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terça-feira, 31 de dezembro de 2024

Tudo fechado

    Era uma vez uma aldeia numa montanha muito alta, congelada, cheia de neve, onde se sentia um vento cortante, e os dias pareciam ainda mais pequenos do que são, no Inverno. 

     As pessoas que lá viviam eram tão frias umas com as outras que pareciam não saber sorrir, não viam nada de bonito, mas as estrelas quiseram fazer uma surpresa para ver se essas pessoas saiam daquele gelo. 

  Num dia de sol, quando todos estavam no seu trabalho e em casa, começaram a atirar garrafas de água com arco-íris a girar, rodopiar, fazer redemoinhos. 

    Deixaram uma garrafa à porta de cada um, e espalhadas pelo chão. Outras garrafas tinham plantas com gotinhas de água que brilhavam como diamantes ao sol. 

    Em algumas garrafas havia flores pequeninas, muito mimosas, de muitas cores. Numas garrafas estavam pequeninas luzes, de muitas cores a piscar, noutras lindas borboletas gigantes, de tamanhos variados e cores. 

   Noutras garrafas estavam guardadas palavras bonitas, noutras estrelas, noutras, raios de luz de todas as cores, e noutra, brilhantes. Todas teriam de ser abertas, e tudo o que estava em cada uma delas, queria sair. 

    Quando regressou o primeiro habitante viu as garrafas espalhadas,  muito surpreso, começou a ver o que tinha em cada uma delas. Ficou maravilhado, nunca tinha visto tanta coisa nova e bonita. 

- Quem pôs isto aqui? Que coisas tão bonitas…! - diz com um sorriso aberto 

    Ainda ficou mais surpreso, quando viu na sua porta uma garrafa, com um bilhete: «Abre a garrafa, ou as garrafas, que tocarem mais o teu coração, e que te tenham feito sorrir». 

- Mas… 

    Volta a olhar para todas as garrafas, e a que tinha as florinhas pequeninas mimosinhas, foi a que tocou o coração dele, e fez abrir um sorriso luminoso. 

  Abriu a garrafa e as florinhas saltam felizes da garrafa para o chão, dançam e dão risadinhas. 

- Obrigada! - dizem todos 

   O Sr. ri à gargalhada, deliciado ao ver flores tão pequeninas a dançar, a cantar de forma tão diferente da dele, mas tão encantadora. Chega outro e pergunta o que o amigo estava a ver e a rir à gargalhada. 

   Ele responde que encontrou todas aquelas garrafas no chão, cheias de coisas tão bonitas, que o fizeram sorrir, e tinha um bilhete à sua porta, a dizer para abrir aquela, ou aquelas garrafa (s), que tocasse (m) o seu coração, e o tivessem feito sorrir. 

    O amigo riu, e ficou a apreciar juntamente com ele, as florinhas a dançar, a ouvir as risadinhas que depois se separaram e foram parara em vários sítios, espalhadas pela neve. 

    Esse amigo, também tinha o mesmo bilhete à porta da sua casa, tal como todos os outros que foram chegando. Cada um abriu uma garrafa diferente, os outros dois ainda estavam com um sorriso aberto, e maravilhados. 

    Uma senhora abriu a garrafa das plantas com as gotinhas de chuva que brilhavam como diamantes. Mal saíram da garrafa começaram a cantar em forma de agradecimento, umas vozes fininhas, que parecia o som do vento, a passar pelos pinheiros. A Sra. riu à gargalhada. 

- Obrigada. - disseram elas no fim, e espalharam-se pelo espaço 

    Outra senhora, viu o bilhete e o que mais tocou o seu coração, foi a garrafa de água com arco-íris a girar, rodopiar, e fazer redemoinho. 

- Ááááhhh…que coisa tão bonita! - diz a senhora com um sorriso de orelha a orelha. 

    Quando abre essa garrafa, os arco-íris espalham-se pelo ar, em forma de grandes e leves bolas de sabão, onde se veem todas as suas lindas cores. Todos suspiram de espanto e de encanto, seguindo as bolas de sabão com os olhos e com sorrisos abertos. 

   Os habitantes ficam deliciados com o que veem. Outro casal abriu a garrafa das borboletas gigantes de todas as cores. Todos pareciam hipnotizados com tantas, e tão bonitas, tão grandes a esvoaçar levemente à sua frente. 

    Algumas borboletas pousaram nos cabelos, outras nas bochechas, outras nas mãos, como se estivessem a fazer carinho. Abriram sorrisos como nunca antes visto, e soltaram gargalhadas, palmas, exclamações de encanto. 

    As borboletas ficam por ali, escolhem lugares diferentes para se instalar. Outro casal com  filhos, abriu a garrafa das estrelas, que sopraram e espalharam-se por todo o lado, deixando tudo brilhante e luminoso, todos aplaudem. 

    O outro casal com filhos, abre a garrafa dos raios de luz, de todas as cores, que se tornam enormes, e iluminam todo o espaço, como holofotes que giravam, mudavam de direções, escondiam-se nas nuvens e voltavam a aparecer, todos riram com vontade. 

  Os habitantes nem querem acreditar, nunca tinham visto tanta coisa bonita. A garrafa das palavras bonitas, quase era esquecida, foi ignorada, mas um pequeno cãozinho deu sinal: ladrou sem parar à beira da garrafa, depois de a cheirar. 

  Ficaram todos preocupados, com aquele nervosismo do cão. Quando se aproximaram, perceberam que estava lá uma garrafa e dizia: «palavras bonitas», abram por favor e leiam-nas uns aos outros. 

    Como não estavam habituados a dizer e a usar palavras bonitas, sentiram medo, e ficaram quase congelados sem mexer na garrafa, a olhar uns para os outros. 

  Juntam-se vários cães, dos habitantes, cheiram a garrafa, ladram em coro, sem parar, lambem a garrafa, põem as patas em cima, e tentam abrir. 

- Os cães gostaram dela! 

- Se calhar podemos abrir, e ver o que há. 

- É. Deve ser isso que os cães estão a dizer. 

    Os cães ladram como que a confirmar que é seguro abrir. 

