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sexta-feira, 27 de setembro de 2013

A folha e o cão

Era uma vez uma folha de árvore enorme, que numa noite de tempestade, com chuva torrencial, trovoada e vento forte, foi arrancada da árvore e arrastada numa enxurrada que se formou no chão do jardim onde vivia.
            A folha deixou-se levar, triste, a tremer, sem saber onde ia parar, mas não podia fazer mais nada…tudo era mais forte que ela. Rolou ao sabor da corrente, escorregou, bateu contra paus e pedras, enrolou-se com outras folhas, e com lixo.
            A noite foi terrível, e a folha só parou quando bateu contra uma janela de um quarto, numa casa, e caiu atordoada. Uma velhinha que passou, com passinhos pequeninos e lentos, apoiada numa bengalinha, e bem agasalhada, passeava o seu cão, e olhou em volta.
- Foi uma noite terrível! Que medo! Nem dormi…e tu também não…pois não, pantufinhas? Uivaste, ladraste, ganiste…mas foste uma grande companhia e aqueceste-me! Como sempre! É por isso que eu gosto tanto de ti! Ainda está tudo de pernas para o ar.

            O cão cheira a folha, e ladra-lhe. A folha assusta-se, e olha para ele.

- Óh, não…não bastava a tempestade, ainda vem este…Aaaaiiii…o que é que vem agora? Olha bichano…deixa-me respirar, sim? – Diz a folha.

            O cão ladra.
- Au…Au…! O que é que te aconteceu? – Pergunta o cão á folha

- Por favor, não me ladres tão perto…estou cheia de dores de cabeça. – Pede a folha.

- Oh…desculpa…! É que nunca te vi aqui antes. Mas estás doente?

- Acho que…não sei.

- Não sabes…? Como assim? Dói-te alguma coisa?

- Sim, dói-me a cabeça e acho que estou toda amassada!

- Não! Até estás mais ou menos direitinha…és enorme.

- Preciso de me secar! E de aquecer…

- Já percebi, foste trazida pela tempestade.

- Sim. Mas não sei onde estou! Eu vim de muito longe, acho eu…ai…não sei…sei que andei aos trambolhões muito tempo, a chocar com paus e com pedras e lixo… Nem sei onde vim parar! - Explica a folha.

- Eu sou daqui! E apercebi-me de tudo…ouvi as chuvadas, que pareciam que iam partir os vidros todos…os trovões, que até me abanavam o esqueleto todo…e…o vento…uuuuuuhhhhhh…parecia que me atravessava! Até ficou quase louco. Estive sempre com a minha dona, à beira dela, bem quentinho e a aquecê-la! Ela estava com muito medo, e eu…nem se fala! Mas enquanto estava lá confortável, pensava nos estavam à chuva, e ao vento…nos que não têm casa, e nos que não se podem aquecer, nem têm ninguém para aquecer! Fiquei triste, sabes…e imaginei-me todo-poderoso, a construir casas para esses…como se fosse um mágico! – Diz o cão.

- A sério? Tu és um bom cão…tens bons sentimentos! – Elogia a folha.

- Sim. Eu também já fui um cão sem dono, e sem casa…dormia onde calhava…e era muitas vezes chutado! Mesmo assim, nunca mordi ninguém. Foram tempos muito duros, mas se calhar, isso amoleceu o meu coração! Gosto apenas de carinho, e de fazer companhia…! Aquela é a minha dona! Trata-te muito bem, e retribui o amor que tenho por ela. Foi ela que me acolheu, quando eu era ainda muito pequeno, e fui deixado na rua! A família dela está muito longe, por isso, eu sou a sua família, neste momento, e ela é a minha família. Uma senhora maravilhosa, com um coração enorme! Anda comigo. Vou mostrar-te onde moramos.

- Está bem.

            A folha vai no lombo do simpático cão. Regressa para casa com a sua dona, e a folha vê a paisagem pelo caminho. Já em casa, a folha fica na beirada da porta para se secar, e aquecer. O cão vai para dentro de casa, mas está sempre de vigia.

- Áááhhh…que sol tão bom! – Suspira a folha a sorrir.

            Passa um coelhinho bravo pequenino, desesperado, a tremer muito, e a chorar.
- Óh, coitadinho…o que foi?

- Estou perdido! Não sei onde estão os meus pais. – Responde o coelhinho muito aflito e a chorar.

- Não te preocupes. Eles vão aparecer rapidamente…! Mete-se aqui debaixo, para aqueceres.

