Era uma vez uma mulher
misteriosa, que tinha poderes especiais, como…conseguir voar, e transformar-se,
dividir-se em milhares, e nunca deixar de ser mulher. Era linda, e jovem, muito
atraente, usava roupas que chamavam a atenção, com cores vermelhas, amarelas,
cor-de-laranja, e cores fortes, misturadas, mas ninguém imaginava o seu poder.
Estava escondida debaixo
daquela beleza, uma mulher que se transformava: umas vezes em fogo, soltando
labaredas assustadoras, que queimavam campos…outras vezes, em chamas
pequeninas, quando beijava os homens que se deixavam levar pela sua beleza, e
outras vezes…quando estava com raiva, criava vulcões…quando estava cansada, era
apenas…fumo.
Por ser tão misteriosa e tão
bonita ao mesmo tempo, despertava inveja em muita gente, que a contratava para
se vingar de alguém, e ela adorava isso. Sentia-se grande e poderosa, o seu
fogo crescia, e ela ficava feliz. Mas às vezes, a mulher fogo, também ajudava.
Foi
o que aconteceu, quando passeava na escuridão da noite, sem pressa, vestida de
vermelho, com os cabelos ao vento, por um bairro isolado numa montanha, de
difícil acesso, com muitas casinhas pequeninas, mas graciosas, que mais parecia
um reino de anões.
-
Huummm…que estranho…está tudo muito silencioso. Ainda não é alta noite! Parece
que não vive cá ninguém! – Diz a mulher fogo.
Um mocho, pousado na árvore mais
velha do bairro, também encantado com a sua beleza, saúda-a:
- Desculpa,
bela mulher...boa noite!
- Olá,
boa noite! – Responde a sorrir.
-
Sozinha por aqui? – Pergunta o mocho surpreso
- Sim,
e qual é o problema?
- Pode
ser perigoso, uma mulher…tão bonita…desculpa a minha ousadia…mas é
verdade…sozinha por aqui…! Não devias fazê-lo.
- (ri)
Porque não? Tu também estás sozinho, certo?
-
Sim…mas este é o meu trabalho…estar de vigia, de noite! E tu, o que fazes por
aqui?
- Não
sei qual é a tua surpresa, de me veres aqui…eu não tenho medo!
- Não
se trata de ter medo, mas na escuridão, muita coisa pode acontecer, ainda por
cima, uma mulher sozinha!
- Já
estou habituada a andar sozinha.
- O que
fazes?
-
Sou…muita coisa!
- Como?
- Sim…sou…
-
És…misteriosa!
-
Exactamente! – Sorri.
- Já
percebi que não queres responder.
- É que
o meu trabalho…é muito diferente dos outros…do teu...eu…não trabalho…
propriamente.
- Bem,
acho que é melhor mudarmos de assunto! Estás aí a enredar…não faz mal…fica à
vontade! Eu também não tenho que me meter. Vai com cuidado e atenção, está bem?
- Está
bem…! És um verdadeiro cavalheiro.
-
Não…sou mocho!
- (ri)
O que eu quero dizer, é que és muito delicado!
- Áhhh…
(ri) Sim…! Sou mesmo. Pensei que me estavas a chamar alguma coisa…!
- Não!
Olha, já agora…já vives aqui há muitos anos?
- Sim!
Desde que existo…não sei há quantos, acho que desde que nasci.
- E
gostas do que fazes?
- Sim!
- Não
te sentes sozinho?
-
Muitas vezes! Mas não me canso muito.
- Isto
é um sítio sossegado não é?
- É!
Geralmente sim.
-
Geralmente? Não é sempre?
- Pode
dizer-se que às vezes há algumas…lutinhas…! Os habitantes peguinham uns com os
outros, discutem, zangam-se…mas a seguir estão bem. Deve ser para quebrar o
isolamento.
- Sim,
isto é realmente muito isolado! Mas…onde estão os habitantes?
- Nas
suas casas…! Estão a dormir…ou…bom…não sei se estarão mesmo a dormir, não estão
na casa deles, mas pelo menos estão recolhidos.
