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quinta-feira, 12 de novembro de 2020

Entre as trevas e a Luz

          foto de Lara Rocha 


          Era uma jovem bonita, alegre, sonhadora, que vivia num mundo de fantasia. Ela não gostava do mundo onde vivia, por isso refugiava-se na sua imaginação. Um mundo muito diferente do nosso e do dela, construído por ela, onde só havia o que ela gostava. 

        Ela era a rainha, todos lhe faziam as vontades, ninguém a chateava, ninguém a incomodava, toda a gente a elogiava e valorizava, e respeitava. Era tudo ao contrário do mundo real onde ela vivia. 

        As pessoas do seu mundo real achavam-na estranha, fugiam dela, pois sempre que se aproximavam dela, preocupados, ela transformava-se numa rapariga completamente diferente: fria, arrogante, cruel, indiferente. Era como se a rapariga se dividisse em duas. 

Um dia teve uma depressão profunda, grave, e ficou quase na pele e no osso. Numa noite, ouviu uma voz, de uma sombra negra, à sua beira, que a acusava:

- Olá...estás assim?

- Quem és tu? - pergunta a rapariga

- Tu sabes muito bem quem eu sou.

- Não sei, não. Nem te vejo!

- Sou eu.

- Quem?

- Aquele a quem não respondeste mais, de há uns tempos para cá. Alguém que gostava muito de ti.

- Sei lá quem é, ninguém gosta de mim.

- Como dói receber o teu silêncio.

- Qual silêncio?

- Como dói receber a tua indiferença!

- Qual indiferença?

- Aquele silêncio e aquela indiferença que me dás de há uns tempos para cá.

- Não sei do que estás a falar.

- Convém-te não saberes, mas eu sei que sabes! Como dói não ter respostas para o teu silêncio.

- Cala-te.

- Cala-te tu. Silêncio! Quero ouvir as palavras do teu silêncio.

- Quem és tu para me mandar calar? Já agora, não tens nada que ouvir o meu silêncio, o silêncio não fala.

- Fala sim! E de que maneira. Como fala.

- Tu deves estar louca…ou louco. És homem ou mulher?

- Sou…

- Quem?

- Ora, tu sabes muito bem quem.

- Não sei

- Quero ver cada palavras do teu silêncio.

- Como é que vais ver isso? Está escuro, e as palavras não se veem.

- As tuas com certeza veem-se.

- Quais?

- Aquelas que não disseste.

- Não sei de nada.

- A que sabe o teu silêncio?

- Sei lá, nunca provei tal coisa.

- Mas já o sentiste…!

- Não.

- Quero saborear e provocar, provar, sentir alguma coisa do teu silêncio no meu corpo.

- Estás-te a passar? Acho que estás a delirar.

- Eu? A delirar…? (gargalhadas)

- Não te podes rir mais baixo?

- Porquê?

- Pode aparecer aí alguém!

- E…?

- Vão pensar que estou a falar sozinha.

- Quero agarrar no teu silêncio!

- Mau… já vais aí?

- Aí, onde?

- Já lhe ouvi chamar muita coisa, mas silêncio…

- Que pornográfica.

(gargalhadas dos dois)

- Mente poluída…

- Isso era o que tu querias. Mas não me estava a referir a isso. Quero saber se é um silêncio quente, ou um silêncio gelado!

(gargalhadas)

- A conversa está a subir… é quente, com certeza, está aqui debaixo da roupa.

- Ai, valho-nos…! Eu estava a falar do silêncio que me mandas… porque é que és assim?

- Mudaste com uma rapidez… eu até estava a gostar da conversa!

- Mas eu estou a falar de coisas muito sérias. Será que o teu silêncio diz alguma coisa, ou muita coisa?

- Ah, voltou a aquecer…não sei, acho que o meu silêncio, se é assim que lhe chamas, não fala, eu é que posso dizer, com a minha boca, ou com o resto do corpo.

- Mostra-me o teu silêncio. Eu quero saber o que é que ele diz…

- Já?

- Sim.

