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sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

A FLOR SOLIDÁRIA

desenhado por Lara Rocha 

NARRADORA - Era uma vez uma fada transformada numa flor linda, enorme, com umas pétalas muito coloridas, atraentes, e delicadas, que vivia num pequeno jardim com outras flores. Ninguém sabia como é que a flor tinha ido ali parar, pois esta apareceu da noite para o dia. Toda a gente tinha uma predilecção por aquela flor…todos queriam fotografá-la, pintavam-na em quadros, e em desenhos…parecia que hipnotizava com a sua beleza rara. Por ser o centro das atenções, a flor era motivo de inveja para as outras, que quase não falavam com ela, e quando falavam, era para lhe dirigir palavras e piadas desagradáveis. Claro que ela não ligava ao que as outras diziam, pois sabia muito bem que era linda, atraente, e admirada por todos. Embora soubesse isso e até gostasse, no fundo, à medida que o tempo passava, a flor começava a ficar um pouco cansada de tanta atenção, não tinha tempo para si, nem para nada, por isso também se sentia triste e solitária. Mesmo assim, mostrava sempre um sorriso a quem a visitava. Além de lindíssima, esta flor era também muito boa…solidária. Adorava acolher todos os bichinhos que nela pousavam, como borboletas, joaninhas, abelhas, e até passarinhos. Todos sabiam que estavam protegidos, quentinhos, e que o seu pólen era da melhor qualidade. Era tão querida, que até servia de guarda-sol, guarda-chuva, tapa vento, e até de cadeira de encosto e escorrega, para os animais que viviam no solo, como cogumelos, coelhinhos, cães, gatos, e muitos outros que por lá passassem. Um dia, a flor estava sossegada no seu terreno, e começou a pensar na vida que levava. Uma rajada de vento toca-lhe suavemente.
FLOR - És tu, vento?
VENTO - Sim, minha beldade. Assustei-te?
FLOR - Não!
VENTO – Estavas muito pensativa. Se calhar nem sentiste o meu abraço!
FLOR – Sim, senti.
VENTO (sorri) – Achei que estavas a precisar.
FLOR (sorri) – E acertaste!
VENTO – Estás triste?
FLOR – Não. Estava só aqui a pensar…!
VENTO – Em quê?
FLOR – Na minha vida.  
VENTO – A tua vida é uma agitação…! (p.c) Estás com ar de cansada.
FLOR – Sim, é mesmo.
VENTO – Queres que vá embora para descansares?
FLOR – Não. Fica. Estou cansada, mas não me importo que estejas aqui.
VENTO – Desculpa estar a meter-me, mas acho que devias descansar.
FLOR – Estou mesmo cansada…e acho que precisava realmente de descansar, mas não posso.
VENTO – Porque não?
FLOR – Porque há muita gente a precisar de mim.
VENTO – Ora, minha amiga, há muitas outras flores que podem fazer o teu serviço. (p.c) Tu entregas-te demais aos outros…não pode ser, querida.
FLOR – Mas eu gosto de ajudar.
VENTO – Certo, e isso é bom…tens bons sentimentos, mas também tens de impor limites, porque se não, dás em louca. (p.c) Tu não és imensa, nem uma super flor.
FLOR – Eu sei. Além de ajudar, gosto de agradar aos outros.
VENTO – Está bem, mas também tens de tirar um tempo só para ti…para recuperares as forças, e descansares.
FLOR – Tens razão…eu não tenho tempo para mim. (p.c) Não sei como sou…não posso descansar.
VENTO – Claro que podes…toda a gente que ajuda quem mais precisa, arranja tempo para si, caso contrário, será ela que precisa de ajuda. (p.c) E tu também, linda, não podes dar resposta a tudo. (p.c) Ninguém consegue.
FLOR – Mas eu queria…
VENTO – Toda a gente queria, mas ninguém é super herói ou super heroína.
FLOR – Sinto-me tão bem por poder ser útil, e por ser tão apreciada, mas estou cansada. E sinto-me sozinha, sabes.
VENTO – Mas estas não são tuas amigas?
FLOR – Não. Quase não me dirigem a palavra, e quando dirigem é para me ofenderem.
