Era
uma vez um pintor que decidiu isolar-se, fechar-se para o mundo, e viajar por
sítios onde nunca antes tinha ido, para conseguir novas ideias. Percorreu
muitos quilómetros, e por onde passou reparou sempre em alguma coisa diferente,
que nunca antes tinha visto. Levou consigo roupa, bebida e as suas inseparáveis
folhas, tintas, e lápis. Desenhou e pintou tudo o que viu pelo caminho.
Parou em sítios diferentes para dormir, e comer, e seguia
caminho de manhã cedo. Pintou o céu cheio de estrelas que viu numa noite, antes
de adormecer, o nascer do sol, o entardecer, animais com quem se cruzou no
caminho e outras imagens que lhe surgiram na mente.
Andou muito, e em
cada sítio onde parou, descobriu um pedacinho de si que ele não conhecia.
Quando chegou a um sítio deserto, com muito calor, abrigou-se à sombra, e
apreciou a paisagem.
- Não tem nada aqui!
Fechou os olhos, e sorriu. Só queria mesmo era descansar.
Dormiu, e enquanto dormia, sonhou. Acordou ainda de noite, bebeu água e pintou
o seu sonho. Voltou a dormir, e mal ele sabia que estava a ser observado.
A lua era gigante, e tinha uma luz incrível. Ele abre os
olhos e vê a lua.
- Lua? Áh! Que linda! - Diz
ele.
- Sim, sou eu. E tu quem és?
- Ando à minha procura… não
sei bem quem sou.
- Mas porque andas à tua
procura? Estás inteiro.
- Pareço inteiro, mas na
verdade…acho que muitos pedaços de mim, andam por aí espalhados.
- Porquê?
- Nunca ninguém é todo
completo. Falta sempre algum pedaço.
- Como assim?
- Parecemos inteiros, mas no
nosso coração faltam muitos pedaços…quando nascemos, ele está inteiro. Quando
vamos crescendo, ele vai-se despedaçando.
- Áh! Que pena. E porque é
que isso acontece?
- Porque sofremos
desilusões, ou porque nos magoam.
- Hum…acho que sei do que
estás a falar.
- Durante muito tempo
dediquei-me a uma pessoa que me fez esquecer de mim mesmo. Dei-lhe tanto
amor…mas ela destroçou-me, ficou com milhares de pedaços meus.
- E não te devolveu?
- Não!
- Mas devias obrigá-la a
devolver.
- Isso não é possível. Um
coração não é uma coisa, um objecto, feito de um material que se partir tem
concerto.
- Como é que deixaste?
- Infelizmente não podemos
fazer nada para mudar isso.
- Estás a falar de um
desgosto de amor…certo?
- Sim. Como é que sabes?
- (ri) Quantas vezes ouço
lamentações e dores de amor.
- Áh! Então já sabes do que
estou a falar.
- Sim.
- Sentimo-nos
vazios…sentimos a falta dos pedaços que ficaram com a outra pessoa. E ela não
nos devolve.
- Sim, eu sei.
- Fiz uma caminhada, para
ver se encontrava os pedaços que me faltam.
- Áh sim? E conseguiste?
- Alguns…mesmo assim, ainda
me faltam.
- Pode ser que os encontres
aqui.
- É! Olha, desculpa, estou
muito cansado…vou dormir.
- À vontade. Estou sempre
aqui.
Ele adormece, e a Lua fica a
admirá-lo. Um pedaço dela separa-se de si e cai à beira do rapaz. Na verdade
ela estava a gostar dele, mas sabia que aquela relação nunca seria possível,
porque ele era humano e ela era lua. Aquele pedaço que lhe caiu era um
pedacinho do seu coração que tinha acabado de ficar triste, e também seria uma
companhia para ele.
Quando ele acorda, já de manhã, vê que a lua tinha
desaparecido, e que era dia. Pintou a bela lua que tinha visto nessa noite, e
suspirou:
- Quem me dera que fosses
uma mulher…serias tão linda, se fosses uma mulher…e se calhar encontraria em ti
todos os pedaços que me faltam.
