Tudo coberto de branco, mesmo o sol, só espreitava em determinados pontos da aldeia, de forma tímida, mas não era o que acontecia com estas pobres folhas que viviam aos pés das árvores.
Algumas tinham a sorte de encontrar tocas nas árvores, aos seus pés, ou nos troncos, outras eram convidadas pelos cogumelos gigantes a abrigar-se debaixo deles.
As menos sortudas, ficavam no chão desde que o vento as arrancava das árvores, eram levadas para baldes, e lá se consolavam com o calor umas das outras.
Pareciam já estar todos habituados àquele frio, mas as folhas viam uma luzerna de sol entre as ruas, não sabiam o que era. Pensavam que era a luz das casas, só que quando olhavam para as casas essa luz era diferente.
Ficavam muito intrigadas. Um dia uma folha decidiu perguntar a uma menina que passava a naquele local, toda encasacada a cantarolar que ia ao supermercadinho fazer umas compras para a mãe:
- Menina...desculpa...-diz uma folha
A menina olhou para todo o lado, não viu ninguém. A folha percebe que a menina não a viu e aos colocou-se aos seus pés.
- Olá! Sou eu que estou a falar contigo!
A menina sorri:
- Áh! Uma folha! Olá! Desculpa, não estava a ver ninguém. Pensei que estava a imaginar.
- Olha...não te vou roubar muito tempo, mas...o que é aquela luzinha ali, entre as ruas?
- São as luzes das ruas, e das casas! Como mesmo de dia, está escuro, elas ficam acesas.
- Áh! Sim. E aquela luz diferente? Que só vemos de vez em quando?
A menina olha para as ruas.
- Não vejo nada de diferente! São as luzes de sempre!
A folha ficou desiludida com a resposta. Sentia que alguma coisa diferente havia naquelas ruas, mas não sabia o que era. Sorriu e disse:
- Entendi! Obrigada...!
- De nada!
A menina segue caminho, a folha volta para o seu local, triste.
- Tenho a certeza que aquela luz é diferente! Não é a das ruas nem das casas. - murmura a folha
- Falaste comigo? - pergunta outra folha
- Não, não...estava só a pensar alto na resposta da menina. Perguntei que luzinha era aquela, ela disse-me que não havia luzinha...era a das ruas e a das casas. Eu disse-lhe que era uma luzinha diferente, aquela que só vemos de vez em quando, além da das ruas e das casas. Tu não vês uma luz diferente?
- Sim, sei de que luz estás a falar. Talvez a menina nunca a tenha visto.
- Acho difícil ela nunca ter reparado numa luzerna diferente!
- Deixa lá! Estas pessoas andam sempre na lua...na vida delas, nos pensamentos delas, não olham para nós.
A menina regressa com as compras, ficou a pensar na pergunta da folha, parou e olhou para as ruas. Viu as luzes das ruas e as luzes das casas que já conhecia há muito, mas realmente viu raios de sol, pequenas luzernas que também não via sempre.
- Realmente...existe ali uma luz diferente! Além das da rua e das casas...já sei o que é! (grita) Óh folha que há bocado me perguntaste o que era aquela luz...onde estás?
A folha, surpresa, e um pouco assustada, volta a aparecer aos seus pés.
- Sou eu! Diz…!
- Há bocado falaste numa luz diferente, além das ruas e das casas, e eu disse-te que eram as luzes de sempre, não havia outra! Mas tu tinhas e tens toda a razão! Aquela luzinha que só vês de vez em quando, além das outras, é a do sol que entra pelas ruas! Umas vezes mais forte, outras vezes, mais fraquinho. Quando sorri tímido, e o dia está mais cinzento, com mais nuvens. Olha que nunca tinha reparado quando se vê daqui! Que lindo! Ficam diferentes as ruas! Áááhhh…! Parece que sorriem e que se tornam mais quentes! Agora não, claro, mas no Verão, sim.
- Áh! Que bonito mesmo! Obrigada!
- Obrigada eu, folha! Nunca tinha reparado como ficam bonitas as ruas com estes raios de sol entre nuvens! Se não me tivesses perguntado continuava sem ver este espetáculo.
- Eu gostava de o sentir! Posso?
- Queres hoje? Hoje não deve ser muito quente...mas posso levar-te e vês!
- Está bem!
A menina leva a folha, deliciada com o que tinha acabado de descobrir, e um grande sorriso.