Ela começa a tirar a roupa entusiasmada.

- Não quero ver tanto… (gargalhadas) eu quero saber o que é que ele diz...quero ouvir palavra por palavra, letra por letra…

- Sei lá se falo nesses momentos…

- Gostava de sentir o teu silêncio!

- Anda… começa tu.

- Ai, senhor… não é disso que estou a falar.

- Não estou a perceber nada. Queres ou não queres?

- És mesmo ignorante! O meu gostar de ti não é esse que tu pensas, é sincero, inocente, com o coração…

- Óh, estás envergonhado, é? (gargalhada) Vá lá, fica à vontade. Eu nem estou a ver-te, só vejo a tua sombra. Mostra-te lá, se queres ver o meu...silêncio!

- O meu gostar de ti não é um gostar de amor, ou de desejo!

- Não acredito. Só queres uma relação de ocasião é…? Ok…

- É um gostar de carinho, um gostar sensível, que nada tem de assustador.

- Podemos explorar outras formas, mais quentes. Eu estou aberta a novas possibilidades.

- Que insensível.

- Porquê?

- O teu silêncio tem rostos, nomes, palavras, sentimentos.

- Desde quando…? Nunca o vi, nem ouvi…

- Choca-me…

- Eu sou alguma galinha, ou pata para te chocar…? E tu és algum ovo…?

- Não percebi!

- Congela-me!

- Nunca fiz isso.

- O teu silêncio faz isso, em mim.

- O que é que ele tem para te fazer isso? Cheira mal…?

- Não! Ai, que coisa… eu estou a falar de sentimentos.

- Não sei do que estás a falar.

- O teu silêncio, esvazia-me, a ti satisfaz-te?

- Porquê? És homossexual? Está-se bem, não tenho nada contra!

- Irraaaa…que indiferença!

- Tu estás indiferente…?

- Não, tu! Eu vim falar contigo, saber porque é que deixaste de falar comigo?

- Não sei quem és, nem vejo a tua cara, não sei do que estás a falar.

- Sou aquele que gostava de ti.

- E agora não gostas?

- Não.

- Então não sei o que estás aqui a fazer.

- Vim à procura de respostas para a tua indiferença.

- E insistes nisso… não te posso ajudar.

Aparecem mais duas sombras que falam com ela:

- Oh, trouxeste mais duas amigas? Hummm...amor a três? Nunca experimentei, mas está bem! Se queres…

- Como tu mudaste! - comenta a sombra negra

- Olha como ele está a sofrer. - mostra outra sombra

- É por causa de não lhe responderes às mensagens. - acusa a outra

- Mas eu não sei quem é! Vocês sabem? Vieram com ele? - diz a rapariga

- Sim, viemos com ele, sabes quem somos, sim! - comenta a sombra

- Não sei.

- Transformaste-te no pior que podia haver. - acusa a sombra negra

- Ele adorava-te! - relembra a sombra

- Que grande desilusão! - diz a sombra negra

- Quem te magoou assim tanto?

- Tu!

- Porquê?

- Não percebes mesmo nada! A sombra negra desaparece, e quando olha para o lado e vê uma rapariga que está a olhar para ela com ar ameaçador.

- O que é que estás aqui a fazer? Também vieste para a farra é? Queres ver o meu silêncio?

- Credo! Chamas-lhe isso? Bem, sempre é melhor do que outros nomes mais badalhocos… (gargalhadas) Eu tenho um igual… se és dessas não tenho nada contra, mas não tenho que te satisfazer.

- Ainda agora estava aqui uma sombra a dizer que queria ver o meu silêncio, e ouvir, trouxe mais duas, agora desapareceram, e vens tu?

- Não sei de nada, não tenho nada a ver com esses dois.

- Então o que vens cá fazer?

- Não sei. Talvez o mesmo que tu!

- Como não sabes?

- E tu também não sabes, mas estamos aqui.

- Onde?

- Aqui!

- Onde?

- Não sabes onde, eu muito menos. Eu vim para aqui porque tu também vieste. Mas se não sabes onde é, eu também não sei.

