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sexta-feira, 27 de setembro de 2013

A folha e o cão

Era uma vez uma folha de árvore enorme, que numa noite de tempestade, com chuva torrencial, trovoada e vento forte, foi arrancada da árvore e arrastada numa enxurrada que se formou no chão do jardim onde vivia.
            A folha deixou-se levar, triste, a tremer, sem saber onde ia parar, mas não podia fazer mais nada…tudo era mais forte que ela. Rolou ao sabor da corrente, escorregou, bateu contra paus e pedras, enrolou-se com outras folhas, e com lixo.
            A noite foi terrível, e a folha só parou quando bateu contra uma janela de um quarto, numa casa, e caiu atordoada. Uma velhinha que passou, com passinhos pequeninos e lentos, apoiada numa bengalinha, e bem agasalhada, passeava o seu cão, e olhou em volta.
- Foi uma noite terrível! Que medo! Nem dormi…e tu também não…pois não, pantufinhas? Uivaste, ladraste, ganiste…mas foste uma grande companhia e aqueceste-me! Como sempre! É por isso que eu gosto tanto de ti! Ainda está tudo de pernas para o ar.

            O cão cheira a folha, e ladra-lhe. A folha assusta-se, e olha para ele.

- Óh, não…não bastava a tempestade, ainda vem este…Aaaaiiii…o que é que vem agora? Olha bichano…deixa-me respirar, sim? – Diz a folha.

            O cão ladra.
- Au…Au…! O que é que te aconteceu? – Pergunta o cão á folha

- Por favor, não me ladres tão perto…estou cheia de dores de cabeça. – Pede a folha.

- Oh…desculpa…! É que nunca te vi aqui antes. Mas estás doente?

- Acho que…não sei.

- Não sabes…? Como assim? Dói-te alguma coisa?

- Sim, dói-me a cabeça e acho que estou toda amassada!

- Não! Até estás mais ou menos direitinha…és enorme.

- Preciso de me secar! E de aquecer…

- Já percebi, foste trazida pela tempestade.

- Sim. Mas não sei onde estou! Eu vim de muito longe, acho eu…ai…não sei…sei que andei aos trambolhões muito tempo, a chocar com paus e com pedras e lixo… Nem sei onde vim parar! - Explica a folha.

- Eu sou daqui! E apercebi-me de tudo…ouvi as chuvadas, que pareciam que iam partir os vidros todos…os trovões, que até me abanavam o esqueleto todo…e…o vento…uuuuuuhhhhhh…parecia que me atravessava! Até ficou quase louco. Estive sempre com a minha dona, à beira dela, bem quentinho e a aquecê-la! Ela estava com muito medo, e eu…nem se fala! Mas enquanto estava lá confortável, pensava nos estavam à chuva, e ao vento…nos que não têm casa, e nos que não se podem aquecer, nem têm ninguém para aquecer! Fiquei triste, sabes…e imaginei-me todo-poderoso, a construir casas para esses…como se fosse um mágico! – Diz o cão.

- A sério? Tu és um bom cão…tens bons sentimentos! – Elogia a folha.

- Sim. Eu também já fui um cão sem dono, e sem casa…dormia onde calhava…e era muitas vezes chutado! Mesmo assim, nunca mordi ninguém. Foram tempos muito duros, mas se calhar, isso amoleceu o meu coração! Gosto apenas de carinho, e de fazer companhia…! Aquela é a minha dona! Trata-te muito bem, e retribui o amor que tenho por ela. Foi ela que me acolheu, quando eu era ainda muito pequeno, e fui deixado na rua! A família dela está muito longe, por isso, eu sou a sua família, neste momento, e ela é a minha família. Uma senhora maravilhosa, com um coração enorme! Anda comigo. Vou mostrar-te onde moramos.

- Está bem.

            A folha vai no lombo do simpático cão. Regressa para casa com a sua dona, e a folha vê a paisagem pelo caminho. Já em casa, a folha fica na beirada da porta para se secar, e aquecer. O cão vai para dentro de casa, mas está sempre de vigia.

- Áááhhh…que sol tão bom! – Suspira a folha a sorrir.

            Passa um coelhinho bravo pequenino, desesperado, a tremer muito, e a chorar.
- Óh, coitadinho…o que foi?

- Estou perdido! Não sei onde estão os meus pais. – Responde o coelhinho muito aflito e a chorar.