- Quem abre primeiro? - pergunta uma senhora

- Posso abrir eu! - diz outra 

    Ficam todos na expectativa, a ver o que sairia da garrafa. O que estaria escrito? Além de palavras bonitas, dizia: Leiam com o coração, sinceridade, e um sorriso na cara. 

- Que coisa estranha! Vamos tentar. 

    Cada um tira um papel com uma palavra bonita, lê em voz alta, com um sorriso, uns deixam escapar umas lagriminhas de alegria, ternura e gratidão, outros distribuem abraços que se tornam longos, outros elogiam, outros dão as mãos, outros procuram pequeninos mimos e oferecem.

    Outros fazem mimos aos animais. No final combinam uma festa à noite, ao ar livre, onde viram as estrelas, como nunca antes tinham visto, as luzinhas pequeninas por todo o lado, os raios de luz que pareciam auroras boreais a dançar, os arco-íris em forma de milhares de bolas de sabão, que se juntaram à festa, esvoaçando por todo o lado. 

    Gostaram tanto das palavras bonitas, que leram, e transformaram num jogo coletivo, onde baralhavam as palavras na garrafa e cada um tirava uma diferente, e as estrelas enviavam todos os dias, palavras bonitas diferentes, e os próprios procuraram. 

    Aprenderam a sorrir com o coração, a elogiar com sinceridade e a abraçar com muito carinho, a conversar muito mais uns com os outros e a ajudar. Aprenderam a apreciar em conjunto e sozinhos as maravilhas da Natureza, que os fazia conversar uns com os outros sobre isso, iam investigar quando não conheciam o que viam, e adoravam ver as lindas borboletas. 

  À noite, juntavam-se para tomar chá, apreciar as estrelas, a lua, e conviver. Tornaram-se uma grande família, onde havia muita amizade, brincadeiras, festas, respeito, felicidade e apesar do gelo da noite, do frio do vento, havia sol, no céu, calor humano, nos abraços, nos elogios, nos sorrisos abertos, nas mãos dadas, nos carinhos que davam aos animais, e uns aos outros, no amor à Natureza, na beleza que aprenderam a ver em tudo o que até aí parecia não existir. 

   As estrelas não podiam estar mais orgulhosas! 

E vocês? Que palavras bonitas acham que estavam na garrafa que dizia «palavras bonitas»? 

Qual ou quais a (as) garrafa (s) que podem vocês escolheriam? 

Porquê? 

Podem deixar as vossas respostas nos comentários, se quiserem. 

                                                                               Fim 

                                                                        Lara Rocha 

                                                                         31/12/2024   


domingo, 15 de dezembro de 2024

Os espirros misteriosos

      Era uma vez um parque no deserto, só com areia ardente, de cor barrenta, o chão cor de laranja, em alguns pontos, a areia parecia Terra, e algumas rochas, dunas. Com tanto calor, onde quase não se respirava, não havia sinais de vida. 

      Mas um dia, algo misterioso aconteceu! A areia espirrou, ecoando por todo o terreno, todo o chão tremeu, e levantou, formando redemoinhos gigantes. As aldeias vizinhas, onde viviam pessoas, sentiram, ficaram muito assustadas a pensar que seria um tremor de terra. Saíram das suas casas, vieram para a rua, e conversaram umas com as outras; todas tinham sentido. 

    Com muito medo, esperaram para ver se acontecia outro. E aconteceu. Mas desta vez foi um som diferente. Um redemoinho, que se tinha levantado com o espirro da areia, ficou sem força, com aquele calor deitou-se, outro redemoinho foi ter com ele, ajudou-o a levantar-se, deu-lhe a mão, o outro voltou a ganhar força. 

    Os dois espirraram estrondosamente, parecia um trovão. Desapareceram rapidamente, e no seu lugar a terra começou a ganhar relva, numa grande extensão. 

    Outros redemoinhos de areia, espirraram em cima dessa relva, apareceram pezinhos de futuras flores e foram largadas sementes ainda por abrir. 

    Formaram-se ventos muito fortes, ciclónicos, que rodaram, rodaram, rodaram, o céu ficou escuro, parecia quase noite, cheio de nuvens. 

    Uns ventos espirraram, e com os espirros formaram-se árvores enormes no espaço onde havia relva e flores, mas também noutros espaços, que faziam sombra. 

    E para que as flores nascessem, outros ventos ciclónicos espirraram. Dos seus espirros surgiu uma chuva torrencial, que regou toda aquela terra deserta e seca. 

    Mas aquele espaço não podia ficar só assim. Então, da água que ficou acumulada na areia, pela chuva torrencial, a areia à volta espirrou outra vez, e formou-se um lago maravilhoso, grande, com margens de rochas, que espirraram e brotam água das suas fendas , para cair no lago, a formar pequeninas cascatinhas. 

    O lago ia ficar só com água? Não! A água queria companhia, então, deu vários espirros! De uns espirros saíram dezenas de peixes de todas as cores, tamanhos, espécies, formas. 

    Os peixes espirram, e aparecem lindos patos, cisnes, gansos, e pedras no fundo do lago. Outro tornado, quando espirra, traz consigo aves de todo o tipo: gaivotas, papagaios, araras, falcões, melros, pardais do deserto, toutinegras do deserto, verdilhões do deserto, corvos, flamingos. 

    Hipopótamos com um lago só para eles, crocodilos noutro lago só para eles. Outro tufão de areia, espirra e espalha animais que vivem na terra, como camelos, cavalos, coelhos, ouriços cacheiros, gatos, cães, ovelhas, burros, galos, galinhas, pintainhos, joaninhas, borboletas, vacas, bois, veados, lobos, raposas, linces, leopardos, panteras, chitas, macacos, elefantes, javalis, e muitos outros. 

    Além dos animais, cada um tinha a sua toca, e num cantinho do deserto, com outro espirro da areia, havia um lago gelado, com gelo à volta, que começava dentro de uma gruta, para pinguins, focas, ursos, leões marinhos. 

    Este lago gelado deu um valente espirro, e formou-se um lago só para golfinhos. Mas ainda sobrava espaço com areia, e na realidade havia pouca água, pouca vegetação. 