- A
esta hora?
- Sim.
-
Levantam-se muito cedo para trabalhar?
- A
maior parte deles, levanta-se com os primeiros raios de sol, mas também vão para
a cama assim que escurece.
-
Mas…que tristeza…não fazem serões cá fora…? Com esta temperatura tão agradável?
-
Não…têm medo do escuro.
- Medo
do escuro…? Mas…então…ligam as luzes, não…? É para isso que elas servem.
- Aqui
não há uma única luz…a não ser de dia, com o sol…e à noite, com a lua. É por
isso que eles têm as persianas levantadas.
- Mas,
como é que não há uma única luz…? Toda a gente tem luz…por onde passo, vejo luz
em todo o lado.
- Aqui
não chega a luz.
- Que
tristeza…! Nem um único candeeiro a petróleo…ou uma vela que seja?
- Não,
nem isso. Acho que eles nem conhecem tais coisas.
- Como
é possível?
- Não
sei. Sei que é assim.
- Não
posso acreditar!
- Mas
acredita que é verdade.
- Que
horror…! Olha…vou dar por ai uma volta…até já.
-
Queres que te acompanhe?
- Não,
obrigada.
- Não
tens luz…
-
Tenho. Eu arranjo, não te preocupes.
- Está
bem…tem cuidado contigo. Se precisares de mim, grita.
- Eu
sei que estás de vigia…obrigada.
E a mulher estende uma mão, de onde
sai uma chama grande. Pega num pau que vê no chão e coloca lá a chama.
-
Vamos, meninas!
Ao
lado dela seguem mais chamas em forma de mulheres. O mocho fica em estado de
choque ao ver aquilo. Ela segue caminho, pensativa. Outra chama que segue ao
lado dela sugere:
-
Amiga…nós ouvimos bem…? Aqui…não há uma única luz…?
- Sim!
É verdade…! – Responde a mulher.
- Como
é possível? – Pergunta outra chama.
- Que
tristeza! – Respondem em coro.
- As
pessoas devem ser muito infelizes…! – Comenta outra chama.
- Com
certeza! Acho que devíamos fazer alguma coisa! – Comenta a mulher.
-
Claro! – Respondem em coro.
-
Acendemos candeeiros, com a nossa passagem pelas portas. – Sugere a mulher.
- Sim,
claro…! – Respondem em coro.
-
Preparadas? – Pergunta a mulher.
- Sim…-
Respondem em coro.
-
Um…dois…três…! – Grita a mulher.
A
mulher e as suas chamas percorrem toda a aldeia, dançam, rodam à volta dos
candeeiros e acendem-nos com as suas chamas. Dão as mãos, e sopram para os
cabos de alta tensão, e o seu calor transforma-se em electricidade, que vai dar
luz dentro das casas, e nas televisões. Toda a aldeia fica cheia de luz, em
tudo o que é candeeiro, e dentro das casas. As chamas estão felizes, e o mocho
está maravilhado.
Um
dos habitantes vai à janela e vê tudo iluminado. Grita:
- Ai…socorro…estamos
cercados de lume! Socorro, ajudem-nos…está tudo a arder.
Os habitantes acordam sobressaltados
com os gritos do senhor, e vão ver o que se passa, muito assustados.
- O que
foi…? – Perguntam em coro.
- Ai…o
que é isto? – Pergunta uma senhora.
- Está
tudo em chamas! – Responde outra senhora muito assustada agarrando-se aos
filhos.
- O que
é isto, mamã? – Pergunta um menino assustado.
- Ai…é
o fim do mundo, mamã…! – Diz uma menina assustada.
- Ai,
não digas isso… - Diz outra menina a chorar.
- Óh,
quem é que fez isto…? Ai, mamã…que medo! – Diz outro menino muito assustado.
- Temos
de fugir…! – Grita outro senhor assustado.
- Para
onde…? – Perguntam todos.
- Ai…ai…ai…Ai,
que vai tudo derreter… - Grita uma senhora velhinha.