- Não te preocupes. Eles vão aparecer rapidamente…! Mete-se aqui debaixo, para aqueceres.

            O coelhinho senta-se na beirada, e o cão sente que alguma coisa não está bem, sai a porta.

- Amigo…este coelhinho está perdido…não sabe onde estão os pais. – Diz a folha.

            O cão cheira, e vai à procura rapidamente. Num abrir e fechar de olhos, com o seu olfacto apurado, encontra a toca do coelhinho, com a entrada coberta de folhas. Os pais estão lá dentro, muito preocupados. O cão espalha tudo com as patas, e põe a entrada a descoberto. O coelhinho saltita feliz, abraça o cão, e acaricia-o. Bate à porta e grita:
- Papá…Mamã…!

            Os pais vão à porta, e abraçam o filho, aliviados.

- Onde foste? – Pergunta o pai

- Ia buscar lenha para nos aquecermos…para vos fazer uma surpresa, mas…o vento arrastou as folhas e o lixo todo, e quando voltei…não soube onde estava a entrada! – Explica o coelhinho.

            Os pais sorriem deliciados.

- Óh, meu amor…que lindo…mas devias ter avisado, que íamos contigo. – Diz o pai.

- Mas assim já não era surpresa…!

- Não te preocupes com as surpresas para nós, querido! – Diz a mãe sorridente, com carinho.

- O cão descobriu a entrada!

            O cão sorri, e ladra.

- Muito obrigada! – Diz a mãe sorridente, acariciando o cão – Entra…vou dar-te água quente…e se quiseres comer alguma coisa…

            O cão entra com o coelhinho, e bebe água quente, conversam animadamente. A folha volta para o sol. Passa um passarinho, com as penas todas ensopadas e meladas da chuva, põe-se também ao sol, junto da folha. O cão regressa da toca, mesmo a tempo, pois prepara-se outra tempestade. Ele convida a folha a entrar. Ela entra. Fora da porta ficou o passarinho. O cão e a folha ficam cheios de pena do passarinho, e a folha quer ir abrigá-lo. Sai por baixo da porta, e fica encostada á janela por cima do passarinho, como se fosse um guarda-chuva. O cão fica com pena dos dois, e abre um cantinho da janela da sala.

- Entrem! Fiquem aqui…! – Diz o cão.

            A folha e o passarinho entram, e ficam abrigados, protegidos e quentinhos, na janela da sala onde tem lareira. A velhinha está a cozinhar, e os três na sala conversam alegremente.
Lá fora, cai uma valente tempestade. A velhinha fica muito assustada, e começa a falar com o cão. O cão, embora assustado, responde sempre, e senta-se à beira da velhinha que está sentado no sofá.
De repente batem à porta. A velhinha vai ver, e o cão segue-a. É uma cadelinha com uma grande ninhada de cãezinhos ainda bebés (8), quase congelados, e fracos.
O cão ladra, uiva, procura logo aquecer os pequeninos, com o seu pêlo, deitado no chão, quase em círculo á volta dos pequeninos.

- Uma visita…! Óhhh…coitadinha! Olha, amigo…acho que arranjei uma família para ti!

A velhinha pega na cadela, carinhosamente, e coloca-a num cobertor perto da lareira, acaricia-a, cobre-a, e dá-lhe água quente. A velhinha prepara outro local em frente à cadela e muito perto da lareira, com o cobertor e deita lá os cãezinhos, o cão ajuda a transportá-los.

- Obrigada, querido! – Diz a velhinha.

            O cão está feliz e orgulhoso. A velhinha dá água quente aos pequeninos, sorri, acaricia-os e cobre-os. O cão lambe a cadela, e os cãezinhos pequeninos. A folha e o passarinho apreciam maravilhados. A velhinha janta, e dá de comer aos animais.
A cadela e os cãezinhos dormem, ao quentinho da lareira, e conversam alegremente uns com os outros. O cão apaixonou-se pela cadela, e pelos filhotes, que os trata tão bem como se fossem seus, sempre com a ajuda da velhinha que os acolheu para o resto das suas vidas.
A folha e o passarinho, ficaram a viver no quarto do sótão da casa da velhinha, e a folha servia de abrigo a muitos animais…era tão grande, que cabiam lá debaixo borboletas, joaninhas, passarinhos…para dormirem sonecas, e protegerem-se do calor, do sol, e mesmo da chuva e do frio.
A velhinha ficou muito mais feliz, e o bondoso cão, tornou-se um verdadeiro ídolo da aldeia, por todos os seus actos de salvar pessoas, de ajudar, e proteger…!

