Era uma vez uma borboleta enorme, leve, de asas vermelhas, muito bonita e generosa , que usava uma xaile preto, sempre que saía ou para se agasalhar. Era uma borboleta mágica.
Uma noite, ouviu uns gritos e choros no campo de plantações ao lado da flor onde repousava. Ficou atenta, de ouvidos bem abertos, e olhos ainda mais a ver se percebia de onde vinham realmente.
Uma outra borboleta disse-lhe que era no campo e que já há uma série de noites, dias, talvez semanas, ouvia esses gritos e choros. A borboleta veste o xaile preto e vai por cima do campo numa noite fantástica de Lua Cheia, luminosa, parecia amanhecer, mas ainda era de noite.
Quem chorava e gritava era um boneco de palha, um espantalho, que apanhou um grande susto ao ver uma sombra enorme da borboleta refletida no chão. O boneco de palha solta um grito e estremece a soluçar:
- Lá vem mais um...!Óh não! -
- Mais um quê? - pergunta a borboleta - Isso não é maneira de falar comigo! Boa noite!
- Desculpa! - pede o boneco triste e a olhar para ela envergonhado - Boa noite. Mas como é que eu posso ter uma boa noite, ou um bom dia...-resmunga o boneco.
- Não sei porque estás a falar assim comigo! Calma, sou do bem! Porque estás tão irritado, e choroso? Nervoso…
- Quem és tu? - pergunta o boneco a choramingar
- Sou uma borboleta!
- És muito estranha! Eu sou um boneco de palha pelo que dizem. Não sei, nunca me vi. Só sei que estou farto de estar aqui, farto de levar com raios de pássaros que pousam em mim, comem-me pedaços em tudo quanto é sítio. Sou um boneco de palha, farto de levar com...bem...com o que elas fazem...com...porcaria de pássaros, penas, patas! Estou farto de ser comido por burros, gado, cegonhas, chuva, sol, vento, trovoada. Percebes? Estou farto de levar com outros insetos irritantes em cima de mim, como se fosse de comer! Depois fazem de mim...cama! Estou farto daqueles pássaros enormes de todo o tipo que me picam com aquelas horríveis garras e bicos de quilómetros (a borboleta ri) Estás a rir porque não és tu que levas com eles. Sacodem-se em cima de mim, que nojo! Deixam-me penas e outras porcarias, outras criaturas irritantes. Alguém me pôs aqui, a achar que ia ser a solução para esses bicharocos estranhos, mas não adiantou nada! Nem quando estão aqui pessoas. Vem para aqui crianças e adultos, dar-me pontapés, murros, puxam-me fios de palha, descem-me o fecho das calças que me vestiram, não sei para quê, põem-se com risinhos, também não sei porquê, nem qual a piada. Só sei que se riem e fazem comentários estranhos. Metem-me coisas nos bolsos, da camisa, e das calças, tiram-me o chapéu, põem nas cabeças deles, usam uma caixa, que nem sei o que é aquilo, nem para que usam, tentam tirar-me as sapatilhas...são um terror! Estou farto. Queria fugir daqui. E tu, o que fazes aqui?
- Ouvi alguém a gritar e a chorar, vim ver se podia ser útil...ajudar alguém ou algum animal.
- Óh…não sei o que queres dizer com isso, mas senti uma coisa boa! Ouviste os meus gritos e choro? (surpreso)
- Sim! Ouvi.
- Desculpa, se calhar estavas a dormir, não? - pergunta o boneco
- Não, não te preocupes! Já viste a Lua que bonita que está? - pergunta a borboleta
- Lua? Quem é a Lua? - pergunta o boneco
- Esta luz que está no campo!
- Áh! Nunca tinha visto...quer dizer, já tinha visto mas não sabia o que era!
- Pois! Estavas sempre centrado em ti, e no que te faziam, que a tristeza e a raiva não te deixavam ver.
- Se fosses tu, se calhar também ficavas triste, e com raiva, não?
- Bom...sim...talvez!
- Mas ela está perto? Parece...
- Não! Está muito longe, mas parece estar perto porque está muito, muito grande. Está lá em cima, onde estão as estrelas.
- Áh! É bonita. Conheces?
- Conheço. As estrelas e a Lua! Em que te posso ajudar? - pergunta a borboleta
- Não sei se me podes ajudar.
- Mas...o que mais querias neste momento? - pergunta a borboleta
- Sair daqui, deixar de estar aqui pendurado a fazer figuras tristes e a servir de diversão para uns, alimento para muitos, saco de porrada para outros tantos, e por aí fora.
- Claro! Compreendo a tua revolta e o teu desejo.
- Obrigado, mas acho que não me podes ajudar, não foste tu que me fizeste assim.
- Posso! - diz a borboleta
- Como?
- Posso tirar-te daí e transformar-te num menino, se quiseres, para teres uma casa, com todo o conforto, pais, irmãos, amigos. Gostavas que isso acontecesse?
- Não sei que nomes são esses que disseste, mas, senti uma coisa boa...acho que gostava. Sempre será melhor do que estar aqui neste estado.
- Muito melhor!
- Mas podes fazer isso?
- Posso.
A borboleta abre o xaile, o boneco fica encantado com as asas dela.
- Que bonita que tu és! Nunca vi uma borboleta assim.