- Quem
é que fez esta judiaria…? – Pergunta outro senhor velhinho.
- Áh,
bandidos, se vos apanhamos… - Acrescenta outro senhor velhinho.
-
Malditos… - Gritam em coro.
- Vamos
já apagar isto…antes que chegue à casa. – Grita um rapaz.
-
Calma! – Grita o mocho.
Calam-se todos.
- Como
é que deixaste que isto acontecesse? – Pergunta um jovem, nervoso.
- Que
espécie de vigilante és tu…? – Pergunta outra velhinha.
-
Deixaste que chegassem fogo a isto tudo…? – Pergunta outra velhinha muito
zangada.
- Nós
confiamos em ti, para tu nos protegeres, e tu deixas que cheguem fogo à nossa
aldeia? – Pergunta outro rapaz zangado.
- Tu és a nossa luz, os nossos olhos…e deixas
que façam isto? – Pergunta uma rapariga.
- (suspira
e fala calmo) Importam-se de me ouvir por favor? – Pergunta o mocho.
- Como
é que te atreves a falar com essa calma toda? – Pergunta outro senhor.
- Tudo
a arder à nossa volta, e tu…assim…como se nada tivesse acontecido…claro, não
foi na tua casa… - Comenta outro rapaz.
- Posso
falar? Por favor… - Pede o mocho calmo.
Começa
tudo a discutir, e a insultar o mocho, a tentar bater-lhe. Ele grita:
-
Calem-se! Por favor…! Deixem-me explicar…e deixem as minhas penas em paz…! –
Grita o mocho nervoso.
Todos se calam, surpresos.
- Vamos
ouvir o criminoso! – Diz um senhor muito zangado.
-
(suspira e fala calmo) Obrigado…! Isto à vossa volta não é um incêndio…nada vai
derreter, nada está a arder…ninguém fez judiaria alguma, ninguém quer acabar
convosco…! É uma coisa que nunca tiveram, mas sempre quiserem ter…! – Explica o
mocho.
- O
quê? – Perguntam todos muito surpresos.
-
Respirem…e em vez de me chamarem criminoso…pensem um bocadinho sobre o vosso
maior desejo! Naquele, em que falam todos os dias, e aquele que todas as
noites, os vossos filhos pedem às estrelas. – Diz o mocho.
Faz-se silêncio.
- O meu
maior desejo era…termos luz! – Diz uma menina.
- Ora…!
Eis que depois de tanto pedirem…as estrelas atenderam ao vosso pedido. Tudo isto…é
luz. (grita) Luz…! Desde sempre muito desejada…e nunca antes aqui instalada. Hoje…finalmente…a
luz chegou à aldeia. Experimentem nas vossas casas…os interruptores, as
televisões, os rádios… finalmente…há luz por todo o lado…como há luz em
qualquer outra cidade! – Explica o mocho.
Todos
soltam exclamações, e grandes sorrisos, e respiram de alívio.
- Luz…! Luz…! - Gritam todos felizes.
- Áhhh…que
lindo! – Suspira uma senhora velhinha, sorridente.
- Como
é que isto aconteceu? – Pergunta outra senhora velhinha.
Mas o mocho não desfaz o mistério da
mulher chama. Há sorrisos, brilhos nos olhares, e algumas lágrimas de felicidade
em todos os rostos. O mocho sorri, e a mulher chama e as outras chaminhas,
apreciam felizes, sorridentes, chocam as mãos e festejam ao ver aquela
felicidade toda. Elas próprias estão encantadas ao ver a aldeia cheia de luz.
- Foram
as estrelas! – Diz o mocho com um leve sorriso.
-
Maravilhoso! – Dizem em coro, maravilhados, e sorridentes.
- Muito
obrigada, estrelinhas… - Dizem as crianças em coro, felizes a olhar para as
estrelas.
- Foi
um milagre! – Gritam os velhinhos felizes, e sorridentes.
-
Milagre! Milagre…óh…céus…muito obrigada… - Agradece uma velhinha feliz.