           
FIM
Lálá
26/Setembro/2013


quinta-feira, 26 de setembro de 2013

A menina que falava golfinhês

Era uma vez uma menina que não falava, e era muito difícil dizer e mostrar o que sentia. Foi rejeitada pelo pai e vivia com a mãe, numa casa pequenina, simples, mas muito confortável, não faltava nada na praia, nem precisava de atravessar a rua para ir para a areia.
           A mãe da menina estava já desesperada, porque não conseguia fazer com que a menina falasse…e às vezes ralhava com ela, obrigava-a a falar, gritava com ela, sacudia-a…e nada! Chamava-lhe bicho do buraco, até lhe batia para ver se ela acordava… Obrigavam-na a falar, e mesmo assim, não falava. Andava por médicos, e nada faziam. Diziam que era preguiça de falar porque não tinha qualquer problema. Mas era tudo para despachar.
            Um dia, a menina saiu de casa sem a mãe reparar, que tinha adormecido vencida pelo cansaço, e foi para a praia em frente à sua casa, onde havia golfinhos mas ela nunca os tinha visto.
            Os golfinhos sentem uma vibração estranha, e vão à superfície. Encontram a menina, saltam na água e encostam o focinho à barriga da menina. Querem cumprimentá-la.
Ela fica estática, com os olhos muito abertos, e os dois golfinhos sentem que ela ficou assustada. Voltam a mergulhar, e a saltar. A menina não sabe que são golfinhos.
Vem um golfinho e pára junto dela. Os dois olham-se fixamente. O golfinho toca-lhe, e ela encolhe-se, mas o golfinho volta a insistir, e deita o seu focinho nas pernas da menina.
Pela primeira vez a menina sorri, e toca a medo no golfinho. Ele solta um guincho doce e melodioso, e mantém-se com o focinho deitado nas pernas dela. Primeiro assusta-se com aquela boca, e tantos dentes, mas depois toca-lhe levezinho.
O golfinho faz-lhe carinhos com o focinho, na cara, dá-lhe beijinhos com o focinho, e ela ri com as cócegas. Acaricia o golfinho mais à vontade. Ele guincha feliz, e ela toca-lhe deliciada, o golfinho rebola e guincha docemente.
Há uma troca mágica entre os dois, e esta ligação desperta na menina emoções…até aí, não sorria, mas o lindo golfinho fê-la sorrir…não ria…e o carinho do golfinho fê-la rir com gargalhadas sonoras. O golfinho faz habilidades e a menina manifesta-se com todo o corpo, agita os braços e as pernas, sacode as mãos, ri e sorri, pelo encanto e a felicidade de os ver fazer habilidades.
Ela faz com a boca os guinchos dos golfinhos, mas não sai o som. A mãe acorda e não vê a menina. Procura-a por toda a casa, grita, chama-a, e sai a correr de casa em pânico.
- Filha…onde estás…? Aparece…Óh…mas porque é que eu adormeci…onde estás filha…? Ainda se falasses…ai…! E agora…? Vou chamar a polícia…
            Olha para a sua frente, e no fundo da praia vê golfinhos. Corre louca pela praia, em pânico, a gritar pela filha. Quando vê que é a filha sentada na areia, respira de alívio. Abraça-a, e beija-a…
- Ááááhhh…estás aqui nos golfinhos…! Quem é que te mandou sair de casa…? E quem é que me mandou adormecer…? Como é que vieste aqui parar…? Que susto! Ai…diz qualquer coisa…! Nem que seja uma asneira…um palavrão…! Fala, filha…fala…!
            A menina olha para a mãe, sem perceber nada do que está a dizer, inexpressiva, olha a mãe fixamente, e esfrega a sua boca e o seu nariz na cara da mãe. A mãe fica surpresa com aquela reacção.