    Para resolver essa falta, ouvem-se mais espirros estrondosos, que fazem  tremer o chão, e levantar areia. Desses espirros e com essa areia pelo ar, nasce uma pequena ilha paradisíaca feita de areias brancas, pinheiros, árvores tropicais, palmeiras, e de diferentes espécies, com um pedaço de praia e um pedaço de mar calmo, quente, transparente. 

    Que coisa tão bonita! As pessoas que viviam nas ilhas e praias vizinhas nunca imaginaram o que tinha acontecido naquele espaço inabitável, onde quase não se respirava. 

    Ficaram muito intrigados, e alguém, decidiu passar próximo daquele sítio, pensou que ia transpirar, mas para sua surpresa, vinha das redondezas, um ar muito mais fresco, com cheiro a maresia, a mentol e eucalipto. 

    Ouvia o som do mar, e dos animais. Foi ver...quando chegou, o lugar não era o mesmo que conhecera desde sempre! O que teria acontecido? Como é que tinha acontecido aquela mudança, quem tinha feito aquilo? 

    Estava boquiaberto, chamou os outros, aos gritos, para perceber se estaria a ver bem, ou se estava a imaginar com o calor...Todos viram o mesmo que ele, todos ficaram muito surpresos, a perguntar-se o que tinha acontecido, quem tinha feito aquela maravilha! 

    Gostaram tanto do espaço e do que viram, que aquele sítio passou a ser um refúgio para relaxar, ver as flores, cada qual a mais bonita, cuidar delas, ver os animais, dar-lhes carinho e alimentá-los, meditar, ler, passear, ir para a praia, refrescar-se, e apreciar toda aquela beleza! 

    O mistério de toda aquela transformação continuou por desvendar, mas estavam muito felizes. 

                                                    Fim 

                                               Lara Rocha 

                                           15/Dezembro/2024 

quarta-feira, 27 de novembro de 2024

Os beijinhos das flores



     Era uma vez uma bela montanha com grandes rochedos, desviada da cidade de onde brotavam belos riachos de água. 

    Estes formavam cascatinhas, primeiro pequeninas, depois aumentavam a intensidade da água, à medida que seguiam caminho para um grande lago, onde havia um espaço muito agradável, verde, cheio de árvores, bancos e mesas para merendas, e um rio. 

    Mas além da água que se formava nas grutinhas das rochas, entre muitas fissuras espalhadas até ao rio, nasciam lindas flores selvagens, de várias cores, tamanhos, e  delicadas. 

    Tinham a companhia dos lobos, há muitos anos, das águias, dos falcões, dos veados, das corças, dos esquilos, morcegos, mochos, corujas, lagartixas, coelhos bravos, linces, corvos, e muitos outros. 

    Os pastores levavam o gado: as vacas, os bois, as ovelhas, as cabras, os bodes, para o pasto que naquela zona era muito bom, juntamente com os seus cães. 

    O vento, a chuva, o sol, o calor, as trovoadas, a neve, também marcavam a sua presença, de forma mais ou menos intensa, de acordo com a estação do ano. 

    Os pastores tinham sempre as suas casinhas de resguardo, porque já sabiam o tempo podia mudar. Infelizmente, nos últimos tempos, as cascatinhas e os riachos, tal como o grande rio do parque estavam praticamente secas e paradas, quase não circulavam pelas rochas, nem nas grutinhas. 

    Estavam sem força, e em vez de transparente, a sua cor, era verde, da pouca que circulava. As flores dos rochedos e da margem do lago, bebiam dela, mas andavam a sentir-se estranhas. 

    O sabor não era o mesmo, uma água que antes sabia tão bem, agora, sentiam um sabor estranho, não sabiam o que estava a acontecer. 

    Nunca tinham visto a água daquela cor, sentiam medo, mas bebiam-na porque não havia outra, e precisavam dela, caso contrário, secavam. 

    Uma tarde, ouviram dois pastores que tinham levado o gado, nos rochedos a comentar um com o outro: 

- Moço, já viste que está quase tudo seco, aqui? 

- Pois! Já reparei. Se calhar tem raízes ou lixo ali nas grutas! 

- Pode ser! Ou é de não chover há muito. 

- É verdade! Pode ser das alterações climáticas! Olha a cor da água! 

- Está horrível. Até lá em baixo! 

- Aquilo não será perigoso? 

    As flores ficam em pânico, agarradas aos caules, e trocam olhares: 

- Pois! Também tenho medo! Aquilo...aquela cor parece veneno. 

- Veneno? - murmuram as flores umas com as outras 

- Se for veneno, estamos todos fritos. 

- Fritos mesmo! Nós e o gado, tudo o que aqui está. 

- Não sei como é que as flores resistem.  

- Mas também veneno não será, se não, os nossos animais ficavam mal dispostos, e não estão. 

- Pois. Mas pelo sim, pelo não, é melhor analisarmos a água, não? Os animais bebem-na pelo caminho, mas para percebermos porque é que está daquela cor. 

- É. Boa ideia. Pode ser uma alga. Os meus às vezes também bebem, mas esta de cima também está quase seca, acho que é melhor do que a de lá de baixo! 

-É, mesmo assim, já está com uma cor estranha! 

- Vamos ver às grutinhas de onde ela sai, se há alguma coisa a poluir. 

- Boa ideia. 

    As flores ficam muito ansiosas e com muito medo. Os pastores entram nas grutinhas, iluminam o espaço, e não há nada a impedir a passagem da água, nem a polui-la. Quando voltam a sair, os dois comentam: 

- Nada! 

- É. Deve ser a própria poluição do ar, e de estarem paradas! Mesmo assim, já não são nada do que eram, e pelo sim, pelo não...vamos levar uma amostra para análise. 

- É. É melhor. Estas flores não estão com um ar muito saudável, mas deve ser da pouca água. 

    Os pastores recolhem um bocadinho de água num frasco limpo, em cima e em baixo, e levam ao laboratório. As flores, olham para a água, para ver o seu aspeto. 

- Que exagero, aqueles dois pastores! - comenta uma flor 

- Não estamos assim com tão mau aspeto. - comenta outra 

- Nem eu! - diz outra 

    Mesmo com muito medo, uma flor inclina-se e encosta as pétalas às águas, que tem ao seu lado, como se fosse dar um beijinho, soprar ou fazer uma oração. 