VENTO (grita) – Que coisa mais feia…Inveja! (p.c) Claro, é por isso que não vos apreciam.
(As outras flores viram-se para outro lado e disfarçam)
FLOR (a rir) – Deram-se por achadas.
VENTO (ri) – Claro. Elas sabem que tu és muito melhor que elas, em todos os sentidos. Elas não fazem nada de bom pelos outros.
FLOR – Não digas isso…! Eu não sou melhor que ninguém…! Sou apenas eu.
VENTO – Invejosas é o que são. (p.c) Comparando com elas, és muito melhor que elas, no sentido em que tens sentimentos, e fazes coisas boas por quem te pede ajuda. Elas não. (p.c) É por isso que toda a gente gosta de ti.
FLOR – Mas elas são bonitas, e têm a função delas…não deviam ter inveja, porque eu não as substituo.
VENTO – Deixa-as para lá. (p.c) Tu és humilde, elas são arrogantes, e convencidas…! (p.c) Isso faz uma grande diferença.
FLOR – Por favor, amigo… (p.c) Tira-me daqui. (p.c) Eu preciso de paz… (p.c) Preciso de respirar. (p.c) Quero desaparecer e descansar um bocado noutro sítio, entendes?
VENTO – Claro que te entendo! E apoio-te completamente. (p.c) Vamos, eu levo-te! (p.c) Onde queres ir…?
FLOR – Leva-me tu…para qualquer sítio! (p.c) Eu vou para onde me levares. Quero é sair daqui. Deste sítio onde me sinto amarfanhada, sufocada.
VENTO – Tens toda a razão. (p.c) Já estão a abusar de ti! (p.c) Precisas mesmo de um tempo só para ti.
FLOR (sorridente) – Boa…! Vamos!
FLOR 1 (ri, feliz) – Isso…vai…!
FLOR 2 (ri, feliz) – Ááááááhhhh…finalmente!
FLOR 3 (ri, feliz) – Que bom, finalmente este espaço vai voltar a ser todo só para nós!
FLOR 6 (ri, feliz) – Boa….vamos voltar a ser o centro das atenções de toda a gente.
FLOR 4 (ri, feliz) – Xau…!
FLOR 5 (ri) – Vai e não voltes.
FLOR 1 (ri) – Não fazes falta nenhuma aqui.
VENTO – Ainda vão querer muitas flores como a vossa amiga, aqui, suas cobrinhas venenosas.
NARRADORA - As flores riem, mas a flor ignora-as. O vento levanta a flor da terra, suavemente, e ela voa, sem pressa, às gargalhadas, feliz.
FLOR (feliz, a rir) – Ááááááhhhh…que linda a vista daqui! (p.c) Uau. (p.c) Até parece que estou a sonhar.
VENTO (sorri) – Não! Não é um sonho…estás mesmo a voar!
FLOR (feliz, às gargalhadas) – Áh, áh, áh…que linda a vista daqui. (p.c) Sinto-me mesmo tão levezinha…! (p.c) Pareço uma pena de gaivota. (p.c) Que bom…estou livre! (p.c) É maravilhoso (p.c) Há tanto tempo que não me sentia assim. (p.c) Ááááhhh…que lindos, estes campos! E aqueles riachos…! (p.c) Até dá vontade de mergulhar…e vou mesmo (baixa um pouco e mergulha no riacho, feliz, fica toda salpicada). É fresquinha! (p.c) Mas sabe bem! (p.c) Áh, áh, áh…até parece que rejuvenesci. (p.c) Que bom! (Raspa na erva, contente) Que erva fofinha…faz cóceguinhas… (ri, feliz) Que lindo! (p.c) Olha, cavalos, vacas, galinhas, patos, porcos…cães…naquela quinta…que giro! (p.c) E flores…tantas…! (p.c grita) Olá amigas…!
FLORES (sorridentes) – Olá.
GIRASSOL (a rir) – Estás a voar?
FLOR – Sim. (p.c) Finalmente estou livre.
MARGARIDA – E estavas presa?
FLOR – Sim, num jardim pequeno, cheio de flores invejosas. (p.c) Voem também. Venham comigo.
FLORES (gritam) – Espera por nós.
NARRADORA – As flores voam juntas, felizes, livres, com a linda flor, brincam, rodopiam no ar, dançam ao sabor do vento, e passam por um parque onde está uma criança a brincar, que olha para elas, e chama-as a sorrir. Elas descem e brincam com a menina.
MENINA – Venham comigo visitar a minha tia que teve um bebé! (p.c) Ela vai ficar muito feliz.
FLORES (sorridentes) – Vamos!
