava e não perdia. Mas pensou que na cidade, por causa da poluição e ruido os pássaros não fariam isso. 
       Parou uns momentos a olhar para o céu, e que surpresa! Viu dezenas de pássaros que pareciam ainda um bocadinho distantes, a voar de um lado para o outro, formando ondas, setas e meios círculos, com uma leveza e harmonia tão bonita e especial, como ela já conhecia. 
        Ficaram todos a olhar para ela, que estava parada, com um sorriso de orelha a orelha, e os olhos colados ao céu, a acompanhar os movimentos de dança dos pássaros. Não sabiam o que é que ela estava a ver. 
Um jovem perguntou-lhe: 

- Estás bem? 

        Ela não respondeu, e parecia que estava noutro planeta. Aproximou-se um senhor e perguntou: 

- Menina... está tudo bem? 

        O jovem explica: 

- Eu já perguntei se estava tudo bem, mas ela não respondeu. Parece que está a dormir de olhos abertos. 

        O bando de pássaros aproxima-se, em movimentos ondulantes, a jovem suspira e diz: 

- Olhem que lindo, que coisa mais maravilhosa... o bailado dos pássaros! 

- O quê? - perguntam os dois 

        Ela responde, sem tirar os olhos dos pássaros: 

- O bailado dos pássaros! 

        O senhor insiste: 

- Menina, está mesmo bem? 

- Sim, estou ótima, deixem-se de perguntas e apreciem este momento. Olhem para aquele bando de pássaros, tão leves, tão elegantes, tão coordenados no voo, parece que estão a dançar, a ondular. Que delícia! 

        O jovem e o senhor olham para os pássaros, e quase sem dar por isso, em seguido estavam todos parados no parque a olhar para os pássaros, igualmente encantados. 

- Nunca vimos isto aqui! - comenta um jovem de um casal 

- Áh! Que bonito. - diz uma jovem 

- Uau! 

        Ela ouve grandes exclamações, e quando os pássaros desaparecem num telhado onde teriam os seus abrigos, a jovem aplaude, e todos seguem o seu exemplo. 

- Menina, obrigada por nos mostrar uma coisa tão bonita! - comenta uma senhora com alguma idade 

- Nunca tinham visto? - pergunta a jovem muito surpresa 

- Não! - respondem todos 

- Na minha cidade, vi muitas vezes, e aqui também deve acontecer mas nunca repararam! - diz a jovem 

- Se acontece, nunca reparamos! 

- Passam todos os dias a correr, só a olhar para a frente, e a grande velocidade, perdem o que há de mais bonito. É como na minha cidade, só alguns são capazes de ver esta magia! Olhem as cores do céu, que coisa mais encantadora! Nos próximos dias estejam mais atentos. - recorda a jovem 

- Que lindo! - suspira um senhor com alguma idade 

- Vou para casa, com este afago na minha alma! É o bailado dos pássaros. - diz a jovem com um grande sorriso 

- Eu também! - respondem todos 

- Até amanhã! - diz a jovem 

- Até amanhã, menina. - dizem todos 

        Cada um vai para a sua casa, com os olhos cheios de beleza, com a imagem daquele bailado, mais serenos, e sorridentes. No dia seguinte, mais ou menos à mesma hora, a jovem voltou ao parque, e percebeu que todos se juntaram a ela, para ver outra vez o bailado dos pássaros que se repetiu sempre bonito e especial, com palmas e sorrisos quando os pássaros recolheram. 
        O momento do bailado dos pássaros, naquele parque passou a ser um hábito, repetido por todos, apreciado em silêncio, do início até ao fim, e aplaudido. Parecia quase uma contemplação sagrada que todos respeitavam, paravam e seguiam os movimentos encantadores dos pássaros a dançar. 

                                                                FIM 
                                                            Lara Rocha 
                                                         15/Outubro/2020

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