Era
uma vez um trapezista com uma forma muito estranha, nada parecido com um ser
humano, que adorava brincar e fazia malabarismos no anel de um planeta, onde
ele construiu o seu quarto.
Da
janela ele via o lindo planeta Terra, que parecia hipnotizá-lo…e para onde ele passava
muito tempo a olhar, a tentar imaginar como seria, se as pessoas eram como ele,
o que comiam, se andavam da mesma forma que ele, e muitas outras coisas.
Embora
ele quisesse muito ir à terra, sabia que isso não seria possível, e começava a
acreditar que tudo fazia parte de um sonho. E tal como um sonho, ele apenas
olhava para a terra, sorria e sonhava acordado, ou de olhos fechados.
Um
dia, quando cresceu, deixou de sonhar e de imaginar como seria a Terra, porque
pensava que já não tinha idade para sonhar, e para pensar em coisas que nunca
iriam acontecer. Nesse dia em que deixou de sonhar, ficou triste, viu-se ao
espelho e pareceu-lhe ter mais rugas. As lágrimas caíram-lhe dos olhos mas logo
a seguir foi para o seu trabalho.
Nunca
tinha dito a ninguém que gostava de ir à Terra, mas havia uma constelação que
sabia, mesmo sem ele falar, porque viam-no a olhar pela sua janela, e o brilho
nos seus olhos. Uma delas falou com uma nuvem que ia nesse dia para a Terra, e
a nuvem sugou-o enquanto ele fazia um malabarismo.
Mas que grande susto. Gritou muito
assustado, e a nuvem pede-lhe:
- Pára de gritar! Por favor…estás a deixar-me com dores
de cabeça. Aliás…nem sei porque estás a gritar dessa maneira.
- Mas…mas…onde é que eu estou?
- Estás dentro de mim.
- E quem és tu?
- Sou uma nuvem.
- Porque é que eu estou dentro de ti, engoliste-me?
- Sim, engoli-te!
- Porquê? Eu não sou de comer.
- Que conversa tão desagradável. – Murmura a nuvem
- Como é que eu vim aqui parar? Eu estava nos meus
ensaios, e de repente…sou assim…
- Sugado!
- Isso.
- Sim, foste sugado. E depois?
- Porquê?
- Porque é que estás a fazer tanta pergunta?
- Então…? Estou preocupado…não sei como vim parar aqui…não
sei onde estou… acho que nem nos conhecemos.
- Porque é que queres saber tudo?
- Porque estou assustado.
- Mas não precisas de ficar assustado. Vou levar-te a
um sítio que tenho a certeza que vais gostar e onde já querias ir há muito
tempo.
- Onde?
- Pensa…!
- Óh…não sei.
- Pensa.
- Em quê?
- No sítio onde já querias ir há muito tempo.
Ele fica
em silêncio, pensativo.
- Na minha infância, há muito tempo atrás queria ir à
Terra. Mas isso não passou de um sonho, como aqueles que se tem à noite, onde
tudo pode acontecer, e que sabemos que não se realizam. Mas, mas…isso vem a
propósito de quê? Estávamos a falar sobre a minha chegada aqui.
- Vais realizar hoje o teu sonho.
- O quê?
- Isso mesmo. Vais à Terra.
- Não pode ser…eu acho que estou a sonhar ou a
imaginar.
- Não há idades para sonhar e imaginar. Porque é que
deixaste de sonhar e imaginar?
- Porque estava muito ocupado, tinha de treinar muito,
e trabalhar. Não podia perder tempo com coisas da infância, que já vai há tanto
tempo.
- Não há idades! E o que aconteceu, quando deixaste de
imaginar e sonhar?
- Ganhei rugas…e fiquei triste, mas habituei-me.
- Pois…
- Mas tu para onde vais?
- Para a Terra!
- Áhhh!
- E tu também vais. Prepara-te que estamos a chegar, e
vou largar-te num pára-quedas em forma de grande manjerico, com milhares de
manjericos.
- Mas o que é que tenho que fazer?
- Senta-te nesse pára-quedas e segura-te bem.
- O que é isto tudo aqui?
- São manjericos para largar lá em baixo.
- Manjericos? Huummm… que cheirinho tão bom!
