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quarta-feira, 7 de março de 2018

Os quadros atrás das portas

   

        Era uma vez uma menina que entrou numa casa onde havia muitas portas. Pelo corredor ouviam-se vários sons, e cheiros diferentes. A menina quis saber onde levavam aquelas portas, mas como eram misteriosas, pediu a presença do seu anjo da guarda, que apareceu de imediato.
- Olá! Obrigada por teres vindo. Quero abrir estas portas...por favor, protege-me...
- Combinado. - Diz o anjinho
            A cada porta que abria, perguntava ao seu anjinho se podia abrir sem perigo. O anjinho confirmava que sim. A primeira porta, tinha um lindo quadro pintado por alguém, com uma imagem de uma bailarina numa paisagem montanhosa.
- Quem pintou este quadro...? Que lindo!
            Apreciou o quadro. Abriu a segunda porta, e tinha uma janela, que tentou abrir, mas não conseguiu. Da janela via-se um jardim com cores de Outono.
- Parece ser outro quadro, mas a janela parece mesmo verdadeira, e vê-se que tem um jardim com cores de Outono.
            A outra porta mostrava uma praia paradisíaca, mas a menina não podia entrar, nem ouvia o barulho do mar ou do vento.
- Óh. É outro quadro, que parece uma praia paradisíaca. Porque é que eu não posso entrar? Esta paisagem é tão bonita.
- Mas é um quadro! - Relembra o anjinho
- Pois.
           Na porta ao lado, ouviu gritos, tiros, explosões, choros. Ficou assustada. O anjinho recomendou-lhe:
- Não abras essa porta! É a porta da guerra, é assustadora e feia!
- A porta da guerra? Consegues ver daí?
- Consigo, por isso é que te estou a dizer.
- Vocês não vão para esses países em Guerra? Há tanta gente a sofrer.
- Não! Bem gostaríamos, mas não nos deixam entrar.
- Mas é uma guerra mesmo, ou é uma pintura sobre guerra? Eu estou a ouvir gritos, choros, tiros, explosões...
- É um quadro sobre a guerra, mas é muito realista e feio.
- Se é um quadro como é que eu consigo ouvir?
- Tem uma gravação de sons, para causar impressões nas pessoas que o vêem e saber do que se trata.
- Áh! Então não é real.
- Não. Aqui não é real, mas infelizmente é real em muitos países do Mundo.
- E porque é que eu não posso abrir? Se é uma pintura, não é perigoso.
- Certo, se quiseres abre, mas as imagens são muito feias, acho que não devias ver.
- Está bem! Então não vejo. As que vejo na televisão sobre a guerra são horríveis, e assustadoras, às vezes também não me deixam ver.
- Pois não, e fazem muito bem, porque as imagens são mesmo muito feias e más.
- E a do lado, posso abrir?
- Podes.
            Ela abre a porta do lado e ouve sons de passarinhos.
- Pássaros na gaiola! Que lindos...têm umas penas que dá gosto. Áh...afinal não são reais... são...pintados, mas eu estou a ouvi-los.
- Sim, tem uma gravação com o chilrear deles, para quem vê a pintura sentá-la de forma mais especial.
- Que bonito que é ouvi-los...e aquelas cores das penas. A natureza é mesmo perfeita!
- É.
           Abre as portas seguintes: uma tem uma pintura com coelhos espalhados a correr por um campo de erva alta, outros coelhos parecem estar escondidos atrás de árvores porque só se vê parte da cabeça, com orelhas, ou o rabinho. No outro quadro está pintado uma menina entre cerejeiras, com um cesto cheio de lindas cerejas e algumas no chão. Na porta ao lado, estava pintada uma montanha coberta de neve, com uns raios de sol entre as árvores. A outra mostrava um lago com patos em fila, atrás da mãe, e uma paisagem à volta muito verde. Outro tinha pintado uma gruta com um ribeirinho de água, gelo, e cristais. A outra mostrava a fotografia de uma família enorme e feliz, com uma noiva. Na outra tinha nuvens com formas engraçadas, a outra mostrava dunas de um deserto, e cactos, na outra apareciam grandes águias, umas em voo, outras pousadas em terra. Ainda viu uma casa de campo, com pessoas que pareciam quase reais, animais da quinta que pareciam sair da tela. Noutra viu um céu estrelado à noite, e noutra uma tela em branco, com pincéis, lápis de cor, e de cera, tintas.
- Porque será que esta tela está em branco, e tem aqui material de pintura?
- Não sei, talvez seja de quem pintou as outras todas, e ficou sem ideias, não pintou mais.
             Entrou o pintor, sorridente e diz:
- Olá pequena. Viste as minhas pinturas?
- Olá. Sim...desculpe ter entrado assim.
- Ninguém disse que não podias ter entrado, aliás, a porta principal está sempre aberta para quem quiser apreciar o que quero dizer ao Mundo, e a quem vê.