- O que é isso, filha? É um beijinho?  
            A menina olha para a mãe e sorri. A mãe solta uma grande exclamação, feliz:

- Ááááááhhhh…! Há bocado um beijinho…? Agora…Um sorriso? Não pode ser…estou a alucinar…? Áhhh…deve ser a minha vontade que fales…! Já estou a ouvir coisas, e a ver…sim, porque tu nunca sorriste…! Nem sequer isso, minha querida…nem sequer um sorriso, e nunca me deste beijos, nunca me tocaste…! Será que ficas tão triste quanto eu, por não falares, e por não te expressares…? Se calhar nem tens consciência do que se passa à tua volta! Não estás nada assustada…talvez porque já conheças bem este sítio…! Mas eu já ia chamar a polícia…felizmente encontrei-te a tempo! Sã e salva! Os golfinhos…são tão lindos, não são? (sorri) Que delícia de bichos!
            A menina deita-se na areia e a cabeça nas pernas da mãe, tal como o golfinho fez com ela. A mãe fica gelada para ver o que vai fazer.
- O que foi, filha…?
            A filha olha para ela, fixamente, deitada no seu colo, muito séria e inexpressiva. De repente, solta uma gargalhada sonora. A mãe muito surpresa, ri, e bate palmas, feliz.
- Ááááááhhhh…que gargalhada tão bonita! Boa, filha…que bom! Que felicidade ouvir a tua gargalhada, e ver os teus olhos brilhantes, com o sorriso. Mas…acho que acabou de acontecer um milagre! De repente foste expressiva…! Que linda! Obrigada, meu amor…obrigada. E tu também não te deitavas no meu colo, nem sorrias, nem me davas beijos…!
            A menina olha para os golfinhos com um grande sorriso, a mãe deixa escapar algumas lágrimas de felicidade. E de repente…os golfinhos guincham, e a menina reproduz os guinchos, toda entusiasmada, agitando as mãos e as pernas e rindo às gargalhadas. Sai do colo da mãe e vai para a beira dos golfinhos.
A mãe fica a ver o que ela vai fazer. Eles encostam-se a ela, aos guinchos, ela acaricia-os, feliz, e às gargalhadas. A mãe ri incrédula, e a menina continua a guinchar eufórica e a manifestar-se com todo o corpo.
Os golfinhos dão-lhe beijinhos, e ela retribui neles, e na mãe. A mãe não cabe em si de felicidade, e aproxima-se dos golfinhos, acaricia-os, e a menina abraça a mãe, e beija-a.
Depois deste dia, todos os dias, a mãe levava a menina para a lagoa artificial da praia, onde estão os golfinhos, e brinca com eles todos os dias. Eles guincham, ela também. Eles tocam-lhe, ela também, eles beijam-na, ela beija-os e beija a mãe. Eles guinchavam, ela também.
Nasceu uma nova menina, que graças à relação que criou com os golfinhos, uns tempos depois, tornou-se muito mais expressiva, começou a falar a sua língua normal, com a mãe, familiares e amigos, que lhe ensinavam pacientemente, e de forma carinhosa, com imagens e brincadeiras…e falava golfinhês, todos os dias, com os doces e simpáticos golfinhos, durante horas…com guinchos e gargalhadas, risos e carícias, mergulhos…
Por tudo isto, todos começaram a chamar este acontecimento de milagre dos golfinhos.
Tudo pode aprender-se melhor com as vibrações de carinho e dedicação, paciência, simpatia e elogios, risos, brincadeiras e valorizando cada pequenino passo.


FIM
Lálá
26/Setembro/2013



quarta-feira, 25 de setembro de 2013

De quem é a cesta de Outono?