- É para eles usarem numa festança da cidade. Eles também
sonham, em qualquer idade, e até acham que os manjericos são enviados pelos
deuses da Natureza. As estrelas e o Universo responderam a essa fantasia deles,
porque ficam muito felizes e há uma aragem fresca.
- Áh! Que bonito…
- Vê pela janela.
- Uau! É maravilhosa…
- Prepara-te.
- Mas eu vou aparecer nesta figura?
- Não! Logo vês como vais aparecer.
Na terra viram uma nuvem muito escura
que voava pelo céu de uma cidade e fazia adivinhar uma terrível tempestade.
- Agora! Boa viagem…até já… aproveita e diverte-te.
Todas as pessoas fugiram para as suas casas.
- Um…dois…três…!
A enorme nuvem abre as portas e uma
coisa muito estranha aconteceu, e ninguém percebeu…da grande mancha escura que
parecia chuva, em vez de trovões e água, saiu um pára-quedas gigante em forma
de manjerico com o rapaz.
- Até já!
- Até já…Obrigado.
- De nada…
- O que é aquilo? – Pergunta o rapaz
Todos
ficam a olhar pelas janelas, e vêem o enorme manjerico em forma de pára-quedas.
Do pára-quedas soltam-se os nacos de terra com manjericos que se espalham por
todo o lado no solo.
O sol
abriu e o rapaz aterrou. Viu tudo o que estava à sua volta, cheira tudo, corre,
salta, trepa às árvores, faz malabarismos, anda quilómetros, muito feliz, e
sorridente, rodopia, dá cambalhotas, toca em tudo, e todos ficam a olhar para
ele. Ele solta grandes exclamações de encantado e feliz.
- Que linda que é a Terra! Uau! Isto é mesmo como eu
imaginava…isto…não sabia que existia aqui…Ei…tantas casas…eles não estão
apertados? Os terráqueos são estranhos! Áh! Que lindo! Huummm…cheira bem. Ei…tantas
cabeças ali…Ai, que barulho, são carros? Onde vão tão rápido? Que malucos. E aquelas
luzes? Eram as que viam lá de cima? Onde está aquela água? O que é que faz
ficar tudo azul?
Quando as pessoas saem à rua, abrem um enorme sorriso.
- Os manjericos! – Gritam todos
E rezam
para agradecer aos céus, porque sempre acreditaram que os manjericos eram
mandados por deuses. Guardaram-nos e o rapaz continua a passear.
Umas
coisas eram como ele tinha imaginado, e pensado como eram, outras eram muito
diferentes! Mas ele adorou tudo. Nenhum ser humano o viu a passear.
Depois de ter visto tudo, a nuvem foi
buscá-lo outra vez, e contou tudo o que viu, o que sentiu, o que cheirou. A nuvem
ouve-o atentamente e sorri e ri com ele.
- A vida precisa de magia e de sonho…não há idade para
sonhar ou deixar de o fazer. – Diz a nuvem
E o rapaz de regresso à sua casa, voltou a ser muito
feliz, a brincar, a sonhar de olhos abertos e fechados, e a ficar cheio de
energia.
- Filho…acorda! São horas de ir para o colégio. – Diz
uma voz feminina
- Óhhh…não! Eu quero estar na minha casa lá em cima… -
diz um menino
- O quê? – Pergunta a voz feminina
- Eu vivia lá em cima… tinha um quarto com janela
virada para a Terra, e fui sugado por uma nuvem escura que me largou de
pára-quedas em forma de manjerico. Ela sabia que era um sonho muito antigo que
eu tinha…e o pára-quedas largou manjericos no solo, porque achavam que tinham
sido enviados pelos deuses… - conta o menino
A mãe desata a rir e percebe que foi
tudo um sonho que o menino teve nessa noite, e sonhou com manjericos porque
tinha-os visto no seu jardim, e perguntou como é que eles foram lá parar…disseram-lhe
que foram os deuses que mandaram…A vida tem de ter magia e sonho, ilusão e
fantasia, sem idade, para nos sentirmos vivos, e fazer o coração bater mais
forte de felicidade. Nos sonhos tudo pode acontecer, até ir à lua e fazer malabarismo
num anel de um planeta, ou descer de pára-quedas em forma de manjerico.
E vocês? Também sonham? Por onde já andaram?
FIM
Lálá
(26/Maio/2015)