Era uma vez um ser
gigante, que sobrevoava muitas cidades. Quer dizer...na verdade ele não era
assim tão gigante!
Só parecia, porque quando o viam ele estava muito esfomeado,
como só conheciam a sua sombra e os barulhos que fazia, imaginavam-no com um
tamanho assombroso, uma bocarra enorme, garras e patas que impunham respeito.
Mas
ao aterrar para ir buscar comida, ninguém pensava que ele era a figura escura
que viam, porque tinha um tamanho normal, não passava de um gato grande.
Como é
que ele parecia tão gigante, ninguém sabe explicar. Talvez fosse a sua fome,
que o tornava muito maior do que era na realidade.
Mesmo assim, ele continuava a assustar, porque
a sua fome não era bem de comida. Corria atrás das pessoas, e todos gritavam,
porque pensavam que ia atacá-los, ou comê-los. O pequeno gigante não entendia
porque todos fugiam dele.
Um
dia, o sábio da aldeia, farto de queixas desse ser assustador, pediu para ser
chamado quando esse tal monstro aparecesse que ele queria vê-lo. O sábio não
acreditava que fosse um monstro, havia alguma coisa que lhe dizia que as
pessoas estavam a exagerar.
E
assim foi. Quando o terrível monstro imaginário voltou a aparecer, todos os
habitantes gritaram. O sábio apareceu. O gigante ficou assustado, e tremia,
branco, com o medo.
- É ele! - Gritam todos
- Cuidado! - Recomenda um vizinho
- Ele é perigoso, olhe que tem
máscaras e tudo, porque quando o vemos aqui por cima é enorme e ruidoso, aqui
em baixo é esta amostra.
- Não se deixe levar pelo ar
dele... é falso.
- Calem-se! Vão para as vossas
casas. Eu quero ficar a sós com ele.
- Mas... - dizem todos surpresos
- Eu já disse. Vão para casa.
- Mestre...
- Casa! - Ordena o sábio
- Veja lá!- Alertam todos
- Casa. - Diz o sábio firmemente
- Se precisar...
- Vão!
Todos se retiram,
com medo, e o gigante ainda com mais medo. O sábio olha-o de cima a baixo.
Suspira, fecha os olhos, fica em silêncio uns segundos e dá uma
risadinha...depois... solta uma valente gargalhada, que quase congela o
gigante.
- Óh, pequeno...desculpa a minha
gargalhada! - Diz o sábio
O gigante está
quase congelado com o medo
- Então... tu... é que... (outra
gargalhada) és o...tal monstro... que sobrevoa a cidade e ataca?
- Ah... sou? Talvez... não sei,
acho que é o que dizem para aí.
O sábio dá outra
gargalhada
- Muito gosto em
conhecer-te...(gargalhada) tenebroso gigante.
- Não se ria para ele! - grita uma
voz dentro de uma janela
O gigante ri
nervoso.
- Onde está o teu gigantismo? -
pergunta o sábio a rir
- Não sei porque dizem que sou
gigante.
O sábio ri:
- A cabeça desta gente inventa cada
uma...é o medo do desconhecido que desperta a imaginação!
- Áh! Não sei o que é isso. Mas...E
o senhor não tem medo de mim? Está-se a rir?
- Não! Claro que não tenho medo de
ti. Sei que és do bem!
- Como é que sabe?
- Sei! O que fazes por aqui?
- Estou esfomeado... vim à procura
de comida.
- Comida...? Huuummmm... mas não é
uma comida qualquer, como a nossa pois não? - pergunta o sábio
- É. - Diz o gigante
- Não é! Sentes fome?
- Sinto!
- Fome de comida?
- Sim.
- Não!
- Então... eu é que sei como está a
minha barriga. Está vazia.
- Certo...mas... e a tua alma está
alimentada?
- Está... - Diz o gigante, triste
- De quê?
- De... da comida que lhe dou.
- Vá lá... tu sabes que não é desse
tipo de comida que estou a falar.
- Não?
- Claro que não! Tu vens à procura
de comida para a tua alma! Queres saciar a tua fome de carinho, amizade, amor,
atenção, afeto, risos... companhia... não é?
- É? - Pergunta o gigante muito
surpreso
- É! E tu sabes muito bem do que
estou a falar!
O
gigante faz silêncio e olha para o chão.
- Porque é que toda a gente diz que
sou gigante?
- De facto não és assim tão grande
em tamanho, mas as pessoas vêem o tamanho da fome da tua alma, com o tamanho
dos ruídos que fazes, e por correres atrás deles.
- Mas eu não corro atrás deles para
lhes fazer mal.
- Certo, mas eles não sabem da fome
da tua alma. Tu só transmites a fome interior...que eles não conhecem! Como é
gigante a tua fome! Toda a gente tem fome...as mesmas fomes que tu...a do corpo
e a da alma, mas só conhecem a do corpo. Se conseguissem ver a da alma, tudo
seria diferente.
- E porque é que eles não conseguem
a fome deles...?
- Há muitas coisas que não os deixa
ver essa fome interior deles...
- Como é que eu posso matar a minha
fome...?
O sábio suspira.
- Deixa-me pensar um pouco, por
favor. Enquanto isso, podes vir a minha casa.
O sábio entra em
casa com o gigante, os dois conversam durante muito tempo, enquanto tomam chá.
O Sábio decide fazer um baile com todos os habitantes, a que chamou: baile dos
gigantes, e apresenta o gigante.
O sábio fala da
fome interior, e todos deixam escapar algumas lágrimas, quando reconhecem que
também eles têm um gigante dentro deles, ruidoso e faminto de amor, de atenção,
carinho, afeto, diálogo, amizade, companhia.
Nesse dia todos os
gigantes esfomeados se encontraram, partilharam afetos, abraços, carinhos,
amizade, conversaram, acolheram o gigante, pediram desculpa, e encheram-no de
carinho. Ele não podia estar mais feliz, e passou a ser mais um daquela cidade.
Somos cada vez
mais, gigantes esfomeados de valores, de amor, de amizade, dos outros, embora
tenhamos medo de nos aproximarmos. Há muitos fatores que não deixam ver os
gigantes uns dos outros, se não, veríamos que afinal somos mais iguais na nossa
essência, do que alguma vez imaginamos, e por muito diferentes que sejamos, não
deixamos de ser... gigantes esfomeados!
FIM
Lara Rocha
9/Outubro/2018
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