        É Setembro, e um agricultor levantou-se muito cedo, com os primeiros raios de sol. Vestiu uma roupa confortável, e um agasalho, pois nas primeiras horas da manhã está fresco, e depois aquece. Tomou o pequeno-almoço, e toda a família ficou a dormir, porque os seus filhos são muito pequenos, e a sua esposa ficou com eles.
Pegou nos seus lindos cães e levou-os para o campo, onde ficou de se encontrar com os vizinhos, também jovens rapazes, e algumas raparigas para a colheita. Puseram logo mãos à obra!
David conduziu o trator, pelos campos todos, sem pressa, e os outros nos atrelados, com as tesouras próprias para ficarem mais altos e chegarem mais facilmente aos frutos que estavam mais acima. Outros vizinhos, jovens cortaram os cachos e apanharam os frutos de baixo, e os mais velhos foram para outro campo, colher os legumes.
Colocaram tudo separado: maçãs em baldes, pêras noutro balde, uvas brancas noutro, uvas vermelhas noutro, amoras, castanhas, amêndoas, feijões, cebolas, nabos, alho francês, courgette, xuxus, batatas, cenouras, nozes, romãs, tomates, salsa, pepinos, limões, espigas de milho, laranjas, abóboras, cabaças, e muitas outras prendinhas da Natureza.
À medida que ia nascendo o dia e o sol aparecia, ia ficando mais quente, por isso todos iam bebendo água fresca, conversavam e riam alegremente. Num instante, todos os baldes ficaram cheios, com cores variadas e muito bonito. Vão buscar mais baldes e enchem-nos.
Como estão muito ocupados a cortar cachos enormes, e as frutas, nem dão pelo tempo passar, e chega a hora de almoço. A esposa de Francisco vai chamá-los, pois todas as esposas que ficaram em casa com as crianças, juntaram-se e cozinharam para todos.
Consolam-se com o almoço e convivem alegremente. No fim da barriguinha confortada, voltam para os campos apanhar o resto que falta. Os cães estão muito estranhos…molengos, mas ao mesmo tempo inquietos, ladram e uivam.
A senhora mais velha da aldeia, de 105 anos, muito fina de cabeça, e sempre muito simpática, carinhosa e dedicada, vai à janela, olha para a paisagem e sorri.
- Olá! – Diz a Sra. - Sente a brisa no seu rosto – Sei que já chegaste…e linda como sempre! Vens carregada de surpresas para todos…aposto!
- Que bom vê-la de novo, doce senhora! – Sussurra uma linda voz feminina.
- O prazer é todo meu…! Então…muito bem-vinda, princesa Outono! – Diz a senhora sorridente.
A senhora fica mais um pouco à janela. À noite, deitam-se cedo, porque estão estafados. De repente, passeia-se discretamente, no sossego da noite, e ao som das cigarras, grilos, sapos e rãs e relas…uma jovem rapariga misteriosa.
Tinha um vestido muito comprido, feito de folhas de vários tons, e cabelos de troncos fininhos com gotinhas de água transparentes penduradas, olhos dourados, e uma capa de nuvens cinzentas, com um lindo e grande cesto num braço, e o outro braço no seu namorado vento…muito ciumento, mas estava calmo, e muito apaixonado, é por isso que as pessoas sentiam uma brisa quente. Os dois passeiam sem pressa, trocando muitos carinhos, sorrisos, e risos, danças sem música, e brincadeiras.
- Que casal tão romântico…apaixonado…! Ai…! – Suspira a doce velhinha. – Como eu gostava de ter tido um amor assim…! – Sorri – E tive! Nos meus sonhos…! Nunca apareceu de verdade.
Enquanto a senhora fica a apreciar, sentada numa poltrona na varanda, a jovem aproxima-se dos baldes, e pousa o cesto no chão. O seu namorado sopra para o cesto, e este divide-se em cestos mais pequenos. Ela decora-os com grandes folhas verdes, e salpicos de outras folhas, mais pequenas, de outras cores. Pega nos legumes e frutas misturados e divide-os por cada cestinha. E na cesta grande, faz o mesmo.
Coloca uma cestinha à porta de cada casa, e deixa a grande no campo. A rapariga misteriosa desaparece. Na manhã seguinte, a rapariga está lá, mas não a vêem.
            Quando saem a porta, reparam num cesto pequeno, sorriem, mas não dão muito valor. Quando os agricultores chegam ao campo, e vêem aquela cesta enorme, perguntam em coro:
- O que é isto?
- Parece que nos esquecemos de uma cesta aqui…! – Comenta Igor.
- Não! Esta cesta não é nossa! – Repara Nicole.
- Então esteve aqui alguém a mexer nos nossos produtos…! – Reclama João.
- Mas que grande lata…e deixou aqui vestígios…? – Pergunta Mára.
- Há aqui alguma coisa de muito estranho…não há marcas de passos no chão…como é que deixaram isto aqui? – Repara e pergunta Irene.
- Bem pensado! – Respondem em coro.
            Ouvem uma voz doce:
- É minha!
            E forma-se uma enorme ventania. O vento não gostou que a tivessem ignorado.
- Pára, amor! – Ordena a voz.
- Perdoa-me…minha princesa…! Já parei… - Diz o vento.
- O quê? – Perguntam todos, a olhar para todos os lados, para ver se descobrem de onde vem a voz.
- De quem é este cesto? – Pergunta Rita.
- É meu! – Responde a voz.
- Onde estás, tu que falas? – Pergunta Nuno, nervoso.
- Estou mesmo à vossa frente…no solo, na terra, nas árvores, nas frutas, nos legumes, no ar! – Responde a voz.
- O quê? – Perguntam em coro.
- Isto deve ser alguém a brincar! – Comenta Jacinta.
 - Não! É real…não viram o cestinho à vossa porta? – Pergunta a voz.
- Sim! – Respondem em coro.
- Fui eu que o deixei lá! E este também! – Diz a voz.
- Mas nós não pedimos nada…! – Respondem todos.
- Aparece! – Ordena Hugo zangado.
            O vento dá uma forte rajada na cara do Hugo, como se fossem duas grandes estaladas. Ele gira, e grita, com as fustigadas. A voz ri. A velhinha aparece, sorridente.
- Mas que linda cesta! – Diz a senhora.
- Sim…! – Dizem em coro.
- Estamos a tentar descobrir quem a deixou aqui…! – Explica Mónica.
- Eu sei quem foi! – Diz a senhora a sorrir.
- Sabe? – Perguntam em coro.
- Foi você? – Pergunta Diana
- Não…! Foi a Princesa Outono! – Responde a senhora.
- Quem? – Perguntam todos
- A Princesa Outono! – Diz a senhora
- Não vemos ninguém! – Respondem em coro
- Só ouvimos uma voz. – Diz Clara
- Ela está mesmo aqui! Diante dos vossos olhos, por todo o lado…no chão, na terra, nas árvores, nos frutos, nas cores… – Responde a senhora a sorri.
- Isso foi o que ela nos disse. – Respondem em coro.
- Mas que espécie é…? – Pergunta Nancy
- É a Princesa Outono! Ela não aparece em forma de gente, como nós…mas é um ser muito especial…deixou-vos um presente à porta, para anunciar a sua chegada, mas vocês estão tão emaranhados nos vossos afazeres que nem reparam no que se passa à vossa volta! Nem no vosso interior! – Diz a senhora.
- Obrigada pela cesta! – Dizem todos a sorrir.
- Chegou a Princesa Outono! – Diz a Senhora.
- Ááááááhhhh…! – Dizem em coro.
- Claro! Começa hoje! – Reflete Paula.
- Olá Outono! – Dizem em coro.
- Olá! – Diz a Princesa Outono sorridente.
- Que surpresas nos trazes este ano? – Pergunta Mónica
- Logo ficarão a saber…! – Responde a Princesa Outono.
- Porque não juntam tudo e fazem um grande piquenique? – Sugere a senhora.
- Excelente ideia! – Gritam todos, felizes.  
            E todos juntam as colheitas, fazem diferentes pratos, sobremesas, sumos, e sopas, cada qual a mais deliciosa, e saudável, numa grande festa, vestidos à época, com música, e a Princesa Outono, transformada numa linda mulher. O Outono também tem as suas belezas…! Feliz Outono!



