Era
uma vez várias famílias que viviam num lugar sossegado, que se chamava monte
amarelo. Um paraíso perto da cidade onde trabalhavam, com ar puro, sem poluição,
só com os sons da natureza.
A
paisagem era encantada, e fazia parte desta um monte mais alto, conhecido como
o Monte Vermelho que era habitado por lobos…alguns humanos já tinham ido lá,
mas poucos se atreviam, porque tinham medo dos lobos que ouviam uivar, e que os
fazia arrepiar até os ossos.
Esse Monte Vermelho também servia
de inspiração para as ameaças dos pais quando queriam pôr os filhos na ordem, e
para artistas escritores, pintores e fotógrafas que tiravam boas ideias. Um dia
uma criança de uma das famílias olhou para o monte dos lobos e reparou que em
vez de verde ou amarelo, estava vermelho, e mostrou ao Avô:
- Avô, olha aquele monte…não é verde, nem amarelo.
- Pois não. É vermelho. – Responde o avô
- Porquê? – Pergunta a criança
- O nosso é amarelo, aquele é verde, o outro é vermelho…olha…foi
o nome que lhe deram…podia ser o monte azul, o monte branco. Sempre o conheci
com esse nome. – Explica o Avô
- Já foste lá?
- Não.
- Porque não?
- Porque…olha porque…é…muito longe daqui.
- E não gostavas de ir lá?
- Não faço muita questão.
- O que é isso?
- Isso, o quê?
- Não fazes isso que disseste?
- Muita questão?
- Sim.
- Quer dizer que não quero ir lá.
- Porquê?
- Porque…já te disse que é longe.
- O Avô está a mentir. – Diz a Avó
- O quê? 8entre dentes para a Avó) Não lhe contes. –
Resmunga o Avô
- Estás a mentir, Avô? Isso não se faz. – Repara a
criança
- O Avô não vai lá porque lá vivem os lobos. –
Responde a Avó
- Lobos? – Pergunta a criança
- Sim, lobos. – Respondem todos
- É um lugar horrível. – Reforça o pai
- Já foste lá? – Pergunta a criança
- Já. – Diz o pai
- Não queiras ir para lá…sempre me disseram que era
um lugar perigoso. – Acrescenta um tio
- Já foste lá, tio?
- Não. Mas os adultos ameaçavam-me muitas vezes que
me levavam para lá se eu não ficasse à mesa,
e que os lo… (os adultos interrompem e mandam-no calar discretamente)
- E quê? – Pergunta a criança curiosa
- E que… - Dizem todos
- E que esse lugar é selvagem, não é para nós,
seres humanos. – Diz a outra avó
- Já foste lá, Avó?
- Não. Bastou que me ameaçassem uma única vez…
respeito era muito bonito.
- E porque é que o monte é vermelho? – Volta a
perguntar a criança
- Porque…os lobos…
O outro tio ia dizer o que lhe tinham dito, mas os
adultos interrompem e respondem em coro:
- Foi o nome que lhe deram!
- É…! – Dizem todos
- Podia-se ter chamado monte roxo, monte
cor-de-rosa… - Diz uma tia
- Pois. – Dizem todos
- Já foste lá, tia?
- Não.
- Eu gostava de ir lá. – Comenta a criança
- Só os lobos podem andar por lá, o caminho é muito
difícil
A
criança não ficou convencida, mas não perguntou mais nada. Quando se foi
deitar, olhou para o monte e não estava vermelho. Estava escuro.
No dia seguinte, a criança volta a
olhar para o monte e estava vermelho, mas quando se ia deitar, estava escuro
outra vez. Ele começou a achar muito estranho, e perguntou ao outro avô:
- Avô…olha…aquele monte está vermelho. Mas à noite,
quando vou para a cama, o monte não está desta cor.
- Pois não, porque quando vais dormir, está escuro.
- Muda de cor?
- Muda.
- Porquê?
- Porque de dia tudo tem cor, de noite, parece tudo
igual…a nossa casa e todas as outras casas, as árvores, os montes…tudo parece
igual. De dia o monte é vermelho porque se reparares existem ali nuvens, e o
sol está por trás das nuvens, que fazem o sol parecer vermelho, por isso, onde
o sol reflecte, ali, no chão do monte, parece que tudo fica vermelho! Se
estivesse um sol aberto como aqui, ias ver o monte amarelo, ou verde-claro e
verde escuro…ao fim da tarde é cor-de-laranja ou vermelho, e é branco quando há
neve.
- Áh! Que lindo. E há mesmo lobos lá, ou são homens
disfarçados? – Pergunta a criança
- Há lobos, mesmo.
- Daqueles como a história do capuchinho?
- Sim.
- E maus como ele?
- Nem sempre.
- Como assim?
- Se sentirem que estão em perigo, se os agredires,
ou se estiverem com fome, são selvagens, podem ser um pouco agressivos, ou
tentar magoar-te para se defenderem, e às vezes comem animais para se
alimentarem. Mas poucas vezes vêm aqui ao monte.
- Áh! Estou a perceber.
Nessa noite, foi Lua Cheia…e
estava enorme, linda. Começou a aparecer por trás do monte vermelho. O menino
estava a ver com a família. Um espectáculo da natureza que todos gostam de ver,
e deliciam-se.
- Avô…olha a cor do monte…parece que tem ali uma
bola de luz.
- Sim, já vais ver o que é.
A lua sobe, sobe, sobe…até que
aparece por inteira.
- A lua. – Diz a criança encantada com um grande
sorriso.
E ouve-se o uivo crescente dos
lobos…como uma orquestra…começa o chefe da alcateia, e os outros seguem-no, até
que todos uivam prolongadamente em coro, virados para a lua. Pode ver-se as
sombras deles. Os humanos arrepiam-se e sorriem, os cães ladram.
- O que é isto? – Pergunta a criança
- São os uivos dos lobos. – Respondem todos
- Estão a saudar a lua! – Diz uma avó
- Áhhhh…que lindo! Agora o monte já não está
vermelho…está… – Suspira a criança a sorrir
- Prateado. – Diz a mãe
- Branco. – Diz um tio
- Amarelado. – Diz outra tia
- Branco azulado. – Diz o pai
- Enluado! – Diz o Avô.
- Agora o monte está avermelhado porque o sol viu a
sua apaixonada lua. – Diz uma adolescente da família com ar de sonhadora
- Eu acho que ele está vermelho por ter tantos
lobos a olhar para ele… - Diz outra adolescente da família
- Pode ser o reflexo da raiva dos lobos por alguma
coisa…olha como eles uivam…- Diz outra adolescente da família
Estas
famílias tinham a tradição de se reunir em noites de Lua Cheia, para viver e
reviver estas fantasias saudáveis da infância, e para correr com os medos, que
sabiam agora em adultos, não serem reais, mesmo assim gostavam de sonhar…Eram
momentos de união e partilha, convívio, magia…depois das crianças se deitarem,
a noite era dos crescidos.
Muitos segredos e medos que os
adultos viveram, os mitos, as lendas, as histórias e as fantasias que o Monte
Vermelho tinha despertado nas suas infâncias, ficaram por contar às crianças,
para que elas não ganhassem medo, e para cada uma delas poder viver,
experimentar a magia, as suas próprias fantasias em relação aos mistérios da
Natureza.
E vocês? Porque acham que o monte era vermelho?
Fim
Lálá
(27/Abril/2016)