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sexta-feira, 14 de março de 2025

O menino com estrelas nos olhos

     Era uma vez um menino não muito rico, que vivia com a sua família numa pequena casa, parecia frágil e desfazer-se a qualquer momento, num descampado de uma grande cidade, onde existiam mais casas, de pessoas a viver com dificuldades. 

    Na verdade, não tinham tantas coisas materiais como as crianças de agora, nem tecnologia, fugiam da Guerra, e da pobreza dos seus países. 

    Os pais trabalhavam, mas não faltava comida, higiene, livros, brinquedos, brincadeiras com os vizinhos, amigos e familiares ao ar livre, e nas casas uns dos outros. 

    Tinham muito amor, carinho, atenção, dedicação, diálogo, entre os pais e as crianças, interação e alegria, muitas gargalhadas, mesmo que às vezes não estivessem muitas horas com os filhos. 

    Quando estavam, estavam, inteiros, só para os filhos, com  carinho, amor, atenção, brincavam com eles, eles ajudavam os pais como podiam e sabiam nas tarefas, e os pais valorizavam, elogiavam, mesmo que não estivesse perfeito. 

    Eles próprios produziam muita da sua comida numa pequena horta, e partilhavam o que uns tinham e outros não, ou quando precisavam. 

    Não faltava roupa, bem tratada, limpa, passada a ferro, nem camas onde dormir, tinham cozinha, sala, casa de banho, sótão. 

    Eram crianças educadas, os pais estavam sempre preocupados em saber como iam na escola, falavam com os professores, pediam para ajudar os meninos, e era isso que faziam. 

    Crianças muito bondosas, como os pais. Cada um rezava várias vezes para agradecer tudo o que tinham, só pediam que continuassem juntos, com saúde, com comida, felizes, com comida, água, casa, cama, roupa, e o amor e carinho dos pais, dos irmãos, dos amigos, dos vizinhos e outros familiares. 

    Eram crianças e adultos com estrelas nos olhos, que faziam confusão aos coleguinhas da cidade, com mais bens materiais do que eles. 

    Não percebiam como é que não tendo o que eles tinham, nada, ou quase nada como achavam que era, conseguiam sorrir, rir, estar interessados nas aulas, ser bons alunos. 

    Um dia, um menino perguntou a esse coleguinha: 

- Desculpa, posso fazer-te uma pergunta? 

- Sim, claro! Faz…!

- Onde vives? 

- Já sabes onde vivo, é naquele descampado aqui da cidade, com mais pessoas, umas da minha cor, da minha raça, outras de outros lugares, e damo-nos todos bem! Mas não é só essa a pergunta, pois não? 

- Ahhh...bem...não quero ser demasiado aborrecido, mas...como é que vocês vivem? Não têm o mesmo que nós, pois não? 

- Temos muitas coisas que vocês têm! Uma casa, uma cama, pais, irmãos, primos, tios, água, comida, roupa, não nos falta atenção, amor, carinho, dedicação, conversa com os nossos pais e com os outros, brincadeiras. Não passamos frio, nem necessidades. 

- Mas vocês não têm telemóveis, nem mochilas de marca, nem roupa como a nossa, nem sapatos como os nossos, nem computadores. 

- Mas temos isso tudo, para que é preciso marca? Ou telemóveis e computadores? 

- Nós não vivemos sem isso! 

- Pois, já reparei, mas os professores deixam-nos fazer os trabalhos à mão, eu gosto. 

- Vocês não brincam? 

- Brincamos, e muito! 

- Com quê? 

- A muita coisa, ao que nos apetece, e ao que nos faz felizes. Temos brinquedos, brincamos ao ar livre, uns com os outros, e nas casas uns dos outros, temos livros, lemos muito. E tu, brincas? 

- Sim, quer dizer...com brinquedos não, brincamos com os telemóveis, jogos eletrónicos, já somos crescidos para brincar como tu. 

- Que asneira! Vocês não são felizes, pois não? 

- Somos...

- Sois? Não parece nada. Duvido que ao brincarem com essas coisas, sejam felizes, como nós. 

    O menino fica pensativo. 

- É a marca das roupas, lá essas coisas eletrónicas que vos fazem felizes?

- Sim...- diz o menino triste 

- Porque ficaste triste? 

- Porque...acho que na verdade não temos tudo o que tu tens para ser feliz. 

- O que vos falta? 

- Falta-nos...o estarmos mais tempo com os nossos pais, que trabalham muito, e ao fim do dia, estão cansados, querem descansar, deixam-nos com os telemóveis, jogos e trabalhos de casa, mas não têm tempo para brincar connosco, até porque já somos crescidos para isso, como eles dizem. 

