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terça-feira, 24 de outubro de 2023

Monólogo: Gratidão ao meu amor passado

 


Gratidão ao meu amor passado.


NARRADORA - Uma rapariga quer fazer as pazes com o passado, um amor que ela pensou ser para sempre, mas acabou de uma semana para a outro, depois de um pedido de casamento.

Como ela estava iludida! E todas nós ficamos iludidas, mas nem sempre é como imaginamos. Confiamos plenamente, e de repente, tudo se desmorona. Como é possível? Estavam sempre a dizer...aos anos que vai…vira a página, já devias ter arranjado outro. Ele arranjou logo outra, trocou-te, tu devias fazer o mesmo, isso ajuda a esquecer mais rápido.

Já devem ter ouvido isso, de certeza! Mas concordaram? É assim tão fácil? Claro que não, para ele pode ter sido, mas para mim, e para nós, mulheres, nem sempre é assim tão fácil.

Uma série de anos depois, resolveu escrever uma carta positiva, de agradecimento pelos bons momentos, os que devem prevalecer para ajudar a diminuir a raiva, o ódio, a vontade de vingança.


- Gratidão, gratidão, gratidão pela boa escolha do local onde me pediste em namoro, e pela simplicidade com que o fizeste! Gratidão, gratidão, gratidão, pela nossa música, que acompanhou e marcou o início do namoro, naquele sítio de sonho.

Gratidão, gratidão, gratidão, a ti, que te chamei «meu amor» enquanto durou, e tu a mim que me tratavas carinhosamente por «mor». Gratidão, gratidão, gratidão a ti, meu amor passado, pela oportunidade de te mostrar o que eu era sem máscaras, pela possibilidade de me conhecer como namorada, e perceber como sabia amar.

Gratidão, gratidão, gratidão, pela oportunidade recíproca que demos um ao outro, de viver o amor, a amizade, e tudo de bom que vivemos. Gratidão, gratidão, gratidão, por todas as palavras bonitas que ouvi de ti, gratidão, gratidão, gratidão, por todas as gargalhadas que dei contigo.

Gratidão, gratidão, gratidão, a ti, meu amor passado, por me teres correspondido, o único amor correspondido, depois de tanta desilusão, e quando eu já não acreditava que fosse conhecer alguém que se interessasse por mim.

Apesar de todos os meus amigos e familiares me dizerem que um dia ia aparecer, que ele estava guardadinho para mim, que ia aparecer quando menos esperasse, que não havia idades…eu achava que era só para alguns.

Gratidão, gratidão, gratidão, a todos os que me disseram isso! Eu não acreditava, mas a verdade é que de um dia para o outro, apareceste. Gratidão, gratidão, gratidão, meu amor antigo, correspondido, por teres visto tudo o que eu tinha de bom e desconhecia.

Gratidão, gratidão, gratidão, meu amor antigo por me ajudares a crescer e a tornar-me numa pessoa diferente. Gratidão, gratidão, gratidão meu amor antigo e correspondido por todos os momentos de carinho, por todos os abraços, por todos os encontros, por todos os passeios que demos, por todas as coisas bonitas que me mostraste, que vivi, que disseste e que senti contigo ao meu lado.

Gratidão, gratidão, gratidão, por todos os momentos de intimidade, telefonemas, conversas, mensagens, webcam. Gratidão, gratidão, gratidão por me teres feito acreditar no amor!

Gratidão, gratidão, gratidão, pelos presentes que me ofereceste, gratidão, gratidão, gratidão por conhecer a tua família pessoalmente, e pelos dois sobrinhos: um já me chamava «tia», e eu gostava deles como se fossem meus sobrinhos, por aquele momento delicioso em que estive com o teu sobrinho mais velho a dormir no meu colo. Eu quase explodia de felicidade quando ouvi chamar «tia». O outro sobrinho estive pouco tempo com ele, mesmo assim, foi muito bom!

Gratidão, gratidão, gratidão por todas as lágrimas quando ias para fora, e pela alegria dos momentos em que nos falávamos ao telefone todos os dias, pela Internet. Gratidão, gratidão, gratidão pelos postais que me enviaste, pelos toques, pelo anel, por me teres pedido em casamento, um sonho que não se cumpriu, mas pelo menos fui feliz quando o ouvi.