FIM
Lálá  
(25/Setembro/2013)


quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Chuvada!



        








        


foto de Lara Rocha 


        Era uma vez, na chegada do Outono, uma linda borboleta, chamada Mára, que se esqueceu desta chegada! O dia estava cinzento, sentia-se cheiro a fumo das chaminés, e das castanhas assadas, e a lareiras.
O vento estava muito zangado com alguma coisa…! Se calhar tinha dormido mal, ou estava mal disposto, porque era um bocadinho frio mas forte, pois por onde passava arrancava sem dó nem piedade as folhas das árvores. Sacudia-as e batia-lhes, e era só folhas pelo ar, a rodar e a cair no chão. Elas gritavam e tentavam agarrar-se, mas não conseguiam!
Umas caiam sobre a terra, outras na erva, não se magoavam muito, mesmo assim, não gostavam das grandes cambalhotas que davam pelo caminho até aterrar, e das cabeçadas nas janelas, nos telhados, nas portas, nos vidros, na parede e em cima de carros.
Outras folhas, não tinham a mesma sorte: umas caiam em cima de troncos e raminhos que estavam no chão, outras caiam nos bancos duros de pedra e de madeira do jardim, e outras caiam directamente no chão duro das ruas, dos pátios.
Mára ainda não se tinha apercebido da ventania, porque quando começou…a borboleta ainda passeava pelo mundo dos sonhos, e nem ouviu, ou se ouviu não ligou.
Devia ter tanto sono, que não quis perder tempo a ver o que era, mas de certeza que fazia barulho, a não ser que a sua casa fosse à prova de som, o que não acontecia.
Quando abriu os olhos, pensou que ainda podia dormir mais…embora tivesse acordado muito cedo, como quase sempre fazia, espreguiçou-se, bocejou, e viu muito escuro.