- Óh maravilhas águas, por favor...não estejam doentes, se não, onde vamos beber? Precisamos muito de vocês. Gratidão, gratidão, gratidão, Natureza, por estas águas que nos fazem bem! 

- A quem é que estás a agradecer? - pergunta uma 

- À Natureza! Ela gosta que lhe agradeçam, e acredito que está tão feliz, que vai limpar estas águas. 

- Ela não está boa do caule, nem das pétalas! - diz uma flor surpresa 

- A água deve ter mesmo qualquer coisa venenosa, nunca disse isto. - comenta outra 

    Dá mais um beijinho com a pétala, e endireita-se. As outras gritam: 

- Cuidado! Não te encostes a essas águas. 

- Também acho melhor não, enquanto não soubermos o que está a acontecer com essas águas. 

- Façam o mesmo! Ou não vão beber, só porque aqueles falaram? - convida a flor 

- O que é que tu fizeste? 

- Dei-lhe dois beijinhos e disse o que vocês ouviram. 

- E achas mesmo que as águas vão ficar limpas, só porque disseste isso… 

- Com certeza! Façam, e vão ver amanhã. 

- És mesmo sonhadora. - diz outra 

- Mas…- diz outra assustada 

- O que é que tem o mas? - pergunta a flor 

- Não sei...acho que não...quer dizer...não queria! Mas depois do que aqueles disseram, fiquei a pensar que podia estar ou podemos ficar doentes! - diz outra flor nervosa. 

- Há quanto tempo já bebemos desta água e as de lá de baixo, e nunca nos aconteceu nada? - pergunta a flor 

- Já há bastante tempo, é verdade, quer dizer...desde sempre que estamos aqui. Mas a água não era daquela cor. - responde a outra flor 

- Que mudou de cor e está fraca, está! Porquê? Não sabemos...-repara outra 

- Pode ser a poluição do ar, a falta de chuva. - diz a flor 

- Sim, é...! É verdade. Pelo que sei...desde que estamos aqui, quando não chove há muito tempo, ela fica com esta cor. - lembra outra flor 

- Pois é! - diz a flor 

- Vamos experimentar! Dar também um beijinho nas águas, para ver se acontece alguma coisa. - aceita outra flor 

- E não se esqueçam de agradecer. - reforça a flor 

- Boa! - dizem todas 

- É isso. - concordam todas

    Cada uma encosta as pétalas como fazem para beber, tocam com as pétalas nas águas e nas rochas, como se fossem a dar um abraço às rochas. As águas vibram e fazem pequeninas ondinhas, dão beijinhos com as pétalas e agradecem à Natureza. Convidam as de baixo a fazer o mesmo, e fazem.  

    Na manhã seguinte, nem querem acreditar no que estão a ver...as águas pareciam sair de todos os buracos e mais alguns, até de espaços invisíveis, como se tivesse chovido vários meses, e enchesse os riachos. 

    Uma água limpa, a correr com toda a força, as flores de cima e da berma do rio, aplaudem, felizes, e provam a água: 

- Humm...que delícia! - Suspiram todas 

- Como está transparente e abundante. - comenta uma 

- Mas o que é que aconteceu aqui? - pergunta outra 

- Parece que choveram meses seguidos de ontem para hoje! - comenta uma flor surpresa 

- Realmente! - dizem em coro 

- Que maravilha! - sorriem todas 

- Olhem a de lá de baixo, que espetáculo. Com o sol a dar, parecem brilhantes. - repara outra flor 

- Eu disse que ia resultar! - diz a flor que começou, orgulhosa. 

- Tinhas razão, a Natureza gostou que lhe agradecêssemos. - comenta outra flor 

- E dos nossos beijinhos. - acrescenta outra 

- Claro! Eu disse, e vamos agradecer outra vez, em coro? - sugere a flor 

- Claro que sim, ela merece. Meninas aí de baixo, gritem connosco...vamos agradecer à Natureza! 

- Estamos convosco! - gritam as de baixo 

- Um...dois...três…- grita uma flor de cima 

- Gratidão, gratidão, gratidão, querida Natureza!

    Dizem todas em coro e aplaudem. Chegam os pastores com o gado, e ficam quase congelados com a surpresa de ver tanta água e tão limpa. 

- Mas, mas...o que é que aconteceu aqui? - pergunta um pastor 

- Não sei. Mas realmente as análises deram tudo bem. 

    O gado bebe deliciado, e manifestam-se, como se estivessem a confirmar que aquela água está mesmo boa, e até eles ficaram surpresos. 

    Os pastores sobem com o gado, provam a água das rochas. 

- Que diferença! - diz um pastor 

- Realmente...é pura! - diz o outro 

    Ajoelham-se, rezam e agradecem o regresso e a limpeza da água. 

- E quando for época das chuvas, das trovoadas e da neve é que vai ser! - acrescenta um pastor 

- Pois é. - concorda o outro 

    Os dois dão uma gargalhada, de tão felizes: 

- Até as flores estão mais bonitas! - comenta um pastor 

- Pois estão. 

- Vou já encher a minha garrafa. 

- Eu também. 

    E os dois ficam a apreciar a mudança, encantados, enquanto o gado pasta e bebe a água, sem saberem que foram os beijinhos, os abraços e a gratidão das flores, à Natureza. 

                                                    FIM 

                                               Lara Rocha

                                        25/Novembro/2024  





terça-feira, 19 de novembro de 2024

O gato Neve


    
Era uma vez um grande gato, branco, peludo, de olhos amarelos, que vivia com a família numa toca, adorava desfilar, com o seu ar vaidoso, sentar-se em cima de um cogumelo atraente, vermelho, com pintas brancas. 

    Andava pelo chão, sempre a cheiricar tudo, passeava sem pressa pelo espaço, a olhar para todos com ar que parecia de superior, mas era timidez. 

    O gato empoleirava-se num cogumelo, de cano alto, cabeça larga, via a linda paisagem gelada nas montanhas ao fundo, o verde dos campos, e as várias cores das folhas das árvores, que tentava trepar muitas vezes, mas não conseguia. 