- Estás a gozar comigo?

- Não!

- Estás louca?

- Estamos.

- Não pode ser…lá porque tu estás, não quer dizer que eu esteja.

- Pode, é… e quer dizer…! Qualquer um pode ficar louco…desta vez, ficamos nós.

- Mas que raio de conversa é esta?

- É uma conversa normal.

- Não acho nada normal.

- Estamos loucas!

- Tu deves estar.

- E tu também.

- Estás no meu quarto?

- Estou!

- Entraste por onde?

- Por onde? Pela porta é claro.

- Que porta?

- Ora…um quarto tem porta.

- Áh! Pois…está bem. Mas o que é que tu queres de mim?

- Quero mostrar-te um sítio.

- Onde?

- Verás.

- Mas eu não posso sair daqui, pois não?

- Podes.

Ela estala os dedos e as duas raparigas vão para um labirinto cheio de caminhos, árvores e sombras.

- Que raio de sítio é este?

- É o teu interior!

- O quê?

- Sim…a tua cabeça, o teu coração…é aqui que está tudo.

- Mas eu não quero estar aqui.

- Mas tens de estar! E é agora.

- Porquê?

- Porque é aqui que vais encontrar muitas respostas.

- Respostas?

- Sim! Qual é o espanto? Não queres saber porque estás ali naquele quarto, que não é o teu quarto?

- Quero!

- Anda.

- Mas o que é que tens a ver com isto?

- Sou uma parte de ti!

- Estás louca?

- Estamos loucas. Precisamos de dar este passeio por este sítio para ficarmos bem.

- Tu és muito estranha.

- Somos.

- Não estou a perceber nada.

- Anda comigo.

Dão a mão e vão por uma série de caminhos sem saída. A rapariga grita aflita:

- Isto não tem saída! Não quero estar aqui…estou a sufocar. Eu quero sair daqui.

- Tem saídas, temos de procurar.

- Eu não gosto deste sítio.

- Procura a saída.

A saída está bem perto, mas ela não a vê, e a outra rapariga desaparece.

- Onde estás, outra?

- Continua a procurá-la. – Diz a voz da rapariga que está escondida.

- Ajuda-me.

- Procura sozinha. Também não ajudaste ninguém que te pediu.

- Não…por favor, volta!

- Áh, áh…tu sempre disseste que eras capaz de fazer tudo sozinha! Que não precisavas de nós nem de ninguém. Safa-te agora! Tu vais encontrar.

- Mas eu preciso.

- Não quero saber. Procura. Tens de sair daí sozinha…

A rapariga procura muito aflita, anda de um lado para o outro, entra em cada caminho diferente do labirinto, grita, chora, corre. A outra ela ri-se escondida.

- Por favor ajuda-me. Estou muito nervosa. – Grita a rapariga

- Continua à procura…vais encontrar. Eu não posso ajudar-te.

- Que cobra, má, nojenta! – Grita

- Era mesmo isso que tu eras. Continua. – Diz a outra

    Ela procura desvairada por caminhos sem saída, escuros. Encontra outros caminhos escuros: um com fantasmas brancos, outro com monstros, outro com figuras aterradoras e horríveis, outro onde só ouve vozes e gargalhadas. 

        Noutro caminho, as vozes gritam com ela, acusam-na, insultam-na. Noutro, umas sombras não dizem nada, só apontam dedos e empurram-na. Noutro, as sombras gozam-na, puxam-lhe os cabelos, riem-se dela, gritam-lhe. A outra ela ri-se. No quarto, ela abre os olhos sobressaltada, muito agitada, e grita ofegante:

- Não! Eu quero sair. Eu não quero voltar àquele sítio.

- Mas vais voltar. – Diz a outra

- Onde estiveste?

- Perto.

- Porque é que não me ajudaste? Já conhecias aqueles caminhos?

- Já. E tu também.

- Eu não…se conhecesse antes, já sabia como sair dali. Porque é que não me levaste por outros caminhos?