- Aqui vê-se mais e melhor! É aqui que eu moro! - diz a menina
- Uau! Que giro! - diz a folha
- Quando não há nuvens qualquer rua fica bem quentinha! Mas este sol de hoje é fraquinho, não aquece muito.
- Virão dias mais quentes, com certeza! - diz a folha
- Sim! Quando o sol estiver mais forte, eu vou-te buscar para o sentires! É muito bom!
- Combinado! Muito obrigada!
- Da nada! Ver-nos-emos em breve.
- Claro que sim. Qualquer coisa estou ali!
A menina pousa a folha no chão, entra em casa, a folha sobe a rua à procura do sol. Numa praceta da aldeia, desamparada, sem árvores, o sol brilhava, tudo estava mais claro e mais agradável.
- Ei, quase parece as luzes das ruas. - sorri
O sol faz uma surpresa à folha. Começa a andar para trás.
- Óh…vais fugir, agora que sei que és tu?
O sol sorri, e ela vai atrás dele, deixando as nuvens para trás, e vai parar à sua casa, onde quase nunca vai, no Outono e no Inverno. As folhas nem querem acreditar.
fotos de Lara Rocha
- Que delícia de calor! Obrigada querido Sol! - suspira uma folha
- Obrigada! - Dizem todas
- Áh! Que espetáculo! Há quanto tempo não sentia assim uma coisa tão boa! - comenta outra folha
As folhas esbarrigam-se, saltam, de felicidade, deliciam-se com a claridade e o calor agradável do sol.
- Por favor, Sol, volta para este sítio mais vezes! Olha para isto...onde nós vivemos...já estamos habituadas mas com sol...contigo, é outra coisa! - pede uma árvore
- Vocês também precisam de chuva! - lembra o Sol
- Claro que sim, mas tu és melhor. - diz outra árvore
- Deixa para lá quem não te liga nenhuma! - comenta outra árvore
As folhas correm, saltam, abraçam-se, brincam umas com as outras, dançam, cantam, batem palmas, caminham sorridentes.
- Pois é! Olha a nossa alegria, olha a indiferença dos habitantes que nunca tinham reparado que tu passeavas pelas ruas. - comenta outra árvore
- É mesmo! Nunca tinham visto a tua luz! E foi uma folha que reparou! Só não sabia que eras tu!
O Sol fica feliz e promete voltar:
- Voltarei, sim! Tens toda a razão! Acho que não me ligam mesmo. Só quando eu não apareço há muito tempo, para me ralhar. E quando apareço durante muito tempo também não ficam satisfeitos...resmungam do meu calor!
- Não sabem o que querem! - ri um cogumelo
- Não mesmo! - diz o Sol
- Bem...não saias daqui. É tão bom sentir-te! Estamos sempre neste lugar frio, sombrio, precisamos de ti! - diz a folha
- Está bem, obrigado! Mas daqui a pouco vou ter de sair. Só que volto!
- Está bem. - dizem todas
- Muito obrigada por este bocadinho! - diz outra árvore
- De nada! - diz o Sol a sorrir
Como prometido, o Sol vai e volta. As folhas ficam o resto do dia felizes, e mais quentinhas. Os habitantes continuam na vida deles, sem reparar na beleza que existe à sua volta, nem no Sol. Mas isso não o incomoda, porque ele vai alegrar as folhas que tanto lhe pediram, aquecê-las, vê-las dançar, cantar, brincar.
A menina aprendeu com a folha a ver os raios de Sol pelas ruas, e como isso tornava tudo mais bonito. Também passou a estar mais atenta à presença das luzernas de sol, e a sorrir.
Até contou aos pais, que contaram aos tios, e um deles, era fotografo. Dedicou-se a fotografar esses raios de Sol pelas ruas, em todos os recantos onde apareciam e nunca tinham visto, nas folhas, na neve, nos telhados, no chão, nas árvores.
Tudo ganhava um brilho especial, magia, cor. E foi a partir de uma exposição que o fotógrafo fez com as fotografias, que os habitantes começaram a apreciar a natureza que os rodeava.
Isso fê-los sentir mais felizes, orgulhosos, ensinou-os a dar valor a tudo o que viam.
FIM
Lara Rocha
11/Dezembro/2023
E vocês? Gostam de sentir, de apreciar o sol, a chuva, as nuvens, a neve e tudo o que a natureza oferece?
O que gostam mais?
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