A borboleta sorri:
- Obrigada, mas eu já estou cá há muito e bem perto.
- Já sei, a minha tristeza e raiva, não deixaram.
- Isso mesmo!
- Preparado?
- Sim.
- Agora não fales, por favor. Nem tenhas medo. Confia em mim, está bem?
- Está bem.
A borboleta murmura alguma coisa, roda o xaile em cima do boneco, à volta dele, passa o xaile pelo boneco todo, várias vezes, o boneca fica um pouco assustado e incrédulo, mas com esperança e curiosidade para saber o que vai acontecer.
Prometeu que confiava na borboleta e assim fez. Num toque de magia, o boneco desaparece cheio de estrelas douradas, e aparece em forma de menino de carne e osso.
Estava vestido com a roupa de boneco de palha, calçado com as sapatilhas.
- Desejo realizado! - diz a borboleta a sorrir - Que lindo! Vão adorar-te.
A borboleta ri, retira um espelho da capa, e o menino vê o seu reflexo. Primeiro, fica muito surpreso, depois sorri.
- Ele está a fazer o mesmo que eu!
- Sim.
A borboleta explica pacientemente.
- Agora: salta, corre, toca em ti, para veres do que és feito. - diz a borboleta
O menino sorri, não sabe como fazê-lo, a borboleta saltita, ensina tudo o que ele tem de aprender, ajuda-o, ele vê que tem pernas, pés, braços, mãos, dedos nas mãos, dedos nos pés, cara, olhos claros, boca, dentinhos, mãos, orelhas, sobrancelhas, cabelo.
Tudo! Como nós, humanos, mas ainda demora algum tempo a perceber as diferenças e faz muitas perguntas à borboleta que explica tudo pacientemente, exemplifica, para eles fazer o mesmo e aprender.
- Muito obrigada, borboleta! - diz o boneco, agora menino - acompanha-me, por favor! Se não te importares. Tenho...
- Tens medo! - diz a borboleta
- Acho que é isso.
- Está bem.
- Isso é bom ou mau?
- Depende, mas geralmente é bom. Vais aprender isso com os teus pais e irmãos.
O menino segue as instruções da borboleta, para andar, correr, saltar, respirar, sorrir, falar, cantar, lidar com as pessoas. O menino explora, feliz, todo o ambiente. Corre, salta, encontra-se com outros animais, vê toda a natureza, brinca com a borboleta, rebola na relva, no chão.
Os dois têm longas conversas. Já de manhã, a borboleta leva-o para uma casa de um casal já com filhos da idade do menino, mais novos e mais velhos, muito simpáticos, carinhosos, sensíveis, que falam com ele, para o conhecer, e adoram-no.
O casal planeava adotar uma criança mas estava difícil. A borboleta sabia disso, e mandou para lá esse menino, que o apresenta, em forma de uma linda mulher, de xaile preto, roupa vermelha, cabelos muito longos e escuros, olhos escuros, pele morena, o menino está abismado com quem vê:
- Bom dia, aqui está o vosso menino que tanto desejavam adotar!
O casal sorri, emocionado, abraça-se, abraça os filhos, abraça a borboleta em forma de mulher, e abraça o menino. Não cabem neles, de felicidade. O menino também não podia estar mais feliz.
- Bem vindo, meu amor! Nosso amor. - diz a mãe
- Não te vai faltar nada, prometemos! - diz o pai
Os irmãos sorriem, e ele retribui.
- Não temos palavras para lhe agradecer, Sra...? - diz a mãe
- Luz. Luz, chega! Não é preciso o Sra. De nada. Tratem-no bem, como tratam os vossos filhos, e o que precisarem de mim, estou por aqui, vou passando por aqui. Até já.
A borboleta abraça todos, os irmãos e os pais, levam-no para dentro de casa, onde mostram a casa toda, dão-lhe o nome Hugo, ele sorri muito, dão-lhe de comer e beber, preparam uma cama para ele, confortável, com uma almofada, coisas que nunca tinha experimentado, mas estava nas nuvens.
Os irmãos emprestaram-lhe brinquedos, deram-lhe roupas, era um menino educado, calmo, sorridente, que ajudava nas tarefas, brincava com os irmãos, muito carinhoso com todos, ouve histórias que os irmãos contam, até vai para a escola como os irmãos.
Todos os adoram, acolhem-no, ajudam-no, ensinam-lhe coisas novas e a brincar, muito atento, esperto, educado, simpático, um menino muito querido. A borboleta está sempre vigilante, atenta, todos os dias, umas vezes como mulher, outras vezes como borboleta de xaile preto.
Os dois conversam alegremente, todos os dias, quando o menino está sozinho, e ele diz à borboleta como está feliz. Uns dias depois, o menino apresenta a borboleta aos irmãos, e aos pais, que ficam maravilhados com ela.
Esta, de vez em quando deixa-lhes uns pequenos presentes, mimos, por tratarem tão bem do seu amigo, com as magias do seu xaile preto.
Que prendas acham que a borboleta de asas vermelhas e xaile preto, deixava?
Já viram uma borboleta vermelha de xaile preto?
E se vocês fossem o boneco de palha? Pediam o mesmo que ele?
Realizavam o desejo do menino se fossem a borboleta? Como?
Podem deixar nos comentários, se quiserem.
FIM
Lara Rocha
16/Agosto/2025

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