            O coelhinho senta-se na beirada, e o cão sente que alguma coisa não está bem, sai a porta.

- Amigo…este coelhinho está perdido…não sabe onde estão os pais. – Diz a folha.

            O cão cheira, e vai à procura rapidamente. Num abrir e fechar de olhos, com o seu olfacto apurado, encontra a toca do coelhinho, com a entrada coberta de folhas. Os pais estão lá dentro, muito preocupados. O cão espalha tudo com as patas, e põe a entrada a descoberto. O coelhinho saltita feliz, abraça o cão, e acaricia-o. Bate à porta e grita:
- Papá…Mamã…!

            Os pais vão à porta, e abraçam o filho, aliviados.

- Onde foste? – Pergunta o pai

- Ia buscar lenha para nos aquecermos…para vos fazer uma surpresa, mas…o vento arrastou as folhas e o lixo todo, e quando voltei…não soube onde estava a entrada! – Explica o coelhinho.

            Os pais sorriem deliciados.

- Óh, meu amor…que lindo…mas devias ter avisado, que íamos contigo. – Diz o pai.

- Mas assim já não era surpresa…!

- Não te preocupes com as surpresas para nós, querido! – Diz a mãe sorridente, com carinho.

- O cão descobriu a entrada!

            O cão sorri, e ladra.

- Muito obrigada! – Diz a mãe sorridente, acariciando o cão – Entra…vou dar-te água quente…e se quiseres comer alguma coisa…

            O cão entra com o coelhinho, e bebe água quente, conversam animadamente. A folha volta para o sol. Passa um passarinho, com as penas todas ensopadas e meladas da chuva, põe-se também ao sol, junto da folha. O cão regressa da toca, mesmo a tempo, pois prepara-se outra tempestade. Ele convida a folha a entrar. Ela entra. Fora da porta ficou o passarinho. O cão e a folha ficam cheios de pena do passarinho, e a folha quer ir abrigá-lo. Sai por baixo da porta, e fica encostada á janela por cima do passarinho, como se fosse um guarda-chuva. O cão fica com pena dos dois, e abre um cantinho da janela da sala.

- Entrem! Fiquem aqui…! – Diz o cão.

            A folha e o passarinho entram, e ficam abrigados, protegidos e quentinhos, na janela da sala onde tem lareira. A velhinha está a cozinhar, e os três na sala conversam alegremente.
Lá fora, cai uma valente tempestade. A velhinha fica muito assustada, e começa a falar com o cão. O cão, embora assustado, responde sempre, e senta-se à beira da velhinha que está sentado no sofá.
De repente batem à porta. A velhinha vai ver, e o cão segue-a. É uma cadelinha com uma grande ninhada de cãezinhos ainda bebés (8), quase congelados, e fracos.
O cão ladra, uiva, procura logo aquecer os pequeninos, com o seu pêlo, deitado no chão, quase em círculo á volta dos pequeninos.

- Uma visita…! Óhhh…coitadinha! Olha, amigo…acho que arranjei uma família para ti!

A velhinha pega na cadela, carinhosamente, e coloca-a num cobertor perto da lareira, acaricia-a, cobre-a, e dá-lhe água quente. A velhinha prepara outro local em frente à cadela e muito perto da lareira, com o cobertor e deita lá os cãezinhos, o cão ajuda a transportá-los.

- Obrigada, querido! – Diz a velhinha.

            O cão está feliz e orgulhoso. A velhinha dá água quente aos pequeninos, sorri, acaricia-os e cobre-os. O cão lambe a cadela, e os cãezinhos pequeninos. A folha e o passarinho apreciam maravilhados. A velhinha janta, e dá de comer aos animais.
A cadela e os cãezinhos dormem, ao quentinho da lareira, e conversam alegremente uns com os outros. O cão apaixonou-se pela cadela, e pelos filhotes, que os trata tão bem como se fossem seus, sempre com a ajuda da velhinha que os acolheu para o resto das suas vidas.
A folha e o passarinho, ficaram a viver no quarto do sótão da casa da velhinha, e a folha servia de abrigo a muitos animais…era tão grande, que cabiam lá debaixo borboletas, joaninhas, passarinhos…para dormirem sonecas, e protegerem-se do calor, do sol, e mesmo da chuva e do frio.
A velhinha ficou muito mais feliz, e o bondoso cão, tornou-se um verdadeiro ídolo da aldeia, por todos os seus actos de salvar pessoas, de ajudar, e proteger…!

           
FIM
Lálá
26/Setembro/2013


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