E desenha uma bela mulher dentro da enorme lua. Nessa
noite, a Lua voltou a aparecer, linda e enorme. Ele sorri-lhe:
- Olá! Deixaste um presente
para mim?
- Sim! (sorri) Gostaste?
- Adorei. Também tenho dois
presentes para ti.
- A sério?
- Sim. Olha…
Ele mostra-lhe as duas pinturas.
- Áh! Que lindas pinturas. E
eu…sou eu! Áh! Mas estão perfeitos… e essa rapariga que está aí, era a que
ficou com os teus pedaços?
- Não! Esta…talvez seja quem
tem todos os pedaços que me faltam.
- Uau! É linda. E existe?
- Não sei…gostava que sim.
- Porque é que achas que ela
teria os teus pedaços?
- Não sei se tem…nem sei se
ela existe, mas…foi apenas uma bela mulher que me surgiu na mente.
- Gostavas de a encontrar?
- Gostava.
- Fecha os olhos…
Ele fecha os olhos e da Lua cai outro pedaço, em forma de
mulher, igual à que o rapaz tinha pintado na Lua.
- Já posso abrir?
- Já.
Ele olha e diante dele, está a mulher que ele pintou.
- Áhhh…mas o que é isto?
- Sou eu.
- És igualzinha à que eu
pintei. Onde estavas?
- Ali…
- Mas…o que fazes aqui?
- Foste tu que me chamaste!
- Áh! És tu que tens os
pedaços que me faltam?
- Quem sabe!
- Como saberei?
- Olha para os meus olhos…
- São lindos!
- Obrigada, os teus também.
Mas olha mais…
O rapaz mergulha nos olhos da mulher lua e consegue
descobrir coisas maravilhosas.
- Sim…és tu quem tens os
pedaços que me faltam.
- Encontraste-os?
- Sim, nos teus olhos.
- Boa.
Ele estende-lhe a mão, segura na mão dela, e diz:
- Fica comigo para sempre…eu
preciso dos pedaços que encontrei nos teus olhos.
Ela sorri. Cai aos pés dos dois, outro pedaço de lua, que
se abre e de lá de dentro, sai uma explosão de luz, cheias de cor, envolve os
dois, e abraçam-se carinhosamente. Conversam, ele pinta uma bela imagem, trocam
um beijo e ao amanhecer, a Lua dá um enorme, sonoro e luminoso beijo aos dois
que estão a conversar.
- A amizade entrou,
agora…Deixem o amor entrar! Quando ele quiser, ou quando ele entender que pode
entrar. Alimentem-no, cuidem-no e protejam-no todos os dias, com dedicação,
respeito, carinho, diálogo, amizade, fidelidade e liberdade. – Diz a Lua
- Obrigada. – Dizem os dois,
felizes
- Olha por nós. – Pede o
rapaz
- Sim, olharei sempre por
vós. – Garante a Lua
A Lua derrete, desaparece e a mulher acorda ao lado do
rapaz que dorme. O rapaz acorda sobressaltado e grita:
- Lua…
A rapariga acorda, olha para ele.
- Isso é maneira de acordar?
- Desculpa. A lua estava a
derreter…
- O quê?
- Dormimos juntos?
- Parece que sim…e depois?
- Nada.
- Acho que estava a
sonhar…mas tu és-me familiar…
(Ela sorri)
- Sou aquela que tem os teus
pedaços…que encontraste no meu olhar.
- Áh! Claro que sim. Tu
existes mesmo…?
Ele confirma na pintura.
- Sim, és mesmo tu! Como é
que apareceste aqui?
Ela sorri, e ele retribui o sorriso:
- Já sei...fui eu que te
pintei.
- Sim, mas foi ela que me
enviou para ti…e agora vai cuidar sempre de nós. Eu sou um pedacinho dela.
Os dois sorriem, abraçam-se, e ele regressa para casa,
com o pedacinho de lua que tinha todos os pedacinhos que lhe faltava.
FIM
Lálá
(27/Fevereiro/2015)
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