- Tu é que escolheste esses!

- Como é que fui eu que escolhi? Eu não gostei, nem gosto daqueles caminhos. Estão cheios de coisas horríveis.

- Tu é que quiseste ir por eles! Tinhas muitos outros. Tu é que foste por eles, pela tua maneira de ser, porque te afastaste e afastaste a tua realidade. As pessoas que estavam à tua volta e que gostavam de ti, que sempre se preocuparam, tentaram sempre desviar-te desses caminhos, e levar-te por outros, mas tu não quiseste segui-los. Preferiste ficar no reinado onde tu eras a única rainha, onde todos estavam aos teus pés, e à mercê das tuas vontades.

- O quê?

- Sim. Eras arrogante, fria, distante, má, indiferente, nada à tua volta existia, nem ninguém. Só tu.

- Não pode ser.

- Pode! E foi mesmo isso. É por isso que agora estás aqui.

- Mas eu não quero isso!

- Tens de voltar ao labirinto.

- Não! Lá só tem figuras horríveis.

- Mas tens de as enfrentar…

- Não!

- Sim! Para saíres, tens de voltar.

      E a outra rapariga volta a levá-la para o labirinto. Ela volta a passar pelos menos caminhos, e por outros igualmente escuros. Um tem sombras que lhe estendem as mãos, e choram ajoelhadas. Um choro perturbador. Outras, gritam, outras ajoelham-se e contorcem-se. Entra noutro caminho que tem gelo quebradiço no chão, e parte à medida que ela passa rapidamente. Entra noutro onde vê uma série de portas. 

    Abre uma porta e só tem esqueletos, outra tem fumo, outra tem serras a trabalhar, outra tem pregos no chão, outra tem água, outra fogo, outra buracos no chão e na parede, outra com raios, outra com vento ciclónico, e outra com relâmpagos e redemoinhos. Ela não entra em nenhuma. Foge de todas.

      Vai dar a outro caminho escuro, e cheio de lama, onde acha que várias mãos a empurram e ela cai. Sai desse caminho com dificuldade, e muito assustada. Entra noutro caminho onde vê sombras que lhe apontam objetos cortantes, gritam e riem. 

        Ela foge desse e entra noutro, onde ouve o som de chicotes a bater no chão. Ela desata a correr, e entra numa porta cheia de vento que a suga. Dá um grito e um salto na cama. Abre os olhos muito aterrorizada.

- Gostaste do que viste?

- Não. Eu não volto lá! Não quero voltar lá! É um mundo horrível. Assustador. Cansativo. Estou esgotada!

- Era o mundo onde estávamos.

- O meu mundo não era assim.

- Era! Tanto era assim que agora estamos aqui. Tu é que só te vias a ti! Eras o centro de tudo. Nada do que estava à tua volta, interessava. Fizeste sofrer muita gente que tentou tirar-te desse mundo. Mas não quiseste sair dele.

- Eu não conheço aquela gente, nem aqueles caminhos. Nem quero conhecer, nem andar por lá outra vez.

- Para isso é que estamos aqui.

- Por favor…não me deixes voltar para lá!

- Agora achas feio.

- Claro. Não pode ser pior.

- Mas na altura achavas bonito.

- Na altura não era nada daquilo. Ninguém me fez mal, agora querem fazer-me mal. Parece 

que estão todas as personagens a vingar-se de mim.

- Claro. É mesmo isso!

- Posso pedir-lhes desculpa?

- Podes. Não sei se elas vão aceitar, mas podes tentar.

- Como é que eu faço isso?

- Volta ao labirinto.

- Óh não!

- Queres pedir desculpa, ou não?

- Quero mas naquele sítio…

- Eles só estão nesse sítio.

- Eles vão acabar comigo na mesma hora. Todos têm um ar assustador… mau…raivoso.

- Tenta, não sejas como eles.

        Ela volta ao labirinto, e chama todas as personagens que viveram no seu mundo. Elas aproximam-se silenciosamente e olham-na. Encontram-se num caminho escuro, mas com alguma luz.

