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terça-feira, 27 de junho de 2023

Baú

 

Palavras soltas, pensamentos sem sentido, perdidos, recordações 


Durante os anos em que vivemos o nosso amor, fomos duas duas árvores que crescemos juntas. Duas árvores com alma, frágeis, que ensinaram uma à outra e aprenderam juntas. 

Duas sementes inocentes, ainda debaixo da terra, com medo de aparecer depois de um longo sono de muitos invernos, com medo do mundo à sua volta, e com medo do amor, de amor, sem sequer saber conscientemente o que era Amor, e o que era Amor. 

Estávamos dispostos a aprender, e era um desejo comum. Duas sementes que se encontraram no momento delas, em que estavam destinadas a encontrar-se para continuar a amar. 

Talvez o amor que nos unia, sempre tivesse existido, e quando menos creditei, já tinha desistido, tu provaste que os meus amigos tinham razão. 

Diziam-me que havia alguém guardado para mim, alguém especial, que ia aparecer no momento certo, quando tivesse de ser. Com a minha idade, comparava-me com os que tinham (alguns); e achava que nunca teria. 

Tenho a sensação que as nossas almas se reconheceram e reencontraram para cumprir o seu propósito, igual ou diferente, só elas saberão pelo que nos fizeram viver um com o outro.

Não senti medo, entreguei-me a ti, deste-me uma oportunidade, eu aceitei. Lançaste a primeira semente! Começou uma amizade simples, sem pressa, com bons momentos, partilhas, telefonemas, mails, alegrias, passeios, almoços, brincadeiras, gargalhadas. 

Pediste-me em namoro de uma forma tão bonita, inocente, simples, mas sincera. Eu aceitei. O meu primeiro amor! Correspondido! Como estava feliz, alguém que me valorizava como eu era, que gostava de mim, que me conquistou sem pressa, pela amizade, que tanto me ensinou, que era como eu imaginava muitas vezes. Foi num sítio maravilhoso, com uma música que chamamos «a nossa música», um dia muito emotivo, os dois adorávamos. 

Senti-me como se naquele dia alguns dos meus medos tivessem desaparecido. Sim, tu sabes, tinha medo de amar, medo de me entregar, eu tinha-te dito isso. E tu compreendeste-me, porque também sentias alguns, acolheste-me, conquistaste-me sem pressa, ofereceste-me um livro que me ajudou. 

Essa foi outra raiz que construiu a nossa relação. Um amor que vimos crescer. juntos, e as sementinhas de carinho, amizade, respeito, companheirismo, felicidade, que regamos com amor, e mesmo com dor. 

Um amor que fizemos por crescer e vimo-lo crescer, cada raminho, cada folhinha, cada raminho, cada tronco com os nossos abraços. A cada troca de olhares, tão mágico, como só nós soubemos como era especial, quando nós nos calávamos, os nossos olhos falavam uns com os outros, contemplavam-se, olhavam-se. 

Enquanto isso acontecia, sorriamos sem saber bem de quê, talvez fossem os nosso olhos que se tocavam, abraçavam ou beijavam. A cada troca de olhares, vimos despertar folhinhas, das mais pequeninas, às maiores, que cresceram com cada lágrima que chorei sempre que ias embora. 

Fomos flores abertas a cada sorriso, a caba brilho no olhar, quando deixávamos que eles falassem uns com os outros. Fomos árvores com folhas de todas as cores, acompanhando as estações do ano.

Descansamos à sombra das raízes, que se foram tornando mais fortes, com os sonhos que construímos juntos, de vida a dois, de sermos dois num só, como já nos sentíamos, a cada enlace de mãos, a cada abraço, a cada gargalhada, a cada passeio, de cada vez que ouvíamos a nossa música juntos, e a emoção quase transbordava, transformando-se em estrelas brilhantes. 

Tudo estava bem encaminhado, com pedido de casamento, e de repente, alguma coisa terrível aconteceu...a árvore de raízes fortes, bonita, foi enfraquecendo, ficou doente, secou. 

Deixou de haver sonhos a dois nas raízes, fusões de raminhos e troncos que se entrelaçavam com os abraços, a nossa música não tocou mais, os olhos deixaram de falar, as bocas também, tornamo-nos flores fechadas.

Passou a ser noite sem estrelas, sem lua, o dia todo para mim, para ti talvez fosse dia 24h, sem noite. Tantos anos depois, não me interessa saber como está a tua árvore, a que plantaste com outra. 

A minha árvore desapareceu, não voltaram a aparecer sonhos, nem projetos, nem sorrisos, nem raízes, muito menos sementes para as construir. 

Os medos voltaram, e deixei de acreditar outra vez no amor. Pelo menos nessa forma de amor. A única coisa que resta, não é sequer que haja alguém especial à minha espera, ou pensar que vai aparecer no momento certo....deixei de acreditar nisso! 

O que resta, são as boas lembranças, estrelas cadentes, astros que de vez em quando percorrem a mente, e de longe a longe, fazem sorrir. Não sei se a nossa história ficou completa, talvez tivesse durado o que tinha de durar, para cumprirmos a nossa missão um com o outro, sem que os nossos sonhos juntos, de sermos um só e outros, tantos que construímos, tivessem de ser real, e de acontecer. 

O fim foi inesperado, doeu, entristeceu, morri, nunca mais foi a mesma, não sei se melhor ou se pior (eu acho); já falo em ti, há muito sem chorar, sem dor, mas com ódio e raiva (algumas vezes), pela pessoa que fui e levaste contigo, e pela pessoa pior em que me tornei depois de ti. 

Quis muitas vezes vingar-me, tu sabes do que estou a falar, e como ia fazê-lo, a tua sorte foi que ainda tive a capacidade de pensar duas vezes... 

Devolve-se as minhas melhores partes, que ficaste com elas. Para que as queres, se a outra é melhor? A reconstrução ainda está a acontecer...

Foste o meu melhor, e o meu pior. Que pena! Mas é porque não tinha que ser...isso às vezes dóis, sabes?! Mas tu não quiseste ser o meu melhor, nem conhecer tanto de melhor que tinha para te dar. 

A carne foi fraca. Resta-me agradecer-te por tudo de bom, por tudo o que aprendi contigo, e desejar que fiques feliz, em paz, com quem rega agora a tua árvore. 


                                                FIM 

                                            Lara Rocha 

                                            27/Junho/2023 

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