    Ficava irritadíssimo, e a observar atentamente como é que outros animais conseguiam trepar às árvores. Via uma grande cascata, mas não sabia como chegar lá o amarelo dos girassóis e das espigas, o castanho dos troncos das árvores.

    Pensava e olhava atentamente, encantado com as cores das roupas das pessoas que trabalhavam nos campos, via o azul do céu, outras vezes, o cinzento, o roxo, o vermelho, o laranja, o amarelo, o cor-de-rosa. 

    Adorava cheirar tudo, provava pedacinhos de fruta, e recebia mimos, comida, bebida, para ele e para a família, dos habitantes, mas não percebiam porque é que ele se sentava no cogumelo. 

    O cogumelo sentia medo do gato, mas não se mexia. Um dia perguntou ao gato: 

- Óhhh…qualquer coisa, que está aí em cima...eu não sou uma casa, nem uma toca, nem uma árvore, porque é que vens sentar-se sempre aqui, com tanto espaço livre? 

- Primeiro, não sou qualquer coisa, sou um gato! Depois, eu também  tenho casa, família, e ando por aí, mas tu tens qualquer coisa que eu adoro. 

- Áh! És um gato...e então, o que adoras tanto em mim, para não saíres? Eu sou um cogumelo, e dizem que sou venenoso! 

- Sim, já ouvi falar de ti. Porque é que és venenoso? 

- Não sei. 

- Para te defenderes, porque és muito bonito, e muitas pessoas querem provar-te, ou comer-te! 

- Como tu? 

- Eu não te quero provar, nem comer-te. Só venho para aqui, para ver a paisagem, e porque o teu chapéu é largo, confortável, dá para ver bem a paisagem! 

- Que paisagem? 

- Ora...a que tu vês daí. 

- Tu deves ver mais do que eu, estás mais alto! 

- Pois, tens razão! 

- Mas porque é que vens para aqui? 

- Para ver a paisagem, como já disse.

- Desculpa...acho que é mais alguma coisa! 

- Bem...porque...eu sou um gato solitário. 

- Solitário? 

- É. Quase não tenho amigos. 

- Porquê? 

- Não sei. Ouvi dizer que sou...tímido, mas acham que sou arrogante, ou vaidoso. 

- Hummm…também já ouvi dizer isso. 

- Mas estas pessoas comentam tudo! 

- Nem imaginas quanto. 

- De ti também? 

- Claro! 

- E o que dizem? 

- Que pareço um cogumelo de um filme. Não sei o que é isso. Sei que fazem todos uma festa, parece que sou uma estrela, depois lembram-se que sou venenoso. 

- Pois, acho que estou a ver. 

- Também viste esse filme? 

- Acho que sim. 

- E também era venenoso?

- Era. 

- Áh. Está bem, mas agora importas-te de sair de cima, por favor? 

- Claro. 

    O gato dá um salto, e parece que tem quilómetros. O cogumelo assusta-se: 

- Que grande que tu és. Como é que cabias ali em cima? 

- Sim, eu arranjava a caber. Desculpa a minha ousadia. Fico contente por teres falado comigo! 

- És bonito! Branco, com esses olhos...

- Obrigado. 

- Como te chamas? 

- Neve! 

- Neve? Que nome...raro! 

- É por ter o pelo tão branco como a neve, aquela das montanhas, e a que cai aqui no tal Inverno. 

- Áh sei. Sim, realmente pareces. 

- Já viste como tudo à nossa volta é bonito? 

- Sim. Mas em cima de mim, vês alguma coisa de especial? 

- Sim, muita coisa. 

    O gato descreve tudo o que vê. O cogumelo fica encantado, e com muita curiosidade em conhecer essa paisagem que nunca vira. O gato convidou-o a irem para um local onde conseguissem ver. O cogumelo conhece, e os dois ficam em silêncio a contemplar a paisagem. 

- Que bonito! - suspira o cogumelo 

- É mesmo. - concorda o gato 

- Nunca tinha visto como hoje! Obrigado, Neve, por este passeio.

- De nada! Também estou a adorar, e descubro sempre alguma coisa nova, quando vejo a paisagem. 

- Hoje descobriste? 

- Sim. 

- Que interessante! 

    Os dois conversam alegremente, e passeiam por outros sítios. Ao fim do dia, cada um volta para a sua casa. 

- Desculpa, Neve, eu estava errado a teu respeito! Sentia medo de ti, e não sabia que eras um gato, como eras, se me fazias mal...- diz o cogumelo  

- Não faz mal! Compreendo! Eu acho que faria o mesmo. Desculpa eu sentar-me no teu chapéu, sem pedir autorização, não sabia que falavas. - diz o gato 

- Claro, não faz mal. Gostei de ti. 

- Eu também gostei de ti. 

- Vamo-nos encontrar mais vezes, e passear por aí? 

- Com certeza! Estou sempre por aqui.

- Boa. Eu também. 

- Até amanhã. 

- Até amanhã. 

    O gato vai feliz para casa porque alguém conversou com ele, e o cogumelo, feliz porque alguém o levou a ver uma paisagem que ele não conhecia. 

    No dia seguinte, encontram-se alegremente, e encontram uma ave. Perguntam se ela sabe onde fica a cascata. A Ave conhece bem aquele caminho, e leva-os até lá. 

    A cascata é maravilhosa, com uma água limpa, cai com pressão, o barulho dela é relaxante, e os dois quase adormecem. Para acordar, entram na água do lago, mas está tão gelada, que dão um grande salto, mal se molham e um sonoro grito. 

    Vão para a margem, e dão umas valentes gargalhadas: 

- Que água tão gelada. - comenta o gato 

- Pois é! Parece que está cheia de neve. 

- É mesmo. 

    Levanta-se um vento cortante, e o céu fica escuro: 

- Óh não...vai chover? - pergunta o cogumelo 

- Vai. 

- Acho que vamos ter de ir embora! 

- Pois é. 

    Os dois regressam, e começam a cair flocos de neve, os dois amigos ficam numa alegria, como se fosse a primeira vez que viam neve. 