- Ááááhhh… (boceja) Acho que ainda é muito cedo, vou dormir mais um bocadinho…ainda está a amanhecer, de certeza, pela cor que estou a ver ali nas frinchas!
            Vira para um lado e para o outro, na sua cama fofa, mas ouve muita agitação.
- Estes vizinhos acordaram muito cedo hoje…! Onde irão com tanta pressa…? Hoje não é dia de trabalho! Ou será que estou confusa? Não…não é mesmo! Bem…estou cheia de sono, vou dormir mais um bocadinho.  
            A borboleta Mára queria dormir, mas a sua amiga Jú, já estava acordada e cheia de energia, com muita vontade de passear, e não queria ir sozinha! Bate na janela de casa da amiga Mára, e grita:
- Bom Dia, amiga…!
            Ela salta da cama, abre as persianas da sua casa. Mára e Jú conversam da janela. Mára está um pouco confusa.
- Olá, bom dia…! Caíste da cama? – Pergunta Mára.
- Eu não…felizmente não…também se caísse, a queda era pequena! Já aconteceu de acordar no chão, mas porque rebolei…nem me magoei…mas porquê? Tu caíste?
- (sorri) Não! Também não caí abaixo da cama… só estou a dizer isto, porque ainda é muito cedo! – Diz a borboleta Mára.
- Cedo? Não! Já é tarde…já amanheceu há muito, tu é que dormiste demais. – Responde Jú a rir.
- Ai…! Não pode ser!
- Mas é!
- Está tão escuro! O sol já nasceu?
- Claro que já nasceu…! Está escuro, porque o céu está cheio de nuvens. É que hoje começa o Outono.
- Ááááhhh…! É?
- É!
- Nem me lembrei disso…! Vi tão escuro, pelas frinchas das persianas que pensei que ainda estava a amanhecer.
- Não. Já são horas de estar fora da cama…!
- Já tomaste o pequeno-almoço?
- Já, claro! Nunca sairia de casa sem tomar o pequeno-almoço. Se não tomasse, nem conseguia voar.
- Pois! Nem eu. Entra!
- Está bem. Vamos dar uma volta?
- Sim, pode ser…só espero é que não chova!
            Jú entra, e Mára toma o pequeno-almoço enquanto conversam e riem alegremente uma com a outra. Veste-se, e as duas amigas saem. Estão com muita dificuldade em voar.
- Acho que não foi grande ideia termos vindo passear, hoje! – Diz Mára.
- Pois…! Acho que tens razão…eu é que pensei que não ia estar tão mau! Muitas vezes está um céu cheio de nuvens e conseguimos voar…! Hoje…estou muito presa! – Diz Jú.
- Eu também! Isto hoje não está fácil…! – Diz Mára a arfar.
- Pois não! O céu está cheio de nuvens e humidade.
- Acho que é melhor voltarmos para trás, não? – Sugere Mára.
- Não…vamos continuar…não vai chover, tenho a certeza! – Assegura Jú.
            E nesse mesmo instante, começam a cair as primeiras pingas de chuva, e o vento a soprar mais forte.
- Ui…vou-me embora! – Diz Mára.
- Sim, acho que também vou! – Diz Jú.
            E as duas borboletas tentam a muito custo voar mais depressa, para um sítio abrigado, mas não encontram, e o vento brinca com elas…sem elas quererem.
Elas gritam, mas o vento empurra-as, vira-as no ar, sopra tão forte que vira as suas asas ao contrário. Coitadinhas. Ficam muito cansadas, e o vento atira-as para o chão. Arrastam-se rasteiras ao chão, e o vento empurra-as para trás, quando elas tentam ir para a frente. Quase não conseguem respirar, mas fazem de tudo para escapar à chuva que agora é mais forte.
- Vento…pára! Por favor! – Gritam as duas.
            O vento ri-se, e sopra ainda mais forte.
- Porque é que estás a fazer isto connosco? – Pergunta Jú.
- Deixa-nos chegar a casa…vá lá! – Implora Mára.
- Só estou a fazer o que me mandam…lembrem-se que hoje começa o Outono…devem estar a contar com vários dias de chuva e vento, e não arriscar, como fizeram hoje! O céu escuro e cheio de nuvens indica que vai chover. – Explica o vento.