- Os meus pais, e os nossos pais também trabalham, nem sempre estão muitas horas connosco, mas quando estão, fazem-nos felizes, dão-nos amor, carinho, atenção, falam connosco. 

- Pois, os nossos pais não têm tempo para isso, levam trabalho de casa e tudo. 

- Para quê? 

- Para nos darem tudo o que precisamos! 

- E isso deixa-vos feliz? 

- Acho que...agora que estou a falar contigo...acho que não! 

- Claro que não podem ser felizes! De que adianta ter tudo, material, do bom e do melhor, se os pais se sacrificam tanto para vos dar o que precisam, mas não dão o que precisam realmente, e o que vos faz verdadeiramente felizes? 

- Pois é! Tens razão. 

- Um dia destes, vais à minha casa, ver como somos felizes, sem essas vossas coisas. Está bem? 

- Está bem. Obrigada, desculpa se fiz alguma pergunta que não devia. 

- Não faz mal. 

    Os dois combinam uma visita ao descampado onde vive o menino com estrelas nos olhos. Ficou muito surpreso, por ser tão bem recebido, e por perceber que todos eram tão felizes com tão pouco, como ele achava. 

    Brincaram, riram, o menino apresentou o amigo a toda a gente, todos o receberam com carinho e sorrisos, ele visitou várias casas, que realmente não tinham muito luxo, como as deles, mas tinham o essencial e eram confortáveis, acolhedoras. 

    Os pais dos meninos foram todos muito simpáticos, acolheram-no como se ele fosse da família, divertiram-se à grande, ele brincou com brinquedos como já não fazia há muito tempo, e adorou, sentiu-se feliz, riu muito, com todos. 

    Percebeu que o menino tinha razão, que tinham tudo! E eram felizes, muito mais do que ele e os outros meninos que viviam em casas com eletrónicas, que tinham computadores, jogos eletrónicos, roupas e sapatos de marca. 

    Mas realmente, a relação entre todos não se comparava com a deles. Sentiu-se feliz, como nunca antes se tinha sentido. 

    Não lhe faltou carinho, bem brinquedos e muita gargalhada, amizade, e até lanches recheados. Decidiu que ia dizer aos seus pais, que sentia falta do amor, do carinho, da presença, da atenção deles, mesmo que não fosse muito tempo, e que queria voltar a brincar com brinquedos. 

    Aprendeu muito com este amiguinho, e antes de ir para casa, agradeceu, dizendo-lhe: 

- Muito obrigado, amigo. Por me ensinares o que é a verdadeira felicidade, que esta está na simplicidade, no amor, na amizade, no carinho, na presença, no ter o suficiente. 

- De nada! Anda mais vezes, serás sempre muito bem recebido e muito bem vindo. Aqui foste feliz, não foste? - diz o menino a sorrir 

- Sim, fui! Muito feliz. Obrigado por me ensinares e mostrares o que é a felicidade. Agora é que percebi porque é que tens estrelas nos olhos, tu, e os teus! Todos os que aqui estão. 

- Sim! De que achas que é? 

- É de felicidade! E ela está em coisas que eu nunca imaginei. 

- Pois é! - sorri o menino - volta sempre! Hoje também tens estrelas nos teus olhos. 

- São de felicidade! - sorriem os dois, e trocam um abraço - Muito obrigado por tudo! Voltarei, sim.

- Até amanhã! 

- Até amanhã! 

    E o menino vai para casa, feliz, conta aos pais, que se sensibilizaram, quiseram falar com os pais do amiguinho, para saber como conseguiam, aprenderam, e fizeram como eles, tornando o menino tão feliz como o amiguinho. 

    Levaram-no para casa, brincaram juntos, e com os outros amigos, riram muito, os pais arranjaram tempo para estar com o filho.  

    Só para ele, como faziam os pais do outro menino, deixaram de se preocupar tanto com o trabalho, e aprenderam com aquela comunidade o que era a felicidade, onde estava, a ficar com estrelas nos olhos como eles. 

    Tornaram-se quase uma família, e sempre que havia coisas que os filhos já não queriam, ou não vestiam nem calçavam, davam ao menino da comunidade e aos outros familiares, amigos, pais, primos, vizinhos.

    Aprenderam a partilhar, e recebiam outras coisas em troca. Quando isso acontecia, ficavam com estrelas nos olhos porque seria? 

Podem deixar os vossos comentários, se quiserem. 

                                                    Fim  

                                              Lara Rocha 

                                             13/Março/2025 

     


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