- De
certeza que não apareceu ninguém por aqui, mocho? – Pergunta outro menino.
- De
certeza…não apareceu mesmo ninguém, rapaz! Eu fiquei tão espantado como tu…! E acredita
que também me assustei quando vi esta luz toda! – Diz o mocho, seguro.
As chamas riem baixinho.
- Vamos
festejar… - Sugere uma velhinha feliz.
- Boa! –
Gritam todos.
-
Perdoa-nos mocho…! – Pede outro senhor.
- Sim,
desculpa…não fomos correctos contigo! – Acrescenta outro senhor velhinho.
- É verdade! – Respondem todos.
- Tu és
o nosso vigilante, ficas as noites acordado, e nós ainda te maltratamos com
palavras, e a querer bater-te…que injustos que fomos… Perdoa-nos! – Diz outra
senhora velhinha.
- Sim,
fomos precipitados porque ficamos muito assustados…! Pensávamos que era um incêndio…-
Explica uma senhora, mãe de três crianças pequenas.
- Não
faz mal! Eu compreendo…se estivesse no vosso lugar, também seria capaz de
reagir assim…ou ainda pior…! Às vezes também me assusto. E pareciam incêndios,
mesmo. O que importa agora, é que têm luz, finalmente, por todo o lado, em toda
a aldeia, na rua, nas vossas casas…a partir de hoje, a vossa vida será muito
diferente! Têm mesmo é que festejar, e ficar muito felizes! Eu também estou! –
Explica o mocho.
- Sim! –
Gritam todos felizes, e aplaudem sorridentes.
- A
nossa vida vai ser muito melhor, a partir de hoje. – Concorda outro senhor
velhinho.
- Ai…estou
tão feliz! – Comenta outra velhinha, sorridente e feliz.
E
todos os habitantes, percorrem toda a aldeia, maravilhados, a olhar para cada
candeeiro com luz, e falam sobre as diferenças na paisagem, no chão…em todo o
lado.
Fazem novas descobertas, soltam
grandes exclamações, e sorrisos. Entram em casa, e experimentam todas as luzes,
tudo funciona…e todos aplaudem.
Nessa noite, mais ninguém dorme
com a felicidade do acontecimento…a chegada da luz. E a partir desse dia, toda
a vida da aldeia mudou…nunca mais foi a mesma…as pessoas faziam serões com
cantares e convívios nocturnos, com as luzes da rua, e dos campos, deixavam as
luzes de casa acesas, viam televisão, ouviam rádio…faziam trabalhos artesanais
à noite enquanto conviviam, e riam…iam para os campos de noite, porque havia
luz…a aldeia ganhou uma nova vida.
As chamas também passavam por
lá em forma de lindas mulheres, para absorver e deliciar-se com a felicidade
dos habitantes, dançando com eles, e convivendo alegremente. E no frio, elas
acendiam as lareiras aos habitantes, com os seus sopros de chamas, sem que os
habitantes se apercebessem…eles achavam que eram obras dos deuses…prémios,
pelos seus trabalhos e bons sentimentos!
O mocho era o único que sabia
quem elas eram, e o único que sabia que tinham sido elas que levaram luz àquela
aldeia. Trocavam olhares cúmplices, e felizes, e também conviviam e aqueciam o
mocho.
A luz faz muita falta na nossa
vida, mas às vezes só nos lembramos da sua importância, quando ela nos falta
por qualquer motivo. E que tal, se agora, no fim desta história de magia e
poderes especiais, nos lembrássemos da luz que temos todos os dias, e agradecêssemos…mentalmente…cada
um à sua maneira…ou…com um grito colectivo: «OBRIGADA/O»! Luz do olhar, Luz do
coração, luz dos sentimentos, luz dos sorrisos, luz da saúde, luz da
felicidade, luz das estrelas, luz do sol…luz da lua…luz da água, luz da paz…
VIVA A LUZ! Viva qualquer tipo de
luz…!
FIM
Lálá
(14/Agosto/2013)
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