Era uma vez um pincel que estava
mergulhado na água com um produto, para tirar os pedaços de tinta depois do
trabalho. A função dos pincéis é trabalhar…transferir para o papel os
sentimentos, emoções e pensamentos, desejos e sonhos…do pintor.
Os
pincéis dançam, rodam, sobem e descem, vão para a esquerda e para a direita,
fazem círculos, quadrados, triângulos, e formas misturadas, como o pintor
decide.
Umas
vezes trabalham mais, outras vezes trabalham menos, conforme as ideias do
pintor, mas não são nada sem as tintas. O pintor escolhe as cores, mistura, usa
uma de cada vez, ou várias de cada vez, o pincel adora acariciá-las, escorregar
pelas telas e folhas grandes.
Este
pintor estava tão louco, eléctrico que pintou durante toda a tarde, em que
chove torrencialmente. Nasceram uma série de quadros nessa tarde, e o pobre pincel
estava mesmo muito cansado, ainda via tudo a andar à roda quando parou.
Mesmo
depois de tanto quadro, o pintor ainda queria pintar outro, mas não tinha mais
ideias. Então, decidiu ir para a varanda da marquise, ver chover, e para ver se
ganhava novas ideias. Enquanto olhava para a janela, quase vencido pelo
cansaço, instalou-se no cadeirão, cobriu-se com uma manta, e sem dar por isso,
o cinzento das nuvens, e a escuridão, tomaram conta dele. Adormeceu e sonhou…
Enquanto
o pintor dormia, os dois gatos ficaram no quarto, com o pincel e as tintas, a
apreciar os quadros. Tinham ficado todos muito bonitos! Pareciam verdadeiros! Uns
eram sobre a cidade: pessoas de guarda-chuva, galochas, candeeiros acesos, cães
e gente a procurar abrigos numa correria louca, carros a levantar grandes
chafarizes de água e a dar banho aos desgraçados que passavam, pessoas que
dormiam na rua…e outras cenas que o pintor tinha visto… Outros quadros eram do
mar, e outros quadros do campo.
- Valeu
a pena tanta volta! – Suspira o pincel.
-
Sim! – Respondem as cores, e os gatos.
- Aquele
peixe existe mesmo? – Pergunta o gato esfomeado, a lamber os
bigodes.
- Que
peixe? – Perguntam todos.
-
Aquele que tem um aspecto…Huummm…com aquelas cores: vermelho, azul-escuro,
amarelo, cor-de-laranja, branco, preto…e…prateado e dourado…! – Descreve
o gato.
- Não
sei! – Respondem todos.
- Se
ele o desenhou…existe quanto mais não seja, na imaginação dele. – Explica
o outro gato.
- Eu
nunca vi um peixe assim…também nunca mergulhei no mar ou nos rios, para ver se
existe! – Responde a tartaruguinha pequenina do aquário.
-
Tem um aspecto…Huummm…apetece mesmo espetar ali o dente! Inhame, inhame… – Murmura
o gato esfomeado.
- Só
pensas em comer! – Exclama o outro gato.
- Não
podes comê-lo…é de papel, e o papel não se come! – Explica a tartaruguinha.
- Que
pena! – Suspira o gato esfomeado.
-
Gosto mesmo daquelas cores! – Exclama o pincel.
-
Olhem: porque não fazemos uma surpresa ao nosso amigo, para lhe retribuir o
trabalho que ele nos dá, e assim é também um hino à nossa amizade! – Sugere
a tartaruguinha.
- Como?
– Perguntam em coro.
-
Fazemos todos juntos, um lindo quadro para ele. – Sugere a tartaruguinha.
-
Acho muito boa ideia…já somos amigos há muito tempo, estamos sempre aqui, e se
não fosse ele, não teríamos nada de interessante para fazermos…ficaríamos a
apanhar pó, ou seriamos comidos… - Reflecte o pincel.
- Sim,
é verdade…estamos juntos há tanto tempo, e nunca festejamos! – Lembra
o outro gato.
-
Pois! – Dizem em coro.
-
Mas o que vamos fazer? – Pergunta outro pincel.
-
Podemos misturar-nos, e juntar os lápis de cor, e os marcadores…os guaches, as
tintas de água, a tinta-da-china, as tintas de óleo, as purpurinas… - Sugere
o pincel.
-
Sim! – Respondem em coro.
-
Posso participar? – Pergunta a tartaruguinha.
- Claro…!
– Responde o pincel.
-
E nós? – Perguntam os gatos.
- Também.
– Responde o pincel.
-
Pomos uma musiquinha para nos inspirar. –
Sugere a tartaruguinha.
-
Boa! – Respondem em coro.
-
É melhor pormos a tela em baixo…- Lembra o pincel.
-
Claro! – Respondem em coro.
-
Já era o que eu ia fazer, para ninguém se magoar ao atirarem-se contra mim.
A folha branca desliza da tela, e pousa
no chão. O pincel salta do frasco, sacode-se, liga o rádio, e todos se
preparam. Ao som da música, todos os materiais começam a dançar alegremente, os
lápis de cor começam, e cada um, passa pela folha, faz um risco que quer, com
os movimentos, acompanhados de palmas dos outros.
Depois,
todos juntos, os lápis de cor dançam uns com os outros sobre a folha, e fazem
círculos, uns encaixados nos outros, em direcções diferentes.
A
estes, juntam-se os marcadores, que encaixam os seus movimentos corporais, nos
círculos feitos pelos lápis de cor, em todos os sentidos da folha, com as cores
muito bem conjugadas.
Os outros
materiais apreciam de fora, e gostam do efeito, mas sentem que falta mais cor. Os
guaches, as tintas de água, e as tintas de óleo dançam individualmente com o
cavalheiro pincel, e deslizam pela folha…parece que andam de patins.