- Por favor…não olhem assim para mim. Não me façam mal! Sei que estão muito magoadas e magoados comigo, ofendidos, e querem vingar-se…eu sei…compreendo-vos. Só agora é que estou a ter a noção disso! Por isso…até me sinto envergonhada. Não sei como pude chegar a este ponto.

            As sombras falam com ela num tom irónico:

Rainha…!

Como é bom ver-te aqui.

Desapareceste…

Estamos cheias de saudades tuas…rainha.

Muitas.

Vieste visitar-nos?

Ou vieste pedir-nos um favor…

Dar uma ordem…?

Castigar?

O que nos vais fazer mais?

Ou vieste pedir-nos que acabasses contigo?

- Pensamos que já tinham acabado contigo!

- Sofremos muito por tua causa.

- Chegamos ao nosso limite.

- Passaste todos os limites.

- Não mereces nada de bom.

- Claro que queremos vingar-nos.

- O que tu fizeste connosco não tem classificação.

- Foi muito mau.

- Nós é que não percebemos como fomos capazes de permitir tanto.

            A rapariga envergonhada responde:

- Têm toda a razão.

- O quê? - perguntam todas

- O que estás a dizer é mesmo verdade?

- É!

- Mas que grande mudança! - comenta uma sombra

- Não sei se devemos acreditar nisto. - comenta outra personagem

- Acreditem! - pede a rapariga

- No inicio foi bom, mas cansamos!

- Quer dizer…foi divertido…foi uma tentativa de enganar o medo.

- Tu eras a nossa rainha…primeiro amiga…depois…cruel!

- Fizeste tudo para que o medo se apoderasse de nós…e para que pudesses fazer tudo o que quisesses connosco.

- Depois de tudo, como te atreves a chamar-nos?

- Eu chamei-vos para vos pedir perdão. - diz a rapariga

- O quê? – perguntam todas, e desatam a rir

- Essa é boa…

- Muito boa.

- É. Eu não quero mais este mundo. Quero libertar-vos, e quero viver no mundo real. - assume a rapariga

- Tu é que o transformaste neste mundo horrível.

- Eu sei. Não sabia disso, mas agora sei. - diz a rapariga

- Nós também não gostamos de aqui estar! Só estamos onde nos deixaste.

- Por isso é que estou aqui! Para me perdoarem e para irmos todos para o mundo real que espero ser muito mais bonito que este. - reconhece a rapariga

- Huuuummmm… - dizem todas, e faz-se silêncio

A claridade aumenta.

- Por favor perdoem-me todas as maldades que vos fiz. Este foi o refúgio que encontrei do mundo real, de coisas que eu não gostava. Encontrei-vos aqui. Não tinha noção de onde estava metida. Juro-vos que não queria ter construído este mundo horrível.

- Este mundo horrível, foste tu que construíste, com tudo de mau que tinhas e que não podias mostrar na tua sociedade.

- Vivias na escuridão da tristeza e da desilusão, da dor, do ódio, da raiva, da maldade…

- Tudo dentro de ti era feio! - dizem as sombras

- Como querias construir um mundo bonito…

- um refúgio agradável com tanta carga pesada, escura?

- Pois…não tinha percebido isso. Mas é verdade! Mas acho que ainda posso mudar de mundo, não? - diz a rapariga

- Sim. - respondem todas

- Só depende de ti.

- Vocês gostam de estar aqui? - pergunta a rapariga

- Claro que não! - dizem todas

- Tira-nos daqui. - pede uma sombra

- Odiamos este sítio. - diz outra sombra

- Estamos cansados do escuro!

- Estamos esgotados. - dizem todas

- Estamos fartos deste ambiente.

- Por mau que seja o teu mundo real, de onde fugiste, temos a certeza que é bem melhor que este!

- Acho que começo a perceber que sim. Vocês perdoam-me? - pede a rapariga

Faz-se silêncio. Aumenta a claridade.

- Tu libertas-nos? - perguntam todas

- Tiras-nos daqui?