NARRADORA – Juntam-se e formam um lindo ramalhete. A criança leva à Tia que está em casa com o bebé, e fica maravilhada com aquele ramalhete. No fim do dia, as flores, já um pouco cansadas, aterram novamente na sua quinta, e a flor pousa em cima da relva. Um casal de passarinhos que estava num ninho, muito aflito, porque queria agasalhar os pequeninos, mas não tinha como, chilreia muito alto, em busca de ajuda. A flor olha para cima, sobe, e cobre com as suas grandes e macias pétalas os papás e os filhotes. Os passarinhos ficam radiantes, e agradecem.
PASSARINHO (PAI) – Óh, mas que maravilha…!
PASSARINHO (MÃE) – Que preciosa ajuda. De onde veio?
FLOR (sorridente) – Vim por aí…! De um jardim.
PASSARINHO (PAI) – Óh, mas que surpresa tão boa!
FLOR (sorridente) - Não fiz nada de mais.
PASSARITO 1 (sorridente) – Que linda que é!
FLOR (sorri, deliciada) – Obrigada, meu querido.
PASSARITOS – Muito obrigada…!
PASSARITO 2 – Que quentinho.
PASSARITOS (sorridentes) – Ááááhhh…que bom!
PASSARINHO (MÃE) – Não sei como lhe agradecer.
FLOR (sorridente) – Não tem de agradecer.
VENTO – Querida flor…não deixes que te façam o mesmo que no outro jardim.
FLOR – Não consigo ficar indiferente!
VENTO – És sensível, eu sei, mas por favor…não te entregues demasiado.
FLOR – Não consigo deixar de ser solidária, e de ajudar quem mais precisa, e quem me pede.
VENTO – E podes continuar a sê-lo, mas não deixes que abusem.
FLOR – Sabes uma coisa, ao ser solidária, ao ajudar a alegrar já me sinto livre. (p.c) Agora…estou feliz porque já descansei, já quase ninguém reparou em mim, e fui solidária…agora…sou livre a dobrar. (p.c) Fora da terra e dos jardins, posso ser muito mais útil. (p.c) Obrigada vento.
VENTO (sorridente, e deliciado) És mesmo linda! (p.c) Por fora e por dentro. (p.c) Até breve, minha querida. (p.c) Qualquer coisa chama-me! (p.c) Gosto muito de ti.
FLOR (sorridente) – Eu também gosto muito de ti, e de mim!
VENTO (sorri) – E bem podes gostar muito de ti…deves ter muito orgulho em ti! (p.c) Só te peço uma coisa…não deixes que abusem! Não faças tudo o que te pedem…a todos! (p.c) Primeiro, lembra-te que ninguém pode valer a todos, por muito que queiram… (p.c) Isso é impossível! (p.c) Segundo, porque não és uma super-heroína, nem tens super-poderes…por isso…vai com calma. (p.c) Não passes dos teus limites.
FLOR (sorri) – Eu sei. (p.c) Obrigada pelos teus conselhos. (p.c) Assim o farei!
VENTO – Lembra-te que estarei sempre aqui!
FLOR (sorridente) – Eu sei, amigo!
VENTO (sorridente) – Até breve!
FLOR (sorridente) – Anda visitar-me…!
VENTO (sorridente) – Com certeza. Fica descansada.
FLOR (sorridente) – Até breve.
NARRADORA – O vento segue caminho, e a flor fica no ninho dos passarinhos. É mesmo assim…quando somos solidários, quando damos um bocadinho de nós, a quem mais precisa, mesmo um bocadinho pequenino, às vezes até pode parecer insignificante, mas vale muito para quem não tem nada…nem um sorriso. Quando damos um pedacinho de nós…mesmo que pequenino, o nosso coração fica mais livre! (p.c) Não podemos voar, porque não temos asas, mas experimentem a bondade…e vão sentir o vosso coração a voar de felicidade por se dar aos outros, a quem mais precisa de uma coisinha pouca para nós… mas que lhe faz toda a diferença. Com um pequeno gesto, nem que seja um pequeno carinho, faz o vosso coração voar, e com ele, voa também o coração de quem recebe esse pedacinho! Sejam bonzinhos e solidários como a flor, mas tenham muita atenção a quem pede, pois infelizmente há adultos mal intencionados que não conhecem a bondade, e aproveitam-se da dos outros. Pequenitos…perguntem aos vossos papás, e mamãs, quando quiserem ajudar, se podem ou não fazê-lo. Não ambicionem o muito…não se preocupem em dar muito…preocupem-se em dar, com o coração, sintam alegria por isso, e dêem com bondade e carinho.

FIM
Lálá.
(14/Dezembro/2012)

1 comentário:

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