    Brincam um com o outro, pelo caminho, apanham flocos, rebolam na neve que se acumula rapidamente, e o gato ouve os pais a chamá-lo muito aflitos, ao longe: 

- Neve...Neve...onde estás? - grita a mãe 

- Neve...Neve...anda para casa, que está a nevar! - grita o pai 

    Os dois amigos correm, e os pais respiram de alívio. 

- Onde estavas, Neve? - pergunta a mãe 

- Fomos ver a cascata! - diz o gato 

- Pensamos que não ia nevar! - diz o cogumelo

- Quem vos levou à cascata? - pergunta a mãe 

- A águia. - diz o gato 

- É tão bonito! - suspira o cogumelo

- Havemos de ir lá, mas agora, vai para casa, cogumelo, que os teus pais também estão preocupados. A Neve vai ser dura. 

- Pois vai. Sim, vou já para casa. Obrigado. Até amanhã, Neve. Se precisarem de alguma coisa, estamos aqui ao lado. - diz o cogumelo

- Obrigado! - dizem os pais 

- Vocês também. - diz a mãe

- Boa noite. 

- Boa noite. 

    O cogumelo vai para casa dele, ao lado da casa do gato Neve. A neve cai a noite toda, e de manhã continua. 

    Fica uma camada espessa no chão, e de manhã, o gato Neve, quase se confunde com a neve. Toda a floresta e os habitantes vão brincar com a neve, de vez em quando, o gato Neve, esconde-se na neve para brincar, mas rapidamente descobrem-no, pelos olhos.

    Há muitas gargalhadas, muitas escorregadelas, cambalhotas, bonecos de neve, mergulhos na neve, roupas molhadas, sapatos ensopados, fazem um almoço com todos, e o gato Neve faz novos amigos. 

    Os pais estão surpresos com a mudança do filho, e agradecem ao cogumelo. O cogumelo sorri orgulhoso, torna-se um grande amigo do gato Neve, apresenta-o a outros amigos.

    Até os adultos e outros animais, divertem-se na neve, brincam com o gato Neve. Para aquecer, fazem um belo almoço, saboroso, cheiroso, passam o dia a conviver na neve. 

    Ao lanche um chazinho e biscoitos, muita gargalhada, muita animação, danças, brincadeiras, jogos, como já era costume nessa aldeia, quando começava a nevar.  

                                    FIM 

                               Lara Rocha 

                            19/Novembro/2024 

    Gostavam de ter um amigo como o gato Neve, e o cogumelo? 

    Brincariam com eles, na neve? A que jogos? 

Podem deixar nos comentários. 


    

terça-feira, 15 de outubro de 2024

A maçã de vidro com estrelas

 


       Era uma vez uma maçã, aparentemente igual às outras. Vermelha, grande, redonda, pendurada na árvore num enorme campo verde onde existiam outras árvores. Mas à noite, uma magia acontecia! 

      Quando um jovem rapaz, simples, que vivia na aldeia se deitava por baixo da árvore, para descansar, relaxar depois do stresse da cidade, e ouvir todos os barulhos à sua volta, certa noite, olhou para cima, viu um objeto estranho que nunca tinha visto. 

     Levanta-se assustado, e murmura: 

- Trabalhei tanto, hoje, que até já estou a ver coisas. Ou...a imaginar. 

     Olhou outra vez para a árvore, a toda a volta, de várias perspetivas, apreciou cada ramo, cada maçã, e realmente havia uma diferente. 

- Espera aí...afinal...acho que estou a ver bem! Esta maçã, é diferente de todas as outras. Mas, de dia são todas iguais, à noite também devem ser. Não...devo ser eu a imaginar. Alguma vez uma maçã vai ser diferente das outras à noite? De dia, são diferentes, umas maiores, outras mais pequenas, umas com formas maiores, outras com formas mais pequenas, mais perfeitinhas, ou com deformações...mas são boas, e são maçãs! Umas são de cor amarela, outras mais vermelhas, outras mais acastanhadas, com manchas, pintas de várias cores, mas à noite...acabam por ser...à primeira vista, todas iguais. Não...esta é diferente! Hummm… 

     Pega na maçã e comenta: 

- É pesada! Não. Isto não é uma maçã. Alguém pôs isto aqui, não sei como, nem para quê! É...linda! Mas...(toca com os ossos do meio dos dedos) É...é...de...vidro? Como pode ser? E...tem pintinhas a luzir. (Levanta a maçã) Áh! Que espetáculo! É transparente, e tem estrelas. É! São estrelas. (Olha para cima, e vê um céu repleto de estrelas, acompanhadas da Lua, cintilantes). Que céu tão bonito! E esta maçã de vidro reflete estas estrelas?! Deve ser isso. (Vira a maçã em vários sentidos, e vê sempre estrelas refletidas na maçã). Mas, que coisa mais bonita! Como é que isto veio aqui parar? 

- Boa! Reparaste. - diz a árvore 

      O jovem assusta-se: 

- Quem está aí? 

- Estás a olhar para mim. 

- Onde? 

- A árvore onde estava essa maçã! 

- É mágica. Mas quem é que a pôs aí? 

- Isso não interessa! 

- E porque é que ela está aí, ou para quê? 

- Para te lembrar que as estrelas existem, e gostam de ser apreciadas. Há quanto tempo não as vias? 

- Não sei...mas acho que as vejo todas as noite, aqui, quando me deito estado a ti para descansar. 

- Não. Se as visses, saberias que eram estrelas refletidas nessa maçã. 

- É que não estava à espera de ver estrelas numa maçã de vidro! Numa macieira, com tantas maçãs, que vejo todos os dias, e todas as noites, mas nunca vi nenhuma com estrelas. 

- Vês as estrelas, mas não as sentes nos teus olhos, nem no teu interior. 

- Acho que ninguém as sente! Elas estão muito longe. 

- Mas deviam sentir, porque tu também és feito de estrelas, todos são feitos de estrelas. Uns tem as estrelas sempre atrás das nuvens, outros nunca as veem porque estão sempre debaixo de tempestades, outros...uns dias veem-nas, outros dias não veem, e outros, veem-nas numa noite clara, todos os dias, quando vão para a cama, agradecer mais um dia, tudo o que merece ser agradecido, e sonhar. 

- Não sei se percebi o que disseste! 