Juntam-se
mais uns pincéis de diferentes espessuras e tamanhos, e dançam com eles nos
sítios certos, nas imagens que precisam, e desenham linhas, pontos, traços,
pequeninos detalhes que fazem toda a diferença. A tartaruguinha e os gatos
também acrescentam uns miminhos onde acham que precisa.
Está
um quadro de um verdadeiro artista…a brincar e a dançar, a conviver
alegremente, cada um contribuiu para uma obra completa, cheia de pormenores nas
imagens…parece tão real! E com umas cores…de sonho! Parece uma fotografia do
real. Que lindo!
No
final, todos voltam aos seus sítios, limpam-se, e apreciam a obra de cima.
-
Uau! – Suspiram em coro.
-
Está lindo! – Elogia o pincel, orgulhoso e sorridente.
- Fomos
mesmo nós que fizemos isto? – Pergunta outro pincel.
-
Sim! – Gritam em coro.
-
Fantástico! – Elogia um gato.
- E
nós? – Perguntam as purpurinas.
-
Áhhh…! – Exclamam todos.
-
Esquecemo-nos de vocês! – Exclama a tartaruguinha.
-
Desculpem! – Exclamam todos.
- Ainda
podem terminar… - Sugere o outro gato.
- Onde?
– Perguntam as purpurinas.
- Já
está cheio… - Exclama outro pincel.
- Ali…no
cimo da folha…e no solo… o que vos parece? –
Sugere a tartaruguinha.
-
Sim! – Exclamam todos.
E as purpurinas dão o remate final á
pintura.
-
Perfeito! – Gritam todos.
Todos aplaudem, orgulhosos, sorridentes
e felizes. A folha volta para a tela. Apreciam mais uma vez. Todos os materiais
abraçam-se, trocam elogios, dizem o que sentem uns pelos outros…e de repente
ouvem barulho na varanda. O pintor acordou. Cada um vai para o seu sítio, como
se nada fosse. O pintor olha mais uma vez para a janela, e volta para o quarto.
-
Adormeci! – Suspira o pintor.
Quando chega ao quarto vê a linda
pintura pendurada.
- Mas…
estou a sonhar? – Pergunta o pintor.
-
Não! – Respondem os gatos.
-
Ááááhhh…mas…fui eu que fiz isto? – Pergunta o pintor, maravilhado com a imagem.
-
Fomos nós! – Gritam todos.
-
Quem fez esta pintura tão bonita…? –
Pergunta o pintor.
-
Fomos nós para te agradecer o trabalho que nos dás. – Explica o pincel.
- E
foi um hino à nossa amizade! Porque já estamos juntos aqui há muito tempo, e
nunca demonstramos carinho uns pelos outros…nunca nos tínhamos abraçado, nem
divertido tanto… – Acrescenta a tartaruguinha.
-
Pois é! – Concordam todos.
- Como
não estavas inspirado, resolvemos fazer-te esta surpresa. – Responde a folha.
-
E ficou lindo! Está perfeito… Muito obrigado! – Responde o pintor com um
sorriso de orelha a orelha.
-
Aprendemos contigo! – Acrescente o gato esfomeado.
- Acredito!
Aprendemos sempre uns com os outros! –
Responde o pintor.
-
Foi muito bom este bocadinho, amigos! –
Agradece a tartaruguinha.
-
Sim! – Concordam todos, sorridentes.
-
E sabem outra coisa muito importante? –
Pergunta o pintor.
-
O quê? – Perguntam todos.
-
Cada um de vocês é diferente do outro…cada um tem a sua cor, e o seu material…mas
todos juntos fizeram este quadro maravilhosamente lindo, perfeito, cheio de
vida! – Explica o pintor.
-
Tens toda a razão! – Concordam todos a sorrir.
-
Muito obrigada por existirem! Também não sou nada sem vocês. Preciso de cores,
para me dar alegria, e transmitir tudo o que sinto a quem me vê! – Agradece
o pintor.
- Obrigado
amigo! – Agradecem todos os materiais.
-
Até fiquei inspirado…vou pintar…a gratidão e a amizade…os abraços e o carinho,
a dança! ─ Informa o pintor.
─ Boa! ─ Gritam em coro.
─ Lá vamos nos
outra vez! ─ Exclama o pincel.
E o pintor…põe outra vez mãos a obra. Ficou
tão feliz com a surpresa que os amigos lhe prepararam, e com a amizade que lhe
demonstraram, que surgiram na sua mente, mais quadros…alegres, cheios de cores,
acompanhados de música e dança.
─ Com estes
quadros, vou mostrar a toda a gente, que não vivemos sem amigos, e que devemos
reconhecer o carinho que nos dão, e que temos por eles. Vou mostrar também que
sozinhos não somos nada, e que todos precisamos uns dos outros! Vou mostrar
ainda que os sentimentos bons e bonitos devem ser mostrados, vistos por todos,
sentidos por todos…precisamos de sentir que somos queridos para alguém, e os
outros também precisam de o saber. ─ Comenta
o pintor, enquanto pinta.
─ E a gratidão
também deve existir sempre, em todas as nossas relações e em todos as pequenas
coisas que recebemos, que temos…que damos e que retribuímos. ─ Lembra o pincel.
─ Com gratidão
tudo fica muito mais bonito, mais brilhante e luminoso. ─ Comenta a purpurina prateada.
─ Com amizade
e gratidão…o mundo pode ser melhor. ─ Afirma
o pintor.
E continua nas suas pinturas, feliz e
grato.
FIM
Lálá
27/Julho/2013
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