Era uma vez um descampado numa floresta, onde viviam muitos animais. Nesse descampado, existia uma árvore gigante, de tronco muito largo, muito antiga, com muitos ramos em todas as direções e diferentes grossuras.
Havia uma porta redonda, aberturas no tronco mais para cima, que pareciam janelas, mas quando se espreitava estava sempre tudo fechado. Mas de noite viam-se luzes a sair por essa porta, muitos metros de altura, aparentemente não se ouvia barulho, só no local.
Ninguém sabia o que era, sentiam medo de ir lá ver, mas numa noite, uma coruja quis ir ver, ela também andava por cima desse descampado, via as luzes e ouvia música.
Sobrevoou a zona, e quando pousou em frente à porta, no solo, uma lebre elegante, delicada, olhou - a de cima a baixo, com uns olhos que pareciam saltar de órbita, a coruja até ficou intimidada, cheirou-a.
- Porque estás a olhar para mim com esses olhos e a cheirar-me? - pergunta a coruja
- Estava a ver se eras boa criatura!
- Essa agora! Não posso andar por aqui, livremente? Quem és tu para mandar em mim, ou dizer se posso ou não andar por aqui?
- Sou a lebre porteira.
- A lebre porteira?
- Sim. Aqui dentro é um bar, com música, espetáculos de canto e dança, teatro, ginástica, às vezes, relaxamento, declamação de poesias, apreciação de artes, onde dezenas ou centenas de coelhos convivem. Todas as noites, há aqui atividades!
- Áh! Então é por esse que vemos estas luzes?
- Sim.
- Só aqui à beira é que ouvimos mais barulho.
- Claro, por respeito aos outros animais, viemos para este descampado, para não perturbar o descanso.
- Áh! Boa ideia. Obrigada.
- Já estão aqui há muito tempo, não?
- Sim. Às vezes os coelhos saem e vem cá para fora.
- Então também há atividades cá fora?
- Há! Mas são mais silenciosas, por respeito aos habitantes.
- Que tipo de atividades?
- Mais sossegadas!
- Tudo acontece neste tronco?
- Sim.
- Tem espaço para tanta gente?
- Tem. Tem 4 andares!
- Áh! Então são nestas janelas?
- São.
- Nós realmente só vemos as luzes, e os barulhos só se ouvem aqui. Não sabíamos o que era.
- Pois! De dia, está fechado. E tu vens de onde?
- Aqui da floresta!
- És uma coruja, não és?
- Sou.
- Querias entrar, não era?
- Era…
- Hummm…não sei se podes!
- Como assim?
- Vou perguntar. Espera aqui, por favor.
- Porque é que eu não posso entrar? É exclusivo para coelhos?
- É.
- Áh…! Mas eu só queria ver o que era e como era!
- Vou perguntar. Espera aqui.
A coruja espera à porta, a apreciar o espaço, regressa a lebre pouco depois, com um coelho vestido de fato:
- Boa noite! Quer entrar?
- Boa noite, sim, quer dizer...gostaria!
- Para que quer entrar - pergunta o coelho
- Para ver como é.
- Não nos vem fazer mal?
- Claro que não! Não tenho nada contra coelhos, sou a guardiã da noite. Ando por aqui, pela floresta.
- Promete que não vai chamar os outros para virem para aqui...?
- Prometo!
- É que nós gostamos de ser discretos, ter o nosso próprio espaço, estar uns com os outros, conviver.
- Claro, compreendo.
- Bom...entre, mas lá fora, não conte como é, certo?
- Certo! Obrigado.
A coruja entra, olha para todo o lado, todos os coelhos olham para ela, sorriem, cumprimentam, ela retribui, fica encantada com a decoração e a quantidade de coelhos que estão nesse espaço, a rir à gargalhada, a comer, a beber, a dançar, a ouvir musica, a fotografar, a conversar.
- Nunca vi tanto coelho no mesmo espaço! Tão diferentes na cor do pelo, nos tamanhos...muito bonitos. - comenta a coruja com a lebre porteira
A lebre porteira ri:
- É verdade! Imagino que sim, e hoje não é dos dias em que está mais cheia.
- O espaço é muito agradável, nunca imaginei que isto fosse assim. Por fora nada indica como é assim.
- É verdade!
- Muito bonito!
- Obrigado. Quer subir para ver o resto?
- Sim.
- Boa noite! - dizem os coelhos a sorrir
- Boa noite, divirtam-se! - diz a coruja
- Já fazemos isso, obrigado.
- Boa!
Percorre todos os andares, admira o espaço, a decoração, vê a paisagem entre as janelas.
- Que paisagem maravilhosa! - murmura e suspira a coruja
Voltam a descer.
- Já vai embora? - pergunta o coelho chefe
- Sim!
- Está bem!
- Gostei muito do espaço. Parabéns!
- Obrigado. Não quer ficar mais um pouco?
- Não...só queria ver mesmo o que eram aquelas luzes que víamos.
- Entendo! Por favor, não conte aos outros.
- Está prometido! - diz a coruja
- Sabe que na floresta existem muitos perigos para nós, coelhos...
- Sim, compreendo! O que precisarem, eu ando todas as noites, aqui, e por toda a floresta, é só chamar.
- Muito obrigado, confiamos em si, e de nossa parte, também. Apareça quando quiser.
- Obrigado.
- Passe uma boa noite!
- Obrigada, divirtam-se.
- Sempre! - diz o coelho chefe a rir
- Até à próxima.
- Até à próxima.
E a coruja regressa a casa, satisfeita por ter descoberto de onde vinham as luzes altas da floresta. Como prometeu não contar, quando os outros animais lhe perguntavam curiosos, o que eram aquelas luzes, ela dizia que não sabia:
- Não sei...possivelmente da cidade!
- Na cidade há estas luzes?
- Sim, e muitas mais.
- Áh! Está bem, mas o que será?
- Isso não sei. Só vejo as luzes.
A coruja passava por lá de vez em quando, sobrevoava muitas vezes a zona para apreciar a paisagem e ver as luzes, cumprimentava a lebre, e perguntava se estava tudo bem, se não precisavam de nada.
A lebre porteira agradecia, conversavam um pouco, riam, e alguns coelhos saiam para as atividades mais livres e calmas, ela assistiu, aplaudiu. Outros coelhos apareciam nas janelas, cumprimentavam-na, sorriam e brincavam com ela.
Aquele espaço passou a ser um refúgio e de diversão para a coruja, porque convidavam-na para entrar, ver alguns espetáculos, quando perceberam que ela era de confiança, confirmada pela lebre porteira.
Era a única a quem permitiam entrada, e ela respeitava. Fez grandes amigos, estava sempre atenta, para os proteger se fosse preciso, e divertia-se muito com eles.
Afinal as misteriosas luzes que se viam em toda a floresta e pensavam que era da cidade, vinham do descampado, do tronco enorme de uma árvore antiga, transformada num lugar reservado, discreto e silencioso para os outros animais, cheio de diversão e amizade.
Os outros animais nunca souberam o que existia no descampado, sentiam medo do espaço, e pensavam que as luzes vinham da cidade.
E vocês, visitavam esse descampado?
Acham que a lebre porteira vos deixava entrar? Porquê?
Como imaginam esse espaço?
O que existiria nele para vocês?
Quem deixavam entrar?
Podem deixar as respostas nos comentários.
FIM
Lara Rocha
20/Abril/2025