- Nem sempre! Há dias que apenas estão cheios de nuvens, mas não chove! – Defende Mára.
            O vento leva-as a casa. Pelo caminho, as duas apanham uma grande chuvada, fria, com gotas pesadas. As suas asinhas ficam ensopadas…e as duas desatam a espirrar, a tossir e a tremer. Ao chegar a casa, ansiosas por entrar, torcem as asas, e molham os cogumelos que estão em baixo do tronco ao lado.
- Ei, está a chover tanto que até chega aqui! – Comenta um cogumelo.
- Não…esta água vem das asas delas…olha para aquilo…! – Diz o outro cogumelo.
- Desculpem! – Dizem as duas borboletas.
- Abriguem-se! Está a carregar… - Grita um passarinho, também já com as penas todas coladas.
- Queres abrigar-te na minha casa? – Pergunta Mára.
- Não…tenho os meus filhos à espera… - Responde o passarinho.
- Trá-los também! – Sugere Mára.
- Não…obrigado, nós temos o nosso tronco! – Diz o passarinho sorridente.
- E a nós quem nos abriga? – Pergunta um cogumelo.
- Nós! – Grita um casal de folhas gigantes que acabam de ser atiradas da árvore.
            As duas folhas abraçam-se e protegem os cogumelos.
- Muito obrigado! – Respondem os cogumelos em coro.
- Mas e a vocês quem vos abriga? – Pergunta a borboleta Jú, preocupada.
- Nós somos impermeáveis. – Responde uma folha.
- Entrem meninas, não apanhem mais frio…não se preocupem mais connosco. – Diz a outra folha.
            As duas grandes folhas abrigam também as flores, e chove cada vez mais, com cada vez mais vento. As borboletas entram, completamente encharcadas, e secam-se, a espirrar, a tossir e a tremer.
- Mas que grande chuvada! – Suspira Mára, a tremer.
- Que horror! Nunca apanhei uma assim! – Diz Jú, a espirrar e a tremer.
- Pensei que ia ficar sem asas. – Lamenta Mára.
- Eu também! – Diz Jú, a tremer e a tossir.
- Ai! Acho que vou ficar doente. – Diz Jú.
- Eu também! – Diz Mára.
- Vou para a minha casa! – Diz Jú.
- Espera que a chuva pare, se não ainda ficas pior. – Diz Mára preocupada.
- Quem vai cuidar de nós? – Pergunta Mára.
- Cuidamos nós uma da outra! – Sugere Jú.
- Mas estamos as duas doentes! – Suspira Mára.
- Sim, por isso mesmo…temos de estar mais unidas que nunca…lembras-te do juramento que fizemos uma à outra quando nos conhecemos? – Lembra Jú.
- Sim, claro que me lembro! Tens razão…nunca rompemos esse juramento…e não vai ser hoje! – Sorri.
- Pois não! Vamos mas é tomar já um chá…
- Boa!
            Mára faz um chá, e as duas quase fazem a sinfonia das constipações…espirros, tosse, tremores…tomam um belo chá quente, e de repente batem à porta. É um gatinho, que está doente, e quase não consegue falar, com o pêlo todo colado. Mára abre a porta.
- Óóóhhh…! Coitadinho…! – Dizem as duas.
- Entra, bichaninho.
- Boa! E agora…ele também está doente…?
- Não…pode ser que esteja só com frio.
            Secam-no, mas o bicho está mesmo doente. Dão-lhe também um chá, e como estão os três doentes, assim que passa a chuva, cada um vai para a sua casa, com a promessa de se falarem ao telefone, se precisarem. Que grande chuvada! Mas essa tempestade foi boa porque regou a terra que estava muito seca, e juntou os animais, que se tornaram grandes amigos. Todos ficaram doentes, mas conseguiram ajudar-se uns aos outros, à medida que iam melhorando.
            Com a chuva não se brinca, e no Outono/Inverno é preciso protegermo-nos, estarmos preparados para mudanças rápidas de tempo…pois de repente, pode começar a chover.
            E vocês já apanharam uma grande chuvada? Como ficou o vosso corpo? Seriam capazes de abrigar um amigo vosso, que estivesse à chuva? Já o fizeram? Ficaram felizes de o fazer? E o vosso amigo como se sentiu?
FIM.
Lálá

(19/ Setembro/ 2013)