- Relembra-te das minhas palavras, e perceberás. Vocês andam sempre na Lua, com os pés na terra, sempre a correr, sempre a olhar para coisas que não têm nada de estrelas, nem nada de bonito, nunca olham para o que é realmente especial, é por isso que estão a perder o vosso melhor! 

- Estás a dizer que somos maus? 

- Não...são indiferentes, e distraídos, só reparam no que não interessa. Tu sabes que muitos de vocês também têm maldade que chegue, em vez de estrelas. 

- E temos estrelas? 

- Sim! Nos olhos, no coração, nos atos, nas boas relações com os outros, nos sonhos, nos pequenos gestos de carinho, na voz, no canto, em todo o lado. As estrelas são parte de nós, do que somos! Podes ficar com essa maçã, e sempre que olhares para ela, verás estrelas, podes olhar para o céu, e para essa maçã, para te lembrares quem és. 

- Mas o que é que eu tenho a ver com as estrelas? 

- Isso, só tu saberás responder, olhando para a maçã, e conversando com as estrelas. 

- Que lindo! Mas isso é difícil. 

- Difícil? Não...é só olhares para as estrelas da maçã, e elas dão-te as respostas que procuras. 

- Uau! Todas? 

- Todas...não sei! Não sei quais são as tuas perguntas, mas também não tenho de me meter nesse teu assunto. Só cumpri a minha função...dar-te a maçã de vidro, para veres as estrelas refletidas nelas, e lembrar-te delas. Ao mesmo tempo, para te descobrires...talvez! 

- Terás outras maçãs de vidro com estrelas com outras pessoas? 

- Não sei. Olha para a maçã com estrelas: quando te sentires nervoso, quando estiveres triste, quando estiveres com  dúvidas ou com medo, quando não conseguires dormir, quando te sentires cansado, vazio, desiludido, sem esperança, solitário, sem sonhos e objetivos. E agradece todos os dias, tudo o que achas que deves agradecer. 

- Assim farei! Muito obrigado. Vou descansar. Boa noite, e gratidão pelas tuas maçãs, que são uma delícia, gratidão por esta maçã tão especial. 

- De nada! (sorri a árvore) Boa noite, e volta sempre. 

- Obrigado. Voltarei com certeza! Boa noite. 

     O jovem vai todo feliz, com a maçã de vidro com estrelas, deita-se, põe-na na mesinha de cabeceira, e sorri a olhar para ela. Faz o que a árvore sugeriu, e dorme sossegado, olhando para a maçã de vidro com estrelas, de dia e de noite, sempre que precisava, conversava e via as estrelas.

                                                    FIM 

                                              Lara Rocha 

                                         15/Outubro/2024

E vocês, já viram estrelas? 

Têm esse hábito de olhar para o céu e ver estrelas? 

Gostavam de ter uma maçã de vidro com estrelas? 

Falariam com ela?

Podem deixar nos comentários.

                                                    

quarta-feira, 9 de outubro de 2024

Castelinho de sonho

      