Gratidão, gratidão, gratidão pelos momentos em que fui dormir à tua casa e senti aquele conforto de acordares ao meu lado, e aquele carinho com que me acordavas. Ficávamos os dois assim...lado a lado, de mão dada ou apenas encostados e abraçados, com troca de beijos. Como era bom!

Doeu, quando acabaste, claro! Quando fizeste a tua escolha pela outra, com quem estás agora, e na realidade já estavas, mas eu não sabia. Gratidão, gratidão, gratidão, por todo o romantismo adormeceu em mim, ou já não existe, mas existiu.

Gratidão, gratidão, gratidão, por não seres possessivo, nem ciumento. Gratidão, gratidão, gratidão por me teres apresentado os teus amigos, por me teres aceitado como eu era.

Doeu, claro que sim, quando levaste contigo todos os sonhos que eu tinha começado a construir connosco. Senti que chegamos a ser um «eu», «um tu» e «um nós», sempre que nos fundíamos, tantas vezes, pelo olhar, um no outro, sem palavras, pelos abraços, pelos beijos, pelos sorrisos.

Quando me pediste em casamento, e eu aceitei, porque estávamos bem, ao fim de 4 anos, sonhava com um «eu», um «tu» e um «nós», cada vez melhor, maior e mais forte. Mas quando acabaste no fim de semana seguinte...depois de me teres pedido em casamento, foi muito mau, não gostei, deixei de saber quem era e nunca mais fui a mesma.

Ainda demorei a aceitar que só para ti é que as coisas não estavam bem entre nós. Claro, não podiam estar bem, com a varejeira que andava à tua volta a provocar-te. Não tinhas mais argumentos contra mim, não sabias como te desculpares, e ainda negaste até assumir que não era só ela que estava interessada em ti.

Não sei do que te encantaste com ela! Talvez ela te tenha dado o que eu não te dei! Não dei porque não era mesmo o que eu queria dar-te, pelo menos nesse momento. E parecia que pressentia que não era contigo que eu ia ficar, ou seria medo!

Preferi não me entregar assim tanto, nem tudo! Na verdade é porque não merecias. Foi o melhor que eu fiz! Dei-me muito a ti, tu também deste muito de ti a mim, tivemos momentos muito bons, embalados pela nossa música, que ouvimos várias vezes juntos, e sentíamos uma ligação muito especial, aquela música tinha a ver connosco. Ainda hoje adoro essa música, sorrio, e acho que vai continuar a ser lembrada como a «nossa música», para sempre! Pela beleza, magia, pelas coisas boas que ela transmite.

Fala de amor, quase como foi o nosso, só não foi mais porque não quiseste. Não gostei nem aceitei algumas propostas que me fizeste, sei que também não gostaste, mas aceitaste. Gratidão, gratidão, gratidão por isso! Respeitaste as minhas escolhas e decisões, mesmo com dor.

Tive apoio psicológico ligeiro, quando acabaste, mas foi essencial para eu falar de ti sem chorar, apesar da dor, que pensava perdurar até hoje, mas não. Demorou muito a passar, sim, é verdade, o ódio, mas com o apoio psicológico aprendi a viver sem ti, a recordar os bons momentos.

Demorei muito tempo até voltar a ser outra pessoa, que ainda estou no caminho da descoberta e da construção. O teatro, pouco depois de teres acabado, também ajudou em muita coisa.

Se houver um segundo amor, vai ser uma redescoberta para mim, serei uma nova «eu», porque deixaste-me fossilizada, desconhecida de mim mesma, e não, não arranjei ninguém desde que acabamos! Ao contrário de ti, que uns dias ou semanas antes já tinhas outra, com certeza.

Até te conhecer, aliás, conheci-te, sem pensar que iria dar alguma coisa entre nós, também não acreditava, depois de tanta desilusão, não pensava como seria, não sabia como era enquanto namorada. E tu disseste que eu era uma grande mulher.

Era um misto de incerteza, curiosidade, querer e ter medo. Mas conseguiste ver-me, quiseste dar-me uma oportunidade. Gratidão, gratidão, gratidão por essa oportunidade!