- Sim. Liberto-vos, e tiro-vos daqui com todo o gosto. - diz a rapariga

- Nós perdoamos-te. - respondem todas

         A rapariga abre um grande sorriso, e o mundo que era escuro, cheio de sombras, e figuras horrendas, encolhe. Um vento fortíssimo arrasta todas as personagens e ela incluída, de mãos dadas para se segurarem, elas rodam, algumas caem, outras ajudam a levantar, outras batem contra algumas árvores, mas não se magoam, seguram-se umas às outras.

            Há muitas cores, muitas luzes misturadas. O novo espaço é um jardim cheio de sol, luz, cores vivas, flores, relva, pássaros, lagos, fontes, cascatas. As sombras deixam de ser pretas, e todas as personagens são visíveis, sorridentes, com ares serenos, meigos, todos se abraçam, e beijam e abraçam a rapariga. A outra ela aparece com um enorme sorriso.

- Vês? Conseguiste! Muito bem…parabéns!

A rapariga abraça a outra ela, as duas sorriem:

- Muito obrigada por me terem perdoado!

- Muito obrigada por nos teres libertado! - dizem todas

- Que lindo sítio!

(Ouve-se barulhos da cidade ao longe)

- Não vou sair daqui.

- Tens de sair para voltares para a cidade onde vives e onde todos te esperam. Mas poderás voltar a este sítio sempre que quiseres.

- Estaremos sempre aqui…mas queremos é ver-te aqui poucas vezes.

        Todos riem.

- Muito obrigada pela vossa companhia, durante este tempo.

- Eles são muito mais bonitos com luz!

- Pois são!

- Está na hora de acordares.

- Mas eu estou a dormir?

- Estás! Vais acordar dentro em breve, como nova…agora que mudaste para a luz.

- E eles?

- Eles vão estar sempre aqui. Podes vir visitá-los algumas vezes, mas a este lado do labirinto. 

lado da luz.

- E o lado horrendo?

- Esse quase desaparecerá. Não voltes a entrar nele.

- Não voltarei. Até breve amigos! Ou…personagens!

- Olha como eles estão felizes!

- E ganha juízo!

        As duas raparigas dão a mão com um grande sorriso, e ela acorda na ala psiquiátrica, consciente. Olha em volta, e familiares e amigos estão à sua volta. Primeiro preocupados, depois quando ela abre os olhos, sorriem aliviados.

- Olá! - dizem todos

- Bem-vinda!

- O soninho foi longo, não?

- E bom?

- Eles amam-te!

        A rapariga sorri.

- Onde estou?

- Não te preocupes com isso!

- Vais sair daqui.

- Vais ficar boa!

- Não sei o que aconteceu!

- Não faz mal.

- Sabes quem somos?

- Sei!

       Eles põem a conversa em dia, contam-lhe novidades, todos riem muito e com a medicação ela melhora de dia para dia. Teve força suficiente, com a ajuda da família, dos amigos e da sua outra ela para não voltar ao mundo da depressão, das sombras, e figuras assustadoras, e agora, figuras bonitas, sorridentes, de paz e alegres que brincam com ela.     

        Ela reaprendeu a viver em sociedade, e transformou-se numa pessoa do bem, passou a procurar ajuda quando precisou, e aprendeu a aproveitar tudo de bom…reencantou-se pela cidade, por tudo o que a rodeia. 

        A depressão tem cura, é preciso estar atento aos sinais e qualquer um de nós pode tê-la. Qualquer um de nós pode viver no mundo da escuridão, das trevas, onde tudo é horrível, assustador, e viver no mundo da luz, da cor, da felicidade.

        Mesmo quando o mundo da luz tem trevas e as sombras invadem esse mundo, podemos sempre contar com quem nos ama, com a família, com os amigos e com os anjos em forma de psicólogos ou médicos. 

        Mesmo com trevas e sombra, vale a pena viver…e no mundo da luz! No nosso mundo.

Fim

Lara Rocha

(11/Julho/2015)








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