  Era uma vez uma menina que sonhou com um castelinho, mas não era igual aos que ela já tinha visitado com os pais. Este ficava escondido numa floresta, por onde era preciso passar, com pequeninas surpresas. 
    Cascatinhas, borboletas gigantes e cheias de cores, que esvoaçam à frente de quem passa, agulhas de pinheiros pequeninos, e troncos fininhos de árvores que adoram passar carinhosamente pelos cabelos das pessoas, e estas ficam todas arrepiadas, sorriem, riem de cócegas. 
    Passar por árvores que parecem ter olhos e sorrir para os visitantes, sentir um cheirinho tão agradável a mentol fresco, a flores, vê-las aos seus pés, ao lado, na relva, tão grandes e tão bonitas! 
    Ver pássaros e ouvi-los, de todas as espécies a chilrear, cada um com o seu cantar, parece uma sinfonia confusa, a desfilar diante dos olhos. Cada qual o mais bonito, cheio de cores, passam à frente da menina, e ela acaricia-os. 
    A paisagem é encantada, mágica. De repente, ouve uma música alegre, olha para todo o lado, e vê um jovem palhacinho, sorridente, mascarado, a dançar e a tocar, aos pés de uma árvore. 
    Para de tocar, olha para a menina, faz uma vénia, e com um sorriso, estende o braço, convida-a a entrar naquela árvore.
- Olá menina bonita, entra! Muito bem vinda. 
- Olá! Adorei a tua música. Mas entro aí na árvore? Como?
    E o palhacinho tira uma chave dourada do bolso. A árvore está cheia de fechaduras. 
- Tanta fechadura! Qual é a que pertence a esta? 
- Experimenta. 
- O que tem lá para ver? 
- Verás! 
- Mas... 
- Experimenta.
    A menina fica preocupada, experimenta várias fechaduras, que não abrem, até que uma delas abre. 
- Boa! Conseguiste...agora...fica à vontade! 
- Tu não vens comigo? 
- Não! 
- Mas, porque não? Como é que eu me oriento ali dentro? 
- Não precisarás de ninguém para te orientar. Quando entrares, saberás. É para explorar! Vais adorar. 
- Obrigada… 
    A menina entra, com medo, e começa a explorar todo o local. A entrada é uma gruta, cheia de cristais, uns transparentes, outros coloridos, tem um pequeno lago, com água a borbulhar, transparente, com peixes de vários tamanhos e cores. 
    Por cima dela, lindos candeeiros com uma boa luz, e outros que variam a intensidade das luzes, as cores: umas mais fortes, outras mais suaves. 
    Ela fica surpresa, encantada, solta grandes exclamações, e sorri. 
- Áh! Que lindos. 
    De repente, olha para o lado e dá um grito, porque vê um bando de morcegos pendurados, a dormir, enrolados nas suas asas. 
- Que coisa horripilante é esta? 
    E desata a correr, por um corredor, com armários, até uma sala, luxuosa, onde se senta numa cadeira poltrona de cor azul, macia, de veludo, para recuperar o fôlego. 
     Na sala havia uma mesa, com cadeiras e uma varanda. 
- Deve morar aqui alguém…! Que cadeira tão bonita, macia...confortável. Será a casa daquelas criaturas nojentas, penduradas? 
    Ouve uma voz: 
- Estás enganada! Aquelas criaturas horripilantes, são morcegos inofensivos, a dormir. Não é deles, eles estão aqui, porque são nossos amigos. 
- Quem está a falar?
    Aparece à sua frente, uma menina de cabelos longos, da sua idade, e do seu tamanho, a sorrir. 
- És tu que moras neste castelo? 
- Sim. Anda conhecer o resto!
- Mas aquele palhacinho que toca lá fora, dá a chave a toda a gente? 
- A toda a gente não! Só a quem ele sente que é uma boa pessoa. É que sentimo-nos muito sozinhos, e adoramos receber visitas de pessoas especiais, como tu. 
- Onde está a tua família? 
- Está ali. 
    A menina dá-lhe a mão, abre a varanda da sala, e leva-a para um belo jardim, onde estão os pais e os irmãos, a apanhar sol, confortavelmente deitados em colchões, sorridentes.  
    Os cães da família, que correm atrás das bolas das crianças, brincam uns com os outros, aproximam-se dela, cheiram-na, ela faz-lhes carinhos, e eles lambem-na eufóricos. Ela ri-se. 
- Eu gosto muito de cães! Tão fofinhos, estes. Também tenho cães. 
    Dão as boas vindas à menina visitante, de forma tão carinhosa como se fosse família. Conversam com ela, os irmãos e a menina convidam-na para dar um mergulho na piscina de água quente, tão bonita, tão agradável, que borbulha como um jacusi, não dá vontade de sair de lá. 
    Saltam, brincam, riem, conversam umas com as outras, com brinquedos, mergulham, e chega um grupo de senhoras, muito simpáticas, que trazem a comida. 
    Um banquete, que ela nunca tinha visto, tudo com um ar delicioso, dizem para ela comer tudo o que lhe apetecesse. Ela agradece. 
    Depois da barriguinha cheia e muita diversão, mostram-lhe o resto do castelo, com quartos grandes, mobiliário muito bonito, varanda, com vista para as montanhas distantes, muito altas, algumas com neve nos picos, e para a floresta.
    Cada quarto tinha fotografias, luzinhas de presença que se ligava antes de dormir, em forma de estrelas, como se estivessem no espaço. 
    Cada um com a sua casa de banho privativa, luxuosa, as camas confortáveis, bonecos e brinquedos no quarto dos mais pequenos, livros, secretárias, armários com roupas, e tudo muito bonito. 
    De repente, percebem que se está a formar uma tempestade, e avisam a menina para voltar para casa dela, guardar a chave, e seria sempre muito bem vinda àquele castelinho. 
- Uma tempestade? Mas estava um dia tão bonito, tão quente! 
- Pois estava, mas aqui é mesmo assim, de repente, tudo muda, e as tempestades visitam-nos. 
    A menina agradece, acompanham-na até à porta, a conversar alegremente, abraçam-se, dão dois beijinhos, desejam boa viagem, e que chegasse a casa antes da tempestade. 
    Ficou prometida uma nova visita, deu um abraço ao palhacinho que lhe deu a chave, e no sonho, quase a chegar à sua casa, a menina percebeu que também se estava a formar uma tempestade. 
    Na realidade acordou com um grande e estrondoso trovão, e uma grande chuvada. Ela acorda assustada, os pais vão ao quarto dela, e veem-na sentada na cama. 
- Então filha, dormiste bem? - pergunta a mãe 
- Sim! Vim agora da floresta, ainda bem que cheguei a casa antes da tempestade. Lá na floresta também se estava a formar, por isso é que acharam melhor que eu viesse embora antes da tempestade. Afinal, aqui também vai haver uma tempestade.
- Sim, já começou! - diz o pai 
- Mas qual floresta é que estás a falar? - pergunta a mãe 
- A floresta que visitei, tinha coisas muito bonitas, uma paisagem mágica, borboletas gigantes, pássaros de todas as espécies, cores, passei lá umas horas muito boas, com um palhacinho muito simpático que tocou uma música, deu-me uma chave dourada, para eu experimentar num monte de fechaduras e ver qual abria. 
    Abriu uma, e conheci um castelo tão bonito, com pessoas tão simpáticas, animais, comi petiscos deliciosos, brinquei muito com eles, os cães eram uma fofura. Os quartos eram todos bem decorados, as paredes tinham estrelinhas que acendiam à noite. Adorei! 
- Mas não te vimos, nem ouvimos sair... - comenta o pai a rir 
- Óhhhh...foi um sonho? - pergunta a menina desiludida e triste? 
- Sim! Estás na tua cama, no teu quarto...- diz a mãe 
- Óh!
- Acordaste com o trovão, não? - pergunta o pai 
- Sim. Pensei que foi verdadeiro! Foi tão bonito. - comenta a menina 
- Claro! - dizem os pais 
- Mas foi só um sonho. 
- Eu queria que tivesse sido verdadeiro...! - diz a menina triste 
- Esquece o sonho, a noite já acabou, o sonho foi com ela. Vá, vamos tomar o pequeno almoço, e fazer outras coisas, porque hoje não dá para ir lá para fora. - diz o pai 
- Está bem. - diz a menina triste 
- Podes escrever esse sonho, se foi assim tão bonito! - sugere a mãe a sorrir 
- Tu também escrevias os teus sonhos?
- Alguns. 
- Boa ideia. - diz a menina a sorrir 
- Mas primeiro tomamos o pequeno almoço. - lembra o pai 
- Está bem. 
    A menina levanta-se, e vai com os pais para a cozinha. Tomam o pequeno almoço, conversam alegremente, e fora de casa, a tempestade continua. 
    No fim do pequeno almoço, a menina segue a sugestão da mãe: escreve o sonho, sorridente. 

E vocês, se fossem passear por uma floresta, como esta menina, como seria? 
O que viam pelo caminho? 
Tinham um palhacinho à vossa espera? 
Ele dava-vos a chave? 
Seria dourada? 
Como seria a entrada do castelo, e todo o seu interior? 
Podem imaginar como quiserem, e deixar nos comentários. 

                                       FIM 
                                  Lara Rocha
                                 9/Outubro/2024