- Gostei muito dos seus quadros. Parecem muito reais... e aqueles com sons, ainda mais. O seu quadro da guerra não vi. As imagens da guerra são muito feias, tristes, e assustadoras! E aqueles sons...não quis ver.
- Tens toda a razão. As imagens que lá tenho não são bonitas...são de muita tristeza, dor, e revolta! Não gosto de guerra, nem eles gostam, mas pintei para me libertar desses sentimentos. Às vezes alguns de nós precisamos de ver essas imagens horríveis para pensarmos, e deixarmos de ser tão exigentes, estamos sempre a dizer mal e a reclamar de tudo, mas se virmos estas imagens e outras, onde há crianças e bebés com fome, pensamos duas vezes antes de sermos ingratos! Temos tudo, temos paz, e ainda assim, queremos sempre mais. Temos tudo o que os dessa imagem e das outras pagariam milhões para ter, casas...as suas que foram destruídas, sonhos que ficaram subterrados com as crianças que ficaram lá debaixo. Saúde, brinquedos, comida, roupa...nós temos casa, conforto, luz, roupa, comida, brinquedos, não temos guerra nem bombas a cair sobre as nossas cabeças, temos água, que eles não têm, temos ar, que eles têm mas poluído. Não temos do que reclamar, mas reclamamos porque nos falta sempre algo material que achamos que é imprescindível ter, às vezes só porque o outro tem. Não é?  Não temos de fugir, as nossas crianças têm mesas, cadeiras, computadores, livros, mas outros não têm nada, e mesmo assim são educados, interessados, aprendem e são felizes com o pouco, muito pouco, quase nada que têm.
- É verdade! Que lindo pensamento! - Diz o anjinho com as lágrimas nos olhos
- Sim, pois é, nunca tinha pensado nisso.
- Os que menos têm, são os que mais agradecem, e reconhecem! - Acrescenta o pintor
- Pois é! Já ouvi dizer que sim. E para que é aquela tela branca com os materiais? Ficou sem ideias?
- Podes pintar tu!
- A sério?
- Sim.
- Mas, eu não sei pintar!
- Claro que sabes. Todos sabemos.
- Acha?
- Tenho a certeza, e não tem de ficar perfeito. Se ficar perfeito deixa de ser natural.
- Mas os seus estão perfeitos, e parecem naturais.
- Obrigada, mas não, não estão perfeitos...eu não quero que fiquem perfeitos. Experimenta!
- Ahhh...acho que não vou conseguir...e se estrago a sua tela?
- Não faz mal. Tenta! É claro que vais conseguir.
              A menina pega numa cor e desenha um círculo, uma lágrima e mais círculos pequeninos. Depois diz:
- Não está bem... mas sabe o que quer dizer? Quer dizer...o círculo de fora é o nosso mundo, que está a chorar, e quer um abraço!
- Quer um abraço de paz, para secar as lágrimas, não é? - pergunta o pintor a sorrir
- Sim!
- Está maravilhoso. Deixa-o aí, por favor, e escreve essa interpretação!
- Onde?
- Aí em baixo... é tão bonita essa mensagem! Quero que todos vejam.
- Obrigada! Também podia pôr a sua... - Sugere a menina
- Já pensei nisso, mas quero dar liberdade às pessoas que vêem os meus trabalhos para pensarem o que quiserem...eu posso pensar isso, mas elas podem pensar diferente!
             A menina escreve a sua interpretação na tela, o seu anjinho da guarda sorri orgulhoso e rendido às mensagens que ouviu do pintor e da menina.
- O senhor é uma alma de luz! - Diz a menina
- Obrigado, filha... sou apenas um ser humano! Como tu, e os meus filhos.
- Tem filhos?
- Sim, sou casado, e tenho 6 filhos. Felizmente, todos eles bem educados, generosos...
- Almas de luz! - Acrescenta a menina
- Isso! - Sorri o pintor
- Eles também pintam?
- Alguma coisa...
- Porque não põe aqui os quadros deles?
- Eles não pintam quadros, mas qualquer dia, ponho-os a pintar quadros.
- Bem, vou deixá-lo pintar. Parabéns pelos seus quadros, e continue! Áh...e muito obrigada pelo que me ensinou hoje! Não me vou esquecer da sua mensagem.
- Obrigado, serás sempre muito bem-vinda, sempre que quiseres! - Diz o pintor
- Obrigada. Até já.
- Até já.
             A menina sai com o seu anjinho, e reescreve a mensagem que o pintor lhe transmitiu, num bloco que anda sempre com ela. O anjinho confirma que foi tudo aquilo que ela escreveu.
            E vocês, que portas abririam? O que teria em cada uma delas?

                                                                   FIM
                                                                   Lálá  
                                                               7/Março/2018
             

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