Era
uma vez uma árvore só com pequenos troncos, sem uma única folha, perdida num
grande descampado, sem relva, só terra, e sem luz.
Por ser um sítio escuro,
via-se muito bem as estrelas do céu, mas todas as pessoas tinham medo de ir
para lá.
Este era um sítio fantástico para
animais noturnos, como morcegos, mochos e corujas. À noite, esse campo ganhava
vida com tanto bicho de um lado para o outro, de ramo em ramo, iam para os becos
da cidade e voltavam, faziam uma grande barulheira, e de dia, dormiam na
árvore.
Um dia, uma pequena menina foi à
procura de um sítio onde pudesse ensaiar sossegada as suas músicas que tocava
em flauta, sem incomodar as pessoas, principalmente uns vizinhos que detestavam
flauta, e ralhavam muito com ela.
Chegou ao campo da árvore dos
morcegos, e reinava o sossego. Como era de dia, os animais noturnos dormiam. Os
morcegos fechados nas suas asinhas, pendurados, as corujas e os mochos nas
crateras do tronco da árvore que era um sítio escuro e silencioso.
Quer dizer…eles pensavam que era
silencioso, e era! Até aparecer a menina. Pois é! Como a menina não sabia que
aqueles eram animais noturnos, e dormiam de dia, nem olhou para a árvore, de
tão concentrada que estava na sua flauta.
Andava de um lado para o outro, dançava e rodava ao mesmo
tempo, com algumas quedas à mistura e ria-se sozinha. Estava tão feliz, e
sentia-se tão livre que nem deu pelas horas passarem. Quase à noitinha os morcegos, os mochos e as corujas começam
a despertar lentamente, e preparam-se para a noite. A menina está muito
assustada, porque está escuro e esqueceu-se do caminho.
Ela olha para cima, e vê
montes de olhos pregados nela
- Quem és tu? – Pergunta uma
coruja
- És caçadora? – Pergunta um
mocho
- Não. Sou uma menina.
- Uma menina? – Perguntam em
coro
- Sim.
- Humana? – Perguntam em coro
- Sim! Porquê?
- Da cidade? – Pergunta outra
coruja
- Sim.
- Huummm…estou cheio de fome… -
Murmura um morcego gordo
- Era de estranhar se não
estivesses com fome! – Resmunga a sua mulher
- O que é que isso quer dizer? –
Pergunta a menina assustada
- Não é nada comum aparecer
aqui…humanos! – Diz outro mocho
- O que é que isso quer dizer?
Que me vão morder? – Pergunta a menina assustada
- Não! – Respondem em coro
- O que é isso que tens na mão?
– Pergunta uma morcega
- É uma flauta! – Responde a
menina
- E o que é que isso faz? –
Pergunta outra morcega
- Isso tem um ar ameaçador! –
Diz outra morcega
- Óh, não…não faz mal! Faz
música! – Responde a menina
- Isso dá de comer? – Pergunta o
morcego gordo
(Todos riem)
- Não. Quer dizer…não dá
comida, mas dá consolo…! E alimenta a alma! – Responde a menina
- Quem é a alma? Posso comê-la?
- (Ri) Não. A alma está dentro
de nós. Não se pode comer.
- Óh, o consolo não é de comer!
A alma também não…o que é que tu comes? – Resmunga e pergunta o morcego gordo
- Que insensível! – Resmunga a
sua esposa
- Como muita coisa…mas alma e
consolo não.
- E essa coisa não comes? –
Pergunta o morcego gordo
- Não. Isto faz música…não se
come. – Diz a menina
- Podes tocar um bocadinho, por
favor? – Pede outro mocho
- Claro que sim! – Diz a menina
a sorrir
- Óh, com licença…não quero
saber de tocares…quero é comer… - Resmunga o morcego gordo e voa.
Todos riem. A menina começa a tocar, e todos os animais
ficam espantados com o som da flauta, quase não pestanejam. Sorriem e
choramingam, balançam o corpo e seguem a música. Todos aplaudem a menina.
- Ááááhhh! – Suspiram todos a
sorrir
- Que lindo! – Diz uma morcega
ainda embalada.
- É mesmo bom. – Diz um mocho a
sorrir
- Onde aprendeste a tocar isso?
– Pergunta um morcego
- Sozinha e na escola.
- Maravilhoso! Mexe com o
coração…é lindo… - Diz uma coruja encantada
- Obrigada. Podem ajudar-me a
encontrar o caminho de volta para a cidade, por favor? É que estou perdida…
- Óh, mas isso é fácil… - Diz
um mocho
- Vamos para lá agora. – Diz a
sua esposa coruja
- Segue-nos! – Diz um morcego
- Muito obrigada. – Diz a menina
- Por favor…toca mais um pouco
para nós! – Pede outro mocho
- Claro que sim…
E a menina vai o caminho todo a tocar feliz, os morcegos,
os mochos e as corujas acompanham-na, voam e pairam à frente dela, circundam-na
e dançam como bailarinos profissionais, felizes, leves e sorridentes, uns com
os outros e sozinhos. Todos chegam à cidade, e os animais começam a chorar e a
aplaudir.
- Óóóhhh…! – Lamentam todos
- O que foi? Não gostaram? –
Pergunta a menina preocupada
- Adoramos! – Respondem todos
- Então porque estão tão
tristes? – Pergunta a menina
- Porque…
- Porque…
- Porque vamos ter de nos
separar! – Diz uma coruja
- Mas não por muito tempo…pois
não? – Pergunta uma morcega
- Claro que não. Vamo-nos
encontrar muitas vezes. E se quiserem, venham até à minha casa que lá não falta
que comer.
- A sério? – Perguntam todos
- A sério. Venham.
Os animais acompanham-na e nem querem acreditar…realmente…no
sítio onde a menina vivia havia mosquitos às centenas, e outros petiscos para a
bicharada. A menina entra em casa, os pais muito preocupados, mas aliviados
quando a veem.
- Onde foste? – Pergunta o pai
- Fui tocar para um sítio
livre, e distrai-me com as horas
- Podias ter dito! Ficamos
muito preocupados! – Diz a mãe
- Desculpem…
A família conversa. Enquanto isso, todos os morcegos,
corujas e mochos comem quanto querem. Nesse mesmo sítio tem outra árvore
igualzinha à outra, onde viviam. Instalam-se lá, mesmo em frente ao quarto da
menina, e ela vê-os da sua janela.
- Vão ficar aqui? – Pergunta a
menina
- Sim. – Respondem todos
- O comilão já voltou?
- Já…
- Que lugar recheado…! – Diz o
morcego satisfeito e regalado
(Todos riem)
- Está-se muito bem aqui. – Diz
uma morcega!
- O meu quarto é este…daí
podemos ver-nos! – Diz a menina
Todos os animais ficam felizes,
saltitam de alegria e pousam na beirada da janela do quarto da menina para
conversarem e riem à vontade. De dia, os morcegos, os mochos e as corujas dormiam
na árvore, e à noite saiam.
Depois desse dia, eles e
a menina tornaram-se grandes amigos, e até o vizinho resmungão, começou a
gostar das músicas que a menina tocava na flauta. Os morcegos protegiam a
menina e toda a gente dos insuportáveis mosquitos e outros insetos, e a menina,
em troca dava-lhes música que eles adoravam.
FIM
Lara Rocha
(2/Outubro/2014)
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