Já vai há tanto tempo...tantos anos…! Não voltei a apaixonar-me. Raramente penso se vai acontecer outra vez ou não. Não sei se conseguirei voltar a amar, a ter alguém que me ame, o amor se existiu acabou, se não existiu, o que quer que seja, acabou!

Parece que foi ontem...e já lá vai há tantos anos…! Foi muito bom enquanto durou. A dor passou e ficaram as lembranças dos bons momentos! Não tenho a certeza se a raiva passou ou adormeceu, com o passar do tempo, eu realmente era boa demais para ti!

É porque não tínhamos de ser um «nós», para sempre...só enquanto durou. O primeiro amor nunca se esquece, nem as desilusões, passe o tempo que passar, elas apenas adormecem e deixam-nos continuar.

Fizeram parte de nós, fazem parte do nosso passado, daquilo que fomos nessa altura, e aprendemos, melhoramos, pioramos, tanto com as desilusões, como com o fim das relações, depois da dor!

Enquanto não aparece outro amor, se é que vai aparecer, fico entre a vontade, o medo, a descrença, a insegurança, o acreditar que vai acontecer de novo, que há alguém destinado para mim, à minha espera, alguém especial, algures...no infinito.

Enquanto não acontece, quero ficar apenas com as tuas boas recordações de vez em quando, só para me fazer sorrir! E hoje, agradecer-te por toda a eternidade, todos os bons momentos, tudo o que fui contigo, tudo o que fomos um para o outro, tudo o que vivemos juntos.

Já não serei a mesma, e tu também não, ninguém volta a ser o, ou a mesma pessoa depois deste acontecimento. Mas poderei ser melhor se houver alguém diferente, que limpe todo o lixo emocional que deixaste em mim.

Talvez um dos propósitos das relações seja esse...transformar-nos, fazer-nos crescer, como se fossem rascunhos, até à perfeição final, a do amor puro, companheiro, leal, sensível, respeitador, brincalhão, divertido, amigo, carinhoso, compreensivo, que nos traga à superfície o melhor de nós, que goste de conversar, que nos descubra diariamente, nos pequenos gestos, nos grandes.

Mesmo assim, hoje, agradeço-te...amor antigo...primeiro amor...cada segundo, cada minuto, cada dia, cada hora, cada semana, cada mês e cada ano. Gratidão, gratidão, gratidão, amor antigo, amor passado…

Mas de hoje em diante, quero libertar o meu coração, de ti, de todas as desilusões e amores não correspondidos, que doeram e destruíram-me, mas felizmente que nunca tivemos nada. Não era para eles, até te conhecer, que me transformaram e ajudaram a descobrir o meu melhor para te dar.

Hoje, agradeço-te por tudo, mas quero libertar o meu coração, deixar-te lá num cantinho, pequenino e derreter o gelo que lá deixaste. Liberto-te! Meu primeiro amor, que já não és, mas já foste, e porque somos também passado, tu fazes parte dele, é lá que estarás, com quem eu fui contigo, juntamente com os bons momentos que de vez em quando gosto de recordar.

Hoje, eu liberto-te para sempre, meu amor, meu primeiro amor! Foi quanto perdeste. Gratidão, gratidão, gratidão por tudo, e...até sempre. Eu liberto-te! Vai! Não precisas de ocupar mais o meu coração magoado e congelado, como o deixaste.

Eu quero libertar-te, quero derreter o meu gelo, deitar fora o lixo emocional da dor que me deixaste. Vai amor...lá para a caixinha do passado, onde talvez me encontres, aquela que fui, quando me conheceste!

A que sou agora, não conheces, nem conhecerás. Encho o meu coração de gratidão por tudo de bom que vivi contigo, e por teres sido o meu primeiro amor. Abro uma frincha para outro alguém, se houver e se conseguir, descongelar, enchê-lo de luz, de amor, e curar as feridas que deixaste!

Havendo ou não outro amor para mim...vai! Para o passado! Não te quero mais no meu presente! Não preciso mais de ti, no meu presente! Vai para o passado e fica lá. Já são muitos anos de prisão para o meu coração. Vai! Eu solto-te dele! Vai lá para o passado, e não voltes, com grande, grande gratidão, para sempre e até sempre! No passado.


                                                              FIM

                                                           Lara Rocha

                                                           23/10/2023

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